Introdução à Astronomia (AGA210) Notas de aula Cosmologia Enos Picazzio – IAGUSP – 2006 Esta apresentação é parcialmente baseada no capítulo “Universo e Cosmologia”, do livro virtual “Astronomia e Astrofísica”, de Kepler de Souza Oliveira Filho e Maria de Fátima Oliveira Saraiva (UFRGS), adotado como texto complementar do tópico “Cosmologia”, do curso AGA210. Princípio Cosmológico O Universo é homogêneo e isotrópico. Homogêneo: é o mesmo em qualquer lugar Isotrópico: é o mesmo em qualquer direção Implicação: o Universo não pode ter centro ou borda As observações mostram que o Universo é homogêneo em escalas superiores a 10 milhões de anos luz. Para escalas menores, podemos ver estrelas, galáxias e aglomerados de galáxias, mas em larga escala os elementos de volume são homogêneos. Paradóxo de Olbers* Se o Universo fosse homogêneo, isotrópico, infinito e imutável, então o céu noturno deveria ser brilhante já que em qualquer direção a haveria uma estrela. O volume de uma esfera aumenta com o quadrado do raio (V = 4πR2). Portanto, quanto mais longe se olha, mais estrelas se vê; ou seja, a quantidade de estrelas aumenta com o quadrado da distância. Século 17: Johannes Kepler rejeitava a idéia de um universo infinito recoberto de estrelas Galileu Galilei mostrou que a Via Láctea era composta de uma miríade de estrelas, e usou o fato de que o céu é escuro à noite como argumento para provar que o universo era finito Século 18: Edmund Halley e Heinrich Wilhelm Mattäus Olbers* retomam a questão Paradóxo de Olbers Algumas propostas de solução: 1. A poeira interestelar absorve a luz das estrelas (Olbers) - com o passar do tempo, a poeira entraria em equilíbrio térmico com as estrelas e passaria a brilhar tanto quanto elas! 2. A expansão do universo degrada a energia (a luz de objetos muito distantes chega muito desviada para o vermelho e portanto muito fraca) - cálculos mostram que a degradação não é suficiente para resolver o paradoxo. 3. Independentemente de o Universo ser ou não infinito, vemos apenas uma parte dele – a região que a luz teve tempo de percorrer até nos atingir, desde que o Universo surgiu, ou O Universo ainda é jovem - sendo a velocidade da luz finita, ainda não houve tempo para que a luz dos objetos mais distantes nos atingisse. O Universo observável é fisicamente limitado, por ser finito no tempo (idade). A escuridão da noite parece ser uma prova de que o Universo teve um início. Expansão Deslocamento Espectral para o Vermelho 1912: Vesto Melvin Slipher descobriu que as linhas espectrais das estrelas na galáxia M31 (Andrômeda) apresentavam um enorme deslocamento para a região azul do espectro (blueshift, em inglês), um indicativo de que essa galáxia está se aproximando do Sol, a 300 km/s. Observando as demais galáxias durante duas décadas, Slipher demonstrou que a maioria das 41 galáxias que estudou apresentava deslocamento espectral para o vermelho (redshifht), indicando que as galáxias estavam se afastando de nós. Slipher descobriu que quanto menos brilhante a galáxia (portanto mais distante) maior era o deslocamento para o vermelho. Expansão Deslocamento Espectral para o Vermelho 1912: Vesto Melvin Slipher descobriu que as linhas espectrais das estrelas na galáxia M31 (Andrômeda) apresentavam um enorme deslocamento para a região azul do espectro (blueshift, em inglês), um indicativo de que essa galáxia está se aproximando do Sol, a 300 km/s. Observando as demais galáxias durante duas décadas, Slipher demonstrou que a maioria das 41 galáxias que estudou apresentava deslocamento espectral para o vermelho (redshifht), indicando que as galáxias estavam se afastando de nós. Slipher descobriu que quanto menos brilhante a galáxia (portanto mais distante) maior era o deslocamento para o vermelho. Expansão 1929: Edwin Powel Hubble, observando o deslocamento para o vermelho nas linhas espectrais das galáxias observadas por Milton La Salle Humason, e medindo suas distâncias, descobriu que as galáxias estavam se afastando com velocidades proporcionais à sua distância: quanto mais distante, maior a velocidade de afastamento. Simulação (não significa que ele seja esférico) 1 Mpc = 3,26 