A EXCEÇÃO DO CONTRATO NÃO CUMPRIDO E A SUA RELAÇÃO COM A GARANTIA DAS OBRIGAÇÕES NO DIREITO BRASILEIRO1 PAULO R. ROQUE A. KHOURI2 É fato que o contrato, dentro da sociedade moderna de consumo, é o negócio jurídico a que mais se recorre para permitir a circulação de bens e serviços na sociedade. É a própria circulação da riqueza que se instrumentaliza, quase sempre, através dos contratos. O ordenamento jurídico empresta efeitos a esses negócios e lhes outorga proteção a fim de permitir que o que foi livremente acordado deva ser fielmente cumprido. Na maioria das vezes, o vínculo jurídico contratual estabelece-se, sem a necessidade de cumprimento de qualquer formalidade especial, tão somente com base no mero acordo de vontades em torno do objeto do negócio, o que vai permitir que a sua instrumentalização, em si, não constitua entrave à velocidade normal do tráfego econômico. O incumprimento da obrigação é um incidente que coloca em risco o crédito. A sociedade não tem interesse que essa crise se prolongue; mesmo que o incidente de incumprimento ocorra é fundamental que ele possa ser superado, voltando o cumprimento das obrigações contratuais ao seu curso normal; entretanto, se o credor, mesmo valendo da execução coativa da obrigação, não recebe seu crédito essa sua legítima expectativa revelar-se-á inteiramente frustrada. 1 Trabalho apresentado no curso de Mestrado em Direito da Universidade de Lisboa, setembro 2003. O Autor é advogado, professor, pós graduado em Direito do Consumo pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, Mestrando em Direito Privado pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Autor do Livro Contratos e Responsabilidade Civil no CDC, Brasília Jurídica, 2002. 2 2 Não obstante a garantia geral patrimonial outorgada ao credor, no sentido de que todo o acervo patrimonial do devedor, que seja penhorável, responde pelo cumprimento de suas obrigações; existem ainda as garantias especiais que atuam no sentido mesmo de reforçar essa garantia geral. No caso das garantias especiais pessoais ou fidejussórias aumenta-se esse acervo patrimonial com a vinculação de terceiras pessoas à relação jurídica obrigacional . A partir de então, não é apenas a garantia geral incidente sobre o patrimônio do devedor originário, que vai atuar na proteção dos efeitos do incumprimento, mas também o patrimônio de terceiros, que aceitaram essa vinculação. Nas garantias reais, vinculam-se não diretamente pessoas ao cumprimento efetivo da obrigação, mas patrimônios específicos, que são destacados do acervo de bens do próprio devedor ou de terceiro para fazer face aos efeitos do incumprimento. E poderá haver outros institutos que desempenhem essa função de garantia do cumprimento das obrigações, ao mesmo tempo que efetivam outras funções? Em outras palavras, pode haver institutos, que mesmo desempenhando precipuamente outras funções, acabem por desempenhar ainda a função de garantia das obrigações? A doutrina tem respondido afirmativamente a essa indagação, surgindo neste contexto, as garantias indiretas. Neste trabalho, nos interessa saber se o medieval instituto da exceção do contrato não cumprido, próprio dos contratos bilaterais, a par de permitir a paralisação momentânea do cumprimento da obrigação com vistas a pressionar o excipiente ao cumprimento integral do contrato, se ele desempenha uma função de garantia. 3 Se o contrato, a partir da vontade, é fonte, por excelência das obrigações, e, portanto, sujeitam-se ambas as partes ao seu fiel cumprimento, a existência do sinalagma obrigacional pode permitir a exceção desse cumprimento. O sinalagma pode permitir a paralisação momentânea da obrigação, tendo como ponto de partida a conduta do devedor a que não oferece a prestação que lhe compete. O estudo desse instituto da exceptio non adimpleti contractus é, portanto, de fundamental relevância para a compreensão do desenvolvimento da relação obrigacional nos contratos bilaterais. Isto porque ao mesmo tempo em que ele, como se verá adiante, persegue o cumprimento integral do contrato, acaba por proteger o crédito do contratante que o aciona, evitando-se assim os efeitos perversos do não cumprimento da obrigação a que faz jus. No sentido de buscar uma resposta para a questão que este trabalho propõe, impõe-se, inicialmente, uma breve nota sobre a evolução deste instituto com acento na influência do direito canônico medieval sobre sua origem efetiva. Para relacionar esse instituto com a garantia das obrigações, tornase importante dialogar com os requisitos que autorizam o seu acionamento. Embora, em regra, o instituto deva ser acionado quando não haja a simultaneidade do cumprimento, há obrigações, em contrato bilateral, que mesmo sem a necessidade de cumprimento simultâneo, autorizam o seu acionamento. Excepcionalmente, ante o risco fundado do não oferecimento da prestação por parte daquele contratante que deve cumpri-la posteriormente, pode o contratante a quem incumbe o cumprimento em primeiro lugar recusar a prestá-la. 4 Antes de chegar a uma conclusão sobre a natureza da exceção do contrato não cumprido, importa aferir sua afinidade com os institutos do direito de retenção e a compensação. São institutos que reconhecidamente permitem a não entrega da prestação ao credor ou, no caso da retenção, a recusa mesmo dessa entrega, tendo como ponto de partida a defesa do recebimento de um crédito. Se esses institutos, ao permitirem essa conduta ao credor, de alguma forma estão também excepcionando o cumprimento da obrigação, por que a exceção não guardaria em si também essa função de garantia? Da mesma forma deve-se identificar os pontos de contacto entre a exceção e outros mecanismos de proteção ao crédito, como a cláusula penal e as arras. Todos os pontos acima, naturalmente servirão ao lastreamento de uma conclusão sobre a natureza da exceção do contrato não cumprido, enquanto detentor de uma função de garantia; função esta que poderia coexistir ao lado de sua função primordial, a do cumprimento integral do contrato. Esta função que a exceção é chamada a desempenhar não colide com uma eventual função de garantia; pelo contrário, pode com ela compatibilizar-se perfeitamente, conforme adiante se demonstrará. 1. BREVE NOTA SOBRE A EVOLUÇÃO DO INSTITUTO DA EXCEÇÃO DO CONTRATO NÃO CUMPRIDO Não há na evolução do instituto da exceção do contrato não cumprido, uma associação direta com qualquer instituto da garantia das 5 obrigações, que, segundo anota M. FRAGALI, era estranho ao pensamento da “giurisprudenza romana” 3. O direito romano também não teria conhecido o instituto da exceção do contrato não cumprido, nos termos em que ele hoje encontra-se consolidado. Isto porque, embora existissem contratos com obrigações para ambas as partes, como é o caso da própria compra e venda, amplamente conhecida pelos romanos, dado o extremo formalismo dos negócios jurídicos à essa época, as mesmas eram independentes e não interdependentes como reclama a aplicação do instituto 4. Tal implicava que o cumprimento do contrato era sempre obrigatório, mesmo ante a falta do cumprimento da outra parte. O que se abria ao contratante fiel era a execução do contrato e não sua resolução ou suspensão da execução. O vendedor corria, inclusive, o risco de perder a coisa se não promovesse a execução da obrigação não cumprida contra o comprador5. Se o direito romano não desenvolveu o conceito de contrato sinalagmático, com obrigações interdependentes, permitiu, por outro lado, que o contratante fiel se socorresse ou no direito de retenção ou no direito de compensação. Tais institutos eram amplamente conhecidos no Direito Romano. O direito de retenção era freqüentemente invocado na compra e venda (emptio venditio) e locação com efeito prático semelhante ao do medieval instituto da exceção do contrato não cumprido.6 Entretanto, o contraente fiel, diante da falta do cumprimento de uma obrigação, podia-se socorrer ou no instituto da retenção, ou no instituto da compensação. 3 4 5 In “Garanzia (diritto privatto)” , Enciclopédia del Dirito, XVII, 1969, p. 446 Cf. ABRANTES, José João - in “A Excepção de Não Cumprimento do Contrato no Direito Civil Português”, Almedina Coimbra, 1986, pág. 16 Cf. VIGARAY, Alvarez Rafael – “La Resolucion de Los Contratos Bilaterales por Incumplimiento”. Universidade de Granada. !972., pág. 11. 6 Referidos institutos eram amplamente admitidos na romana” “giurisprudenza 7 . A doutrina ainda hoje, conforme adiante se verá, sempre identificou elementos de proximidade entre a exceção, o direito de retenção e a compensação; milenares institutos estes, que sempre desempenharam uma função de garantia das obrigações, ainda que de forma indireta. O instituto desenvolveu-se mesmo a partir da Idade Média, por influência do direito canônico, vinculado à idéia de justiça comutativa e boa fé. A falta de cumprimento de uma obrigação era considerada tanto pecado como a própria mentira, porque significava quebra da palavra empenhada. Isto porque ao contratar os canonistas consideravam que a obrigação era assumida perante Deus, tendo em vista que esse ato comportava um juramento 8. Para compatibilizar a indissolubilidade da obrigação que tinha, em vista de seu caráter sagrado e a posição de fragilidade em que ficava o contratante fiel, os canonistas desenvolveram a idéia da interdependência das obrigações de ambas as partes. O cumprimento de uma obrigação depende do outro cumprimento a que está ligado e que a justifica. Daí que os canonistas passaram a admitir que essas obrigações bilaterais eram portadoras de uma condição tácita 9. Essa idéia de interdependência das obrigações, fundamental para a consolidação do instituto, acabou por outorgar ao credor um reforço no seu crédito, que concepção anterior do direito romano ele não tinha, qual seja a 6 Cf. KASER, Max – “Direito Privado Romano”. Tradução de Samuel Rodrigues. Ferdinando Hämmeler. Fundação Calouste Gulbenkian, 1999, pág. 230 7 Cf. KASER, Max. Ob. Cit. , pág. 230 8 Cf. VIGARAY, Rafael Alvarez . Ob. cit. , pág. 24. 