Cledson dos Santos Estudo Teórico das Propriedades

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE
CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E TECNOLOGIA
NÚCLEO DE PÓS–GRADUAÇÃO EM FÍSICA
Cledson dos Santos
Estudo Teórico das Propriedades Estruturais, Eletrônicas e
Ópticas do Tetraborato de Lítio (Li2B4O7)
São Cristóvão – SE
2014
Cledson dos Santos
Estudo Teórico das Propriedades Estruturais, Eletrônicas e
Ópticas do Tetraborato de Lítio (Li2B4O7)
Dissertação apresentada ao Núcleo de PósGraduação em Física da Universidade
Federal de Sergipe, como parte dos
requisitos necessários para a obtenção do
Título de Mestre em Física.
Orientador:
Dr. Milan Lalic
São Cristóvão – SE
2014
RESUMO
No presente trabalho foram estudadas as propriedades estruturais, eletrônicas e ópticas do
tetraborato de lítio, Li2B4O7, um material importante, frequentemente usado como detector de
radiação e de nêutrons. Como ferramenta de cálculo foi utilizado o método “ab-initio” Linear
Augmented Plane Wave (LAPW) baseado na Teoria do Funcional da Densidade (DFT) e
implementado no código computacional Wien2k. Os efeitos de correlação e troca do sistema
eletrônico foram simulados através de um potencial semi-local, “Modified Becke Johnson”
mBJ, recentemente desenvolvido. Os parâmetros de rede e todas as posições atômicas na
célula unitária cristalina do Li2B4O7 foram otimizados, a fim de atingir uma configuração de
mínima energia para o sistema. Os resultados obtidos, referentes ao volume da célula unitária
e das posições atômicas, mostraram boa concordância quando comparados com medidas
experimentais. O cálculo da estrutura eletrônica (estrutura de bandas e densidade de estados DOS) revelou a natureza e o tamanho do band gap fundamental do composto, bem como o
caráter orbital das bandas por sua volta. De acordo com os resultados, o Li2B4O7 possui gap
fundamental indireto de 9,2 eV. No topo da banda de valência predominam orbitais do tipo p
dos átomos de oxigênio, enquanto que o fundo da banda de condução é formado, em sua
maioria, por estados p referentes aos átomos de boro, B(1). As posições dos picos da DOS na
banda de valência, assim como o valor calculado do gap, concordam muito bem com
resultados experimentais. Neste trabalho também foram calculadas as partes real e imaginária
do tensor dielétrico do Li2B4O7, bem como o seu índice de refração. A análise da parte
imaginária do tensor dielétrico possibilitou a interpretação, em termos das transições
eletrônicas, do espectro de absorção óptica do Li2B4O7. Os resultados revelaram que a borda
de absorção se encontra perto da energia de 9,2 eV, e que o primeiro pico é devido às
transições eletrônicas entre estados p dos átomos de oxigênio para estados P dos átomos de
boro, as quais ocorrem dentro do grupo trigonal, B(1)O3. O índice de refração foi calculado
para as duas direções de polarização da luz, paralelas aos eixos cristalinos a e c. De acordo
com esses resultados, o Li2B4O7 é um material opticamente anisotrópico. O índice de refração
calculado concorda bem com o experimental, medido em uma faixa de comprimentos de onda
de 184 a 2325 nm. Na essência do presente estudo é possível concluir que o potencial mBJ,
computacionalmente eficiente, descreve precisamente as propriedades eletrônicas e ópticas do
Li2B4O7.
Palavras-chave: Propriedades ópticas. Estrutura Eletrônica do Li2B4O7. Teoria do Funcional
da Densidade.
ABSTRACT
In present dissertation we studied theoretically the structural, electronic and optical properties
of lithium tetraborate, Li2B4O7, an important material, frequently used as detector of radiation
and neutrons. As a calculation tool we utilized first-principles Linear Augmented Plane Wave
(LAPW) method, based on Density Functional Theory and implemented into WIEN2k
computer code. Exchange and correlation effects within the electronic system were simulated
by recently developed “Modified Becke Johnson” (mBJ) semi-local potential. The lattice
parameters and atomic positions within the Li2B4O7 unit cell were computationally relaxed,
and the resulting structure was found to agree well with the experimental one. Calculated
electronic structure (band structure and density of states – DOS) revealed the nature and
magnitude of the band gap (indirect, 9,2 eV), as well as the orbital character of the bands
around it. The valence band top consists predominantly of oxygen’s p-states, while the
conduction band bottom is dominated by the p-states of boron which is trigonally coordinated
with its neighboring oxygens (B(1)). The energies of principal peaks in the valence band DOS,
as well as the calculated magnitude of the gap, are found to agree very well with experimental
findings. Next, we calculated real and imaginary part of dielectric tensor of the Li2B4O7, as
