É fato que o contrato, dentro da sociedade moderna

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A EXCEÇÃO DO CONTRATO NÃO CUMPRIDO E
A SUA RELAÇÃO COM A GARANTIA DAS OBRIGAÇÕES NO DIREITO BRASILEIRO1
PAULO R. ROQUE A. KHOURI2
É fato que o contrato, dentro da sociedade moderna de consumo, é o
negócio jurídico a que mais se recorre para permitir a circulação de bens e
serviços na sociedade. É a própria circulação da riqueza que se
instrumentaliza, quase sempre, através dos contratos.
O ordenamento jurídico empresta efeitos a esses negócios e lhes
outorga proteção a fim de permitir que o que foi livremente acordado deva
ser fielmente cumprido. Na maioria das vezes, o vínculo jurídico contratual
estabelece-se, sem a necessidade de cumprimento de qualquer formalidade
especial, tão somente com base no mero acordo de vontades em torno do
objeto do negócio, o que vai permitir que a sua instrumentalização, em si,
não constitua entrave à velocidade normal do tráfego econômico.
O incumprimento da obrigação é um incidente que coloca em risco o
crédito. A sociedade não tem interesse que essa crise se prolongue;
mesmo que o incidente de incumprimento ocorra é fundamental que ele
possa ser superado, voltando o cumprimento das obrigações contratuais ao
seu curso normal; entretanto, se o credor, mesmo valendo da execução
coativa da obrigação, não recebe seu crédito essa sua legítima expectativa
revelar-se-á inteiramente frustrada.
1
Trabalho apresentado no curso de Mestrado em Direito da Universidade de Lisboa, setembro 2003.
O Autor é advogado, professor, pós graduado em Direito do Consumo pela Faculdade de Direito da
Universidade de Lisboa, Mestrando em Direito Privado pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa.
Autor do Livro Contratos e Responsabilidade Civil no CDC, Brasília Jurídica, 2002.
2
2
Não obstante a garantia geral patrimonial outorgada ao credor, no
sentido de que todo o acervo patrimonial do devedor, que seja penhorável,
responde pelo cumprimento de suas obrigações; existem ainda as garantias
especiais que atuam no sentido mesmo de reforçar essa garantia geral. No
caso das garantias especiais pessoais ou fidejussórias aumenta-se esse
acervo patrimonial com a
vinculação de terceiras pessoas
à relação
jurídica obrigacional . A partir de então, não é apenas a garantia geral
incidente sobre o patrimônio do devedor originário, que vai atuar na
proteção dos efeitos do incumprimento, mas também o patrimônio de
terceiros, que aceitaram essa vinculação. Nas garantias reais, vinculam-se
não diretamente pessoas ao cumprimento efetivo da obrigação, mas
patrimônios específicos, que são destacados do acervo de bens do próprio
devedor ou de terceiro para fazer face aos efeitos do incumprimento.
E poderá haver outros institutos que desempenhem essa função de
garantia do cumprimento das obrigações, ao mesmo tempo que efetivam
outras funções? Em outras palavras, pode haver institutos, que mesmo
desempenhando precipuamente outras funções, acabem por desempenhar
ainda a função de garantia das obrigações? A doutrina tem respondido
afirmativamente a essa indagação, surgindo neste contexto, as garantias
indiretas.
Neste trabalho, nos interessa saber se o medieval instituto da
exceção do contrato não cumprido, próprio dos contratos bilaterais, a par de
permitir a paralisação momentânea do cumprimento da obrigação com
vistas a pressionar o excipiente ao cumprimento integral do contrato, se ele
desempenha uma função de garantia.
3
Se o contrato, a partir da vontade, é fonte, por excelência das
obrigações, e, portanto, sujeitam-se ambas as partes ao seu fiel
cumprimento, a existência do sinalagma obrigacional pode permitir a
exceção desse cumprimento. O sinalagma pode permitir a paralisação
momentânea da obrigação, tendo como ponto de partida a conduta do
devedor a que não oferece a prestação que lhe compete.
O estudo desse instituto da exceptio non adimpleti contractus é,
portanto,
de
fundamental
relevância
para
a
compreensão
do
desenvolvimento da relação obrigacional nos contratos bilaterais. Isto
porque ao mesmo tempo em que ele, como se verá adiante, persegue o
cumprimento integral do contrato, acaba por proteger o crédito do
contratante que o aciona, evitando-se assim os efeitos perversos do não
cumprimento da obrigação a que faz jus.
No sentido de buscar uma resposta para a questão que este
trabalho propõe, impõe-se, inicialmente, uma breve nota sobre a evolução
deste instituto com acento na influência do direito canônico medieval sobre
sua origem efetiva.
Para relacionar esse instituto com a garantia das obrigações, tornase importante dialogar com os requisitos que autorizam o seu acionamento.
Embora, em regra,
o instituto deva ser acionado quando não haja a
simultaneidade do cumprimento, há obrigações, em contrato bilateral, que
mesmo sem a necessidade de cumprimento simultâneo, autorizam o seu
acionamento. Excepcionalmente, ante o risco fundado do não oferecimento
da
prestação
por
parte
daquele
contratante
que
deve
cumpri-la
posteriormente, pode o contratante a quem incumbe o cumprimento em
primeiro lugar recusar a prestá-la.
4
Antes de chegar a uma conclusão sobre a natureza da exceção do
contrato não cumprido, importa aferir sua afinidade com os institutos do
direito de retenção e a compensação. São institutos que reconhecidamente
permitem a não entrega da prestação ao credor ou, no caso da retenção, a
recusa mesmo dessa entrega, tendo como ponto de partida a defesa do
recebimento de um crédito. Se esses institutos, ao permitirem essa conduta
ao credor, de alguma forma estão também excepcionando o cumprimento
da obrigação, por que a exceção não guardaria em si também essa função
de garantia? Da mesma forma deve-se identificar os pontos de contacto
entre a exceção e outros mecanismos de proteção ao crédito, como a
cláusula penal e as arras.
Todos os pontos acima, naturalmente servirão ao lastreamento de
uma conclusão sobre a natureza da exceção do contrato não cumprido,
enquanto detentor de uma função de garantia; função esta que poderia
coexistir ao lado de sua função primordial, a do cumprimento integral do
contrato. Esta função que a exceção é chamada a desempenhar não colide
com uma eventual função de garantia; pelo contrário, pode com ela
compatibilizar-se perfeitamente, conforme adiante se demonstrará.
1.
BREVE NOTA SOBRE A EVOLUÇÃO DO INSTITUTO DA
EXCEÇÃO DO CONTRATO NÃO CUMPRIDO
Não há na evolução do instituto da exceção do contrato não
cumprido, uma associação direta com qualquer instituto da garantia das
5
obrigações, que, segundo anota M. FRAGALI, era estranho ao pensamento
da “giurisprudenza romana” 3.
O direito romano também não teria conhecido o instituto da exceção
do contrato não cumprido, nos termos em que ele hoje encontra-se
consolidado. Isto porque, embora existissem contratos com obrigações para
ambas as partes, como é o caso da própria compra e venda, amplamente
conhecida pelos romanos,
dado o extremo formalismo dos negócios
jurídicos à essa época, as mesmas eram independentes e não
interdependentes como reclama a aplicação do instituto 4. Tal implicava que
o cumprimento do contrato era sempre obrigatório, mesmo ante a falta do
cumprimento da outra parte. O que se abria ao contratante fiel era a
execução do contrato e não sua resolução ou suspensão da execução. O
vendedor corria, inclusive, o risco de perder a coisa se não promovesse a
execução da obrigação não cumprida contra o comprador5.
Se o direito romano não desenvolveu o conceito de contrato
sinalagmático, com obrigações interdependentes, permitiu, por outro lado,
que o contratante fiel se socorresse ou no direito de retenção ou no direito
de compensação. Tais institutos eram amplamente conhecidos no Direito
Romano. O direito de retenção era freqüentemente invocado na compra e
venda (emptio venditio) e locação com efeito prático semelhante ao do
medieval instituto da exceção do contrato não cumprido.6 Entretanto, o
contraente fiel, diante da falta do cumprimento de uma obrigação, podia-se
socorrer ou no instituto da retenção, ou no instituto da compensação.
3
4
5
In “Garanzia (diritto privatto)” , Enciclopédia del Dirito, XVII, 1969, p. 446
Cf. ABRANTES, José João - in “A Excepção de Não Cumprimento do Contrato no Direito Civil
Português”, Almedina Coimbra, 1986, pág. 16
Cf. VIGARAY, Alvarez Rafael – “La Resolucion de Los Contratos Bilaterales por
Incumplimiento”. Universidade de Granada. !972., pág. 11.
6
Referidos institutos eram amplamente admitidos na
romana”
“giurisprudenza
7
. A doutrina ainda hoje, conforme adiante se verá, sempre
identificou elementos de proximidade entre a exceção, o direito de retenção
e a compensação; milenares institutos estes, que sempre desempenharam
uma função de garantia das obrigações, ainda que de forma indireta.
O instituto desenvolveu-se mesmo a partir da Idade Média, por
influência do direito canônico, vinculado à idéia de justiça comutativa e boa
fé. A falta de cumprimento de uma obrigação era considerada tanto pecado
como a própria mentira, porque significava quebra da palavra empenhada.
Isto porque ao contratar os canonistas consideravam que a obrigação era
assumida perante Deus, tendo em vista que esse ato comportava um
juramento 8.