9 Idem, ob.cit. pág. 25: “El forzar el promitente al cumplimiento de su propria obligación , incluso, en el caso de incuplimiento de la otra parte , chocaba manifestamente contra los princípios de la equidad y entonces se admitió que ejecución de la contraprestación fuese um condición tácita de la validez de la promessa”. 7 de que não estaria sujeito ao sacrifício patrimonial da entrega da prestação se, simultaneamente, a contraprestação não lhe fosse entregue. Impor-se ao contraente fiel o cumprimento do contrato ante o incumprimento do devedor importaria em perda do equilíbrio da relação jurídica obrigacional, com sérios danos à justiça comutativa do contrato 10 . Daí que os canonistas consideravam como uma ofensa também à boa fé, que o contratante infiel pudesse exigir a obrigação da outra parte. Todos os contratos sinalagmáticos, então, perante o direito canônico passaram a comportar a exceção do contrato não cumprido como uma condição implícita presente nessas obrigações. O direito canônico não criou o contrato bilateral. A compra e venda, contrato bilateral, por excelência, era amplamente conhecida dos romanos. Entretanto, pode-se dizer que, ao reconhecer a interdependência das obrigações, emprestou às obrigações bilaterais um mecanismo desconhecido até então para a proteção do interesse do credor: o direito de paralisar o cumprimento do contrato até o recebimento de seu crédito. Conforme adiante se verá, na efetivação dessa proteção, a exceção, em certos momentos, vai funcionar como uma verdadeira garantia. Após experimentar sua plena consolidação na idade média, o instituto acabaria esquecido na primeira grande codificação da Idade Moderna: o Code Civil Francês de 1804. Por esse dispositivo, o contratante fiel podia pleitear a resolução, uma vez que, por influência do direito canônico, o direito francês não renúncia à idéia da presença de uma condição resolutiva implícita nos contratos bilaterais. Por outro lado, ao tratar do incumprimento das obrigações, o Código Napoleônico apenas admitiu expressamente a 10 Cf. ABRANTES, João Jose. Ob. Cit. pág. 19. 8 resolução, omitindo-se quanto à exceção 11 . Para VIGARAY 12 , por influência da Escola da Exegése e a verdadeira sacralização da autonomia da vontade, chegou-se a sustentar mesmo a impossibilidade da exceção, com base no artigo 1184º do Code. Entretanto, apesar de uma resistência inicial, a exceção acabou sendo admitida na doutrina e na jurisprudência. O BGB alemão de 1900 foi a primeira grande codificação a consagrar expressamente o instituto 13 . Perante o Direito Civil alemão, pode-se dizer que, diante do incumprimento de uma obrigação nos contratos bilaterais, a exceção era a regra; a resolução operava-se apenas em um número muito reduzido de casos. Hoje, o ordenamentos instituto jurídicos está presente em contemporâneos14, praticamente Códigos Civis todos Italiano os , Espanhol, Argentino, Chileno, Japonês etc. No direito brasileiro, o instituto que já existia no artigo 1092 do Código Civil de 1916, integra também o novo Código de janeiro de 2003, praticamente com a mesma redação do anterior, só que o instituto acabou desdobrado em dois dispositivos 11 15 . Em Cf. Idem , ibidem. Não foi apenas a exceptio non adimpleti contractus que acabaria esquecida no Código Napoleônico, outros institutos diretamente ligados à justiça comutativa, como a lesão e a rebus sic standibus também não foram positivados naquele ordenamento. Tal se deve à manifesta vocação liberal do Code , muito mais apegado ao valor da segurança jurídica, que à justiça das relações obrigacionais. Neste sentido, qualquer instituto, cuja atuação importava em uma interferência direta ou indireta no conteúdo do negócio jurídico, foi afastado pelo Code. Veja que até recentemente, o Código Napoleônico não tinha uma única norma que permitisse ao magistrado reduzir a cláusula penal flagrantemente excessiva, pois só no final do século passado, o ordenamento francês passou a admitir expressamente essa possibilidade de revisão da cláusula penal. 12 Ob. cit. pág. 33 13 ENNECCERUS, Ludwig et alii – ”Tratado de Derecho Civil. Apêndice. Código Civil Aleman”. Bosh.Casa Editorial. Barcelona, 1955 . pág. 67. Art. 320º do Código Civil Alemão - “Quien está obligado por um contrato bilateral puede negar la prestación que lê incumbe hasta la efecuación de la contraprestación, a no ser que este obligado a cumplir la prestación antipadamente ...” 14 Cf. BEVILAQUA, Clovis. Código Civil Brasileiro Comentado. Livraria Francisco Alves, Rio de Janeiro, 1934, pág. 263 15 Art. 476: “Nos contratos bilaterais, nenhum dos contraentes, antes de cumprida a sua obrigação pode exigir o implemento da do outro.” 9 Portugal, a consagração expressa do instituto veio com o Código Civil de 1966 16, onde teve tratamento semelhante ao do BGB Alemão. 2. AS GARANTIAS DAS OBRIGAÇÕES DIANTE DO RISCO DO INCUMPRIMENTO Há em todo o contrato, sobretudo, nos contratos de duração, um momento delicado, digo mesmo crucial, para o interesse das partes e para a própria sociedade, que é momento do cumprimento da obrigação pactuada. Essa obrigação materializa-se na prestação consistente na conduta humana positiva ou negativa, que deve ser efetivada ao seu credor. A sua morte natural é o pagamento, o cumprimento em si. Se o cumprimento inocorre, pode-se dizer que há uma crise na relação obrigacional; crise essa que pode levar à frustração, por inteiro, da expectativa do credor. É, exatamente, no sentido de proteger o credor quanto aos efeitos dessa crise, cujo risco todos os contratantes, de alguma forma, em maior ou menor grau, sempre têm de enfrentar, é que no ordenamento jurídico existem vários mecanismos, cuja finalidade precípua é a proteção efetiva do crédito. As garantias são, por excelência, um meio eficaz a essa proteção. PAULO CUNHA coloca brilhantemente o problema em foco; quando afirma que “em matéria de obrigações toda a garantia há de convergir para este 10 resultado: fazer com que o devedor pague, ou melhor, fazer com que o credor receba” 17. A principal função de uma garantia, conforme reconhece a doutrina 18, é seguramente a de garantir o cumprimento de uma obrigação. É para esta função precípua que converge todo sistema de garantias 19, seja ela pessoal ou real. Não importa o tipo de incumprimento, se total ou até mesmo parcial, a garantia age como mecanismo protetor do credor, para que ele receba o seu crédito tal como se obrigou o devedor. A partir do momento que o credor protege o seu crédito com uma garantia especial, conforme sustenta ROMANO MARTINEZ20, ele fica em uma posição privilegiada em relação aos outros credores. É que além da garantia geral que tem todo e qualquer crédito, representada pelo patrimônio do devedor, ela dispõe ainda de um reforço da mesma (da garantia geral). Ao garantir o cumprimento da obrigação, a garantia, secundariamente, está realizando uma outra função ao reduzir os riscos da insolvência do devedor. Como se sabe, o patrimônio do devedor é garantia geral de toda e qualquer obrigação por ele assumida. A doutrina italiana a denomina de garantia primária ou genérica 21 . Esse patrimônio deve ser avaliado pelo credor antes de contratar. Se esse patrimônio é bom, não está gravado com nenhum ônus, em princípio, o próprio credor pode assumir o risco de contratar sem exigir qualquer outra garantia especial. Entretanto, mesmo abstraindo-se o risco futuro do patrimônio ser alienado de forma gratuita ou onerosa, essa garantia geral pode também não ser idônea o suficiente para proteger o interesse do credor, seja porque está gravada 17 18 19 20 In “DA GARANTIA DAS OBRIGAÇÕES”, Lisboa, 1938, pág. 16. SANCHEZ , José Ignácio Bonet e CAROL, Ubaldo Nieto ett alli - “Tratado de Lãs Garantias em la Contratación Mercantil”, Tomo I, Citas, Madrid, 1996, pág. 133. Nesse mesmo sentido, GOMES, Orlando, “Obrigações”, pág. 227 FRAGALI, Michele. Ob. cit., pág. 446 ett alli, Ob. Cit., p. 67 11 com algum ônus, seja porque é insuficiente para fazer face à dívida a ser assumida. Em outras palavras, o risco quanto à solvabilidade do devedor persiste e ele pode comprometer o cumprimento da obrigação. A opção que teria seria exatamente de reduzir consideravelmente esse risco quanto ao efeitos do incumprimento, recorrendo a algum tipo de garantia especial 22 .E aqui entra uma importante característica do instituto da garantia especial, que é a de acrescer ao crédito um reforço patrimonial, que originariamente, o