well as its refractive index. Analysis of imaginary part of dielectric tensor permitted us to
interpret the optical absorption spectrum of the Li2B4O7 in terms of electronic transitions that
occur between populated and empty electron states. The results revealed that absorption
threshold starts at 9,2 eV approximately, and that the first absorption peak originates from
electron transfer from the full O p-states to the empty B p-states within the trigonal, B(1)O3,
structural motif. Refractive index is calculated for two directions of polarizations of incident
light, parallel to the crystallographic axes a and c. It was concluded that the Li2B4O7 is
optically anisotropic material. Calculated refractive indexes were compared to experimental
ones, recorded in the wavelength range from 184 to 2325 nm, and it was found a good
agreement between them. On the basis of present study we conclude that computationally
efficient semi-local mBJ potential accurately describes the electronic and optical properties of
the Li2B4O7.
Keywords: Optical Properties. Electronic Structure of Li2B4O7. Density Functional Theory
Dedico este trabalho ao meu querido e amado
filho Lucas, por ser a razão da minha vida, e
aos meus pais, Marizete e Erivaldo, por terem
me trazido ao mundo.
AGRADECIMENTOS
Agradeço, especialmente, ao senhor Jesus, por sempre me agraciar com seus dons e
ensinamentos;
A toda minha família, pelo apoio e dedicação;
A minha esposa Joselaine, pelo companheirismo;
Ao meu orientador Dr. Milan Lalic, pelos ensinamentos e por toda dedicação, contribuindo de
forma efetiva para a construção deste trabalho;
Aos amigos, por todas as discursões construtivas e por todos os momentos de alegria;
A CAPES, pelo apoio financeiro;
A Universidade Federal de Sergipe, por contribuir na construção de uma sociedade mais
consciente e igualitária.
SUMÁRIO
I INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 1
1 Introdução .............................................................................................................................. 1
II CONSIDERAÇÕES TEÓRICAS ....................................................................................... 3
2 Teoria do Funcional da Densidade ...................................................................................... 3
2.1 O Problema de Muitos Corpos .......................................................................................... 3
2.2 A Aproximação de Born-Oppenheimer............................................................................ 4
2.3 Os Teoremas de Hohenberg e Kohn ................................................................................. 5
2.4 O Formalismo de Kohn e Sham ........................................................................................ 7
2.5 Aproximações para os Potenciais de Correlação e Troca ............................................. 12
2.5.1 Aproximação da Densidade Local (LDA) ................................................................... 12
2.5.2 Aproximação do Gradiente Generalizado (GGA) ...................................................... 13
2.5.3 Potencial Modificado de Becke e Johnson (mBJ) ....................................................... 13
2.6 O Método LAPW (Linear Augmented Plane Waves) ................................................... 15
2.7 Cálculos das Propriedades Estruturais, Eletrônicas e Ópticas dos Sólidos. ............... 18
2.7.1 Otimização dos Parâmetros de Rede e das Posições Atômicas ................................. 18
2.7.2 Estrutura de Bandas e Densidade de Estados ............................................................. 20
2.7.3 Propriedades Ópticas .................................................................................................... 22
2.7.4 Constantes Ópticas e as Relações de Kramers-Kronig .............................................. 29
III. PROPRIEDADES ESTRUTURAIS, ELETRÔNICAS E ÓPTICAS DO Li2B4O7 ... 31
3.1 Estado da Arte e Motivação para o Estudo.................................................................... 31
3.2. Detalhes Computacionais dos Cálculos ......................................................................... 33
3.3 Otimização da Estrutura do Li2B4O7.............................................................................. 34
3.4 Estrutura Eletrônica do Li2B4O7..................................................................................... 38
3.5 Propriedades Ópticas do Li2B4O7 ................................................................................... 41
IV CONCLUSÃO ................................................................................................................... 48
REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 50
1
I INTRODUÇÃO
1 Introdução
Uma parte muito grande das pesquisas em física da matéria condensada e em física
computacional é direcionada para resolver o então chamado problema de muitos corpos. A
essência do problema é que somente sistemas contendo uma ou duas partículas podem ser
resolvidos exatamente por métodos matemáticos, produzindo soluções em termos de funções
analíticas. Para sistemas interagentes, os quais contêm mais do que duas partículas, não é
possível chegar às soluções exatas por meio de métodos analíticos. Métodos computacionais,
no entanto, podem ser usados para produzir soluções aproximadas, as quais, em princípio,
podem ser refinadas para qualquer grau de precisão desejável [1]. Neste sentido, foram
desenvolvidas várias teorias, com as quais sistemas eletrônicos contendo muitos corpos
pudessem ser resolvidos e que, posteriormente, foram implementadas em códigos de
computadores.
Uma das teorias mais bem sucedida e utilizada por pesquisadores para solucionar
problemas de muitas partículas é a Teoria do Funcional da Densidade (Density Functional
Theory - DFT) [2,3]. Com ela, várias propriedades fundamentais dos sólidos (estrutura
eletrônica, propriedades estruturais e ópticas, etc.) podem ser obtidas de forma precisa. A
DFT faz parte de uma categoria de métodos denominados de primeiros princípios ou abinitio. Esta denominação nasce do fato de a sua formulação ser feita, totalmente, a partir de
conceitos de mecânica quântica, sem nenhuma aproximação, a priori.
A solução de um problema de estrutura eletrônica, na prática, requer a escolha de
representações matemáticas para orbitais de um elétron. Vários métodos de expansão de
funções de base como solução para problemas desta natureza (os quais a DFT faz uso) foram
propostos. Dentre estes, o LAPW (Linear Augmented Plane Waves), o qual foi utilizado no
presente trabalho, é um dos mais precisos e eficientes em cálculos para predizer propriedades
da estrutura eletrônica, no estado fundamental, de sólidos [4].
Nos últimos anos, o tetraborato de lítio (LTB), Li2B4O7, tem chamado muito a atenção
da comunidade científica devido às suas importantes propriedades físicas e à sua ampla
aplicação em vários campos da ciência e tecnologia [5,6,7,8]. O LTB é um material bem
conhecido como “hospedeiro” em aplicações de dosimetria termoluminescente [8]. Ele possui
número atômico efetivo (Zeff  7,39) muito próximo ao do tecido humano (Zeff  7,42) [8].
2
Além disso, possui também grande potencial quando usado como detector de nêutrons
térmicos, relativamente lentos [6,5].
Embora o LTB apresente importantes propriedades físicas, não existe, na comunidade
científica, nenhum consenso a respeito do seu band gap fundamental de energia [8].
Basicamente, são encontrados apenas três trabalhos na literatura envolvendo cálculos da
estrutura eletrônica do Li2B4O7 [5,6,7]. Destes trabalhos, o de maior expressão neste âmbito,
foi realizado por Islam et al, os quais determinaram teoricamente o valor de  8,9 eV para o
gap de energia do LTB através da DFT utilizando um funcional de correlação e troca (XC)
híbrido. Este valor de band gap calculado está em boa concordância com o valor
experimentalmente estimado (9,0 eV), para o qual se tomou como base um prévio estudo
experimental-teórico com um material similar (LiB3O5) ao LTB [5]. O problema é que os
funcionais híbridos, em geral, são muito exigentes, no sentido de que demandam um esforço
computacional muito grande para obter a convergência dos cálculos.
Quanto às suas propriedades ópticas, apenas o índice de refração foi determinado
experimentalmente [9], sendo que nenhum trabalho teórico, seja sobre o índice de refração ou
qualquer outra constante óptica, foi constatado na literatura.
Dentro desta perspectiva, o presente trabalho tem como objetivo descrever e predizer
as propriedades eletrônicas e ópticas do Li2B4O7 puro, empregando um potencial de XC semilocal, visando, com isso, contribuir de forma significativa para o conhecimento da natureza e
do tamanho correto do gap fundamental de energia, determinar e explicar o espectro de
absorção e predizer o comportamento de algumas constantes ópticas deste composto. O
sucesso em atingir esses objetivos garante que futuras tarefas, envolvendo estudos de defeitos
e centros de luminescência no LTB, possam ser executadas com um esforço computacional
razoável.
3
II CONSIDERAÇÕES TEÓRICAS
2 Teoria do Funcional da Densidade
2.1 O Problema de Muitos Corpos
Em termos gerais, podemos descrever um sólido como uma coleção de partículas
interagentes, tais como núcleos atômicos e elétrons. A equação de Schrödinger independente
do tempo para um sistema composto por N elétrons e M núcleos, é dada na seguinte forma:
 