Para compatibilizar a indissolubilidade da obrigação que tinha, em
vista de seu caráter sagrado e a posição de fragilidade em que ficava o
contratante fiel, os canonistas desenvolveram a idéia da interdependência
das obrigações de ambas as partes. O cumprimento de uma obrigação
depende do outro cumprimento a que está ligado e que a justifica. Daí que
os canonistas passaram a admitir que essas obrigações bilaterais eram
portadoras de uma condição tácita 9.
Essa idéia de interdependência das obrigações, fundamental para a
consolidação do instituto, acabou por outorgar ao credor um reforço no seu
crédito, que concepção anterior do direito romano ele não tinha, qual seja a
6
Cf. KASER, Max – “Direito Privado Romano”. Tradução de Samuel Rodrigues. Ferdinando
Hämmeler. Fundação Calouste Gulbenkian, 1999, pág. 230
7
Cf. KASER, Max. Ob. Cit. , pág. 230
8
Cf. VIGARAY, Rafael Alvarez . Ob. cit. , pág. 24.
9
Idem, ob.cit. pág. 25: “El forzar el promitente al cumplimiento de su propria obligación , incluso,
en el caso de incuplimiento de la otra parte , chocaba manifestamente contra los princípios de
la equidad y entonces se admitió que ejecución de la contraprestación fuese um condición
tácita de la validez de la promessa”.
7
de que não estaria sujeito ao sacrifício patrimonial da entrega da prestação
se, simultaneamente, a contraprestação não lhe fosse entregue.
Impor-se ao contraente fiel o cumprimento do contrato ante o
incumprimento do devedor importaria em perda do equilíbrio da relação
jurídica obrigacional, com sérios danos à justiça comutativa do contrato
10
.
Daí que os canonistas consideravam como uma ofensa também à boa fé,
que o contratante infiel pudesse exigir a obrigação da outra parte. Todos os
contratos sinalagmáticos, então, perante o direito canônico passaram a
comportar a exceção do contrato não cumprido como uma condição
implícita presente nessas obrigações. O direito canônico não criou o
contrato bilateral. A compra e venda, contrato bilateral, por excelência, era
amplamente conhecida dos romanos. Entretanto, pode-se dizer que, ao
reconhecer a interdependência das obrigações, emprestou às obrigações
bilaterais um mecanismo desconhecido até então para a proteção do
interesse do credor: o direito de paralisar o cumprimento do contrato até o
recebimento de seu crédito. Conforme adiante se verá, na efetivação dessa
proteção, a exceção, em certos momentos, vai funcionar como uma
verdadeira garantia.
Após experimentar sua plena consolidação na idade média, o instituto
acabaria esquecido na primeira grande codificação da Idade Moderna: o
Code Civil Francês de 1804. Por esse dispositivo, o contratante fiel podia
pleitear a resolução, uma vez que, por influência do direito canônico, o
direito francês não renúncia à idéia da presença de uma condição resolutiva
implícita nos contratos bilaterais. Por outro lado, ao tratar do incumprimento
das obrigações, o Código Napoleônico apenas admitiu expressamente a
10
Cf. ABRANTES, João Jose. Ob. Cit. pág. 19.
8
resolução, omitindo-se quanto à exceção
11
.
Para VIGARAY
12
, por
influência da Escola da Exegése e a verdadeira sacralização da autonomia
da vontade, chegou-se a sustentar mesmo a impossibilidade da exceção,
com base no artigo 1184º do Code. Entretanto, apesar de uma resistência
inicial, a exceção acabou sendo admitida na doutrina e na jurisprudência.
O BGB alemão de 1900 foi a primeira grande codificação a consagrar
expressamente o instituto
13
. Perante o Direito Civil alemão, pode-se dizer
que, diante do incumprimento de uma obrigação nos contratos bilaterais, a
exceção era a regra; a resolução operava-se apenas em um número muito
reduzido de casos.
Hoje,
o
ordenamentos
instituto
jurídicos
está
presente
em
contemporâneos14,
praticamente
Códigos
Civis
todos
Italiano
os
,
Espanhol, Argentino, Chileno, Japonês etc. No direito brasileiro, o instituto
que já existia no artigo 1092 do Código Civil de 1916, integra também o
novo Código de janeiro de 2003, praticamente com a mesma redação do
anterior, só que o instituto acabou desdobrado em dois dispositivos
11
15
. Em
Cf. Idem , ibidem. Não foi apenas a exceptio non adimpleti contractus que acabaria esquecida
no Código Napoleônico, outros institutos diretamente ligados à justiça comutativa, como a
lesão e a rebus sic standibus também não foram positivados naquele ordenamento. Tal se
deve à manifesta vocação liberal do Code , muito mais apegado ao valor da segurança
jurídica, que à justiça das relações obrigacionais. Neste sentido, qualquer instituto, cuja
atuação importava em uma interferência direta ou indireta no conteúdo do negócio jurídico, foi
afastado pelo Code. Veja que até recentemente, o Código Napoleônico não tinha uma única
norma que permitisse ao magistrado reduzir a cláusula penal flagrantemente excessiva, pois
só no final do século passado, o ordenamento francês passou a admitir expressamente essa
possibilidade de revisão da cláusula penal.
12
Ob. cit. pág. 33
13
ENNECCERUS, Ludwig et alii – ”Tratado de Derecho Civil. Apêndice. Código Civil Aleman”.
Bosh.Casa Editorial. Barcelona, 1955 . pág. 67.
Art. 320º do Código Civil Alemão - “Quien está obligado por um contrato bilateral puede negar la
prestación que lê incumbe hasta la efecuación de la contraprestación, a no ser que este
obligado a cumplir la prestación antipadamente ...”
14
Cf. BEVILAQUA, Clovis. Código Civil Brasileiro Comentado. Livraria Francisco Alves, Rio de Janeiro,
1934, pág. 263
15
Art. 476: “Nos contratos bilaterais, nenhum dos contraentes, antes de cumprida a sua
obrigação pode exigir o implemento da do outro.”
9
Portugal, a consagração expressa do instituto veio com o Código Civil de
1966 16, onde teve tratamento semelhante ao do BGB Alemão.
2.
AS GARANTIAS DAS OBRIGAÇÕES DIANTE DO RISCO DO
INCUMPRIMENTO
Há em todo o contrato, sobretudo, nos contratos de duração, um
momento delicado, digo mesmo crucial, para o interesse das partes e para a
própria sociedade, que é momento do cumprimento da obrigação pactuada.
Essa obrigação materializa-se na prestação consistente na conduta humana
positiva ou negativa, que deve ser efetivada ao seu credor. A sua morte
natural é o pagamento, o cumprimento em si. Se o cumprimento inocorre,
pode-se dizer que há uma crise na relação obrigacional; crise essa que
pode levar à frustração, por inteiro, da expectativa do credor.
É, exatamente, no sentido de proteger o credor quanto aos efeitos
dessa crise, cujo risco todos os contratantes, de alguma forma, em maior ou
menor grau, sempre têm de enfrentar, é que no ordenamento jurídico
existem vários mecanismos, cuja finalidade precípua é a proteção efetiva do
crédito. As garantias são, por excelência, um meio eficaz a essa proteção.
PAULO CUNHA coloca brilhantemente o problema em foco; quando afirma
que “em matéria de obrigações toda a garantia há de convergir para este
10
resultado: fazer com que o devedor pague, ou melhor, fazer com que o
credor receba” 17.
A principal função de uma garantia, conforme reconhece a doutrina 18,
é seguramente a de garantir o cumprimento de uma obrigação. É para esta
função precípua que converge todo sistema de garantias 19, seja ela pessoal
ou real. Não importa o tipo de incumprimento, se total ou até mesmo parcial,
a garantia age como mecanismo protetor do credor, para que ele receba o
seu crédito tal como se obrigou o devedor. A partir do momento que o
credor protege o seu crédito com uma garantia especial, conforme sustenta
ROMANO MARTINEZ20, ele fica em uma posição privilegiada em relação
aos outros credores. É que além da garantia geral que tem todo e qualquer
crédito, representada pelo patrimônio do devedor, ela dispõe ainda de um
reforço da mesma (da garantia geral).
Ao
garantir
o
cumprimento
da
obrigação,
a
garantia,
secundariamente, está realizando uma outra função ao reduzir os riscos da
insolvência do devedor. Como se sabe, o patrimônio do devedor é garantia
geral de toda e qualquer obrigação por ele assumida. A doutrina italiana a
denomina de garantia primária ou genérica
21
. Esse patrimônio deve ser
avaliado pelo credor antes de contratar. Se esse patrimônio é bom, não está
gravado com nenhum ônus, em princípio, o próprio credor pode assumir o
risco de contratar sem exigir qualquer outra garantia especial. Entretanto,
mesmo abstraindo-se o risco futuro do patrimônio ser alienado de forma
gratuita ou onerosa, essa garantia geral pode também não ser idônea o
suficiente para proteger o interesse do credor, seja porque está gravada
17
18
19
20
In “DA GARANTIA DAS OBRIGAÇÕES”, Lisboa, 1938, pág. 16.
