EDUCAÇÃO: UM DEBATE ACERCA DA FORMAÇÃO DE UM “NOVO HOMEM” NA ERA VARGAS (1930 - 1945) Marlon Teixeira de Faria* RESUMO: Nosso trabalho está situado dentro do recorte temporal que vai de 1930 a 1945, período chamado de Era Vargas. Pretendemos, aqui, abordar o papel da educação na formação social do homem, bem como de entendê-la conforme o desenvolvimento social brasileiro do período. Levando em consideração que a década de 1930 está alçada de um ideal de reorganização da política social, teremos a educação enquanto uma ferramenta auxiliar na formação de uma mão de obra especializada, técnica, que atenderá a demanda do novo período, iniciado com a Revolução de 1930. Temos por objetivo perceber as contradições das diretrizes educacionais e as diferentes definições entre os ideais Oligárquicos e Industriais que se seguiam na década de 30, partindo de uma educação voltada para a formação, apenas, técnica para os operários em contraste com uma educação de elite, erudita e voltada para os cargos do alto escalão. Partindo disso, entenderemos a formação de uma massa de trabalhadores que apenas se adequaria ao novo sistema, para atender o ideal do Estado Novo, ou seja, um “Novo Homem” para a indústria. PALAVRAS-CHAVE: Educação, Ideologia e Novo Homem. ABSTRACT: Our work is situated in a time window that goes from 1930 to 1945, a period called Vargas Era. We intend here to show the role of education in a human social building as well as to understand it according to the Brazilian social development in that time. Considering that the 1930 is an ideal scope of the reorganization of social policy, we will have education as a form in training a skilled workforce, a technique that will prove the demand of the new period began with the Revolution of 1930. We understand the contradictions of educational guidelines and the different definitions between the ideals and industrial oligarchy that followed in the 30´s, from an education geared towards training, only for technical workers in contrast with an elite education, erudite and focused on the positions of high society. Based on this, we´ll understand the formation of a group of workers who only have been appropriate to the new system to meet the ideal of the New State, or a "New Man" for the industry. KEYSWORD: Education, Ideology and the New Man. Educação, um conceito um tanto quanto evitado por alguns indivíduos que julgam este um debate de cunho somente pedagógico, preso às paredes de uma sala de aula e às metodologias dos professores. Discutir educação não significa apenas falarmos de salas de aulas, ou escolas, esse conceito enquanto resultado da prática humana desemboca, como um rio, em distintos campos sociais que às vezes nem imaginamos. Se conseguíssemos esboçar um esquema em uma folha que no centro estivesse a palavra educação, veríamos que ao ponto que situássemos alguns conceitos ligados a ela, faríamos uma, como diria José Antunes * Graduado em História pela Universidade Estadual de Goiás, Unidade Universitária de Jussara no ano de 2010. Atualmente cursando Pós-graduação (Lato Sensu) em História e Sociedade pela Faculdade Montes Belos (FMB). E-mail: [email protected] Marques (2010), recuperação da historicidade do termo, que sem dúvida alguma nos remeteriam há tempos muito distantes dos nossos, e à práticas que, a priori, poderíamos questionar sua relação com a educação. Dessa forma, recuperar a historicidade do conceito de educação significa estudar as bases da cultura humana, que se espelhariam em religiões, políticas, práticas econômicas, concepções de diferentes visões de mundo, entre outros fatores. Entendemos então que a importância de se pensar a educação encontra-se na busca da compreensão de valores, tradições, bem como a própria postura hierárquica da sociedade. Aprofundando nossas leituras na temática da educação, percebemos o quadro complexo que surge quando tentamos conceituá-la, devido ela variar conforme períodos e lugares, uma vez que, abordar esse conceito requer que superamos o senso comum, conforme diz Dermeval Saviani (2002), já que o processo educacional não se da apenas nas salas de aulas, mas através das múltiplas relações sociais. Passando a enxergar com outros olhos a prática educacional, surgiram algumas indagações que nos motivaram a desenvolver essa pesquisa, ambas relacionadas à ligação entre educação com a sociedade. Algumas de nossas indagações giram sobre questões como, qual a função da educação na sociedade? Qual a relação que existe entre os paradigmas do processo educacional com o desenvolvimento da sociedade? E também de grande importância para essa pesquisa, qual a relação entre Ideologia