 
Hˆ  (r , R)  E (r , R) ,
(2.1.1)
 
em que E é o autovalor de energia,  (r , R) denota a função de onda do sistema,

 

  

r  r1 , r2 ,..., rN  e R  R1 , R2 ,..., RM  indicam as coordenadas dos N elétrons e o conjunto de
coordenadas dos M núcleos, respectivamente. Formalmente, podemos escrever uma expressão
geral para o operador hamiltoniano total não relativístico, Ĥ , (no SI de unidades), na seguinte
forma:
2
2
2
2





1
e2 Zi
1
e2
Ri
ri
Hˆ   




  

  8 
2 i Mi
2 i mi
4 0 i , j Ri  rj
0 i  j ri  rj
e2 Zi Z j

  .
8 0 i  j Ri  R j
(2.1.2)
1
Nesta expressão, mi designa a massa dos elétrons, enquanto que Z i , j e M i a carga e a massa
nuclear, respectivamente. Os dois primeiros termos no hamiltoniano denotam a energia
cinética dos núcleos e elétrons e os três últimos, a energia potencial devido às interações de
Coulomb do tipo elétron – núcleo, elétron – elétron e núcleo – núcleo, nessa ordem. Na
prática, este é um problema impossível de ser resolvido completamente. Existem várias
características que contribuem para essa dificuldade, porém a mais fundamental é que a
função de onda do sistema depende explicitamente de todas as coordenadas eletrônicas e
4

 
  
nucleares,  (r1, r2 ,..., rN , R1, R2 ,..., RM ) , tal que, em geral, lidamos com um problema de
3( N  M ) graus de liberdade acoplados (sem considerar o spin eletrônico).
A solução de problemas desta natureza envolve, necessariamente, um conjunto
conveniente de aproximações. A primeira delas foi desenvolvida por Born-Oppenheimer e
consiste em separar os graus de liberdade dos núcleos e dos elétrons [10].
2.2 A Aproximação de Born-Oppenheimer
A primeira observação a cerca do problema de muitos corpos é que a escala de tempo
associada com o movimento dos núcleos é usualmente muito maior do que a dos elétrons.
Fisicamente, isto é justificável quando se considera o fato de que a razão entre a massa dos
núcleos e dos elétrons é muito grande [10,11]. Devido a grande diferença de massa, os
elétrons respondem quase que instantaneamente a qualquer deslocamento nuclear. Estes
argumentos consistem na ideia básica da Aproximação de Born-Oppenheimer de separar o
movimento dos núcleos do movimento dos elétrons. Matematicamente, isto significa que a
equação de Schrödinger pode ser separada em duas, uma para os elétrons e outra para os
núcleos. Portanto, em vez de tentar resolver o problema para todas as partículas
simultaneamente, podemos considerar os núcleos com posições fixas e então resolver a
equação de Schrödinger para o sistema eletrônico sob o potencial estático decorrente dos
núcleos. O conjunto de soluções obtidas permite construir uma superfície de energia
potencial, a partir da qual é possível resolver a equação nuclear. É importante ressaltar que a
Aproximação de Born-Oppenheimer se mostra adequada para sistemas avaliados no estado
fundamental, entretanto para estados excitados, deixa de ser confiável [12]. Pode-se, dessa
forma, utilizar esta aproximação e reescrever o hamiltoniano definido na expressão (2.1.2), da
seguinte maneira:
2
2

e2 Zi Z j


1
e2 Zi
1
e2
1
ri
Hˆ  




 

  8 
  .
2 i mi
4 0 i , j Ri  rj
8 0 i  j Ri  R j
0 i  j ri  rj
(2.2.1)
Percebe-se que ao considerar os núcleos fixos, o termo de energia cinética nuclear,
2


2
2
1
 Ri
 M , é nulo e que o termo de repulsão internuclear, 8
0
i
i
2
e Z Z
 R i R j , agora, é
i j i
j
adicionado como uma constante. Escrito nesta forma, o operador hamiltoniano descreve o
5
movimento dos N elétrons sob a ação do potencial externo dos núcleos. A função de onda do