SANCHEZ , José Ignácio Bonet e CAROL, Ubaldo Nieto ett alli - “Tratado de Lãs Garantias em
la Contratación Mercantil”, Tomo I, Citas, Madrid, 1996, pág. 133. Nesse mesmo sentido,
GOMES, Orlando, “Obrigações”, pág. 227
FRAGALI, Michele. Ob. cit., pág. 446
ett alli, Ob. Cit., p. 67
11
com algum ônus, seja porque é insuficiente para fazer face à dívida a ser
assumida. Em outras palavras, o risco quanto à solvabilidade do devedor
persiste e ele pode comprometer o cumprimento da obrigação. A opção que
teria seria exatamente de reduzir consideravelmente esse risco quanto ao
efeitos do incumprimento, recorrendo a algum tipo de garantia especial
22
.E
aqui entra uma importante característica do instituto da garantia especial,
que é a de acrescer ao crédito um reforço patrimonial, que originariamente,
o crédito não tem. Ou seja, para além da garantia geral coberta pelo
patrimônio do devedor, adiciona-se à proteção do crédito algo que o crédito
não tem: uma garantia pessoal ou real. Essa adicionalidade também está
presente de forma mais flagrante na garantia real, quando ela é prestada
por terceiro. Entretanto, mesmo quando a garantia real é prestada pelo
próprio devedor, ao destacar um patrimônio específico de sua massa de
bens para vincular ao cumprimento de uma obrigação, acaba por privilegiar
o crédito deste credor em relação aos demais credores; e este privilégio o
crédito originariamente não tem. É o que denomina-se um reforço qualitativo
da massa patrimonial. No caso da garantia pessoal, como se vinculam
terceiras pessoas ao pagamento da dívida do devedor, adiciona-se à
garantia geral representada pelo patrimônio do devedor outros patrimônios,
reduzindo-se sobremaneira o risco quanto aos efeitos do incumprimento e,
portanto, da solvabilidade do devedor. Na garantia real, vinculam-se coisas
determinadas ao cumprimento da obrigação, móvel ou imóvel, o risco
quanto aos efeitos do incumprimento é reduzido sensivelmente23.
Entretanto, mesmo não negando de forma alguma a fundamental
importância de uma garantia especial para a proteção do crédito, deve ser
21
Cf. FRAGALI, Michele. Ob. cit. pág. 449.
Fragali ( ob. cit. pág. 449) refere-se às garantias especiais como secundárias ou específicas.
23
Cf. PEREIRA, Cáio Mário da Silva. “Instituições de Direito Civil”, Vol. IV, 12ª. Edição, Forense, Rio de
Janeiro, 1995, pág. 220
22
12
registrado que nenhuma garantia, mesmo a real, elimina por completo o
risco do incumprimento. Na verdade a garantia especial não impede o
incumprimento da obrigação; ela apenas reduz os riscos quanto ao efeito
deste incumprimento. E qual é o risco quanto ao efeito deste
incumprimento? Exatamente o risco do credor não conseguir recuperar o
crédito que concedeu, enfim, o risco de perder definitiva e totalmente aquele
crédito. Frise-se que se trata de redução de riscos, não de sua eliminação.
No caso da garantia pessoal, pode ocorrer que os terceiros que se
vincularam ao cumprimento da obrigação, no momento do cumprimento,
tenham- se tornado insolventes, não havendo aí como o interesse do credor
ser satisfeito com o recebimento do crédito. No caso das garantias reais, a
coisa vinculada ao cumprimento da obrigação pode-se deteriorar ou se
perder. Veja, então, que este importante reforço patrimonial ao crédito, por
si só, não é suficiente para eliminar o risco do incumprimento ou seu efeito.
Conforme adiante se verá, quando a natureza do contrato permite, o
instituto da exceção do contrato não cumprido pode acabar concretizando,
com razoável eficiência, uma função que a garantia especial, por si, como
visto, não tem como eliminar: os efeitos quanto ao risco da insolvência do
devedor ou do terceiro garantidor, ou seja, o risco da perda definitiva do
crédito concedido.
3.
A EXCEÇÃO E SEUS REQUISITOS
A exceção do contrato não cumprido consiste na faculdade concedida
a qualquer dos contratantes, em contrato bilateral, com cumprimento
simultâneo das obrigações, de suspender ou recusar o cumprimento da
obrigação que lhe compete até que outra parte contratante ofereça a
13
prestação, que lhe incumbe. Tal recusa em cumprir a obrigação, ao
contrário do que sucede nos contratos unilaterais, onde não há sinalagma
ou
interdependência
das
obrigações,
só
é
possível
porque
o
contratante/devedor não atua apenas nessa qualidade na relação
obrigacional, ele é também credor; o mesmo ocorre com o outro
contratante24. A obrigação de um contratante é a razão de ser da obrigação
do outro contratante. É a este nexo de interdependência que se denomina
sinalagma, que está presente no nascimento de ambas obrigações,
sinalagma genético, como no momento de seu cumprimento, sinalagma
funcional.25
Para a doutrina majoritária, o grande fundamento do instituto da
exceção do contrato não cumprido seria o equilíbrio contratual26. Impor a
realização de uma prestação sem o oferecimento simultâneo da
contraprestação desequilibraria a relação.
ABRANTES
27
admite o
fundamento do equilíbrio contratual para exceção, mas conjuga-o com o
fundamento do cumprimento integral do contrato. A exceção não buscaria
apenas o equilíbrio da relação, mas o próprio cumprimento integral do
contrato. Para ABRANTES, não fosse o cumprimento integral do contrato
também o fundamento da exceção, diante da ameaça do incumprimento,
simplesmente ao contraente fiel só restaria a alternativa de pedir a
resolução do contrato e não a sua suspensão ou a própria execução
forçada da obrigação. Parece nos que o real sentido do instituto da exceção
24
25
26
27
Cf. TELLES, Inocêncio Galvão. “Direito das Obrigações”, 7ª. Edição, Coimbra Editora, 1997, p. 450
Cf. COSTA, Mário Júlio de Almeida. Direito das Obrigações. Almedina. Coimbra. 1994. p. 299
Cf. LEITÃO, Luís de Menezes – “Direito das Obrigações”, Vol. I, 2ª. Edição, Almedina,
Coimbra, 2002, pág. 194. Nesse mesmo sentido, TELLES, Inocêncio Galvão, Ob. cit. , p. 451
Ob. cit. pág. 199. Embora não apresente uma discussão maior sobre a natureza desse instituto
o pensamento de SERRA, Adriano Vaz ( “Boletim do Ministério da Justiça”, no. 67, p. 18), nos
conduz a essa mesma justificativa: “A excepção do contrato não cumprido, sendo uma simples
excepção dilatória, supõe que o excipiente quer o cumprimento do contrato e apenas recusa a
cumprir enquanto o outro contraente não cumprir ou não oferecer o seu cumprimento
simultâneo.”
14
é exatamente o do cumprimento integral do contrato, sem a sua conjugação
com o equilíbrio contratual, que apenas indiretamente nos oferece algum
critério para enfrentamento da questão, nunca sua justificativa para fazer
atuar o próprio cumprimento integral do contrato. Não se está para tal
perquirindo se o contrato está equilibrado ou desequilibrado, porque
pressupõe que, se o contrato não tivesse esse equilíbrio, sequer, o credor
estaria a buscar o seu cumprimento na forma avençada. Daí que outros
meios lhe socorreriam, como a própria resolução ou revisão por
onerosidade excessiva; não a exigência do cumprimento, que, em si,
comporta o recurso à exceção. Se é certo que o instituto não deve ser
tratado sobre o prisma da vontade subjetiva em si, mas com uma
concepção objetiva28 do próprio desenvolvimento da relação obrigacional,
não é a falta do cumprimento de um contrato que objetivamente o
desequilibra; o equilíbrio não se relaciona diretamente com o cumprimento
ou incumprimento, mas com o conteúdo da própria prestação29.
Entretanto, o que interessa propriamente a este trabalho, é saber se o
instituto da exceção do contrato não cumprido, a par de outras funções que
exerce no desenvolvimento da relação obrigacional do contrato bilateral, do
próprio fundamento do cumprimento integral do contrato, comporta uma
função de garantia; ainda que na forma de uma garantia indireta das
obrigações. Para tal é importante verificar os requisitos que fazem acionar o
instituto para confrontá-los com as garantias.
Inicialmente, importa separar o instituto da exceptio, da resolução por
incumprimento. A doutrina sustenta que ambos os institutos têm como ponto
28
29
Cf. TELLES, Inocêncio Galvão. Ob. cit. , p. 451
Cf. ASCENSÃO, José de Oliveira. Direito Civil. Teoria Geral. Vol. III, Coimbra Editora, 2002, pág. 211.
15
de partida o incumprimento da obrigação
30
. Não cumprida a obrigação em
um contrato bilateral, seria caso de excepcionar o cumprimento do mesmo
ou de sua resolução. Aqui, observa-se, de imediato, uma impropriedade
nesta alegada afinidade. Na exceção, no plano fático, não existe
propriamente um incumprimento da obrigação. Não podemos falar ainda de
incumprimento fático porque, como se verá adiante, tendo em vista o nexo
de interdependência, a obrigação que é a razão de ser da outra obrigação
também não foi cumprida; só podíamos falar de incumprimento fático se
uma parte no contrato bilateral cumpre sua obrigação e a outra parte, na
data avençada, deixa de cumprir a que lhe compete. Aí sim, há
incumprimento fático, porque a obrigação que era dependente da
contraprestação já foi cumprida, enquanto esta não o foi no momento que
deveria sê-lo.
Uma vez que
as obrigações de ambas as partes devem ser
cumpridas simultaneamente, a execução do contrato é suspensa até que a
outra parte se disponha a cumprir a que lhe compete. Concordando com o
pensamento de SERPA LOPES31 é realmente uma condição do exercício
da exceção o “excipiente não ter cumprido ainda a sua prestação”.