milhões A.L. Foi a primeira evidência para a expansão do Universo, Universo embora tenha sido prevista por Alexander Friedmann em 1922 e 1924, e por Georges-Henri Édouard Lemaître em 1927. Expansão 1929: Edwin Powel Hubble, observando o deslocamento para o vermelho nas linhas espectrais das galáxias observadas por Milton La Salle Humason, e medindo suas distâncias, descobriu que as galáxias estavam se afastando com velocidades proporcionais à sua distância: quanto mais distante, maior a velocidade de afastamento. tempo 1 Mpc = 3,26 milhões A.L. Foi a primeira evidência para a expansão do Universo, Universo embora tenha sido prevista por Alexander Friedmann em 1922 e 1924, e por Georges-Henri Édouard Lemaître em 1927. Expansão: Lei de Hubble Velocidade de recessão = HO × Distância HO (inclinação da reta no gráfico abaixo)– constante de Hubble em km/s/Mpc. A velocidade de recessão de uma galáxia é diretamente proporcional à sua distância Valor provável da constante de Hubble: 50 a 100 km/s/Mpc, ou 15 a 30 km/s/m.A.L. 1 Mpc = 3,26 milhões A.L. Expansão: Lei de Hubble Velocidade de recessão = HO × Distância HO (inclinação da reta no gráfico abaixo)– constante de Hubble em km/s/Mpc. Hipótese: as velocidades permanecem constantes no tempo Pergunta: quanto tempo levou para cada galáxia atingir essa distância em que a vemos? Resposta: o inverso da contante de Hubble (1/ HO) Demonstração: distância velocidade distância tempo = H o × distância tempo = tempo = 1 Ho 1 Mpc = 3,26 milhões A.L. Constante de Hubble (HO): de 50 a 100 km/s/Mpc ou 15 a 30 km/s/m.A.L. Isto implica na idade de 12 a 17 bilhões de anos. Mais provável (atual): 13,7 bilhões de anos Expansão: Lei de Hubble Fonte possível de erro no valor de Ho: constância da velocidade de recessão das galáxias Há 3 possibilidades para a velocidade: Densidade de matéria 1. Foi maior no passado: isto significa que a expansão está sendo desacelerada pela força da gravidade entre Maior que os corpos. Então a massa - ou densidade de matéria - a crítica é suficientemente elevada para frear a expansão; 2. É constante: a densidade é suficiente para anular a gravidade e a expansão continua eternamente; Crítica 3. Foi menor no passado: a expansão está sendo Menor que acelerada, ou seja, a densidade de matéria é menor que a crítica no caso anterior. Lei de Hubble: uma escala de distância Expansão Desvio espectral cosmológico: Na realidade o desvio para o vermelho (redshift) é decorrente da expansão, NÃO do efeito Doppler provocado pela velocidade relativa. Como o Universo expande, o espaço expande, e um fóton se propaga nesse espaço em expansão. O resultado é que seu comprimento de onda também expande com o Universo. tempo Expansão: então houve um início? O que se vê: tempo O que se conclui: tempo Singularidade a expansão deve ter havido um início! Expansão: então houve um início? Apesar da descoberta da expansão do Universo, muitos pesquisadores, acreditavam na Teoria do Estado Estacionário, proposta por Herman Bondi, Thomas Gold e Fred Hoyle (19152001). Segundo ela, o Universo é similar em todas as direções e imutável no tempo, com produção contínua de matéria para contrabalançar a expansão observada, mantendo a densidade média constante. Em 1950 Fred Hoyle sugeriu pejorativamente o nome Big Bang para o evento de início do Universo, previsto pela teoria aceita. Expansão eterna? Há duas possibilidades para o destino do Universo: 1. ele expandirá para sempre, 2. a expansão cessará e colapso poderá surgir. O Universo colapsará novamente somente se a atração gravitacional da matéria (e energia) contida nele for grande o suficiente para frear a expansão. Como a massa bariônica (matéria comum) é da ordem de 5% da massa total provável, não podemos ainda determinar se a expansão será eterna. Expansão eterna? Podemos expressar a massa em termos da densidade (massa por unidade de volume). A densidade crítica, que interromperia a expansão é de 100 milésimos de trilionésimos de trilionésimos de grama por centímetro cúbico, isto é: Esta densidade crítica corresponde a 5 átomos de hidrogênio por metro cúbico, dez milhões de vezes menor do que o melhor vácuo que pode ser