 
  
sistema,  (r1 , r2 ,..., rN ; R1 , R2 ,..., RM ) , tem dependência explicita somente com as
coordenadas eletrônicas, tal que as coordenadas nucleares são tomadas como parâmetros. A
equação de Schrödinger envolvendo o hamiltoniano na expressão (2.2.1) constitui o problema
eletrônico de maior interesse em cálculos de estrutura eletrônica em sólidos.
2.3 Os Teoremas de Hohenberg e Kohn
Em 1964, Hohenberg e Kohn formularam, em dois teoremas, as bases matemáticas
sobre a qual a Teoria do Funcional da Densidade (DFT) está erguida [2]. Esta formulação se
aplica a qualquer sistema de elétrons interagentes que se movem sob a influência de um
potencial externo decorrente de núcleos fixos. O hamiltoniano do sistema é dado como
definido na expressão (2.2.1), o qual pode ser escrito na forma de operadores, como segue:

Hˆ  Tˆ  Vˆext (r )  Uˆ ee ,
2

em que, Tˆ  
2
2
 ri
m
i
i
denota o operador de energia cinética e Uˆ ee 
(2.3.1)
1
8 0

ij
2
e
  o
ri  r j
operador de Coulomb, devido a interação de repulsão elétron-elétron. O termo,
2
2
e Zi Z j
e Zi

1
1
Vˆext (r )  


  8  R  R , representa o potencial externo sob o qual os
4 0 i , j Ri  r j
0 ij i
j
elétrons se movem.
Os teoremas de Hohenberg e Kohn podem ser enunciados da seguinte maneira: (i) O

potencial externo, Vext (r ) , é um funcional único (exceto por uma constante) da densidade

eletrônica  (r ) , tal que existe uma correspondência um-a-um entre densidade eletrônica do
estado fundamental e o potencial externo. Como consequência, qualquer observável do
sistema pode ser obtido completamente a partir da densidade eletrônica do estado
fundamental:
 | ˆ |    [  ] .
(2.3.2)
6
Na figura 2.3.1 está esquematizada a relação estabelecida por Hohenberg e Kohn. As
setas menores indicam a solução usual da equação de Schrödinger, em que o potencial


externo, Vext (r ) , determina todos os estados do sistema, i (r ) , inclusive o estado

fundamental, 0 (r ) . A seta maior denota o teorema de Hohenberg-Kohn, o qual promove o


uso da densidade eletrônica,  (r ) , como variável chave [13]. Uma vez que, a  (r ) determina

univocamente o potencial Vext (r ) , determina também a função de onda do estado fundamental

do sistema, 0 (r ) , e, por conseguinte, a energia cinética e a energia potencial. Com isso, a
energia total do sistema toma a seguinte forma funcional:
E[  ]  T [  ]  Vext [  ]  U ee[  ]
(2.3.3)


E[  ]    (r ) vext dr  FHK [  ] ,
sendo que,
FHK [  ]  T [  ]  U ee [  ] .
(2.3.4)
Na equação dada em (2.3.4), FHK [  ] é denominado funcional universal de Hohenberg-Kohn,
no sentido de que é válido para qualquer número de partículas e qualquer potencial externo.
Figura 2.3.1: Representação esquemática proposta por Hohenberg-Kohn.
Fonte: Adaptada da referência [13]
O segundo teorema permite o uso do princípio variacional. (ii) para uma densidade


 
teste ~(r ) , tal que ~(r )  0 e com o vínculo  ~(r )dr  N , (N indica o número total de

elétrons) a energia total do sistema, E[ ~] , atinge um mínimo (global), se e somente se, ~(r )

corresponder à verdadeira densidade eletrônica do estado fundamental,  (r ) . Em outras
palavras, E0  E[ ~] para qualquer ~   .
Em resumo, os dois teoremas estabelecem um caráter variacional para a energia total
do sistema, E[  ] , que pode ser expresso a partir do método variacional de Rayleigh-Ritz:
7


 [ ]  
 v
  r dr  N   0 ,
(2.3.5)
o qual leva a uma equação do tipo Euller-Lagrange:

 F [  ]
 v [  ]
 vext (r )  HK
.