Há,
nesse momento, propriamente uma exceção; excipiente e excepto: não
devedor adimplente e devedor inadimplente. Como sustenta ORLANDO
GOMES, há uma paralisação da execução do contrato
doutrina alemã
32
. Consoante a
33
, na exceção do contrato não cumprido “cada contratante
puede reclamar la prestación de la outra parte sin necessidade de cumplir
la suya própria”. A questão coloca-se desta forma por conta da
simultaneidade do cumprimento. Impondo-se o cumprimento simultâneo da
30
31
284
32
ABRANTES, João José. Ob cit pág. 171.
Curso de Direito Civil, 4ª. Edição, Vol. IV, Livraria Freitas Bastos, Rio de Janeiro, 1962, pág.
GOMES, Orlando – “Contratos”. 18ª. Edição. Forense. Rio de Janeiro. 1998. pág. 92.
16
prestação e contraprestação, ligadas pelo nexo de interdependência, a
questão de saber se o exercício da exceção foi ou não corretamente
acionado é de natureza probatória, que recai sob o contratante que
excepciona o cumprimento
34
. Ao excipiente compete a prova do correto
acionamento da exceção. Até porque, se o excipiente não tiver acionado
justificadamente o instituto, será ele, o considerado inadimplente, não o
excepto. Pode-se até a admitir, para efeito de futura ação de perdas e
danos, que o contratante que se dispõe a cumprir o contrato é propriamente
um contratante fiel; e infiel
35
a parte que não se dispõe a oferecer
simultaneamente o cumprimento da sua obrigação e que, portanto, deve ser
obrigada a reparar eventuais prejuízos sofridos por aquele ou penalizada
com a aplicação de eventual cláusula penal. Em outras palavras, nesta
etapa do desenvolvimento da relação obrigacional, o contratante que deu
causa ao acionamento da exceção, paralisando o contrato, deve-se sujeitar
aquelas conseqüências.
Se
a
exceção
tivesse
como
pressuposto
propriamente
o
incumprimento fático da obrigação não haveria sequer como cogitar para a
exceptio qualquer função de garantia, conforme adiante se demonstrará.
Como exercitar essa função, que pressupõe o poder de uma das partes de
não oferecer a sua obrigação, se o contrato já está incumprido?
Imaginemos o caso de uma compra e venda, onde o preço e a coisa devem
ser entregues 30 dias após a celebração do contrato. Se o vendedor
entrega a coisa antes de receber o preço, como pode o vendedor
excepcionar o cumprimento do contrato, suspendendo o cumprimento de
33
34
Cf. A. Von Thur, ob. cit., pág. 53.
“El demandante , al reclamar el cumplimiento de um contrato bilateral, reconoce que adeuda
um contraprestación...si afirma haber cumplido y la prestación que lê incumbe o haberia
ofrecido em sus debidos términos, debera aportar la prueba de esa afirmación...” ob . cit. pág.
56.
17
sua obrigação, se já a cumpriu? Neste caso, a solução que socorre o
vendedor não é mais a exceção e sim a resolução por incumprimento. No
exemplo citado não há sequer, como a exceção funcionar como garantia,
porque ele só assumirá essa função se o vendedor, ante o não
oferecimento simultâneo do preço, suspender a entrega da coisa.
A exceção também pressupõe a existência de um contrato bilateral; o
mesmo não sucede com a resolução que pode operar-se também em
contratos unilaterais
36
. Distinção fundamental diz respeito aos fins
perseguidos por ambos institutos; enquanto na exceção se busca apenas
suspender a execução do contrato como meio de pressionar o contratante
infiel ao cumprimento integral do contrato, portanto, o fim perseguido é
claramente a manutenção do contrato; na resolução, o que se busca não é
a manutenção da relação obrigacional, mas seu fim prematuro.Tanto que,
em princípio, o incumprimento
37
que autoriza a exceção em um contrato
sinalagmático não é o mesmo que autoriza a resolução. A resolução,
mesmo no contrato bilateral, pressupõe um incumprimento definitivo
38
,
onde a prestação já não seja fisicamente possível, porque o interesse
objetivo do credor não se faz mais presente; na exceção, o incumprimento é
35
36
37
38
LEITÃO, Luís de Menezes (ob. cit. pág. 193), diante da exceção do contrato não cumprido,
utiliza a expressão contraente fiel e não fiel.
ABRANTES, João José - ob. cit. pág. 172, sustenta que a resolução tem como pressuposto a
“existência de um contrato bilateral e a inexecução da contraprestação pelo outro contratante”.
Discordo de tal posicionamento, porque a resolução tem por fundamento o incumprimento
contratual, independentemente desse incumprimento ser proveniente de um contrato
sinalagmático ou unilateral. Veja o caso do comodato, onde tanto a lei brasileira (art. 552º,
CCB), como a lei portuguesa (art. 1140º, CCPT), autorizam a resolução por justa causa.
O termo incumprimento encontra-se em itálico, porque conforme anteriormente sustentando
por este autor, na exceção do contrato não cumprido não há propriamente incumprimento, mas
sim uma suspensão momentânea da execução do contrato.
Neste sentido, sustenta GOMES, Orlando (ob. cit. pág. 93), que a resolução nos contratos
bilaterais com execução simultânea das obrigações “somente deve ser adotada quando o
cumprimento da obrigação se tornar impossível”. Ora, se a obrigação a que parte se obrigou se
tornar impossível ou não interessar mais objetivamente ao credor, não há como acionar o
instituto da exceção; mas sim, em resolução da relação obrigacional.
18
temporário, a prestação ainda é possível e interessa objetivamente ao
credor.
O acionamento do instituto da exceção do contrato constitui-se
mesmo em um direito do contratante fiel de recusar a sua prestação,
enquanto o outro não venha cumprir a prestação que lhe compete. Em todo
contrato bilateral, há a presença de um sinalagma, um nexo, que une as
obrigações das partes; um sinalagma genético e outro funcional. O
sinalagma genético relaciona-se com o próprio nascimento das obrigações
contratuais. Uma obrigação nasce ligada a outra e sem ela não subsiste. É
assim que na falta do sinalagma genético a própria validade do negócio
encontra-se afetada. No sinalagma funcional, já deixamos a formação do
contrato e entramos na execução ou no próprio desenvolvimento da relação
obrigacional.
Se
o
cumprimento
de
uma
obrigação
pressupõe
o
cumprimento simultâneo de uma outra obrigação, à qual se encontra ligada,
haverá assim a efetivação desse sinalagma.
Não é todo o contrato bilateral que autoriza, de início, a exceção.
Tudo vai depender da forma como foi pactuado o cumprimento das
obrigações, que emergem do contrato, bem como a própria natureza dessas
obrigações. Primeiramente, se a obrigação coberta pelo sinalagma se tornar
impossível
39
, não haverá qualquer utilidade em se excepcionar o
cumprimento do contrato. O caso será mesmo de resolução.
Por último, embora no contrato bilateral, as obrigações sejam
portadoras de uma interdependência, pode ocorrer que as partes tenham
pactuado prazos diversos para o cumprimento de suas obrigações ou uma
39
“Extingue-se o direito de opor a exceção se a prestação se tornou impossível...” Cf. GOMES,
Orlando, ob. cit. pág. 93.
19
das partes tenha até cumprido por inteiro sua obrigação, enquanto a outra,
com o consentimento contratual, diferiu para o futuro esse cumprimento.
Nesta hipótese, só restará ao credor duas hipóteses: ou a execução forçada
da obrigação ou a própria resolução do negócio.
Situação diferente é aquela, onde mesmo não havendo a exigência
de cumprimento simultâneo das obrigações, há ainda obrigações das duas
partes a serem cumpridas. Aqui, a exceção poderá ainda funcionar. Nesses
contratos, o contratante a quem incumbe fazer a prestação em segundo
lugar, poderá excepcionar o cumprimento de sua obrigação, ante a falta
inicial daquele a quem incumbia a realização primeira da prestação. Aqui,
nota-se que o contratante que deve cumprir primeiramente a prestação não
poderia utilizar a seu favor, em princípio, a exceção. Isto decorre do próprio
risco que ele teria assumido ao permitir o cumprimento da obrigação da
outra parte em prazos diferentes e não simultaneamente. Esta situação
acaba por deixar o contratante a quem incumbe a realização posterior da
prestação em uma situação mais confortável, pois só irá cumprir a sua
prestação, quando já tiver recebido a que lhe compete pelo contrato. Na
outra ponta, é flagrante a situação delicada do outro contratante, que ao
efetuar a sua prestação ainda não recebeu a que tem direito. Diz-se então
que aquele contratante tem a seu favor o benefício do prazo.
Entretanto, este contratante poderá perder esse benefício em duas
situações: 1) quando deixa de cumprir a sua prestação e automaticamente
já não poderá exigir do contratante fiel o cumprimento da outra obrigação
subseqüente; 2) quando haja risco manifesto, quanto à solvabilidade desse
contratante.
20
Na primeira situação, a perda do benefício do prazo opera-se em
favor do contratante que, em princípio, não o tinha. Como conseqüência, a
exceção passa a poder ser oposta por quem originariamente não detinha
esse benefício. Nessa situação, é até comum que a mora do outro
contratante possa conduzir, nos termos do contrato, ao vencimento
antecipado das obrigações desse contratante faltoso.
Na segunda situação, a exceção é utilizada excepcionalmente para
proteger o contratante que se mostra disposto a cumprir suas obrigações,
contra aquele que ameaça futuramente não proceder da mesma forma.