crédito não tem. Ou seja, para além da garantia geral coberta pelo patrimônio do devedor, adiciona-se à proteção do crédito algo que o crédito não tem: uma garantia pessoal ou real. Essa adicionalidade também está presente de forma mais flagrante na garantia real, quando ela é prestada por terceiro. Entretanto, mesmo quando a garantia real é prestada pelo próprio devedor, ao destacar um patrimônio específico de sua massa de bens para vincular ao cumprimento de uma obrigação, acaba por privilegiar o crédito deste credor em relação aos demais credores; e este privilégio o crédito originariamente não tem. É o que denomina-se um reforço qualitativo da massa patrimonial. No caso da garantia pessoal, como se vinculam terceiras pessoas ao pagamento da dívida do devedor, adiciona-se à garantia geral representada pelo patrimônio do devedor outros patrimônios, reduzindo-se sobremaneira o risco quanto aos efeitos do incumprimento e, portanto, da solvabilidade do devedor. Na garantia real, vinculam-se coisas determinadas ao cumprimento da obrigação, móvel ou imóvel, o risco quanto aos efeitos do incumprimento é reduzido sensivelmente23. Entretanto, mesmo não negando de forma alguma a fundamental importância de uma garantia especial para a proteção do crédito, deve ser 21 Cf. FRAGALI, Michele. Ob. cit. pág. 449. Fragali ( ob. cit. pág. 449) refere-se às garantias especiais como secundárias ou específicas. 23 Cf. PEREIRA, Cáio Mário da Silva. “Instituições de Direito Civil”, Vol. IV, 12ª. Edição, Forense, Rio de Janeiro, 1995, pág. 220 22 12 registrado que nenhuma garantia, mesmo a real, elimina por completo o risco do incumprimento. Na verdade a garantia especial não impede o incumprimento da obrigação; ela apenas reduz os riscos quanto ao efeito deste incumprimento. E qual é o risco quanto ao efeito deste incumprimento? Exatamente o risco do credor não conseguir recuperar o crédito que concedeu, enfim, o risco de perder definitiva e totalmente aquele crédito. Frise-se que se trata de redução de riscos, não de sua eliminação. No caso da garantia pessoal, pode ocorrer que os terceiros que se vincularam ao cumprimento da obrigação, no momento do cumprimento, tenham- se tornado insolventes, não havendo aí como o interesse do credor ser satisfeito com o recebimento do crédito. No caso das garantias reais, a coisa vinculada ao cumprimento da obrigação pode-se deteriorar ou se perder. Veja, então, que este importante reforço patrimonial ao crédito, por si só, não é suficiente para eliminar o risco do incumprimento ou seu efeito. Conforme adiante se verá, quando a natureza do contrato permite, o instituto da exceção do contrato não cumprido pode acabar concretizando, com razoável eficiência, uma função que a garantia especial, por si, como visto, não tem como eliminar: os efeitos quanto ao risco da insolvência do devedor ou do terceiro garantidor, ou seja, o risco da perda definitiva do crédito concedido. 3. A EXCEÇÃO E SEUS REQUISITOS A exceção do contrato não cumprido consiste na faculdade concedida a qualquer dos contratantes, em contrato bilateral, com cumprimento simultâneo das obrigações, de suspender ou recusar o cumprimento da obrigação que lhe compete até que outra parte contratante ofereça a 13 prestação, que lhe incumbe. Tal recusa em cumprir a obrigação, ao contrário do que sucede nos contratos unilaterais, onde não há sinalagma ou interdependência das obrigações, só é possível porque o contratante/devedor não atua apenas nessa qualidade na relação obrigacional, ele é também credor; o mesmo ocorre com o outro contratante24. A obrigação de um contratante é a razão de ser da obrigação do outro contratante. É a este nexo de interdependência que se denomina sinalagma, que está presente no nascimento de ambas obrigações, sinalagma genético, como no momento de seu cumprimento, sinalagma funcional.25 Para a doutrina majoritária, o grande fundamento do instituto da exceção do contrato não cumprido seria o equilíbrio contratual26. Impor a realização de uma prestação sem o oferecimento simultâneo da contraprestação desequilibraria a relação. ABRANTES 27 admite o fundamento do equilíbrio contratual para exceção, mas conjuga-o com o fundamento do cumprimento integral do contrato. A exceção não buscaria apenas o equilíbrio da relação, mas o próprio cumprimento integral do contrato. Para ABRANTES, não fosse o cumprimento integral do contrato também o fundamento da exceção, diante da ameaça do incumprimento, simplesmente ao contraente fiel só restaria a alternativa de pedir a resolução do contrato e não a sua suspensão ou a própria execução forçada da obrigação. Parece nos que o real sentido do instituto da exceção 24 25 26 27 Cf. TELLES, Inocêncio Galvão. “Direito das Obrigações”, 7ª. Edição, Coimbra Editora, 1997, p. 450 Cf. COSTA, Mário Júlio de Almeida. Direito das Obrigações. Almedina. Coimbra. 1994. p. 299 Cf. LEITÃO, Luís de Menezes – “Direito das Obrigações”, Vol. I, 2ª. Edição, Almedina, Coimbra, 2002, pág. 194. Nesse mesmo sentido, TELLES, Inocêncio Galvão, Ob. cit. , p. 451 Ob. cit. pág. 199. Embora não apresente uma discussão maior sobre a natureza desse instituto o pensamento de SERRA, Adriano Vaz ( “Boletim do Ministério da Justiça”, no. 67, p. 18), nos conduz a essa mesma justificativa: “A excepção do contrato não cumprido, sendo uma simples excepção dilatória, supõe que o excipiente quer o cumprimento do contrato e apenas recusa a cumprir enquanto o outro contraente não cumprir ou não oferecer o seu cumprimento simultâneo.” 14 é exatamente o do cumprimento integral do contrato, sem a sua conjugação com o equilíbrio contratual, que apenas indiretamente nos oferece algum critério para enfrentamento da questão, nunca sua justificativa para fazer atuar o próprio cumprimento integral do contrato. Não se está para tal perquirindo se o contrato está equilibrado ou desequilibrado, porque pressupõe que, se o contrato não tivesse esse equilíbrio, sequer, o credor estaria a buscar o seu cumprimento na forma avençada. Daí que outros meios lhe socorreriam, como a própria resolução ou revisão por onerosidade excessiva; não a exigência do cumprimento, que, em si, comporta o recurso à exceção. Se é certo que o instituto não deve ser tratado sobre o prisma da vontade subjetiva em si, mas com uma concepção objetiva28 do próprio desenvolvimento da relação obrigacional, não é a falta do cumprimento de um contrato que objetivamente o desequilibra; o equilíbrio não se relaciona diretamente com o cumprimento ou incumprimento, mas com o conteúdo da própria prestação29. Entretanto, o que interessa propriamente a este trabalho, é saber se o instituto da exceção do contrato não cumprido, a par de outras funções que exerce no desenvolvimento da relação obrigacional do contrato bilateral, do próprio fundamento do cumprimento integral do contrato, comporta uma função de garantia; ainda que na forma de uma garantia indireta das obrigações. Para tal é importante verificar os requisitos que fazem acionar o instituto para confrontá-los com as garantias. Inicialmente, importa separar o instituto da exceptio, da resolução por incumprimento. A doutrina sustenta que ambos os institutos têm como ponto 28 29 Cf. TELLES, Inocêncio Galvão. Ob. cit. , p. 451 Cf. ASCENSÃO, José de Oliveira. Direito Civil. Teoria Geral. Vol. III, Coimbra Editora, 2002, pág. 211. 15 de partida o incumprimento da obrigação 30 . Não cumprida a obrigação em um contrato bilateral, seria caso de excepcionar o cumprimento do mesmo ou de sua resolução. Aqui, observa-se, de imediato, uma impropriedade nesta alegada afinidade. Na exceção, no plano fático, não existe propriamente um incumprimento da obrigação. Não podemos falar ainda de incumprimento fático porque, como se verá adiante, tendo em vista o nexo de interdependência, a obrigação que é a razão de ser da outra obrigação também não foi cumprida; só podíamos falar de incumprimento fático se uma parte no contrato bilateral cumpre sua obrigação e a outra parte, na data avençada, deixa de cumprir a que lhe compete. Aí sim, há incumprimento fático, porque a obrigação que era dependente da contraprestação já foi cumprida, enquanto esta não o foi no momento que deveria sê-lo. Uma vez que as obrigações de ambas as partes devem ser cumpridas simultaneamente, a execução do contrato é suspensa até que a outra parte se disponha a cumprir a que lhe compete. Concordando com o pensamento de SERPA LOPES31 é realmente uma condição do exercício da exceção o “excipiente não ter cumprido ainda a sua prestação”. Há, nesse momento, propriamente uma exceção; excipiente e excepto: não devedor adimplente e devedor inadimplente. Como sustenta ORLANDO GOMES, há uma paralisação da execução do contrato doutrina alemã 32 . Consoante a 33 , na exceção do contrato não cumprido “cada contratante puede reclamar la prestación de la outra parte sin necessidade de cumplir la suya própria”. A questão coloca-se desta forma por conta da simultaneidade do cumprimento. Impondo-se o cumprimento simultâneo da 30 31 284 32 ABRANTES, João José. Ob cit pág. 171. Curso de Direito Civil, 4ª. Edição, Vol. IV, Livraria Freitas Bastos, Rio de Janeiro, 1962, pág. GOMES, Orlando – “Contratos”. 18ª. Edição. Forense. Rio de Janeiro. 