(2.3.6)
Nesta expressão, µ denota o multiplicador de Lagrange associado com o vínculo
 
  (r )dr  N .
A partir da equação (2.3.6), pode-se dizer que o conhecimento do FHK [  ] como
funcional da densidade eletrônica implica em conhecer completamente a solução da equação
de Schrödinger que descreve o sistema. Contudo, os teoremas de Hohenberg-Kohn nada
dizem sobre a forma explicita de FHK [  ] . De fato, a maior complexidade de um problema de
muitos corpos está na determinação deste funcional universal.
2.4 O Formalismo de Kohn e Sham
De acordo com os teoremas de Hohenberg-Kohn, a solução de um problema de muitos
corpos requer o conhecimento da forma explicita do funcional universal, FHK [  ] . O principal
problema na determinação de FHK [  ] surge dos efeitos quânticos, devido ás interações dos
elétrons do sistema, tais efeitos são: a correlação e a troca eletrônica. O efeito denominado por
troca eletrônica aparece como consequência de os elétrons serem partículas fermiônicas e,

portanto, descritas por uma função de onda total,  (r , s), antissimétrica. O movimento
correlacionado dos elétrons, ou seja, o efeito de correlação é consequências de os elétrons
serem partículas eletricamente carregadas. De fato, os elétrons blindam uns aos outros. O
resultado da troca eletrônica juntamente com a blindagem entre os elétrons é que existe uma
depleção (diminuição) na probabilidade de encontrar um elétron próximo de outro. Este
fenômeno é conhecido como buraco de correlação e troca [14,10,13]. É este comportamento
que dá a FHK [  ] o caráter desafiador de expressa-lo como funcional da densidade eletrônica.
Neste sentido, Kohn-Sham propuseram, em 1965 [3], um formalismo no qual toda a
dificuldade de tratamento de um sistema de muitos corpos pode ser superada substituindo-se o
problema original por um auxiliar, de partículas não interagentes e, portanto, passível de ser
resolvido completamente. A ideia de Kohn-Sham consiste em assumir que se a densidade do
8
estado fundamental do sistema auxiliar é igual à densidade do sistema original, então é
possível mapear o sistema real por meio deste outro, de partículas não interagentes.
Seja o sistema auxiliar para N elétrons independentes, descrito por um hamiltoniano
(em unidades de Hartree) dado da seguinte maneira:
N
 
 1
Hˆ aux    i2  vˆaux(r ) .
2

i 1 
(2.3.7)

Aqui, o primeiro termo do hamiltoniano representa a energia cinética usual, Tˆs , e vaux(r ) , um
potencial auxiliar. O índice “s” em Tˆs , indica um operador de uma única partícula (“single
particle”). Para o estado fundamental de Ĥ aux , o sistema deve conter um elétron em cada um

dos N orbitais i (r ) , com as correspondentes autoenergias  i [13]. As funções de onda,

i (r ) , são obtidas resolvendo a seguinte equação, do tipo Schrödinger:


hˆi (r )   i i (r ) ,
(2.3.8)
a qual obedece ao hamiltoniano de um elétron,

1
hˆ   i2  vˆaux(r ) .
2
(2.3.9)
A densidade eletrônica e a energia cinética do sistema auxiliar podem, então, ser calculadas a
partir dos orbitais de um elétron, como segue:

N

 (r )   i (r )
2
(2.3.10)
i 1
TS [  ]  
 

1 N
i ( r )  2 i ( r ) .

2 i1
(2.3.11)
A partir dos teoremas de Hohenberg-Kohn, o valor esperado para a energia total deve
ser um funcional único da densidade eletrônica,
9

 
 aux    TS    Vaux   TS      (r ) vaux(r )dr .
(2.3.12)
Este funcional energia é mínimo para a verdadeira densidade eletrônica do estado
fundamental, tal que deve satisfazer a seguinte equação variacional:

 

  aux [  ]   s (   (r )dr  N  0   S 
 T [  ]
 aux [  ]
 vaux (r ) 
.


(2.3.13)

Observa-se que o multiplicador de Lagrange,  S    i  Eaux [  ] para  (r ) correspondente
i
à exata densidade eletrônica do estado fundamental e que, descrita como tal, a DFT é uma
teoria exata [13,10,15,16].
Utilizando TS [  ] pode-se reescrever o funcional universal de Hohenberg-Kohn para o
sistema real como uma nova quantidade, o funcional de Kohn-Sham, o qual separa a parte
clássica da parte quântica:
FKS    T̂S    VH     XC  .
Nesta equação, VH   
(2.3.14)
 
1  ( r )  ( r )  
dr dr  representa o termo de Hartree, clássico, e
 
2  | r - r  |
 XC   , os efeitos de correlação e troca, quântico:
 XC    T   TS    Uee    VH    TC    U X     UC  
(2.3.15)
Substituindo-se a expressão para FKS [  ] no funcional energia total definido em (2.3.3),
chega-se ao funcional de Kohn-Sham:


 
1  (r )  (r)  
 KS    TS       d r d r    (r )vext (r )d r   XC  .
2
| r  r |
(2.3.16)
Aplicando, como para o sistema auxiliar, o método variacional de Rayleigh-Ritz em
(2.3.1.6), obtém-se a seguinte equação:
10



 KS [  ] T [  ]
 (r )    

 vext (r )     d r   XC


| r  r |

(2.3.17)



 (r )    
Aqui, define-se Veff (r )  vext (r )     d r   XC
, como o potencial efetivo de
| r  r |

Kohn-Sham. O grande feito do formalismo de Kohn-Sham, consiste em reconhecer a mesma
forma para as duas equações em (2.3.13) e (2.3.17),
S 
 T [  ]
 aux [  ]
 vaux (r )  S


(2.3.18)


 KS [  ] TS [  ]

 Veff (r ) .


Comparando estas duas expressões, conclui-se que ambas as minimizações terão a mesma

solução se o potencial auxiliar, vaux(r ) , gera uma densidade eletrônica, tal que corresponda à
exata densidade do sistema real. Se isso for verdade, o primeiro teorema de Hohenberg-Kohn
assegura que:




 (r )   XC  
Vaux (r )  Veff (r )  vext (r )     d r  
| r  r |

(2.3.19)
e, então, tem-se mapeado o sistema real, de partículas interagentes, por meio de um sistema
auxiliar, de partículas independentes. O conjunto de orbitais monoeletrônicos que minimiza a
equação (2.3.17) é solução das, então, “celebradas” equações de Kohn-Sham:


hˆKS i (r )   i i (r )


1 2
hˆKS     Vˆeff (r ) .
2
(2.3.20)



O potencial efetivo, Veff (r ) , é dado como definido anteriormente, Vˆeff (r )  vˆext (r )  VˆH Vˆ XC ,
em que, VXC 
  XC  
é o potencial de correlação e troca (derivativa funcional de E XC )


[10,13]. Os orbitais monoeletrônicos, i (r ) , e suas respectivas autoenergias,  i , são ditos
orbitais e energias de Kohn-Sham, respectivamente. Neste estágio, algumas implicações
11
devem ser anotadas a cerca da interpretação dos autovalores e das autofunções (orbitais) nas
equações de Kohn-Sham: a partir da forma, a qual a equação (2.3.1.20) foi derivada, os
autovalores,  i , são introduzidos como objetos completamente artificiais, em que suas
correspondentes autofunções, i , levam à verdadeira densidade eletrônica do sistema real. É
somente esta densidade eletrônica que tem significado físico nas equações de Kohn-Sham
[15,13].
Nota-se que a solução das equações de Kohn-Sham, requer o conhecimento do termo



de Hartree, VH (r ) , e de correlação e troca. O problema é que tanto VH (r ) quanto Vxc (r ) , são
funcionais da densidade, a qual é obtida dos orbitais monoeletrônicos de Kohn-Sham que
estão sendo procurados. Isto sugere buscar a solução autoconsistentemente. A seguir, é
mostrado, de forma resumida, um esquema de autoconsistência usual para este fim.
Figura 2.3.1: Ciclo autoconsistente para a resolução das equações de Kohn-Sham.
Para resolver este ciclo, alguma densidade inicial deve ser suposta como dado de
entrada (geralmente, parte-se da superposição das densidades atômicas dos átomos do
material), tal que o hamiltoniano é construído. Em seguida, o problema de autovalores é
resolvido e obtém-se o conjunto de orbitais, a partir dos quais a nova densidade eletrônica
pode ser derivada. Por fim, compara-se a densidade eletrônica de saída (nova) com a inicial
(velha), se convergiram então os observáveis físicos podem ser calculados, se não, mistura-se
parte da densidade velha com a nova e retoma-se o ciclo novamente até que seja obtido um
12
grau de convergência desejado. Maiores detalhes sobre a solução autoconsistente das
equações de Kohn-Sham poderão ser encontros nas referências [15,17,16,13].
2.5 Aproximações para os Potenciais de Correlação e Troca
2.5.1 Aproximação da Densidade Local (LDA)
O formalismo de Kohn-Sham para a DFT é, em princípio, exato, a não ser pelo fato de
que o termo de correlação e troca, E xc (  ) , não seja conhecido explicitamente como funcional

da densidade,  (r ) . Para contornar este problema, vários esquemas de aproximações foram
desenvolvidos. Historicamente, um dos métodos mais importantes é “Local Density
Approximation” (LDA) [3]. Nesta aproximação, o termo E xc (  ) é definido como:
LDA