Para que tal se opere, não basta uma desconfiança infundada do
contratante potencialmente fiel, mas indícios suficientemente claros que
possam conduzir, no mínimo, a uma dúvida significativa quanto ao
incumprimento. Essas dúvidas, geralmente, relacionam-se com a prova de
um estado pré-falimentar ou de insolvência do outro contratante, ou nas
hipóteses em que a falência, ou a insolvência já tenham se verificado.
Entretanto, contra esse indício pode voltar-se o outro contratante
oferecendo-se a prestar garantias, que afastem a dúvida justificada.
Em todas as situações que a exceção é chamada a funcionar, mesmo
quando haja prazos diferentes para o cumprimento da obrigação, vê-se que
ela age protegendo o patrimônio do contratante fiel, evitando que ele efetive
o sacrifício patrimonial contido na prestação que lhe compete. Ao obstar
eficientemente este sacrifício patrimonial, muito embora o contratante fiel
não tenha ainda recebido a contraprestação, conforme decorre do contrato,
ele acaba por impedir a constituição do crédito. Essa proteção dá-se de
forma efetiva no contrato bilateral porque, por conta do sinalagma genético
e funcional, o crédito só nasceria para ele quando ele materializa sua
prestação; com a exceção, justificadamente, essa materialização não ocorre
21
e, portanto, não pode falar-se em recuperação do crédito. É que
antecipadamente, antes de sua materialização, o sinalagma funcional a
impede. Podemos dizer que esse modo de atuar do instituto corresponde
também a uma função de garantia? Por ora, ainda é cedo para concluir
nesse sentido, mas, de imediato, é possível aferir que ao impedir
validamente o sacrifício patrimonial do credor, futuro excipiente, a exceção
acaba por atuar de forma eficaz em um momento anterior ao de qualquer
garantia especial das obrigações em si ,ou seja, quando o contrato está
sendo executado antes da concessão do crédito. Como é da própria
natureza do instituto, as garantias especiais atuam na recuperação do
crédito, ou seja, sua atuação é a posteriori e não a priori, como é o caso da
exceção.
4.
A EXCEÇÃO E SUA RELAÇÃO COM A GARANTIA DAS
OBRIGAÇÕES
As garantias típicas, pessoais ou reais, comportam uma característica
essencial: a acessoriedade. As garantias estão presas a um contrato
principal e acessoriamente exercem uma função auxiliar em benefício de
outro negócio
40
. A função exercida pelas garantias é permitir a recuperação
do crédito, em caso de incumprimento da obrigação. Extinto o contrato
principal, extinto também está o negócio acessório de garantia. Da mesma
forma, que declarado nulo o negócio principal, a garantia não tem como
subsistir.
40
TRIAS, Encarna Roca - ob cit. pág 149.
22
As garantias reais são indicadas numerus clausus pelo legislador; já
para as garantias pessoais admite-se que possam ser atípicas, ou seja,
regidas pela autonomia da vontade41. Entretanto, seja qual for a natureza da
garantia, elas serão sempre acessórias; não integram a natureza e estrutura
do negócio principal. Conforme enfatiza ENCARNA ROCA TRIAS
42
, elas
têm essencialmente uma origem convencional.
No caso do instituto da exceção do contrato não cumprido não se
pode falar em acessoriedade e, muito menos, em origem convencional. A
exceção decorre da própria natureza do contrato bilateral, sinalagmático.
Não se pode falar em acessoriedade, se o seu acionamento decorre do
próprio modo de atuar das obrigações. Ela é, em si, o efeito da execução do
próprio negócio principal. Existe, independentemente da vontade das
partes. Tal condição afastaria a exceção do instituto das garantias?43 As
partes, é certo, podem retirar, via contrato o efeito do sinalagma funcional,
aceitando correr o risco de receber uma prestação, sem ter recebido a
contraprestação, como é caso da compra e venda a prazo, onde o bem já
foi entregue imediatamente, após a celebração do contrato e o preço será
pago em prestações. Entretanto, nada pactuando em sentido contrário, as
obrigações, nos contratos bilaterais, devem ser cumpridas simultaneamente
e, portanto, sujeitas naturalmente a exceção.
Como a exceção vincula apenas as partes e não coisas, se ela tem
alguma relação com as garantias especiais, essa relação só poderia ser
com as garantias pessoais, jamais com as garantias reais. Aqui, parece-me
41
42
43
Cf. MARTINEZ, Pedro Romano ett alli. Ob. cit. pág. 150/151
Ett. Alli – “Tratado de Lãs Garantias em la Contratación Mercantil”, Tomo I, Civitas, Madrid,
1996, pág. 147
Para o estudioso espanhol, TRIAS, Encarna Roca - ob cit. pág. 135, aqueles meios que
buscam evitar prejuízos patrimonais e que derivam naturalmente da obrigação pactuada, como
a ruptura do sinalagma, não podem enquadrar-se como garantias em sentido técnico.
23
importante confrontar a exceção com outra característica que além da
acessoriedade, está presente nas garantias pessoais: a adicionalidade. As
partes, espontaneamente, como dito anteriormente, para além da garantia
geral representada pelo patrimônio do devedor, acrescem ao crédito um
reforço patrimonial que ele (o crédito), por si não tem. A garantia real
prestada pelo próprio devedor não adiciona patrimônio à garantia geral em
si, mas ao vincular um bem específico do patrimônio do devedor ou de
terceiro pode-se dizer aumenta-se qualitativamente a massa patrimonial
garantidora do débito, tornando menos vulnerável a recuperação do crédito.
Não há como sustentar a presença da adicionalidade no instituto da
exceção. Pela sua própria natureza, a proteção que ela dá ao crédito nada
lhe adiciona, é da essência do próprio instituto; naturalmente ela já existe
em um contrato bilateral com execução simultânea das obrigações. Não se
pode dizer que o instituto não subsiste sem o negócio principal, porque ele é
próprio negócio principal.
Pode-se
mesmo
dizer
que
ante
a
falta
da
acessoriedade,
característica marcante das garantias especiais e da adicionalidade não
haverá mesmo como sustentar para o instituto da exceção do contrato não
cumprido, a qualidade de uma garantia em sentido técnico, em outras
palavras, uma garantia especial.
Entretanto, tal não importa em negar ao instituto uma garantia em
sentido amplo, conforme adiante se verá.
5.
A EXCEÇÃO E AS GARANTIAS INDIRETAS
24
De início, anote-se que, conforme sustenta GOMES DA COSTA44, o
fato de um instituto servir a proteção do crédito, por si só, não permite lhe
atribuir uma função de garantia indireta. Também não me parece afastar a
função de garantia de um determinado instituto simplesmente porque ele,
consoante critério defendido por GOMES DA COSTA45, não aumenta nem
qualitativa nem quantitativamente a massa patrimonial. Concordo que a
função de garantia não deverá estar sempre associada à proteção ao
crédito conferida por qualquer instituto jurídico; entretanto, parece-me que o
acento deve ser colocado na forma como este ou aquele instituto consegue
neutralizar os efeitos do incumprimento. Em outras palavras, mesmo que a
garantia indireta não implique em aumento qualitativo ou quantitativo da
massa patrimonial do devedor, importa ter em conta como ela, de alguma
forma, consegue neutralizar os efeitos do incumprimento. Se de alguma
forma,
algum
instituto
age
nesse
sentido,
pode-se
dizer
que
complementariamente à proteção do crédito está atuando no sentido de
fazer com que o credor receba e o devedor pague; que, repita-se, é o
critério defendido por PAULO CUNHA46 em torno do qual deve “convergir
todo sistema de garantias”.
Para tal atribuição a qualquer instituto e como critério deste trabalho
parece-me, então, de fundamental importância primeiro avaliar se o mesmo
permite, de alguma forma, a recuperação do crédito ou se mesmo não
estando apto para tal, consegue impedir o sacrifício patrimonial do credor.
Se, diante do incumprimento, o instituto não tem aptidão para agir na
recuperação do crédito ou se, antes mesmo do incumprimento, não tem
como evitar o sacrifício patrimonial do credor, nos parece que qualquer que
seja o instituto protetor do crédito, não haverá como sustentar para ele uma
função de garantia; enfim, será tão somente um mecanismo de proteção ao
44
45
“Assunção Fidejussória de Dívida” - Almedina, Coimbra, 2000
Ob. cit., pág 78
25
crédito, nada mais do que isso, não estará fazendo com que o devedor
pague e o credor receba.
Diferentemente da cláusula penal, que simplesmente pune o
contratante faltoso, mas não impede, em si, o prejuízo, conforme adiante se
verá; diferentemente também da própria garantia especial, que também não
tem como evitar a efetivação do prejuízo, mas apenas busca a recuperação
do crédito, a exceção, como dito anteriormente, por atuar à priori, antes da
efetivação do crédito, acaba por impedir o prejuízo consistente no sacrifício
patrimonial da prestação do excipiens. Como afirma CALVÃO DA SILVA,
“...a função da exceptio pode ser relevante, evitando ao excipiens a perda
do valor da sua prestação”
47
. Se a exceção impede a efetivação do
prejuízo, acaba por neutralizar sobremaneira o acionamento de eventual
garantia especial ou real pactuada, uma vez que estas atuam recuperando
crédito, a posteriori, portanto; ao passo que a exceção atua obstando a
concessão desse mesmo crédito.
Pode-se dizer que enquanto a garantia em sentido técnico atua
amenizando os efeitos do incumprimento, recuperando o próprio crédito, a
exceção atua preventivamente na proteção desse mesmo crédito.