1998. pág. 92. 16 prestação e contraprestação, ligadas pelo nexo de interdependência, a questão de saber se o exercício da exceção foi ou não corretamente acionado é de natureza probatória, que recai sob o contratante que excepciona o cumprimento 34 . Ao excipiente compete a prova do correto acionamento da exceção. Até porque, se o excipiente não tiver acionado justificadamente o instituto, será ele, o considerado inadimplente, não o excepto. Pode-se até a admitir, para efeito de futura ação de perdas e danos, que o contratante que se dispõe a cumprir o contrato é propriamente um contratante fiel; e infiel 35 a parte que não se dispõe a oferecer simultaneamente o cumprimento da sua obrigação e que, portanto, deve ser obrigada a reparar eventuais prejuízos sofridos por aquele ou penalizada com a aplicação de eventual cláusula penal. Em outras palavras, nesta etapa do desenvolvimento da relação obrigacional, o contratante que deu causa ao acionamento da exceção, paralisando o contrato, deve-se sujeitar aquelas conseqüências. Se a exceção tivesse como pressuposto propriamente o incumprimento fático da obrigação não haveria sequer como cogitar para a exceptio qualquer função de garantia, conforme adiante se demonstrará. Como exercitar essa função, que pressupõe o poder de uma das partes de não oferecer a sua obrigação, se o contrato já está incumprido? Imaginemos o caso de uma compra e venda, onde o preço e a coisa devem ser entregues 30 dias após a celebração do contrato. Se o vendedor entrega a coisa antes de receber o preço, como pode o vendedor excepcionar o cumprimento do contrato, suspendendo o cumprimento de 33 34 Cf. A. Von Thur, ob. cit., pág. 53. “El demandante , al reclamar el cumplimiento de um contrato bilateral, reconoce que adeuda um contraprestación...si afirma haber cumplido y la prestación que lê incumbe o haberia ofrecido em sus debidos términos, debera aportar la prueba de esa afirmación...” ob . cit. pág. 56. 17 sua obrigação, se já a cumpriu? Neste caso, a solução que socorre o vendedor não é mais a exceção e sim a resolução por incumprimento. No exemplo citado não há sequer, como a exceção funcionar como garantia, porque ele só assumirá essa função se o vendedor, ante o não oferecimento simultâneo do preço, suspender a entrega da coisa. A exceção também pressupõe a existência de um contrato bilateral; o mesmo não sucede com a resolução que pode operar-se também em contratos unilaterais 36 . Distinção fundamental diz respeito aos fins perseguidos por ambos institutos; enquanto na exceção se busca apenas suspender a execução do contrato como meio de pressionar o contratante infiel ao cumprimento integral do contrato, portanto, o fim perseguido é claramente a manutenção do contrato; na resolução, o que se busca não é a manutenção da relação obrigacional, mas seu fim prematuro.Tanto que, em princípio, o incumprimento 37 que autoriza a exceção em um contrato sinalagmático não é o mesmo que autoriza a resolução. A resolução, mesmo no contrato bilateral, pressupõe um incumprimento definitivo 38 , onde a prestação já não seja fisicamente possível, porque o interesse objetivo do credor não se faz mais presente; na exceção, o incumprimento é 35 36 37 38 LEITÃO, Luís de Menezes (ob. cit. pág. 193), diante da exceção do contrato não cumprido, utiliza a expressão contraente fiel e não fiel. ABRANTES, João José - ob. cit. pág. 172, sustenta que a resolução tem como pressuposto a “existência de um contrato bilateral e a inexecução da contraprestação pelo outro contratante”. Discordo de tal posicionamento, porque a resolução tem por fundamento o incumprimento contratual, independentemente desse incumprimento ser proveniente de um contrato sinalagmático ou unilateral. Veja o caso do comodato, onde tanto a lei brasileira (art. 552º, CCB), como a lei portuguesa (art. 1140º, CCPT), autorizam a resolução por justa causa. O termo incumprimento encontra-se em itálico, porque conforme anteriormente sustentando por este autor, na exceção do contrato não cumprido não há propriamente incumprimento, mas sim uma suspensão momentânea da execução do contrato. Neste sentido, sustenta GOMES, Orlando (ob. cit. pág. 93), que a resolução nos contratos bilaterais com execução simultânea das obrigações “somente deve ser adotada quando o cumprimento da obrigação se tornar impossível”. Ora, se a obrigação a que parte se obrigou se tornar impossível ou não interessar mais objetivamente ao credor, não há como acionar o instituto da exceção; mas sim, em resolução da relação obrigacional. 18 temporário, a prestação ainda é possível e interessa objetivamente ao credor. O acionamento do instituto da exceção do contrato constitui-se mesmo em um direito do contratante fiel de recusar a sua prestação, enquanto o outro não venha cumprir a prestação que lhe compete. Em todo contrato bilateral, há a presença de um sinalagma, um nexo, que une as obrigações das partes; um sinalagma genético e outro funcional. O sinalagma genético relaciona-se com o próprio nascimento das obrigações contratuais. Uma obrigação nasce ligada a outra e sem ela não subsiste. É assim que na falta do sinalagma genético a própria validade do negócio encontra-se afetada. No sinalagma funcional, já deixamos a formação do contrato e entramos na execução ou no próprio desenvolvimento da relação obrigacional. Se o cumprimento de uma obrigação pressupõe o cumprimento simultâneo de uma outra obrigação, à qual se encontra ligada, haverá assim a efetivação desse sinalagma. Não é todo o contrato bilateral que autoriza, de início, a exceção. Tudo vai depender da forma como foi pactuado o cumprimento das obrigações, que emergem do contrato, bem como a própria natureza dessas obrigações. Primeiramente, se a obrigação coberta pelo sinalagma se tornar impossível 39 , não haverá qualquer utilidade em se excepcionar o cumprimento do contrato. O caso será mesmo de resolução. Por último, embora no contrato bilateral, as obrigações sejam portadoras de uma interdependência, pode ocorrer que as partes tenham pactuado prazos diversos para o cumprimento de suas obrigações ou uma 39 “Extingue-se o direito de opor a exceção se a prestação se tornou impossível...” Cf. GOMES, Orlando, ob. cit. pág. 93. 19 das partes tenha até cumprido por inteiro sua obrigação, enquanto a outra, com o consentimento contratual, diferiu para o futuro esse cumprimento. Nesta hipótese, só restará ao credor duas hipóteses: ou a execução forçada da obrigação ou a própria resolução do negócio. Situação diferente é aquela, onde mesmo não havendo a exigência de cumprimento simultâneo das obrigações, há ainda obrigações das duas partes a serem cumpridas. Aqui, a exceção poderá ainda funcionar. Nesses contratos, o contratante a quem incumbe fazer a prestação em segundo lugar, poderá excepcionar o cumprimento de sua obrigação, ante a falta inicial daquele a quem incumbia a realização primeira da prestação. Aqui, nota-se que o contratante que deve cumprir primeiramente a prestação não poderia utilizar a seu favor, em princípio, a exceção. Isto decorre do próprio risco que ele teria assumido ao permitir o cumprimento da obrigação da outra parte em prazos diferentes e não simultaneamente. Esta situação acaba por deixar o contratante a quem incumbe a realização posterior da prestação em uma situação mais confortável, pois só irá cumprir a sua prestação, quando já tiver recebido a que lhe compete pelo contrato. Na outra ponta, é flagrante a situação delicada do outro contratante, que ao efetuar a sua prestação ainda não recebeu a que tem direito. Diz-se então que aquele contratante tem a seu favor o benefício do prazo. Entretanto, este contratante poderá perder esse benefício em duas situações: 1) quando deixa de cumprir a sua prestação e automaticamente já não poderá exigir do contratante fiel o cumprimento da outra obrigação subseqüente; 2) quando haja risco manifesto, quanto à solvabilidade desse contratante. 