e Educação? Questões como essas, darão rumo à nossa pesquisa, além oferecer mais estrutura à nossa compreensão do tema da pesquisa em questão, além de mostrar ao leitor o quanto o processo educacional encontra-se um tanto quanto relacionado com o desenvolvimento social. Para o desenvolvimento desta pesquisa partimos de um recorte temporal que abrange os anos da década de 1930 a 1945 no Brasil. Sabemos que esses anos são marcados pelo período chamado Era Vargas, resultante das reorganizações políticas e sociais iniciadas, pelo menos de uma forma efetiva, com a Revolução de 1930. Esse recorte do tempo e do espaço não foi escolhido de modo aleatório. A escolha pelo tema ocorre devido, segundo Otaíza Romanelli (2010) este ser um momento conturbado, pela Crise de 1929 e após pela Revolução de 1930, que pretendia romper com o poderio social exercido no país pelas Oligarquias. Dessa forma no cenário social brasileiro havia um contraste marcado por uma visão tradicional e uma moderna, ou em outras palavras, uma visão oligárquica, agrária e uma, iniciante, industrial, tecnicista. Essas reorganizações sociais da década de 1930 passaram dos limites da perspectiva econômica e política, segundo Romanelli (2010), neste momento temos algumas mudanças nas diretrizes educacionais no país, que tendiam a se adaptar às mudanças nos campos sociais, além das reorganizações políticas e econômicas, uma vez que temos mudanças sociais a prática educacional de determinado lugar sofre alterações, pois busca se adaptar e preparar os indivíduos à nova realidade. A partir de uma reflexão sobre autores como Celso Furtado (1998) e Caio Prado Júnior (1995), chegamos à hipótese de que em períodos em que há transições, ou reorganizações econômicas e políticas, a tendência é que haja modificações em todo o aparelho social, tomando assim como meta uma série de adaptações nas práticas das esferas sociais. Aplicando esse entendimento de cunho político e econômico ao sistema educacional, principalmente quando nos baseamos em Romanelli (2010), percebemos que a educação não escapa dos reflexos sociais de tais esferas. Partimos por essa idéia por não concordarmos com uma análise da educação que não seja feita de forma estreita com os distintos campos sociais. Estando sensível a tais mudanças, percebemos que a educação a partir da década de 1930 tinha por meta atender as necessidades que a nova perspectiva sócio-política tinha por ideal. Sendo assim as práticas capitalistas e as inovações das tendências tecnicistas ganhavam espaço, ao mesmo tempo em que a educação começava a atender tal demanda. Com isso observa-se em Romanelli (2010) que a educação tinha como função neste momento a formação de homens especializados que pudessem desempenhar e suprirem as necessidades das demandas encontradas no Brasil, essas principalmente de cunho industrial. Para compreendermos essa estreita relação que estamos apresentando entre a educação e o processo de industrialização que, paulatinamente, ocorria no Brasil, há alguns fatores preponderantes para clarear nossas idéias, entre eles, um dos principais, que ocorrerá em 1929. Esse ano marca um período de catástrofe, não só pra o Brasil, pois têm-se início uma crise que abala os EUA e de lá parte ao resto do mundo, afetando principalmente os paises que tinham suas bases econômicas marcada pela exportação. No caso do Brasil a Crise de 29 foi algo que assumiu proporções catastróficas, já que, segundo Furtado (1998), o café era responsável por 70% de nossa exportação. Essa crise marca de forma mais acentuada o país devido, entre 1927 e 1928 os cafeicultores, terem preparado uma grande plantação, que por ventura seria tida como uma das maiores safras esperadas dos últimos anos. Tendo sua economia afetada, o Brasil que tinha como produto soberano o café, sofria grandes perturbações, pois em sua estrutura econômica não havia outro produto que podia fazer frente ao café, e consequentemente este encontrava problemas para sair dos estoques em direção aos mercados consumidores. Dessa maneira o Brasil passa por algumas reorganizações econômicas com o intuito de obter-se uma estabilidade diante aos efeitos da crise. Segundo Fonseca (1989), internamente, o Brasil, com Getúlio Vargas à frente, buscaria soluções para amenizar os efeitos dessa crise, tendo por algumas medidas a criação de impostos sobre a exportação do café, onde os próprios produtores deveriam pagar, dentro desse mesmo plano o governo se propõe a ajudar os produtores comprando as sacas de café destinadas ao estoque. Com esse ato, o Estado teria uma maior participação no processo econômico do país manipulando o preço das sacas de