JOÃO CALVÃO DA SILVA
48
sustenta para o instituto “uma eficaz
garantia para o credor contra a impotência econômica do devedor”. Como
admite CALVÃO DA SILVA, ela não constituiria em uma garantia direta,
mas uma garantia “indireta”. Ao proteger o patrimônio do credor/excipiens
contra a impotência econômica do devedor/excepto, a exceção deixaria de
atuar como simples mecanismo de pressão, assumindo também uma
46
47
Ob. cit., pág. 18.
Ob. cit. pág. 337
26
relevante função de garantia. ORLANDO GOMES49 vê na simples recusa de
um contratante em oferecer a sua prestação uma séria dúvida quanto ao
recebimento da contraprestação; motivo pelo qual defende para o instituto
também uma função de garantia.
COSTA GOMES vê na exceção apenas um importante meio de
pressão contra o devedor; entretanto, resiste a enxergar no instituto uma
função de garantia, ainda que de garantia indireta
50
. A exceptio atuaria tão
somente na proteção do crédito. Esta pressão exercida contra o devedor
seria simples manifestação e conseqüência do próprio sinalagma funcional,
da interdependência das obrigações. Para COSTA GOMES faltaria à
exceção duas condições básicas para o preenchimento de uma função de
garantia: o reforço quantitativo e um reforço qualitativo (como ocorre nas
garantias reais) na massa patrimonial, que atua na relação obrigacional
protegendo o interesse do credor.
ROMANO MARTINEZ
51
, na mesma linha adotada por COSTA
GOMES, recusa uma função de garantia para a exceção porque ela, além
de não assegurar o cumprimento por parte do outro contratante, não
“aumenta ou confere qualquer privilégio em relação ao patrimônio do
devedor ”.
O
fato
de
a
exceção
não
aumentar
quantitativamente
ou
qualitativamente a massa patrimonial protetora do interesse do credor, não
me parece suficiente para retirar do instituto uma função de garantia. Essa
característica deve ser fundamental para o reconhecimento de uma garantia
pessoal (ainda que atípica) ou real, em sentido técnico, mas não para o
48
49
50
51
In “Cumprimento e Sanção Pecuniária Compulsória” - Almedina, Coimbra, 1996, pág. 336.
In Obrigações. 11ª. Edição. Forense. Rio de Janeiro,1997, pág. 227
In “Assunção Fidejussória de Dívida” - Almedina, Coimbra, 2000, págs. 78/79.
Ett alli - “Garantias de Cumprimento“- 3ª. Edição, Almedina, Coimbra, 2000, pág. 192.
27
reconhecimento de uma garantia indireta. Para se assumir enquanto tal, é
evidente que não se lhe pode exigir essa característica da adicionalidade.
Não se trata aqui de reconhecer, então, que todo o mecanismo de proteção
ao crédito acabaria por conter uma função de garantia indireta. O que nos
parece ser fundamental para enxergar na exceção essa função, como dito
anteriormente, é o modo como atua, evitando de forma eficiente a perda da
prestação do excipiente, ou seja, ela de fato contribui para neutralizar os
efeitos de um possível incumprimento.
Se o que se busca com a garantia é a recuperação do crédito
concedido, não se concebe como negar uma função de garantia que
protege o credor contra o risco de perder o próprio crédito; crédito este, que
seria concedido não fosse o acionamento oportuno da exceção.
Se lhe falta a adicionalidade patrimonial que, repita-se, deve ser
própria das garantias em sentido técnico, não se pode dizer que por via da
exceção também não se assegura, ainda que indiretamente, o cumprimento
da obrigação por parte do excepto. É que se o instituto se manifesta como
meio de pressão; esta pressão é dirigida contra o excepto justamente para
que cumpra a sua obrigação, e portanto, o contrato. E qual é objetivo de
uma garantia especial, senão, garantir o cumprimento forçado dessa
mesma obrigação? Ora, se o modo peculiar de a exceção atuar caminha
para que o devedor cumpra sua obrigação e dá ao credor um meio de
pressão para que isto ocorra, o instituto não poderá ser tido como um
simples meio de proteção ao crédito.
É admitindo para a exceção uma função de garantia indireta, que o
instituto será confrontado com outros institutos que, aparentemente,
desempenham também essa mesma função.
28
6.
A EXCEÇÃO E A COMPENSAÇÃO
Na compensação, crédito e débito de relações jurídicas distintas,
onde figuram as mesmas partes, se encontram para extinguir obrigações.
As partes são credor e devedor uma das outras. Pode-se dizer que o credor
também protege o seu crédito, na medida em que seu débito com a mesma
parte da qual é, repita-se credor em outra relação jurídica, atua como
garantia do próprio cumprimento da obrigação. Neste sentido, VON THUR 52
aponta para a existência de uma afinidade da compensação com o direito
de retenção, que tem uma flagrante função de garantia. Isto, evidentemente,
só pode ser possível quando os mesmos sujeitos tenham duas relações
obrigacionais com origens diversas, onde cada qual seja, em função dessa
diversidade de relações, credor e devedor do outro a um só tempo. Nesta
situação, o risco do incumprimento da obrigação é praticamente
neutralizado. Daí que, v.g., o débito do devedor para com o credor na
relação jurídica 1 é compensado, portanto, extinto, pago, cumprido com o
crédito da relação jurídica 2, desse mesmo devedor contra aquele credor.
Encontrando-se, naturalmente, os débitos se extinguem e se o objetivo de
uma garantia é assegurar ao credor que ele receba, não há como afastar
essa função de garantia da compensação.
Haveria, então, uma afinidade entre a exceptio e o instituto da
compensação? Os dois institutos agem de forma totalmente independente,
diferenciada, embora, ao final, acabem por emprestar ao credor uma
29
garantia maior, que a simples garantia geral, quanto ao risco do
inadimplemento.
Na compensação, como ocorre nos contratos bilaterais, o credor é
também devedor. Só que enquanto nos contratos bilaterais esta condição
dupla de credor e devedor está presente em cada participe (contratante) de
uma mesma relação jurídica; na compensação tal qualidade só é possível
se existente duas relações jurídicas obrigacionais distintas. Nos contratos
bilaterais, “toda prestação é contraprestação”
53
. Há, portanto, uma
reciprocidade de créditos e débitos. Diante desta reciprocidade, o crédito de
um credor acaba por tornar-se a garantia do outro. Essa garantia acaba por
ser automática, nesse contexto.
Entretanto, ao contrário do que possa aparecer, a compensação tem
um
acionamento
extremamente
restrito.
Não
basta
apenas
uma
reciprocidade de créditos para que ela opere, existe ainda a necessidade de
que os créditos recíprocos sejam, ao mesmo tempo, homogêneos, fungíveis
e exigíveis 54.
Pode-se dizer, inclusive, que a exceptio, quando autorizada a atuar,
acaba por fazê-lo mais amplamente. Na compensação
55
, o que há não é
propriamente uma suspensão da prestação, mas a sua extinção em função
52
53
54
55
In “Tratado de Las Obligaciones”, tomo II, Tradução de W. Roces, Editorial Réus, Madrid,
1999. pág. 175 “prácticamente la retención representa para el deudor lo mismo que la
compensación, posto que em ninguno de los casos entra em possessión de su dinero...”
Cf. MIRANDA, Pontes - “Tratado de Direito Privado”. Vol. XXVI, 3ª. Edição, Borsoi, Rio de
Janeiro, 1971, pág. 97
Cf. VARELLA, João de Matos Antunes – “Das Obrigações em Geral”, Vol. II, 7ª. Edição,
Almedina, Coimbra, 1997, p. 201/204
Art. 368º CCB: “Se duas pessoas forem ao mesmo tempo credor e devedor um da outra, as
obrigações se extinguem até onde se compensarem”.
30
de dois sujeitos serem ao mesmo tempo credor e devedor um do outro
56
.
Enquanto na exceção, os contratantes estão presos a um mesmo negócio
jurídico e, portanto, é essa mesma relação que gera o crédito e o débito; na
compensação, os créditos e débitos provém de fontes de obrigações
diversas. Há que considerar ainda que a exceção opera-se entre quaisquer
naturezas de prestação, fungível ou infungível, homogêneas ou não;
bastando apenas que haja o sinalagma; o que, em tese, não autoriza a
compensação.
A compensação atua a posteriori, pois as partes só podem
compensar se as prestações, que geram o crédito recíproco, foram
efetivadas; materializadas,
ao passo que na exceptio, ela atua a priori,
antes que qualquer prestação tenha sido efetivada. Parece-me, de forma
clara que, neste sentido, a exceptio ao conduzir à suspensão da prestação
acaba por se tornar mais eficaz na proteção do crédito, que a própria
compensação. Imagine o comprador que, por força de um contrato bilateral
de compra e venda, deva entregar o preço mediante a entrega da coisa,
pelo vendedor. Não havendo a entrega da coisa, ele simplesmente
suspende o pagamento do preço. A esse propósito veja o que ocorreria no
seguinte caso típico de compensação: A faz um empréstimo a B, no valor
de R$ R$10.000,00 ( dez mil reais), com vencimento para 10.11.2003. Em
outra relação obrigacional, A deve a B R$10.000,00, em função de compra
e venda, tendo já recebido o bem vendido com vencimento para aquela
mesma data. Em 10.11.2003, A simplesmente extingue o seu débito do
mútuo com o crédito que ele tem da relação de compra e venda. Registrese, entretanto, que se ele (A) não tivesse recebido o bem da compra e
venda não haveria como invocar a compensação e, por conseguinte, seu
56
Neste sentido, VENOSA, Sílvio de Sálvio – “Direito Civil. Teoria Geral das Obrigações e Teoria
Geral dos Contratos”. Atlas. São Paulo. 2001, pág. 355.