20 Na primeira situação, a perda do benefício do prazo opera-se em favor do contratante que, em princípio, não o tinha. Como conseqüência, a exceção passa a poder ser oposta por quem originariamente não detinha esse benefício. Nessa situação, é até comum que a mora do outro contratante possa conduzir, nos termos do contrato, ao vencimento antecipado das obrigações desse contratante faltoso. Na segunda situação, a exceção é utilizada excepcionalmente para proteger o contratante que se mostra disposto a cumprir suas obrigações, contra aquele que ameaça futuramente não proceder da mesma forma. Para que tal se opere, não basta uma desconfiança infundada do contratante potencialmente fiel, mas indícios suficientemente claros que possam conduzir, no mínimo, a uma dúvida significativa quanto ao incumprimento. Essas dúvidas, geralmente, relacionam-se com a prova de um estado pré-falimentar ou de insolvência do outro contratante, ou nas hipóteses em que a falência, ou a insolvência já tenham se verificado. Entretanto, contra esse indício pode voltar-se o outro contratante oferecendo-se a prestar garantias, que afastem a dúvida justificada. Em todas as situações que a exceção é chamada a funcionar, mesmo quando haja prazos diferentes para o cumprimento da obrigação, vê-se que ela age protegendo o patrimônio do contratante fiel, evitando que ele efetive o sacrifício patrimonial contido na prestação que lhe compete. Ao obstar eficientemente este sacrifício patrimonial, muito embora o contratante fiel não tenha ainda recebido a contraprestação, conforme decorre do contrato, ele acaba por impedir a constituição do crédito. Essa proteção dá-se de forma efetiva no contrato bilateral porque, por conta do sinalagma genético e funcional, o crédito só nasceria para ele quando ele materializa sua prestação; com a exceção, justificadamente, essa materialização não ocorre 21 e, portanto, não pode falar-se em recuperação do crédito. É que antecipadamente, antes de sua materialização, o sinalagma funcional a impede. Podemos dizer que esse modo de atuar do instituto corresponde também a uma função de garantia? Por ora, ainda é cedo para concluir nesse sentido, mas, de imediato, é possível aferir que ao impedir validamente o sacrifício patrimonial do credor, futuro excipiente, a exceção acaba por atuar de forma eficaz em um momento anterior ao de qualquer garantia especial das obrigações em si ,ou seja, quando o contrato está sendo executado antes da concessão do crédito. Como é da própria natureza do instituto, as garantias especiais atuam na recuperação do crédito, ou seja, sua atuação é a posteriori e não a priori, como é o caso da exceção. 4. A EXCEÇÃO E SUA RELAÇÃO COM A GARANTIA DAS OBRIGAÇÕES As garantias típicas, pessoais ou reais, comportam uma característica essencial: a acessoriedade. As garantias estão presas a um contrato principal e acessoriamente exercem uma função auxiliar em benefício de outro negócio 40 . A função exercida pelas garantias é permitir a recuperação do crédito, em caso de incumprimento da obrigação. Extinto o contrato principal, extinto também está o negócio acessório de garantia. Da mesma forma, que declarado nulo o negócio principal, a garantia não tem como subsistir. 40 TRIAS, Encarna Roca - ob cit. pág 149. 22 As garantias reais são indicadas numerus clausus pelo legislador; já para as garantias pessoais admite-se que possam ser atípicas, ou seja, regidas pela autonomia da vontade41. Entretanto, seja qual for a natureza da garantia, elas serão sempre acessórias; não integram a natureza e estrutura do negócio principal. Conforme enfatiza ENCARNA ROCA TRIAS 42 , elas têm essencialmente uma origem convencional. No caso do instituto da exceção do contrato não cumprido não se pode falar em acessoriedade e, muito menos, em origem convencional. A exceção decorre da própria natureza do contrato bilateral, sinalagmático. Não se pode falar em acessoriedade, se o seu acionamento decorre do próprio modo de atuar das obrigações. Ela é, em si, o efeito da execução do próprio negócio principal. Existe, independentemente da vontade das partes. Tal condição afastaria a exceção do instituto das garantias?43 As partes, é certo, podem retirar, via contrato o efeito do sinalagma funcional, aceitando correr o risco de receber uma prestação, sem ter recebido a contraprestação, como é caso da compra e venda a prazo, onde o bem já foi entregue imediatamente, após a celebração do contrato e o preço será pago em prestações. Entretanto, nada pactuando em sentido contrário, as obrigações, nos contratos bilaterais, devem ser cumpridas simultaneamente e, portanto, sujeitas naturalmente a exceção. Como a exceção vincula apenas as partes e não coisas, se ela tem alguma relação com as garantias especiais, essa relação só poderia ser com as garantias pessoais, jamais com as garantias reais. Aqui, parece-me 41 42 43 Cf. MARTINEZ, Pedro Romano ett alli. Ob. cit. pág. 150/151 Ett. Alli – “Tratado de Lãs Garantias em la Contratación Mercantil”, Tomo I, Civitas, Madrid, 1996, pág. 147 Para o estudioso espanhol, TRIAS, Encarna Roca - ob cit. pág. 135, aqueles meios que buscam evitar prejuízos patrimonais e que derivam naturalmente da obrigação pactuada, como a ruptura do sinalagma, não podem enquadrar-se como garantias em sentido técnico. 23 importante confrontar a exceção com outra característica que além da acessoriedade, está presente nas garantias pessoais: a adicionalidade. As partes, espontaneamente, como dito anteriormente, para além da garantia geral representada pelo patrimônio do devedor, acrescem ao crédito um reforço patrimonial que ele (o crédito), por si não tem. A garantia real prestada pelo próprio devedor não adiciona patrimônio à garantia geral em si, mas ao vincular um bem específico do patrimônio do devedor ou de terceiro pode-se dizer aumenta-se qualitativamente a massa patrimonial garantidora do débito, tornando menos vulnerável a recuperação do crédito. Não há como sustentar a presença da adicionalidade no instituto da exceção. Pela sua própria natureza, a proteção que ela dá ao crédito nada lhe adiciona, é da essência do próprio instituto; naturalmente ela já existe em um contrato bilateral com execução simultânea das obrigações. Não se pode dizer que o instituto não subsiste sem o negócio principal, porque ele é próprio negócio principal. Pode-se mesmo dizer que ante a falta da acessoriedade, característica marcante das garantias especiais e da adicionalidade não haverá mesmo como sustentar para o instituto da exceção do contrato não cumprido, a qualidade de uma garantia em sentido técnico, em outras palavras, uma garantia especial. Entretanto, tal não importa em negar ao instituto uma garantia em sentido amplo, conforme adiante se verá. 5. A EXCEÇÃO E AS GARANTIAS INDIRETAS 24 De início, anote-se que, conforme sustenta GOMES DA COSTA44, o fato de um instituto servir a proteção do crédito, por si só, não permite lhe atribuir uma função de garantia indireta. Também não me parece afastar a função de garantia de um determinado instituto simplesmente porque ele, consoante critério defendido por GOMES DA COSTA45, não aumenta nem qualitativa nem quantitativamente a massa patrimonial. Concordo que a função de garantia não deverá estar sempre associada à proteção ao crédito conferida por qualquer instituto jurídico; entretanto, parece-me que o acento deve ser colocado na forma como este ou aquele instituto consegue neutralizar os efeitos do incumprimento. Em outras palavras, mesmo que a garantia indireta não implique em aumento qualitativo ou quantitativo da massa patrimonial do devedor, importa ter em conta como ela, de alguma forma, consegue neutralizar os efeitos do incumprimento. Se de alguma forma, algum instituto age nesse sentido, pode-se dizer que complementariamente à proteção do crédito está atuando no sentido de fazer com que o credor receba e o devedor pague; que, repita-se, é o critério defendido por PAULO CUNHA46 em torno do qual deve “convergir todo sistema de garantias”. Para tal atribuição a qualquer instituto e como critério deste trabalho parece-me, então, de fundamental importância primeiro avaliar se o mesmo permite, de alguma forma, a recuperação do crédito ou se mesmo não estando apto para tal, consegue impedir o sacrifício patrimonial do credor. Se, diante do incumprimento, o instituto não tem aptidão para agir na recuperação do crédito ou se, antes mesmo do incumprimento, não tem como evitar o sacrifício patrimonial do credor, nos parece que qualquer que seja o instituto protetor do crédito, não haverá como sustentar para ele uma função de garantia; enfim, será tão somente um mecanismo de proteção ao 44 45 “Assunção Fidejussória de Dívida” - Almedina, Coimbra, 2000 Ob. cit., pág 78 25 crédito, nada mais do que isso, não estará fazendo com que o devedor pague e o credor receba. Diferentemente da cláusula penal, que simplesmente pune o contratante faltoso, mas não impede, em si, o prejuízo, conforme adiante se verá; diferentemente também da própria garantia especial, que também não tem como evitar a efetivação do prejuízo, mas apenas busca a recuperação do crédito, a exceção, como dito anteriormente, por atuar à priori, antes da efetivação do crédito, acaba por impedir o prejuízo consistente no sacrifício patrimonial da prestação do excipiens. Como afirma CALVÃO DA SILVA, “...a função da exceptio pode ser relevante, evitando ao excipiens a perda do valor da sua prestação” 47 . Se a exceção impede a efetivação do prejuízo, acaba por neutralizar sobremaneira o acionamento de eventual garantia especial ou real pactuada, uma vez que estas atuam recuperando crédito, a posteriori, portanto; ao passo que a exceção atua obstando a concessão desse mesmo crédito. Pode-se dizer que enquanto a garantia em sentido técnico atua amenizando os efeitos do incumprimento, recuperando o próprio crédito, a exceção atua preventivamente na proteção desse mesmo crédito. JOÃO CALVÃO DA SILVA 48 sustenta para o instituto “uma eficaz garantia para o credor contra a impotência econômica do devedor”. Como admite CALVÃO DA SILVA, ela não constituiria em uma garantia direta, mas uma garantia “indireta”. Ao proteger o patrimônio do credor/excipiens contra a impotência econômica do devedor/excepto, a exceção deixaria de atuar como simples mecanismo de pressão, assumindo também uma 46 47 Ob. cit., pág. 18. Ob. cit. pág. 337 26 relevante função de garantia. ORLANDO GOMES49 vê na simples recusa de um contratante em oferecer a sua prestação uma séria dúvida quanto ao recebimento