café. Se não for pretensiosa essa fala, o Brasil dava os primeiros passos rumo a uma nova era. Após haver, supostamente, rompido com a estrutura política e social marcada pela presença das decisões oligárquicas, nas palavras de Ferreira e Pinto (2006): “O golpe de outubro de 1930 que deslocou as tradicionais oligarquias do epicentro do poder tem sido tratado na historiografia a partir de diferentes vertentes explicativas.” (FERREIRA & PINTO, 2006, p. 19). Podemos dizer que houve uma rearticulação de interesses, a força e importância soberana do campo agora encontrava-se dividida com as cidades. Na sociedade brasileira dos anos de 1930 encontramos uma estreita ligação entre fatores que aos poucos tendia a manter relações muito próximas, educação-escola-indústrias, afinal, segundo Romanelli (2010) um novo sujeito, adaptados as novas tendências e preparado para suprir as demandas do mercado teria que aparecer em cena para atender as necessidades desse novo período da história brasileira. O mercado de trabalho carecia de mão de obra especializada, neste momento quem melhor que a educação para buscar soluções para essa questão? Assim a educação passa a ser vista com um olhar diferenciado pelo Estado. Após a argumentação exposta podemos ficar confusos quanto a relação das indústrias com a educação, pois, geralmente temos o hábito de associarmos a educação somente a lugares como a Sala de Aula e ao Professor. Aqui chamamos essa prática de Senso Comum. Este, segundo Saviani, faz com que “Nessas situações nós não temos consciência clara, explicita do porque fazemos assim e não de outro modo. Tudo ocorre normalmente, naturalmente, espontaneamente, sem problemas”. (SAVIANI, 2002, p. 21). Ou seja, não problematizamos nada, apenas reproduzimos, nossa consciência critica, ou filosófica cede lugar a um sentimento de conformação. Com o intuito de apresentarmos uma gama de reflexões sobre o conceito de educação, faremos uma relação entre alguns autores que trabalham nessa temática, educação e sociedade. Sabemos que a educação, enquanto conceito, é algo muito amplo e de difícil definição, assim partimos pela seguinte idéia, entendemos a educação como um fenômeno de ação humana e de reflexão epistemológica atrelada às diversas áreas do conhecimento e ligada ao meio social. Sendo assim, para nós, uma reflexão sobre a educação deve estar ligada a um tempo e espaço, para assim com clareza compreendermos suas pretensões para com a sociedade. Através de Arnaldo Niskier (1992) compreendemos que o conceito de Educação assume tendências que superam os limites estreitos que delimitam uma sala de aula, ele vai além estando presente na própria estrutura da sociedade. Um exemplo disso é quando o autor faz uma referência à educação em Esparta, que consistia em formar guerreiros, ou seja, os padrões educativos espartanos giravam à órbita das batalhas, sendo assim ligado às necessidades sociais. Percebemos aqui um exemplo de práticas educacionais que nos fazem romper com a idéia comum de ligarmos a educação somente a práticas pedagógicas e com as escolas, mais que isso, ela, como sendo, formadora de corpo social e produtora de uma identidade cultural. Neste momento Carlos Rodrigues Brandão (1995) faz algumas ponderações que vão além do que expomos acima, aqui compreendemos que o conceito de Educação não possui uma perspectiva concreta de atuação, ou seja, não contêm um significado exclusivo, pois conforme cada período histórico as necessidades da sociedade alteram as prioridades educacionais. Sendo assim, através de leituras e reflexões acerca do tema percebemos que ele varia de acordo com toda a organização social, e também das relações econômicas e do lugar onde se situa a análise. Mais que isso, segundo Brandão (1995), ela está presente em todos os momentos de nossa vida, exemplificando isso temos que: “A educação participa do processo de produção de crenças e idéias, de qualificações e especialidades que envolvem as trocas de símbolos, bens e poderes que, em conjunto, constroem tipos de sociedade”. (BRANDÃO, 1995, p. 11). Podemos ter um choque nesse momento, porém o que devemos entender é que a educação é algo como que nos deparamos desde nosso nascimento à nossa interação com a sociedade. Agora que apresentamos com traços gerais algumas características do conceito de educação, percebemos que ela não está apenas nas salas de aula, achamos pertinente apresentar o conceito por qual parte esta pesquisa, seguimos a argumentação apresentada por Nildo Viana (2004) de que: “o processo de educação é o livre processo de desenvolvimento das potencialidades humanas, da sociabilidade”. (VIANA, 2004, p. 555). Quando