31
crédito do mútuo ficaria sem uma maior garantia, que não a garantia geral
do patrimônio do devedor.
7.
A EXCEÇÃO E O DIREITO DE RETENÇÃO
A doutrina alemã
57
chegou a sustentar que a exceção decorria do
direito de retenção, sendo uma de suas modalidades
58
. Ë que pelo
exercício do juz retentionis o devedor também recusa o cumprimento de
sua prestação, a entrega da coisa, ante a falta do cumprimento de um dever
relacionada com a própria coisa, particularmente, despesas feitas na sua
manutenção ou administração.
Entretanto, veja que, de início, uma particularidade afasta essa
absorção da exceptio pelo juz retentionis. É que a falta de cumprimento que
autoriza o exercício do direito de retenção não decorre da interdependência
das obrigações
59
, ou seja, o incumprimento não guarda qualquer
sinalagma com o cumprimento da obrigação, que
Assim é, v.g, no mandato remunerado
justifica a retenção.
60
, onde o mandatário, ante a falta de
remuneração, pode reter a coisa administrada, em virtude do mandato. Na
exceção, há a ligação de duas obrigações que nascem conjuntamente e
devem ser cumpridas simultaneamente, ao passo que na retenção, a
obrigação que a justifica nasce de forma independente. Ainda que o código
civil brasileiro não indique expressamente o direito de retenção, como um
57
58
59
Cf. THUR, A. Von - ob. cit. pág. 59.
No direito brasileiro, VENOSA, Sílvio de Salvo - ob. cit pág. 355, aponta para a existência de
afinidades entre os dois institutos.
Neste sentido, SILVA, João Calvão da – “Cumprimento e Sanção Pecuniária Compulsória”.
Coimhra, 1987, pág. 348
32
direito real de garantia, como faz o direito português, o fato é que o
exercício desse direito tem também no nosso ordenamento flagrante caráter
de garantia por conta do próprio modo como atua. Não houvesse a
expressa previsão legal para a retenção, não haveria como o possuidor
reter a coisa em nome da exceção do contrato não cumprido. É que
simplesmente não haveria como vencer a falta de sinalagma dessas
obrigações, ou seja, entre a obrigação do proprietário de pagar pelas
despesas e melhoramentos feitos na coisa e a obrigação do possuidor de
restituí-la; e sem o sinalagma o instituto da exceção simplesmente não age
61
.
A par das considerações acima, é manifesto, entretanto, que o atuar
tanto da exceção como do direito de retenção, permitem a paralisação da
execução da obrigação como meio de pressão tendente a fazer como que a
outra parte cumpra a prestação a que os detentores e os excipientes fazem
jus. São mecanismos que atribuem ao credor a proteção do seu crédito
mediante o exercício de uma conduta que está no seu domínio, qual seja, a
paralisação da execução do contrato. Ao agirem assim, suspendendo o
cumprimento da obrigação, que deveriam cumprir em situações normais,
estão os credores, que a fundamentam tanto na retenção como na exceptio,
pela sua própria conduta, garantindo-se contra o incumprimento, ao mesmo
tempo que pressionam o devedor a cumprir a prestação que lhe compete.
Pode dizer-se até que o direito de retenção atua quando o crédito já
se efetivou e a exceptio não. Em outras palavras, a coisa só será retida
porque o crédito a que faz jus o seu possuidor não lhe foi devidamente
60
61
Art. 681º, CCB: “O mandatário tem sobre a coisa de que tenha a posse em virtude do mandato,
direito de retenção, até se reembolsar do que no desempenho do encargo despendeu.”
Neste sentido, MIRANDA, Pontes - “Tratado de Direito Privado”. Tomo III. Bookseller.
Campinas, 2000, pág. 252
33
pago. Tivesse sido pago o seu crédito não haveria porquê reter a coisa, ou
seja, ela atua quando o incumprimento já se materializou, com o não
pagamento do crédito ao possuidor. Na exceção, como visto anteriormente,
como a execução da obrigação é licitamente paralisada, paralisa-se, por
conseguinte, o nascimento do crédito e seu respectivo débito. Vê-se,
portanto, que o direito de retenção tem um modo de atuar muito próximo ao
das garantias, pois atua, em regra, quando o incumprimento já se
consolidou e o credor, tratando-se de contratos onerosos ou gratuitos (como
no caso do mútuo) já concretizou seu sacrifício econômico. Já a exceção
atua preventivamente, antes que o sacrifício econômico gerador do crédito
se concretize.
Entretanto, por conta da dinâmica própria desses dois institutos, cujo
poder de efetividade se encontra nas mãos do próprio credor, ou seja, eles
mesmos (na exceção e na retenção)
têm como proteger diretamente o
crédito a que fazem juz (no caso da retenção) ou fariam ( no caso da
exceção). Pode-se mesmo dizer, que quando a natureza da relação
obrigacional permita o acionamento de qualquer desses dois institutos, eles
tendem a mostrar-se mais eficientes na proteção do crédito que a própria
garantia pessoal em si, exatamente por se situaram no âmbito da
disponibilidade direta do próprio credor.
A exceção sequer poderá ser afastada mediante o oferecimento de
garantias.
Só
a
realização
da
outra
prestação
a
qual
está
sinalagmaticamente ligada a afasta 62.
62
O Código Civil Português, no seu artigo 428º, 2, diz expressamente que “A excepção não pode
ser afastada mediante a prestação de garantias.” Embora a lei brasileira não refira a questão
da impossibilidade da prestação de garantias, parece-me que essa impossibilidade decorre da
própria natureza do instituto, que não tem apenas uma função de garantia, mas também a de
propiciar o cumprimento integral do contrato, conforme adiante se falará.
34
No direito português, onde o instituto da retenção como garantia
encontra-se melhor disciplinado, o exercício do juz retentiones poderá se
afastado pela prestação de garantias
63
. Tal fato, entretanto, serve apenas
para delimitar melhor a distinção entre os dois institutos, entretanto, a
função de garantia não deixa de existir na retenção, mesmo quando se
admita a prestação de caução. É que, neste caso, não há propriamente
perda da garantia da retenção, mas apenas a sua substituição, admitida
legalmente, por outro instituto igualmente eficaz: a caução.
8.
A EXCEÇÃO E A CLÁUSULA PENAL
A cláusula penal atua quando há um incumprimento contratual. No
direito brasileiro, a doutrina64 majoritariamente aponta para esse instituto,
duas
funções:
uma
função
punitiva
e
uma
função
reparadora,
compensatória dos eventuais prejuízos causados pelo inadimplemento65. Ao
contrário da exceção, depende de pacto acessório para atuar, da culpa do
devedor pelo incumprimento da obrigação e tem como limite de valor o
próprio valor da obrigação principal, podendo ser reduzida pelo Magistrado
se excessiva.
É certo que, ao atuar como uma
penalidade, ela inibe o
inadimplemento, uma vez que o sanciona com o pagamento de determinada
63
Art. 756º, d : “Não direito de retenção: ....d: quando a outra parte preste caução suficiente”.
Cf. RIZZARDO, Arnaldo. Direito das Obrigações, Forense, Rio de Janeiro, 1999, p. 253.
65
O artigo 413 do novo Código Civil Brasileiro refere-se expressamente a clausula penal como penalidade.
No Código Civil Português, a literalidade do artigo 810º que define a clausula penal relaciona-a ao acordo
para “fixar o montante da indemnização exigível”; parece dar realce à função reparadora da clausula;
entretanto , a doutrina portuguesa ( cf. TELLES, Inocêncio Galvão, Ob. cit. , p. 438) vê nesse instituto uma
importante função coercitiva, de castigo.
64
35
quantia em favor do credor. O fato de a cláusula ser devida, mesmo quando
o credor não tenha tido qualquer prejuízo, reforça a obrigação principal66. O
seu caráter sancionatário intimida o devedor, pressionando-o a cumprir a
obrigação67.
Quanto ao incumprimento, a cláusula penal não tem como impedi-lo,
ainda que possa desestimulá-lo com o valor da pena pactuada e, muito
menos, permite, por si só, a recuperação do crédito. Ademais, nos casos
onde não haja culpa do devedor, se a cláusula penal não consegue impedir
o incumprimento, ela, sequer, poderá ser acionada seja para o fim de punir,
seja para o fim de antecipar perdas e danos. Já a exceção impede o
sacrifício patrimonial do credor, mesmo quando, sem a culpa do devedor, a
prestação não seja oferecida simultaneamente. É que a exceção pode ser
acionada objetivamente, sem que se abra espaço para perquirir sobre a
conduta culposa ou não do devedor.
Não se pode negar que a cláusula penal contém um importante
requisito da acessoriedade
68
. Realmente, a sua pactuação acessória
adiciona ao crédito, algo que originariamente ele não tem. Entretanto,
parece-me que essa adicionalidade ao não permitir, por si só,
a
recuperação do crédito, mas apenas contribuir para inibir o inadimplemento,
ela acaba por não adicionar patrimônio à garantia geral. Tal fato demonstra
que a adicionalidade contida na cláusula penal se distancia da
adicionalidade presente nas garantias especiais; adicionalidade esta que
está sempre associada ao reforço da massa patrimonial.