da contraprestação; motivo pelo qual defende para o instituto também uma função de garantia. COSTA GOMES vê na exceção apenas um importante meio de pressão contra o devedor; entretanto, resiste a enxergar no instituto uma função de garantia, ainda que de garantia indireta 50 . A exceptio atuaria tão somente na proteção do crédito. Esta pressão exercida contra o devedor seria simples manifestação e conseqüência do próprio sinalagma funcional, da interdependência das obrigações. Para COSTA GOMES faltaria à exceção duas condições básicas para o preenchimento de uma função de garantia: o reforço quantitativo e um reforço qualitativo (como ocorre nas garantias reais) na massa patrimonial, que atua na relação obrigacional protegendo o interesse do credor. ROMANO MARTINEZ 51 , na mesma linha adotada por COSTA GOMES, recusa uma função de garantia para a exceção porque ela, além de não assegurar o cumprimento por parte do outro contratante, não “aumenta ou confere qualquer privilégio em relação ao patrimônio do devedor ”. O fato de a exceção não aumentar quantitativamente ou qualitativamente a massa patrimonial protetora do interesse do credor, não me parece suficiente para retirar do instituto uma função de garantia. Essa característica deve ser fundamental para o reconhecimento de uma garantia pessoal (ainda que atípica) ou real, em sentido técnico, mas não para o 48 49 50 51 In “Cumprimento e Sanção Pecuniária Compulsória” - Almedina, Coimbra, 1996, pág. 336. In Obrigações. 11ª. Edição. Forense. Rio de Janeiro,1997, pág. 227 In “Assunção Fidejussória de Dívida” - Almedina, Coimbra, 2000, págs. 78/79. Ett alli - “Garantias de Cumprimento“- 3ª. Edição, Almedina, Coimbra, 2000, pág. 192. 27 reconhecimento de uma garantia indireta. Para se assumir enquanto tal, é evidente que não se lhe pode exigir essa característica da adicionalidade. Não se trata aqui de reconhecer, então, que todo o mecanismo de proteção ao crédito acabaria por conter uma função de garantia indireta. O que nos parece ser fundamental para enxergar na exceção essa função, como dito anteriormente, é o modo como atua, evitando de forma eficiente a perda da prestação do excipiente, ou seja, ela de fato contribui para neutralizar os efeitos de um possível incumprimento. Se o que se busca com a garantia é a recuperação do crédito concedido, não se concebe como negar uma função de garantia que protege o credor contra o risco de perder o próprio crédito; crédito este, que seria concedido não fosse o acionamento oportuno da exceção. Se lhe falta a adicionalidade patrimonial que, repita-se, deve ser própria das garantias em sentido técnico, não se pode dizer que por via da exceção também não se assegura, ainda que indiretamente, o cumprimento da obrigação por parte do excepto. É que se o instituto se manifesta como meio de pressão; esta pressão é dirigida contra o excepto justamente para que cumpra a sua obrigação, e portanto, o contrato. E qual é objetivo de uma garantia especial, senão, garantir o cumprimento forçado dessa mesma obrigação? Ora, se o modo peculiar de a exceção atuar caminha para que o devedor cumpra sua obrigação e dá ao credor um meio de pressão para que isto ocorra, o instituto não poderá ser tido como um simples meio de proteção ao crédito. É admitindo para a exceção uma função de garantia indireta, que o instituto será confrontado com outros institutos que, aparentemente, desempenham também essa mesma função. 28 6. A EXCEÇÃO E A COMPENSAÇÃO Na compensação, crédito e débito de relações jurídicas distintas, onde figuram as mesmas partes, se encontram para extinguir obrigações. As partes são credor e devedor uma das outras. Pode-se dizer que o credor também protege o seu crédito, na medida em que seu débito com a mesma parte da qual é, repita-se credor em outra relação jurídica, atua como garantia do próprio cumprimento da obrigação. Neste sentido, VON THUR 52 aponta para a existência de uma afinidade da compensação com o direito de retenção, que tem uma flagrante função de garantia. Isto, evidentemente, só pode ser possível quando os mesmos sujeitos tenham duas relações obrigacionais com origens diversas, onde cada qual seja, em função dessa diversidade de relações, credor e devedor do outro a um só tempo. Nesta situação, o risco do incumprimento da obrigação é praticamente neutralizado. Daí que, v.g., o débito do devedor para com o credor na relação jurídica 1 é compensado, portanto, extinto, pago, cumprido com o crédito da relação jurídica 2, desse mesmo devedor contra aquele credor. Encontrando-se, naturalmente, os débitos se extinguem e se o objetivo de uma garantia é assegurar ao credor que ele receba, não há como afastar essa função de garantia da compensação. Haveria, então, uma afinidade entre a exceptio e o instituto da compensação? Os dois institutos agem de forma totalmente independente, diferenciada, embora, ao final, acabem por emprestar ao credor uma 29 garantia maior, que a simples garantia geral, quanto ao risco do inadimplemento. Na compensação, como ocorre nos contratos bilaterais, o credor é também devedor. Só que enquanto nos contratos bilaterais esta condição dupla de credor e devedor está presente em cada participe (contratante) de uma mesma relação jurídica; na compensação tal qualidade só é possível se existente duas relações jurídicas obrigacionais distintas. Nos contratos bilaterais, “toda prestação é contraprestação” 53 . Há, portanto, uma reciprocidade de créditos e débitos. Diante desta reciprocidade, o crédito de um credor acaba por tornar-se a garantia do outro. Essa garantia acaba por ser automática, nesse contexto. Entretanto, ao contrário do que possa aparecer, a compensação tem um acionamento extremamente restrito. Não basta apenas uma reciprocidade de créditos para que ela opere, existe ainda a necessidade de que os créditos recíprocos sejam, ao mesmo tempo, homogêneos, fungíveis e exigíveis 54. Pode-se dizer, inclusive, que a exceptio, quando autorizada a atuar, acaba por fazê-lo mais amplamente. Na compensação 55 , o que há não é propriamente uma suspensão da prestação, mas a sua extinção em função 52 53 54 55 In “Tratado de Las Obligaciones”, tomo II, Tradução de W. Roces, Editorial Réus, Madrid, 1999. pág. 175 “prácticamente la retención representa para el deudor lo mismo que la compensación, posto que em ninguno de los casos entra em possessión de su dinero...” Cf. MIRANDA, Pontes - “Tratado de Direito Privado”. Vol. XXVI, 3ª. Edição, Borsoi, Rio de Janeiro, 1971, pág. 97 Cf. VARELLA, João de Matos Antunes – “Das Obrigações em Geral”, Vol. II, 7ª. Edição, Almedina, Coimbra, 1997, p. 201/204 Art. 368º CCB: “Se duas pessoas forem ao mesmo tempo credor e devedor um da outra, as obrigações se extinguem até onde se compensarem”. 30 de dois sujeitos serem ao mesmo tempo credor e devedor um do outro 56 . Enquanto na exceção, os contratantes estão presos a um mesmo negócio jurídico e, portanto, é essa mesma relação que gera o crédito e o débito; na compensação, os créditos e débitos provém de fontes de obrigações diversas. Há que considerar ainda que a exceção opera-se entre quaisquer naturezas de prestação, fungível ou infungível, homogêneas ou não; bastando apenas que haja o sinalagma; o que, em tese, não autoriza a compensação. A compensação atua a posteriori, pois as partes só podem compensar se as prestações, que geram o crédito recíproco, foram efetivadas; materializadas, ao passo que na exceptio, ela atua a priori, antes que qualquer prestação tenha sido efetivada. Parece-me, de forma clara que, neste sentido, a exceptio ao conduzir à suspensão da prestação acaba por se tornar mais eficaz na proteção do crédito, que a própria compensação. Imagine o comprador que, por força de um contrato bilateral de compra e venda, deva entregar o preço mediante a entrega da coisa, pelo vendedor. Não havendo a entrega da coisa, ele simplesmente suspende o pagamento do preço. A esse propósito veja o que ocorreria no seguinte caso típico de compensação: A faz um empréstimo a B, no valor de R$ R$10.000,00 ( dez mil reais), com vencimento para 10.11.2003. Em outra relação obrigacional, A deve a B R$10.000,00, em função de compra e venda, tendo já recebido o bem vendido com vencimento para aquela mesma data. Em 10.11.2003, A simplesmente extingue o seu débito do mútuo com o crédito que ele tem da relação de compra e venda. Registrese, entretanto, que se ele (A) não tivesse recebido o bem da compra e venda não haveria como invocar a compensação e, por conseguinte, seu 56 Neste sentido, VENOSA, Sílvio de Sálvio – “Direito Civil. Teoria Geral das Obrigações e Teoria Geral dos Contratos”. Atlas. São Paulo. 2001, pág. 355. 31 crédito do mútuo ficaria sem uma maior garantia, que não a garantia geral do patrimônio do devedor. 7. A EXCEÇÃO E O DIREITO DE RETENÇÃO A doutrina alemã 57 chegou a sustentar que a exceção decorria do direito de retenção, sendo uma de suas modalidades 58 . Ë que pelo exercício do juz retentionis o devedor também recusa o cumprimento de sua prestação, a entrega da coisa, ante a falta do cumprimento de um dever relacionada com a própria coisa, particularmente, despesas feitas na sua manutenção ou administração. Entretanto, veja que, de início, uma particularidade afasta essa absorção da exceptio pelo juz retentionis. É que a falta de cumprimento que autoriza o exercício do direito de retenção não decorre da interdependência das obrigações 59 , ou seja, o incumprimento não guarda qualquer sinalagma com o cumprimento da obrigação, que Assim é, v.g, no mandato remunerado justifica a retenção. 