falamos de potencialidades não queremos delimitar, o físico ou o mental, pelo contrário, pressupomos um desenvolvimento por igual, não fragmentado. No momento histórico que procedemos nossas pesquisas não vemos a educação como um „livre processo‟ uma vez que temos as diretrizes sociais do Brasil marcadas pela influência industrial, assim de livre, a educação passa para algo manipulado, moldado com objetivo de cumprir com as demandas do mercado de trabalho, baseada em uma especide de jogos de interesse. A idéia de que com a educação chega-se a um nível social de igualdade, como nos traz Jorge Nagle (2000), ainda prevaleceu na Era Vargas, no entanto essa idéia assumiu contornos ideológicos mais fortes, que abraçou para si, de acordo com Ângela de Castro Gomes (1999), a imagem do trabalhador, como um dos responsáveis pelo desenvolvimento social do país, como um dos principais sujeitos que livraria a nação do atraso. Para compreendermos como se dá essa disseminação ideológica, primeiro temos de entender o significado desse conceito, no entanto levando em consideração que ele é discutido por vários autores, escolhemos um que nos traz de forma simples e objetiva seu significado. Marilena Chauí diz que: A ideologia consiste precisamente na transformação das idéias da classe dominante em idéias dominantes para a sociedade como um todo, de modo que a classe que domina no plano material (econômico, social e político) também domina no plano espiritual (idéias). (CHAUI, 2006, p. 85). A educação é tida aqui como o carro chefe das transformações sociais, que, no entanto é transmitida através da visão da classe dominante que por sua vez, impõe suas necessidades à classe dominada. Enquanto o cidadão acredita estar contribuindo com o desenvolvimento social de seu país ele apenas contribui, ou melhor, segue conforme o planejado, ou esperado pela classe dominante. Notamos que com toda a influência da educação, presente no meio individual quanto no coletivo, obedecemos a certos padrões e atitudes, estas que são impostas pela nossa formação em um meio social e, que neste caso, nas mãos do Estado servem para ideologicamente reprimir alguns atos e reforçar outros na consciência dos indivíduos, visando a objetivação de seus ideais capitalistas. Assim temos a possibilidade de visualizarmos como poderia se dar a relação de educação e indústria na Era Vargas, e mais que isso a importância de ambas na formação humana do período. Passando a analisar de forma mais atenciosa a Era Vargas e sua relação com a educação, encontramos uma passagem do porque ser a educação algo de fundamental importância para a concretização das idéias que posteriormente seriam divulgadas nesse estado. Sabemos de um fato, claro, quando estudamos esse período. Com a Revolução de 1930, julga-se que o Brasil rompe com as influências diretas das grandes oligarquias, caminhando rumo à industrialização (principalmente quando colocamos em questão a instauração do Estado Novo), havendo essa ruptura, há a necessidade de formação de homens especializados para o novo ramo profissional de se propaga no país nesse momento, assim como nos diz Luiz Carlos Bento (2009), para acompanhar essa nova diretriz social brasileira que se iniciava seria necessário um novo homem. Essa grande guinada educacional no Brasil ocorre, principalmente após a instauração do Estado Novo (1937), como nos diz Helena Bomeny (1999): Em sentido especial, a educação talvez seja uma das traduções mais fieis daquilo que o Estado Novo pretendeu no Brasil. Formar um “homem novo” para um Estado Novo, conformar mentalidades e criar o sentimento de brasilidade, fortalecer a identidade do trabalhador, ou por outro, forjar uma identidade positiva no trabalhador brasileiro, tudo isso fazia parte de um grande empreendimento cultural e político para o sucesso do qual contava-se estrategicamente com a educação por sua capacidade universalmente reconhecida de socializar os indivíduos aos valores que as sociedades, através de seus segmentos organizados, querem ver internalizados. (BOMENY, 1999, p. 139). Observamos aqui que a Era Vargas, com ênfase o Estado Novo conseguiu articular as demandas de mão de obra especializada, ao passo que atendia, ideologicamente, as necessidades do trabalhador, ao mesmo tempo em que dava início ao seu grande projeto de formação de um homem novo, que fosse próprio para esse momento histórico. A respeito de questões educacionais e industriais Luiz Antonio Cunha (1980), diz que: “o Estado Novo assumiu a industrialização como meta, e é provável que essa opção tenha determinado (ou, pelo menos, reforçado) a sua preocupação com a qualificação com a