66
TELLES, Inocêncio Galvão. Ob. Cit. p. 440
THUR, VON A. Ob cit., p.235
68
SANCHEZ, José Ignácio Bonet et alli – “Tratado de Garantias em la Contratación Mercantil“,
Tomo I, Civitas, Madrid, 1996, pág. 899
67
36
Ainda que respeitável doutrina, veja a cláusula penal como um meio
de garantia ampla
69
, parece-me que ela ao não agir para recuperar o
crédito e também para impedir o sacrifício patrimonial do credor, a sua
função não vai além da punitiva e reparadora, configurando-se um mero
instrumento de pressão do credor. Mesmo revelando-se um importante
instrumento de proteção ao crédito, conforme sustenta COSTA GOMES70,
por conta dos fatores acima identificados, não me parece que possa ser
concebido para ela uma função de garantia.
A exceção, quando autorizada a atuar, acaba por ser mais eficiente
na proteção do crédito que a cláusula penal. É que a cláusula penal, uma
vez pactuada, seja ela compensatória ou moratória (tenha sido pactuada
para a inexecução total da obrigação ou o simples retardamento),
ela não
garante ao credor o recebimento do seu crédito e muito menos impede
eficazmente o sacrifício patrimonial do credor
71
. Com relação essa perda
patrimonial ela não consegue recuperá-la e , muito menos, impede que esse
mesmo sacrifício se consolide; ou seja , ela não consegue agir a priori,
como faz a exceção, e muito menos, a
posteriori, como é próprio das
garantias especiais. O fator de pressão, de intimidação mesmo do devedor,
que a cláusula penal traz em si, apenas desestimula , inibe o
incumprimento; mas não a impede. Poder-se-ia argumentar que as
69
70
Cf. RUGGIERO, Roberto – “Instituições de Direito Civil“. Tradução da 6ª. Edição italiana por
Paolo Capitanio - Campinas, Bookseller, 1999, pág. 187. O renomado civilista italiano ao
reforço o vínculo obrigacional, inibindo o inadimplemento, a cláusula penal acaba por exercer
uma função de garantia.
Neste mesmo sentido, SANCHEZ, José Ignácio Bonet et alli - “Tratado de Garantias em la
Contratación Mercantil“, Tomo I, Civitas, Madrid, 1996, pág. 899.
Cf. COSTA GOMES, Manuel Januário. Ob. cit., pág.78 e segs.
37
garantias especiais também não impedem o incumprimento, mas não se
pode
olvidar
que
atuam
reduzindo
sobremaneira
os
efeitos
do
incumprimento, viabilizando a própria recuperação do crédito. Uma vez
consumado o incumprimento, a cláusula penal apenas acresce ao crédito
do credor mais um valor, nada mais do que isso. Tanto esse valor
da
cláusula como o da própria obrigação principal só terão condições de serem
entregues ao credor , após este acionar a garantia geral ou uma eventual
garantia especial, que disponha.
9.
A EXCEÇÃO E ARRAS
O novo Código Civil Brasileiro de forma expressa consagra o instituto
de arras ou sinal nas suas duas espécies,
confirmatórias e penitenciais72.
A doutrina brasileira73 aponta para uma grande afinidade entre a cláusula
penal e o instituto de arras ou sinal.74 Ambos dependem de pacto acessório;
comportam também uma função punitiva e reparadora e só atuam em caso
de incumprimento culposo. A diferença entre os dois institutos residiria na
forma como se aperfeiçoam: enquanto as arras são reais ( dependem da
entrega da coisa ou dinheiro ) a cláusula penal é consensual ( não há
necessidade de entrega de qualquer coisa ou dinheiro para aperfeiçoá-la).
Registre-se que, consoante a prática contratual, o que é comum que
é que apenas um dos contratantes receba arras; entretanto os seus efeitos
72
Arts. 417 a 220 novo Código Civil. Com relação ao Código Civil Português, Menezes Leitão (ob. cit. p.
231) sustenta que só se consagrou as arras confirmatórias; em sentido contrário, Galvão Telles defende
também a presença das arras penitenciais no ordenamento português..
73
Cf. RIZZARDO, Arnaldo. Contratos. 2ª. Edição, Forense. Rio de Janeiro, 2001, pág. 190. Nesse mesmo
sentido, SERPA , Miguel Maria de Serpa. Curso de Direito Civil, 4ª. Edição, Vol. IV, Livraria Freitas Bastos,
Rio de Janeiro, pág. 214
38
estendem-se também ao outro contratante, que apenas as deu. Por conta
dessa particularidade da forma como se aperfeiçoa, em certos casos, as
arras poderão ter uma função de garantia mais ampla que o da exceção.
RUGGIERO defende essa função de garantia para o instituto das arras75.
Essa função emerge naturalmente quando se aprecia o pacto de arras a
partir da perspectiva daquele contratante que as recebeu, seja em dinheiro,
como princípio de pagamento ou que a tenha recebido na forma de
qualquer outro bem móvel. Nestas duas situações, aquele que recebeu
arras, diante do incumprimento culposo, pode ficar com a propriedade da
coisa móvel ou pode reter o dinheiro recebido, como princípio de
pagamento, a título de punição ou de antecipação de perdas e danos. Nesta
situação específica não há como lhe negar uma função de garantia. Como
nestes dois casos, as arras são efetivamente reais, ela pune de fato o
incumprimento e como chama a atenção SÍLVIO VENOSA76 elas acabam
por funcionar como uma garantia do valor a receber. O fato de um
contratante
receber antecipadamente, antes da ocorrência de qualquer
incumprimento, um valor patrimonial do outro contratante, lhe garante
repita-se, por antecipação, o recebimento, no mínimo, de uma punição
pecuniária ou de uma indenização quando o incumprimento importar em
prejuízo. Nesta situação específica, as arras atuam da mesma forma que a
exceção, ou seja, a priori, antes que qualquer sacrifício patrimonial tenha
sido concretizado. Sua função de garantia aqui é mais ampla que a contida
na exceção e se aproxima substancialmente das garantias especiais,
porque elas de fato vão implicar em um reforço quantitativo da massa
patrimonial,
adicionando
ao
crédito
uma
massa
patrimonial
originariamente o crédito não tem.
74
Nesse mesmo sentido A. VON THUR, Ob. cit., pág. 244; RUGGIERO, Roberto. Ob. cit., pág. 199
Ob. cit. pág. 187
76
In Ob. cit. pág. 469
75
que
39
Registre-se
que
se
tratarem
de
arras
confirmatórias
e
eventualmente o valor do prejuízo superar o valor das arras, outra opção
não restará ao credor, senão buscar o complemento das perdas e danos em
ação própria. Neste caso, a sua função de garantia já não será tão eficiente
como o é no caso das arras penitenciais, onde o valor recebido pré-fixa por
inteiro as perdas e danos.
Entretanto, observe-se que o pacto de arras da perspectiva daquele
contratante que não as recebeu, pelo contrário, apenas as deu, não tem
como assumir nenhuma função de garantia. Na perspectiva deste
contratante, elas acabam por funcionar como uma simples cláusula penal;
um simples meio de pressão contra o devedor para cumprir o contrato; um
mecanismo que busca desestimular o incumprimento. Tal decorre do fato de
que para receber o valor constante do pacto de arras ele deverá acionar o
devedor tal como acionaria para receber o valor da cláusula penal.
40
CONCLUSÃO
É certo que a exceção do contrato atua como um importante
mecanismo de pressão com vistas ao cumprimento integral do contrato. O
contrato bilateral, tanto no seu sinalagma genético, como no seu sinalagma
funcional, é um “todo incindível” e a exceção existe para que ele, não
obstante tenha sido afetado pelo incumprimento, possa se recuperar deste
incidente grave e voltar a ser cumprido. O real sentido do instituto da
exceção é exatamente o do cumprimento integral do contrato .
Entretanto, ao exercer a função acima que lhe é própria, em
complementaridade á exceção, pelo modo peculiar com que atua, protege o
crédito e evita o sacrifício da prestação decorrente do sinalagma funcional
se o outro contratante não oferece simultaneamente a prestação que lhe
compete. Ao evitar o sacrifício patrimonial do excipiente, automaticamente
obsta á concessão do crédito sem o oferecimento simultâneo da
contraprestação.
Esse modo próprio de atuar anteriormente à concretização do crédito,
empresta ao instituto uma função de garantia; não o de uma garantia
especial em sentido técnico, mas uma garantia indireta. Para atuar como
uma garantia especial falta á exceção o requisito da adicionalidade, pois
nada acrescenta á massa patrimonial protetiva do crédito. Todavia, se o
objetivo de uma garantia é fazer com que o credor receba o seu crédito,
indiretamente, a exceção acaba por atuar para satisfazer esse escopo. É
que ao paralisar a execução da obrigação, o credor, que diante do
sinalagma funcional é também devedor, ao agir como excipiente pressiona
o excepto a cumprir integralmente o contrato e, portanto, garantir o
41
recebimento do seu crédito. Se, entretanto, o excepto não responde
positivamente à exceção, viabilizando o oferecimento de sua prestação, o
instituto, de forma imediata e eficaz, impede a perda da prestação do
excipiente.
Ao contrário das garantias especiais, a exceção não é mecanismo
idôneo à recuperação do crédito, porque age anteriormente á própria
concessão desse crédito. É modo de agir preventivo, a priori, antes da
concessão do crédito, o que reduz substancialmente os riscos do credor
quanto aos efeitos do não cumprimento da obrigação por parte do devedor.
Se o objetivo de uma garantia é fazer com que o devedor receba, pode-se
dizer, igualmente, que o seu objetivo, na verdade, é evitar o prejuízo do
credor. Ora, se a exceção age eficazmente evitando esse prejuízo, evidente
que
indiretamente
incumprimento.
está
garantindo
o
credor
diante
do
risco
do
42
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