ALFABETIZAÇÃO-CONSCIENTIZAÇÃO NA DECADA DE 1960: PRÁXIS FREIREANA DE EDUCADORES POPULARES CEARENSES. Maria das Dores Alves Souza, UECE1 Eliane Dayse Pontes Furtado, UFC2 A pesquisa que dá origem a este artigo,3 objetiva compreender a influência do pensamento político-pedagógico de Freire na práxis de educadores populares que atuaram em movimentos de alfabetização-conscientização na década de 1960, no estado do Ceará. Fezse uma revisão bibliográfica das obras onde o autor trabalha temáticas que fundamentam e são o sustentáculo do seu pensamento, entre as quais foram eleitas: alfabetizaçãoconscientização como práxis social transformadora; linguagem e descolonização na pedagogia do oprimido e, ainda, a esperança no construto do inédito viável. Estas temáticas são desaguadouros de onde se vê emergir para elas outros temas que as constituem, as configuram e dialogam entre si constituindo assim, o pensamento freireano. Em sua trajetória de vida e de pensador da educação Freire foi defensor do trabalho coletivo e do dialogo como fundamento na construção do saber. Para ele, o sujeito não deve pensar sozinho, sem a coparticipação de outros sujeitos, no ato de conhecer o objeto. Esta reflexão sobre o pensar compartilhado, remete a uma revisão de literatura a partir de um dialogo entre Freire (1980, 1981, 1987) e seus companheiros da trajetória de luta nos movimentos de cultura popular, quais sejam: Carlos Rodrigues Brandão (2002), João Francisco de Souza (2001), Moacir Gadotti (2005), Osmar Fávero (2013) e Paulo Rosas (2002). Por ser Freire um educador popular situado no espaço, no tempo e profundamente enraizado na realidade brasileira, em especial na realidade nordestina, assume importância o contexto histórico e político brasileiro em que se originaram seus estudos e deu-se o compromisso com uma proposta de educação como práxis humana e instrumento de libertação dos homens e mulheres oprimidas na sociedade de classes. Segundo Freire (1987), é fundamental compreender que não há educação fora das sociedades humanas, como também não há homens no vazio. Para o próprio autor, seu pensamento se originou na sociedade brasileira de contexto intensamente cambiante e dramaticamente contraditório. Sociedade em “partejamento.” Contexto, em que a educação popular se fazia necessária, por ser desvestida da roupagem alienada e alienante, por sua força de mudança e de libertação. A investigação, de abordagem qualitativa, referencia-se na História Oral e utiliza a técnica da entrevista no registro de narrativas da experiência humana. Os sujeitos são cinco educadores 1 Professora mestra do curso de Pedagogia do Centro de Educação (CED) da Universidade Estadual do Ceará (UECE). Doutoranda em Educação Brasileira no Programa de Pós Graduação da Universidade Federal do Ceará (UFC). Pesquisadora no nejahm - Núcleo de Referência em Educação de Jovens e Adultos: História e Memória – Ceará. E-mail: [email protected]. 2 PhD, Profª. pesquisadora no Programa de Pós Graduação em Educação Brasileira da Universidade Federal do Ceará (UFC). Orientadora da pesquisa que originou este artigo e coordenadora do nejahm - Núcleo de Referência em Educação de Jovens e Adultos: História e Memória – Ceará. 3 Pesquisa realizada em 2012, para a tese de doutorado em Educação Brasileira, no Programa de PósGraduação da Universidade Federal do Ceará, com previsão de defesa em setembro de 2013. (a) populares, que desenvolveram ações de alfabetização-conscientização na década de 1960, no Ceará. Destes, três atuaram no Movimento de Educação de Base – MEB, uma, em ação de alfabetização de adultos promovida pelo partido Comunista do Brasil e outra, em experiência de alfabetização ligada a uma congregação católica. A entrevista semiestruturada possibilitou as narrativas que fundamentam as análises. O acesso desses educadores ao conhecimento da proposta político pedagógica freireana deu-se a partir da inserção concreta destes educadores em movimentos de alfabetização-conscientização, o qual foi sendo aprimorado em encontros de formação pedagógica que trabalhavam a filosofia do sistema Paulo Freire e a metodologia a ser desenvolvida na prática educativa, possibilitando assim, um estudo consciente na inserção social. Na concepção de educação libertadora a formação política pedagógica deve ser um processo permanente que possibilite o educador desenvolver a capacidade de reflexão crítica sobre a prática educativa. Associa, então, reflexão