60 , onde o mandatário, ante a falta de remuneração, pode reter a coisa administrada, em virtude do mandato. Na exceção, há a ligação de duas obrigações que nascem conjuntamente e devem ser cumpridas simultaneamente, ao passo que na retenção, a obrigação que a justifica nasce de forma independente. Ainda que o código civil brasileiro não indique expressamente o direito de retenção, como um 57 58 59 Cf. THUR, A. Von - ob. cit. pág. 59. No direito brasileiro, VENOSA, Sílvio de Salvo - ob. cit pág. 355, aponta para a existência de afinidades entre os dois institutos. Neste sentido, SILVA, João Calvão da – “Cumprimento e Sanção Pecuniária Compulsória”. Coimhra, 1987, pág. 348 32 direito real de garantia, como faz o direito português, o fato é que o exercício desse direito tem também no nosso ordenamento flagrante caráter de garantia por conta do próprio modo como atua. Não houvesse a expressa previsão legal para a retenção, não haveria como o possuidor reter a coisa em nome da exceção do contrato não cumprido. É que simplesmente não haveria como vencer a falta de sinalagma dessas obrigações, ou seja, entre a obrigação do proprietário de pagar pelas despesas e melhoramentos feitos na coisa e a obrigação do possuidor de restituí-la; e sem o sinalagma o instituto da exceção simplesmente não age 61 . A par das considerações acima, é manifesto, entretanto, que o atuar tanto da exceção como do direito de retenção, permitem a paralisação da execução da obrigação como meio de pressão tendente a fazer como que a outra parte cumpra a prestação a que os detentores e os excipientes fazem jus. São mecanismos que atribuem ao credor a proteção do seu crédito mediante o exercício de uma conduta que está no seu domínio, qual seja, a paralisação da execução do contrato. Ao agirem assim, suspendendo o cumprimento da obrigação, que deveriam cumprir em situações normais, estão os credores, que a fundamentam tanto na retenção como na exceptio, pela sua própria conduta, garantindo-se contra o incumprimento, ao mesmo tempo que pressionam o devedor a cumprir a prestação que lhe compete. Pode dizer-se até que o direito de retenção atua quando o crédito já se efetivou e a exceptio não. Em outras palavras, a coisa só será retida porque o crédito a que faz jus o seu possuidor não lhe foi devidamente 60 61 Art. 681º, CCB: “O mandatário tem sobre a coisa de que tenha a posse em virtude do mandato, direito de retenção, até se reembolsar do que no desempenho do encargo despendeu.” Neste sentido, MIRANDA, Pontes - “Tratado de Direito Privado”. Tomo III. Bookseller. Campinas, 2000, pág. 252 33 pago. Tivesse sido pago o seu crédito não haveria porquê reter a coisa, ou seja, ela atua quando o incumprimento já se materializou, com o não pagamento do crédito ao possuidor. Na exceção, como visto anteriormente, como a execução da obrigação é licitamente paralisada, paralisa-se, por conseguinte, o nascimento do crédito e seu respectivo débito. Vê-se, portanto, que o direito de retenção tem um modo de atuar muito próximo ao das garantias, pois atua, em regra, quando o incumprimento já se consolidou e o credor, tratando-se de contratos onerosos ou gratuitos (como no caso do mútuo) já concretizou seu sacrifício econômico. Já a exceção atua preventivamente, antes que o sacrifício econômico gerador do crédito se concretize. Entretanto, por conta da dinâmica própria desses dois institutos, cujo poder de efetividade se encontra nas mãos do próprio credor, ou seja, eles mesmos (na exceção e na retenção) têm como proteger diretamente o crédito a que fazem juz (no caso da retenção) ou fariam ( no caso da exceção). Pode-se mesmo dizer, que quando a natureza da relação obrigacional permita o acionamento de qualquer desses dois institutos, eles tendem a mostrar-se mais eficientes na proteção do crédito que a própria garantia pessoal em si, exatamente por se situaram no âmbito da disponibilidade direta do próprio credor. A exceção sequer poderá ser afastada mediante o oferecimento de garantias. Só a realização da outra prestação a qual está sinalagmaticamente ligada a afasta 62. 62 O Código Civil Português, no seu artigo 428º, 2, diz expressamente que “A excepção não pode ser afastada mediante a prestação de garantias.” Embora a lei brasileira não refira a questão da impossibilidade da prestação de garantias, parece-me que essa impossibilidade decorre da própria natureza do instituto, que não tem apenas uma função de garantia, mas também a de propiciar o cumprimento integral do contrato, conforme adiante se falará. 34 No direito português, onde o instituto da retenção como garantia encontra-se melhor disciplinado, o exercício do juz retentiones poderá se afastado pela prestação de garantias 63 . Tal fato, entretanto, serve apenas para delimitar melhor a distinção entre os dois institutos, entretanto, a função de garantia não deixa de existir na retenção, mesmo quando se admita a prestação de caução. É que, neste caso, não há propriamente perda da garantia da retenção, mas apenas a sua substituição, admitida legalmente, por outro instituto igualmente eficaz: a caução. 8. A EXCEÇÃO E A CLÁUSULA PENAL A cláusula penal atua quando há um incumprimento contratual. No direito brasileiro, a doutrina64 majoritariamente aponta para esse instituto, duas funções: uma função punitiva e uma função reparadora, compensatória dos eventuais prejuízos causados pelo inadimplemento65. Ao contrário da exceção, depende de pacto acessório para atuar, da culpa do devedor pelo incumprimento da obrigação e tem como limite de valor o próprio valor da obrigação principal, podendo ser reduzida pelo Magistrado se excessiva. É certo que, ao atuar como uma penalidade, ela inibe o inadimplemento, uma vez que o sanciona com o pagamento de determinada 63 Art. 756º, d : “Não direito de retenção: ....d: quando a outra parte preste caução suficiente”. Cf. RIZZARDO, Arnaldo. Direito das Obrigações, Forense, Rio de Janeiro, 1999, p. 253. 65 O artigo 413 do novo Código Civil Brasileiro refere-se expressamente a clausula penal como penalidade. No Código Civil Português, a literalidade do artigo 810º que define a clausula penal relaciona-a ao acordo para “fixar o montante da indemnização exigível”; parece dar realce à função reparadora da clausula; entretanto , a doutrina portuguesa ( cf. TELLES, Inocêncio Galvão, Ob. cit. , p. 438) vê nesse instituto uma importante função coercitiva, de castigo. 64 35 quantia em favor do credor. O fato de a cláusula ser devida, mesmo quando o credor não tenha tido qualquer prejuízo, reforça a obrigação principal66. O seu caráter sancionatário intimida o devedor, pressionando-o a cumprir a obrigação67. Quanto ao incumprimento, a cláusula penal não tem como impedi-lo, ainda que possa desestimulá-lo com o valor da pena pactuada e, muito menos, permite, por si só, a recuperação do crédito. Ademais, nos casos onde não haja culpa do devedor, se a cláusula penal não consegue impedir o incumprimento, ela, sequer, poderá ser acionada seja para o fim de punir, seja para o fim de antecipar perdas e danos. Já a exceção impede o sacrifício patrimonial do credor, mesmo quando, sem a culpa do devedor, a prestação não seja oferecida simultaneamente. É que a exceção pode ser acionada objetivamente, sem que se abra espaço para perquirir sobre a conduta culposa ou não do devedor. Não se pode negar que a cláusula penal contém um importante requisito da acessoriedade 68 . Realmente, a sua pactuação acessória adiciona ao crédito, algo que originariamente ele não tem. Entretanto, parece-me que essa adicionalidade ao não permitir, por si só, a recuperação do crédito, mas apenas contribuir para inibir o inadimplemento, ela acaba por não adicionar patrimônio à garantia geral. Tal fato demonstra que a adicionalidade contida na cláusula penal se distancia da adicionalidade presente nas garantias especiais; adicionalidade esta que está sempre associada ao reforço da massa patrimonial. 