obtido em um laboratório na Terra. A matéria visível do Universo é ainda 100 vezes menor. Relatividade Geral 1905 e 1917: Albert Einstein apresenta suas teorias da Relatividade: Especial ou Restrita (descreve a física do movimento na ausência de campos gravitacionais) e Geral (inclui campos gravitacionais). Segundo elas: - a velocidade da luz no vácuo é constante, independente da velocidade da fonte, - a massa depende da velocidade, - há dilatação do tempo durante movimento em alta velocidade, - massa e energia são equivalentes, e - nenhuma informação ou matéria pode se mover mais rápido do que a luz. - matéria curva o espaço-tempo Trata-se de uma teoria da gravidade, descrevendo a gravitação como a ação das massas nas propriedades do espaço e do tempo, que afetam o movimento dos corpos e outras propriedades físicas. Para Newton, o espaço é rígido e descrito pela geometria Euclidiana. Para Einstein, o espaço-tempo é distorcido pela presença da matéria. Relatividade Geral 1917: Einstein publica o histórico artigo Considerações Cosmológicas sobre a Teoria da Relatividade Geral, construindo um modelo esférico do Universo. Suas as equações não implicavam diretamente em um Universo estático de raio finito (mesma dificuldade encontrada com a teoria de Newton), como se supunha na época já que a expansão foi constatada quase uma década depois, por Hubble. Einstein introduziu em suas equações a famosa constante cosmológica, para obter um Universo estático. Ela atua como uma força repulsiva que evita o colapso do Universo pela atração gravitacional. O holandês Willem de Sitter mostrou que a constante cosmológica permitia um Universo em expansão mesmo se ele não contivesse qualquer matéria. Por isso, a constante cosmológica é também chamada de energia do vácuo. Geometria do Universo A teoria do Big Bang considera que se as galáxias estão se afastando umas das outras, então no passado estiveram mais próximas. No passado remoto, 10 a 15 bilhões de anos atrás, deveriam estar todas num mesmo ponto, muito quente, uma singularidade espaço-tempo, que se expandiu no Big Bang. tempo Singularidade O Big Bang, ou Grande Explosão, criou a matéria, a radiação, o espaço e o tempo. Este é o início do Universo que podemos conhecer. Geometria do Universo 1922: Georges-Henri Édouard Lemaître (padre e cosmólogo belga, 1894-1966) foi provavelmente o primeiro a propor um modelo específico para o Big Bang. Segundo ele, toda a matéria esteve concentrada no átomo primordial, que se partiu em incontáveis pedaços, cada um se fragmentando cada vez mais, até formar os átomos presentes no Universo. Uma enorme fissão nuclear. Sabemos que este modelo não pode ser correto, pois não obedece às leis da relatividade e estrutura da matéria (quântica), mas ele inspirou os modelos modernos. Geometria do Universo Alexander Friedmann (matemático e meteorologista russo, 1888-1925), independentemente de Lemaître, encontrou várias soluções para as equações da teoria da relatividade geral. A família de soluções para a teoria da relatividade geral encontrada por Friedmann e Lemaître descreve um Universo em expansão. As soluções possíveis das equações da relatividade geral incluem expansão eterna ou novo colapso. Geometria do Universo Se a constante cosmológica é nula, os modelos se dividem em três classes: 1. A densidade de matéria é suficientemente para reverter a expansão. Então, o Universo é fechado, como a superfície de uma esfera mas em três dimensões. Algo que se movesse eternamente em linha reta voltaria aos mesmos pontos. Geometria do Universo Se a constante cosmológica é nula, os modelos se dividem em três classes: 2. A densidade de matéria não é suficientemente para reverter a expansão. Neste caso, o Universo é aberto e continuará expandindo eternamente. Geometria do Universo Se a constante cosmológica é nula, os modelos se dividem em três classes: 3. A densidade de matéria tem o valor crítico (intermediário entre os dois casos anteriores). Agora, o Universo é plano (não é aberto, nem fechado) e expande eternamente, mas a velocidade das galáxias será cada vez menor, chegando a zero no infinito. É o Universo Euclidiano, tridimensionalmente