força de trabalho” (CUNHA, 1980, p. 449). Isso não foi só, partindo de suas bases autoritárias, ele não pretendeu apenas formar um homem ideal para o trabalho, acima de tudo, a educação tinha mais funções do que desenvolver as potencialidades do homem, de acordo com Cunha (1980): Permeava as medidas tomadas a partir de 1937, em continuidade com a política educacional autoritária desencadeadora em 1930, o objetivo da burocracia do Estado de utilizar o sistema escolar como mecanismo de difusão ideológica, de modo a não só inculcar a ideologia que o legitimava para, também, impedir que surgisse ideologias alternativas. (CUNHA, 1980, p. 464). Uma das percepções que temos da Era Vargas, era que tal momento, levando em consideração a conjuntura social do período, necessitava de um homem que fosse altamente dócil, uma vez que a atual situação de repressão, violência e censura eram constantes a partir da instauração do Estado Novo. E como vimos acima uma das formas mais eficazes de se garantir essa formação humana começava na Escola, esta sendo transformada em um veículo de difusão ideológica. Compreendendo o período, suas perspectivas políticas e econômicas, percebemos que havia “A necessidade de formar um “novo homem”, adaptado ao espaço urbano e portador de um saber técnico-científico, visava suprir as novas necessidades advindas do processo de modernização”. (BENTO, 2009, p. 14), podemos afirmar que a educação passava por algumas mudanças paradigmáticas. Sua característica de formação humana teria algumas mudanças, onde as tendências industriais ficaram mais fortes, principalmente quando temos em pauta a imagem do trabalhador. Não podemos ser ingênuos de pensar que essa estratégia de juntar a educação e a industrialização se dá de uma hora à outra. Como sabemos a educação não é um processo de ocorre rapidamente, mas há passos lentos, mas contínuos. Assim foram inauguradas, de acordo com Cunha (1980) instituições que ficaram responsáveis por essa nova tendência de ensino, que focou, com ênfase os empregados de fabricas, assim como seus filhos, estes tidos como futuros empregados, como foi o caso do Serviço de Ensino e Seleção Profissional (SESP)1. Para compreendermos o que era mais focado nessas instituições Cunha nos diz que: O SESP oferecia um curso de ferroviário, com quatro anos de duração, para as seguintes especialidades: ajustador, torneiro-fresador, caldeireiro, caldeireiro-ferreiro, ferreiro, eletricista, operador mecânico. Um curso de aperfeiçoamento para o pessoal das oficinas, compreendendo disciplinas como português, matemática, desenho técnico, higiene, prevenção de acidentes e outras. Um curso de tração, para foguistas e maquinistas. Um curso de telegrafo e iluminação, para os aprendizes que já possuem formação profissional mecânica equivalente à terceira série do curso de ferroviários, completando-a com mais um ano de aprendizagem. Um curso de tráfego, visando à especialização do pessoal dos departamentos de movimento e telégrafo, ensinando desenho e matemática. (CUNHA, 1980, p. 447). 1 Sobre essa instituição Cunha (1980) diz que se diferenciava de outras instituições divido, sua „clientela‟ ser restrita à filhos de trabalhadores, principalmente os ferroviários. Assim seus cursos eram, principalmente, preparatórios para o trabalho nas Estadas de Ferro, uma vez que segundo o autor esta era muito visada no Brasil neste momento. Aqui não pretendemos criticar essa instituição por oferecer aos operários tais cursos e especializações que permitissem há esses um aperfeiçoamento de seus serviços nas fabricas. No entanto devemos perceber, conforme a citação, que as disciplinas ministradas nos cursos eram as exatas, ou seja, a tendência de especialização técnica em áreas matemáticas eram maiores2. Como podemos ver não encontramos disciplinas como sociologia, história e filosofia, que atuam de forma crítica, despertando a consciência do indivíduo. Então podemos ver que a formação humana em tais instituições era parcial, ou seja, eram moldas conforme as necessidades, não abrindo margem para outra disciplina que não fosse utilizada no trabalho. Então, o projeto educacional em pauta nesse momento visava uma ascensão e necessidade de desenvolvimento da mão de obra especializada para suprir a demanda do mercado de trabalho, enquanto do outro lado acentuava uma estagnação do desenvolvimento da consciência crítica dos indivíduos, uma visão que fosse capaz de fazê-los perceber as contradições dentro do próprio sistema educacional e até mesmo com a própria composição do Estado Novo e de seu cotidiano. Dentro da reflexão em que se pauta nossa discussão observamos que conceitos já