66 TELLES, Inocêncio Galvão. Ob. Cit. p. 440 THUR, VON A. Ob cit., p.235 68 SANCHEZ, José Ignácio Bonet et alli – “Tratado de Garantias em la Contratación Mercantil“, Tomo I, Civitas, Madrid, 1996, pág. 899 67 36 Ainda que respeitável doutrina, veja a cláusula penal como um meio de garantia ampla 69 , parece-me que ela ao não agir para recuperar o crédito e também para impedir o sacrifício patrimonial do credor, a sua função não vai além da punitiva e reparadora, configurando-se um mero instrumento de pressão do credor. Mesmo revelando-se um importante instrumento de proteção ao crédito, conforme sustenta COSTA GOMES70, por conta dos fatores acima identificados, não me parece que possa ser concebido para ela uma função de garantia. A exceção, quando autorizada a atuar, acaba por ser mais eficiente na proteção do crédito que a cláusula penal. É que a cláusula penal, uma vez pactuada, seja ela compensatória ou moratória (tenha sido pactuada para a inexecução total da obrigação ou o simples retardamento), ela não garante ao credor o recebimento do seu crédito e muito menos impede eficazmente o sacrifício patrimonial do credor 71 . Com relação essa perda patrimonial ela não consegue recuperá-la e , muito menos, impede que esse mesmo sacrifício se consolide; ou seja , ela não consegue agir a priori, como faz a exceção, e muito menos, a posteriori, como é próprio das garantias especiais. O fator de pressão, de intimidação mesmo do devedor, que a cláusula penal traz em si, apenas desestimula , inibe o incumprimento; mas não a impede. Poder-se-ia argumentar que as 69 70 Cf. RUGGIERO, Roberto – “Instituições de Direito Civil“. Tradução da 6ª. Edição italiana por Paolo Capitanio - Campinas, Bookseller, 1999, pág. 187. O renomado civilista italiano ao reforço o vínculo obrigacional, inibindo o inadimplemento, a cláusula penal acaba por exercer uma função de garantia. Neste mesmo sentido, SANCHEZ, José Ignácio Bonet et alli - “Tratado de Garantias em la Contratación Mercantil“, Tomo I, Civitas, Madrid, 1996, pág. 899. Cf. COSTA GOMES, Manuel Januário. Ob. cit., pág.78 e segs. 37 garantias especiais também não impedem o incumprimento, mas não se pode olvidar que atuam reduzindo sobremaneira os efeitos do incumprimento, viabilizando a própria recuperação do crédito. Uma vez consumado o incumprimento, a cláusula penal apenas acresce ao crédito do credor mais um valor, nada mais do que isso. Tanto esse valor da cláusula como o da própria obrigação principal só terão condições de serem entregues ao credor , após este acionar a garantia geral ou uma eventual garantia especial, que disponha. 9. A EXCEÇÃO E ARRAS O novo Código Civil Brasileiro de forma expressa consagra o instituto de arras ou sinal nas suas duas espécies, confirmatórias e penitenciais72. A doutrina brasileira73 aponta para uma grande afinidade entre a cláusula penal e o instituto de arras ou sinal.74 Ambos dependem de pacto acessório; comportam também uma função punitiva e reparadora e só atuam em caso de incumprimento culposo. A diferença entre os dois institutos residiria na forma como se aperfeiçoam: enquanto as arras são reais ( dependem da entrega da coisa ou dinheiro ) a cláusula penal é consensual ( não há necessidade de entrega de qualquer coisa ou dinheiro para aperfeiçoá-la). Registre-se que, consoante a prática contratual, o que é comum que é que apenas um dos contratantes receba arras; entretanto os seus efeitos 72 Arts. 417 a 220 novo Código Civil. Com relação ao Código Civil Português, Menezes Leitão (ob. cit. p. 231) sustenta que só se consagrou as arras confirmatórias; em sentido contrário, Galvão Telles defende também a presença das arras penitenciais no ordenamento português.. 73 Cf. RIZZARDO, Arnaldo. Contratos. 2ª. Edição, Forense. Rio de Janeiro, 2001, pág. 190. Nesse mesmo sentido, SERPA , Miguel Maria de Serpa. Curso de Direito Civil, 4ª. Edição, Vol. IV, Livraria Freitas Bastos, Rio de Janeiro, pág. 214 38 estendem-se também ao outro contratante, que apenas as deu. Por conta dessa particularidade da forma como se aperfeiçoa, em certos casos, as arras poderão ter uma função de garantia mais ampla que o da exceção. RUGGIERO defende essa função de garantia para o instituto das arras75. Essa função emerge naturalmente quando se aprecia o pacto de arras a partir da perspectiva daquele contratante que as recebeu, seja em dinheiro, como princípio de pagamento ou que a tenha recebido na forma de qualquer outro bem móvel. Nestas duas situações, aquele que recebeu arras, diante do incumprimento culposo, pode ficar com a propriedade da coisa móvel ou pode reter o dinheiro recebido, como princípio de pagamento, a título de punição ou de antecipação de perdas e danos. Nesta situação específica não há como lhe negar uma função de garantia. Como nestes dois casos, as arras são efetivamente reais, ela pune de fato o incumprimento e como chama a atenção SÍLVIO VENOSA76 elas acabam por funcionar como uma garantia do valor a receber. O fato de um contratante receber antecipadamente, antes da ocorrência de qualquer incumprimento, um valor patrimonial do outro contratante, lhe garante repita-se, por antecipação, o recebimento, no mínimo, de uma punição pecuniária ou de uma indenização quando o incumprimento importar em prejuízo. Nesta situação específica, as arras atuam da mesma forma que a exceção, ou seja, a priori, antes que qualquer sacrifício patrimonial tenha sido concretizado. Sua função de garantia aqui é mais ampla que a contida na exceção e se aproxima substancialmente das garantias especiais, porque elas de fato vão implicar em um reforço quantitativo da massa patrimonial, adicionando ao crédito uma massa patrimonial originariamente o crédito não tem. 74 Nesse mesmo sentido A. VON THUR, Ob. cit., pág. 244; RUGGIERO, Roberto. Ob. cit., pág. 199 Ob. cit. pág. 187 76 In Ob. cit. pág. 469 75 que 39 Registre-se que se tratarem de arras confirmatórias e eventualmente o valor do prejuízo superar o valor das arras, outra opção não restará ao credor, senão buscar o complemento das perdas e danos em ação própria. Neste caso, a sua função de garantia já não será tão eficiente como o é no caso das arras penitenciais, onde o valor recebido pré-fixa por inteiro as perdas e danos. Entretanto, observe-se que o pacto de arras da perspectiva daquele contratante que não as recebeu, pelo contrário, apenas as deu, não tem como assumir nenhuma função de garantia. Na perspectiva deste contratante, elas acabam por funcionar como uma simples cláusula penal; um simples meio de pressão contra o devedor para cumprir o contrato; um mecanismo que busca desestimular o incumprimento. Tal decorre do fato de que para receber o valor constante do pacto de arras ele deverá acionar o devedor tal como acionaria para receber o valor da cláusula penal. 40 CONCLUSÃO É certo que a exceção do contrato atua como um importante mecanismo de pressão com vistas ao cumprimento integral do contrato. O contrato bilateral, tanto no seu sinalagma genético, como no seu sinalagma funcional, é um “todo incindível” e a exceção existe para que ele, não obstante tenha sido afetado pelo incumprimento, possa se recuperar deste incidente grave e voltar a ser cumprido. O real sentido do instituto da exceção é exatamente o do cumprimento integral do contrato . Entretanto, ao exercer a função acima que lhe é própria, em complementaridade á exceção, pelo modo peculiar com que atua, protege o crédito e evita o sacrifício da prestação decorrente do sinalagma funcional se o outro contratante não oferece simultaneamente a prestação que lhe compete. Ao evitar o sacrifício patrimonial do excipiente, automaticamente obsta á concessão do crédito sem o oferecimento simultâneo da contraprestação. Esse modo próprio de atuar anteriormente à concretização do crédito, empresta ao instituto uma função de garantia; não o de uma garantia especial em sentido técnico, mas uma garantia indireta. Para atuar como uma garantia especial falta á exceção o requisito da adicionalidade, pois nada acrescenta á massa patrimonial protetiva do crédito. Todavia, se o objetivo de uma garantia é fazer com que o credor receba o seu crédito, indiretamente, a exceção acaba por atuar para satisfazer esse escopo. É que ao paralisar a execução da obrigação, o credor, que diante do sinalagma funcional é também devedor, ao agir como excipiente pressiona o excepto a cumprir integralmente o contrato e, portanto, garantir o 41 recebimento do seu crédito. Se, entretanto, o excepto não responde positivamente à exceção, viabilizando o oferecimento de sua prestação, o instituto, de forma imediata e eficaz, impede a perda da prestação do excipiente. Ao contrário das garantias especiais, a exceção não é mecanismo idôneo à recuperação do crédito, porque age anteriormente á própria concessão desse crédito. É modo de agir preventivo, a priori, antes da concessão do crédito, o que reduz substancialmente os riscos do credor quanto aos efeitos do não cumprimento da obrigação por parte do devedor. Se o objetivo de uma garantia é fazer com que o devedor receba, pode-se dizer, igualmente, que o seu objetivo, na verdade, é evitar o prejuízo do credor. Ora, se a exceção age eficazmente evitando esse prejuízo, evidente que indiretamente incumprimento. está garantindo o credor diante do risco do 42 BIBLIOGRAFIA - ABRANTES, José João – in “A Excepção de Não Cumprimento do Contrato no Direito Civil Português”, Almedina Coimbra, 1986 - ASCENSÃO, José de Oliveira. Direito Civil. Teoria Geral. Vol. III, Coimbra Editora, 2002 - BEVILAQUA, Clovis. Código Civil Brasileiro Comentado. Livraria Francisco Alves, Rio de Janeiro, 1934 - COSTA, Mário Júlio de Almeida. Direito das Obrigações. Almedina. Coimbra. 1994 - CUNHA, Paulo. “DA GARANTIA DAS OBRIGAÇÕES”, Apontamentos das aulas do 5º. Ano da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa; Lisboa, 1938 - ENNECCERUS, Ludwig et alii – “Tratado de Derecho Civil. Apêndice. Código Civil Aleman”. Bosh.Casa Editorial. Barcelona, 1955 - FRAGALI, Michele – “Garanzia (diritto privatto)” , Enciclopédia del Dirito, XVII, 1969 - GOMES, Manuel Januário da Costa – “Assunção Fidejussória de Dívida”. 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