crítica à ação em um conceito de práxis - Ação Reflexão – Ação. Fazia parte, da natureza dos movimentos de alfabetização uma compreensão crítica do papel da cultura no processo de formação como também, na importância da luta política pelas necessárias mudanças de que a sociedade brasileira precisava. Essa compreensão também se dava, em relação à cultura em geral e à cultura popular, em particular, como fundamento da educação progressista de adultos. A alfabetização se fazia inserindo-se no âmago dos problemas existenciais das pessoas, pois ela se dava, ao mesmo tempo, que a sua conscientização gradativamente ia emergindo. Através de "situações existenciais", da vida cotidiana, o debate era conduzido, de tal modo que, os alfabetizandos iam emergindo em seu processo de consciência crítica a partir do próprio contexto, de como é, e de como poderia ser. Foi percebida a necessidade de se trabalhar sobre temas sociais que eram trazidos pelos alfabetizandos e alfabetizandas, trabalhados como temas geradores, nas salas de aula, vinculadas aos movimentos populares. Os temas deveriam buscar a perspectiva dos sujeitos e sua cultura, das realidades vividas por eles, no cotidiano de suas comunidades. Muitas vezes resvalou-se para a compreensão de que o tema gerador se restringia a trabalhar-se nos termos do universo vocabular dos sujeitos aprendentes. Na verdade, havia um “mote” – temas sociais a serem trabalhados e encaminhados para problematizações – e também havia a compreensão do aspecto do alfabetismo como linguagem, daí a necessidade de ater-se ao universo vocabular das pessoas. A práxis comporta reflexão da ação e este processo ocorre a partir da tomada de consciência pelos educadores e educandos sobre a importância da permanente reflexão crítica sobre a prática educativa. O caráter não espasmódico ou pontual da crítica é assinalado; enfatiza-se, o aspecto permanente da práxis, que deve transitar dos processos coletivos de análise das salas de aula para os processos da vida comunitária. Essa concepção é explicitada nas narrativas dos educadores que participaram da investigação, nas quais demonstram como funcionava a sistemática de acompanhamento da ação didática em sua conexão com a cultura.Os relatos permitem a compreensão de que as práticas educativas comprometidas com a aprendizagem dos que dela participam, dão-lhes lugar de sujeitos, no processo. Assim, os sujeitos da educação davam o mote, discutiam as palavras geradoras e os temas que problematizavam. A participação nas aulas ia conferindo-lhes lugar de sujeitos das lutas sociais. Nessa direção, as aprendizagens eram desenvolvidas numa sistemática de acompanhamento pedagógico que possibilitavam a analise da práxis vivida. As experiências dos educadores, analisadas na investigação são um exemplo vivo do clima participativo de empolgação e compromisso, que cercava os educadores populares envolvidos nos processos de alfabetização-conscientização, de orientação na Pedagogia freireana. Possibilitam a compreensão de que a práxis referenciada no pensamento político pedagógico de Paulo Freire, desenvolvida pelos movimentos populares no Ceará, na década de 1960, entrelaçara-se a sonhos, a esperanças, ao desejo de justiça social e a utopia de provocar mudanças sociais, políticas e culturais, almejadas pelas camadas populares, no contexto de transição que vivenciava a sociedade brasileira. Demonstraram ainda, o compromisso desses atores sociais em desenvolver uma prática de alfabetizaçãoconscientização vinculada à realidade dos educandos, o que se revelava pela preocupação em trabalhar o domínio da leitura, da escrita e da compreensão crítica da realidade, como instrumento de libertação das condições de exploração e desumanização que vivenciavam os educandos. Isso permite afirmar que as ações de alfabetização-conscientização desenvolvidas no estado, contribuíram para a elevação do nível de alfabetismo e para a ampliação dos processos de organização social e cultural dos homens e mulheres que delas participaram. O movimento deve ser considerado também, um marco histórico na educação popular do Ceará. Palavras-chave: Educação libertadora – práxis – alfabetização conscientização REFERÊNCIAS BRANDÃO, Carlos Rodrigues. Paulo Freire e todos nós: algumas lembranças sobre sua vida e seu pensamento. In: Paulo Freire: Educação e Transformação Social. (Org.). ROSAS, Paulo. 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