discutidos como educação, ideologia e industrialização se juntam no Estado Novo e se mesclam em uma mesma ação que visa reproduzir e legitimar o discurso dominante. Assim comportamentos sociais, visões de mundo e de justiça foram reorganizados ideologicamente pelo Estado, uma vez que de acordo com Boris Fausto (2003), o Estado Novo foi a concentração dos poderes centralizadores no Brasil, e que frente a seu comportamento apresentou facetas de progresso e bem estar social. Ao longo deste artigo compreendemos que a educação do ponto de vista conceitual deve ser analisada a partir de uma compreensão e reflexão sobre espaço e tempo, bem como as necessidades políticas, no bojo da sociedade, já que conforme vemos em Niskier (1992) as tendências sócias, necessidades e os próprios objetivos podem alterar os paradigmas educacionais. Aqui nos surpreendemos com o campo de sua atuação, uma vez que quando rompemos com o senso comum vemos que ela se encontra presente em todos os momentos de nossa vida. Dessa forma, momentaneamente, findamos nossas discussões entendendo, após análise de nosso quadro bibliográfico, que a educação durante a Era Vargas foi o carro chefe de uma série de transformações por qual a sociedade brasileira passava, como por exemplo, o 2 Referente ao trecho supracitado cunha ainda nos diz que: “Foram criadas as escolas técnicas secundarias para oferecer, além dos cursos secundários – equiparados aos federais, seguindo currículos estipulados pelo Ministério da Educação –, cursos exclusivamente industriais e comerciais.” (CUNHA, 1980, P. 445). processo de expansão industrial, e em decorrência a urbanização. Em um período conturbado por crises econômicas, políticas a educação serviu como forma de propagar os ideais de um Novo Estado que esperava, ou melhor, necessita de um Novo Homem e até mais que isso, ela forneceu as ferramentas para poder, com êxito, construir as bases desse Estado. Através das estratégias do Estado, juntamente com a prestação da Educação como forma de disseminação ideológica, temos na Era Vargas, de forma implícita a execução de um projeto de formação humana que através dos anos deu as bases para a construção da fôrma na qual seria feito o Novo Homem. Pensando agora no termino do artigo, cada esfera social, de certa forma, tendera a buscar uma parcela nessa formação humana, no entanto nesta pesquisa, e em nossa atual condição nos pautamos apenas em pensar as contribuições educacionais na execução desse projeto. Pensar as possibilidades de atuação de outras instâncias sociais para a formação humana deve se realizada em outra pesquisa, com mais maturidade de idéias. Como nos diz Wilson de Sousa Gomes (2010), a educação além de um caráter de libertação social e elevação intelectual, por outro lado também tem a capacidade de fazer o oposto. Aqui ousamos dizer que ao invés de libertação mental e elevação social a educação, manipulada pelo Estado, se dedicou a aprisionar os indivíduos no senso comum, a cada vez ficava evidente as diferenças de ensino, até pela criação das Escolas e Instituições (como o SESP) que ministravam cursos técnicos formando assim um Homem Unilateral, limitado socialmente, próprio de uma educação capitalista. O Homem Omnilateral a que Viana (2004) se refere em seu texto, foi eliminado dos paradigmas educacionais brasileiro da década de 1930 a 1945. A idéia de um homem completo com pleno desenvolvimento em aspectos intelectuais e manuais foi barrada, por um Estado Autoritário que o privou do desenvolvimento de varias potencialidades, proporcionando-lhe uma formação incompleta. Aprisionado por jaulas invisíveis, paulatinamente surgia um homem intelectualmente limitado, apto a sobreviver em uma sociedade marcada por desigualdades e censuras onde este se vê como um cidadão feliz e presente no desenvolvimento social do país. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BENTO, Luiz Carlos. Educação em Litígio: Gustavo Capanema, Conciliação e Reforma nos anos de 1930. 1ª ed. Rio de Janeiro: Editora Corifeu, 2009. BOMENY, Helena. M. B. Três decretos e um ministério: a propósito da educação no Estado Novo. In: Dulce Pandolfi (Org). Repensando o Estado Novo. Rio de Janeiro: Ed. Fundação Getúlio Vargas, 1999. p. 137-166. BRANDÃO, Carlos Rodrigues. O que é Educação. 33ª Ed. São Paulo: Brasiliense, 1995. CHAUI, Marilena. O que é Ideologia. São Paulo: Brasiliense, 2006. CUNHA, Luís Antônio. A Política Educacional e a Formação da Força de Trabalho Industrial na Era Vargas. In: Revolução de 30: Seminário Internacional. Editora Universidade de Brasília, 1980. p. 436 – 469. FAUSTO, Boris. 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