reto. Geometria do Universo Aparências para cada caso ABERTO PLANO FECHADO Destino do Universo Destino do Universo Expansão constante, na taxa atual, de um Universo vazio com 15 bilhões de anos O Universo aberto tem mais de 10 e menos que 15 bilhões de anos. A idade do Universo é 10 bilhões de anos. Um Universo de alta densidade é bem mais jovem, tem 5 bilhões de anos. Destino do Universo Com a descoberta da energia escura surge nova possibilidade Expansão acelerada pela energia escura, em um Universo ainda mais antigo O Universo aberto tem mais de 10 e menos que 15 bilhões de anos. A idade do Universo é 10 bilhões de anos. Um Universo de alta densidade é bem mais jovem, tem 5 bilhões de anos. Testando a hipótese do Big Bang Suponha que estamos olhando para o passado, qdo o Universo tinha apenas 100.000 anos. Naquela época: O Universo era bem mais denso e sob alta pressão. Alta pressão implica em temperatura elevada. Pela lei de corpo negro (Planck), alta temperatura produz luz. Como isso ocorreu há muito tempo, a luz que observamos atualmente sofreu desvio para o vermelho (redshift) indo parar na região de microondas do espectro. Como o Universo inteiro brilhava, essa luz deve provir de toda parte do céu. O Fundo Cósmico de Microondas A luz do Big Bang deveria aparecer atualmente como uma emissão de corpo negro (Lei de Planck) de 3 graus absolutos Previsão vs. Observação • 1948: emissão de fundo de 3 K prevista teoricamente por Ralph Asher Alpher, Robert Herman e George Gamow • 1965: Arno Penzias and Robert Wilson a descobrem acidentalmente • 1998: espectro de corpo negro medido pelo satélite COBE Previsão confirmada A idade do Universo SE não houvesse matéria, não haveria gravidade no Universo e a expansão de Hubble seria eterna e a velocidade constante. A idade do Universo seria 1 / H0. No Universo real há matéria, portanto há gravitação, que age contrariamente à expansão de Hubble. No passado, as galáxias afastavam-se umas das outras mais rápido, portanto a idade deve ser menor que 1 / H0. Para um Universo plano, a idade é 2/3 de 1/ H0. Se conseguirmos medir H0, podemos estimar a idade real Universo Inflacionário 1979: Alan Harvey Guth propõe uma fase inflacionária (expansão súbita) logo após o Big Bang 10-35s* após o Big Bang houve uma expansão súbita fazendo o Universo crescer 1075 vezes seu tamanho. Isto decorreu de uma transição de fase (quebra de simetria), fazendo a gravitação agir repulsivamente e provocando resfriamento repentino. Depois de 10-30s**, a teoria é idêntica ao Big Bang padrão. * uma parte em 100 bilhões de trilhão de trilhões ** uma parte em 1 milhão de trilhão de trilhões Universo Inflacionário 1979: Alan Harvey Guth propõe uma fase inflacionária (expansão súbita) logo após o Big Bang Início do tempo 10-35s após o Bing Bang houve uma expansão súbita fazendo o Universo crescer 1075 vezes seu tamnanho. Isto decorreu de uma transição de Inflação fase (quebra de simetria,), Diminuta fração agir repulsivamente. Isto fazendo a gravitação de segundo provocou um super-esfriamento 380 mil anos Depois de 10-30s, a teoria é idêntica ao Big Bang padrão. 13,7 bilhões de anos Radiação cósmica de fundo Satélite COBE (Cosmic Background Explorer): revela pequeníssimas variações (seis partes por milhão) da temperatura na radiação cósmica de fundo. O padrão de uniformidade das medidas só é compatível com a existência do Big Bang, pois de outra forma regiões distintas do Universo não poderiam estar com a mesma temperatura. 380 mil anos após o Big Bang, o Universo era dominado por radiação. Nesta época a temperatura caiu para cerca de 3000 K (prótons começaram a capturar elétrons e formar átomos de hidrogênio e hélio neutros). Com a expansão, a temperatura de fundo caiu para os atuais 2,7 K. Nos modelos de formação de galáxias, estas flutuações são necessárias para permitir que a matéria formada posteriormente se aglomerasse gravitacionalmente para formar estrelas e galáxias, distribuídas em grupos, bolhas, paredes e vazios, como observamos. Roberto D.D. Costa - IAGUSP Roberto D.D. Costa - IAGUSP Roberto D.D. Costa - IAGUSP Roberto D.D. Costa - IAGUSP Roberto D.D. Costa - IAGUSP