GRUPO DE ESTUDOS L1NGUfSTICOS 1Q(1):01-o3,1985. CRITERIOS PARA IDENTIFICACAO DOS VERBOS DE ACAo E DE PROCESSO Francisco da Silva BORBA Sebastia:o Expedito IGNA.CIO IleSE: UNESP Considerando-se que 0 VER80 constitui 0 elemento central na organizat;:ao da frase, a sua c1assificat;:ao se deve fazer a partir das relat;:oes sintatico-semanticas estabelecidas entre ele e os participantes da estrutura frasa!. (Vamo-nos, aqui, ater aos participantes obrigat6rios, isto 6, aqueles suficientes e necessarios para que a frase seja considerada gramatical). Alguns pontos referenciais basicos orientarao os crit~rios adotados para a c1assificat;:ao dos verbas, como, por exemplo, as funt;:oes, consideradas basicas, de AGENTE e PACIENTE, bem como a DINAMICA e II ESTATIVIDADE da frase. Em princfpio, pode-se dizer que a c1assificat;:aodo verbo se fara pelas relat;:oes estabelecidas com 0 primeiro participante - ou sujeito -, sendo que as suas poss(veis relat;:i5escom os demais participantes - ou complementos - orientarao a determinat;:ao de eventuais subgrupos dentro de uma mesma c1asS8.Assim, os verbos do portugues se distribuem por quatro classes: verbosde ACAO, DE PROCESSO, de ACAO-PROCESSO e de ESTADO, que assim se caracterizam: 1. Verbos de ACAo - Sao aqueles cujo sujeito se caracteriza como AGENTE, isto ~, 0 elemento instigador, capaz de, por si mesmo, desencadear a a~o, a diMmica da frase. Da( dizer-se que os verbos de ACAo compoem uma frase ativa que indica um fazer por parte do sujeito. Em princfpio, a funt;:ao de sujeito-agente s6 se exerceria por seres animados, todavia sao tamb~m considerados agentes, e portanto participantes das frases.tivas, os nomes nlo-animados que se apresentem numa das seguintes condit;:oes: (i) que estejam animizados (Ex.: As estrelas sorriam) ou (ii) que sejam nlo-animadospotentes, isto6, capazes de realizar uma at;:ao especffica (Ex.: 0 mar batia nas pedras). Sao exemplos de verbos de ACAO: a) De repente, 0 homem chorou; b) A mulher reelamava porque a crianc;a nao comia; c) Este rapaz nao babe, nao fuma e nao mente; d) 0 homem esbravejava sem razao; e) Todos riam ao mesmo tempo; f) A floresta geme ao entardecer; g) 0 carro corria a 180 quilOmetros por hora. Os complementos dos verbos de ACAo apresentam as seguintes caracter(sticas: nao sao afetados pela at;:ao verbal, isto 6, nao experimentam mudant;:a de qualquer ordem (estado Hsico ou moral, posicionamento no tempo ou BORBA, F. da S. e IGNACIO, S.E. - Critllrios para identific~o dOl verbos de ~o processo. GRUPO DE ESTUDOS L1NGUISTICOS,1Q(11~1-03.1985. e de no espalfo. etc.). e apresentam os seguintes tralfos semanticos: (i) receptivo. Ex.: Nao se deve bater em crianlfa; (ii) destinatArio. Ex.: 0 candidato acenava para a multidao; (iii) locativo. Ex.: 0 mar batia nas pedras; (iv) direcional. Ex.: Vim de Araraquara (origem). Passei por Ribeirio (extensao). Cheguei a Batatais (destino). Preto Observa<:io: 0 complemento pode-se caracterizar ainda como mero especificador do conteudo da alfao verbal. Nesse caso ele pode apagar-se. Ex.: a) 0 homem chorava I~rimas sentidas; b) 0 rapaz s6 bebe cerveja e come frutas; c) A crian(f8 dormia 0 sana dos justos; d) A mulher gritava desaforos. 2. Verbos de PROCESSO - caracterizam-se por comporem frases cujo sujeito. sendo inativo (paciente ou experimentador do processo). e afetado por algo que estc\ foraCtele. Oessa forma. 0 sujeito safre uma mudalllf8 de condi~o ou de estado. Oa{ dizer-se que as frases processivas, embora apresentem tambem uma dinAmica, se distinguem das frases ativas por· indicarem um acontecer com relalfio ao sujeito. Este, por sua vez, se representa por nomes de qualquer uma das subclasses: animados, nio-animados, concretos, abstratos. Ex.: a) 0 poeta morreu; b) As crianlfas aquietaram-se; c) 0 sorvete derreteu; d) 0 vasa quebrou; e) A porta abriu; f) A saudade nao envelhece, ela morre de tedio. Alguns subgrupos constroem-se com complementos que possuem as seguintes caracter{sticas: (i) representam um elemento que, de alguma forma, afeta ou impressiona 0 sujeito, completando, pois, os chamados verbos de percep~o; tanto podem 'Ser meta (ex.: De repente vi uma cena deprimentel, como fonte ou origem (ex.: Ouvi, estarrecido, 0 sam da porta que se abria); (ii) representam uma parte inalien<ivel do sujeito. Ex.: a) Joao quebrou a perna; '\ b) A cozinheira cortou 0 pulsa. Outro grupo constr6i-se com um predicativo, que representa 0 nucleo do predicado e que se une aos chamados verbos de Iiga(:io ou copulativos. Esse predicativo e representado por um adjetivo ou por um substantivo com funlfao adjetiva. Ex.: a) Maria ficou/tornou-se triste; b) A rainha se tornara escrava; BORBA, F. da S. e IGNACIO, S.E. - Crit6rios para identific~io dos verbos de at;io e de processo. GRUPO DE ESTUDOS L1NGUfSTICOS,1Q(lI:01-03,1985. c) A fada virou feiticeira. Observacao: Nas frases processivas, ainda que nao esteja expl(cito, sempre se pressupCie um elemento causativo ou um instrumental, responsavel pela mudanl,:a que se processa no sujeito, e que se indica pela significal,:ao do verba ou do conjunto verbo + predicativo. Ex.: a) 0 sorvete derreteu com 0 calor; b) A cozinheira cortou 0 pulso com a faca; ~ c) Maria ficou triste com a noticia. Com os verbos de percep~o, a causa esta no pr6prio complemento: a) Vi uma cena deprimente; b) Ouvi 0 som da porta. : Em s(ntese, a distinl,:ao fundamental entre os verbos de ACAO e os de PROCESSO esta nas relal,:oes semanticas que se estabelecem entre 0 verbo e 0 sujeito. Nos primeiros, sendo 0 sujeito um AGENTE, ha sempre um FAZER da sua parte. Nos segundos, sendo 0 sujeito um PACIENTE ou um EXPERIMENTADOR, ha sempre um ACONTECER com relacao a ele. Oa( ser poss(vel, como indica W.L. Chafe(*), estabelecer uma regra geral baseada nas perguntas "Que FAZ xl" para os verbos da ACAO, e "Que acontece a xl", para os de PROCESSO, sendo, natural mente, x 0 sujeito. Outro dado importante, que ~ consequencia desse ACONTECER, ~ que, nos verbos de PROCESSO ha sempre uma muda~ de estado ou de condi\:io do sujeito. Outros indicadores contidos nas relal,:oes entre 0 verbo e os complementos, bem como 0 crit~rio da dinllmica VS estatividade, servirao para distinguir os verbos acima dos verbos de ACAO-PROCESSO e de ESTAOO, como se vera a seguir. (*) CHAFE, W.L. - Significado e estrutura JinglUstica. Trad. de M.H.M. Neves, O. G. L. A. S. Campos e S.V. Rodrigues. Sao Paulo, Ao Livro Tecnico, 1979.