 
Exc [  (r )]    (r )  xc (  (r )) dr ,
(2.5.1.1)

em que,  xc (  (r )) é a energia de correlação e troca por elétron, definida sobre a hipótese de

um gás de elétrons homogêneo, com uma densidade,  (r ) , que varia muito lentamente com a

posição, r . Uma forma frequentemente usada de escrever este funcional é separa-lo como
uma soma devido às contribuições de troca e correlação:



 xc (  (r ))   x (  (r ))   c (  (r )) .
(2.5.1.2)
A essência a qual a LDA é derivada (gás de elétrons homogêneo), remete a se pensar
que ela providencia uma boa descrição somente para sistemas com densidades de carga de
caráter local ou que varie lentamente. No entanto, a aplicabilidade prática da LDA tem
comprovado produzir bons resultados mesmo para alguns sistemas considerados como
bastante não homogêneos [18]. Como reportado na literatura [10], a LDA descreve de forma
confiável as propriedades estruturais, frequências vibracionais e módulos elásticos para
muitos sistemas. Por outro lado, em cálculos de energias entre estruturas bastante diferentes, a
LDA pode apresentar erros significativos. Por exemplo, a energia de ligação para muitos
sistemas é superestimada, tipicamente, em 20 a 30 %.
13
2.5.2 Aproximação do Gradiente Generalizado (GGA)
A densidade eletrônica, seja em um átomo, molécula ou sólido, varia gradualmente de
local para local, tal que não deve ser surpresa que em um modelo de um gás de elétrons
homogêneo (como LDA) sejam encontradas algumas deficiências. A maioria dos cálculos
baseados na DFT nos dias de hoje, usam funcionais energia de correlação e troca, E xc , que

envolvem não apenas o caráter local da densidade eletrônica,  (r ) , em um ponto de
 

coordenada r , mas também seu gradiente,  (r ) . Estes funcionais são denominados de
Generalized Gradient Approximation (GGA) e introduzem as chamadas correções não-locais
na LDA. Neste sentido, uma forma geral para o termo de energia de correlação e troca pode
ser escrita na seguinte forma:

   
Exc (  )    (r )  xc (  (r ),  (r )) dr .
(2.5.2.1)
Diferente do que acontece com a LDA, para a qual é definido um único funcional de
energia de correlação e troca,  xc , existe na aproximação GGA, uma variedade de
  
parametrizações do termo  xc (  (r ),  (r )) , a partir das quais diferentes funcionais de
correlação e troca foram desenvolvidos. Uma das parametrizações mais usada e confiável em
cálculos DFT foi proposta por Perdew, Burke e Ernzerhof em 1996 [19].
Em termos gerais, a aproximação GGA tende a melhorar, de forma significativa, a
descrição das distâncias e energias de ligação de moléculas, em relação à aproximação LDA
[10]. Entretanto, no que diz respeito à descrição da estrutura eletrônica de semicondutores ou
isolantes, tanto a aproximação GGA quanto LDA, subestimam, consideravelmente, o valor
experimental do band gap de energia.
2.5.3 Potencial Modificado de Becke e Johnson (mBJ)
De um ponto de vista prático ou teórico, usa-se mais frequentemente o método DFT
com GGA e LDA para estudar a estrutura eletrônica da maioria dos materiais. O fato é que
estas duas aproximações subestimam o gap de semicondutores ou isolantes. Existem, no
entanto, alguns métodos alternativos que melhoram a descrição do band gap com relação a
valores experimentais. Os funcionais híbridos, por exemplo, em que uma fração da energia de
troca exata substitui uma fração da energia de troca em LDA ou GGA. A pesar desta proeza,
14
estes métodos demandam de um esforço computacional muito grande e também não são
satisfatórios em todos os casos. Recentemente, Tran e Blaha [20] propuseram uma versão
modificada do potencial semi-local de Becke-Johnson [21] (mBJ) com o intuito de melhorar
os resultados para os band gaps. Este potencial semi-local, para o qual o termo de troca está
acoplado com o termo de correlação da aproximação LDA, “imita” muito bem o
comportamento dos funcionais híbridos, no sentido de que prediz as bandas de energias
precisamente, tal que os band gaps dos materiais calculados concordam muito melhor com
experimentais.
O potencial mBJ como proposto por Tran e Blaha, tem a seguinte forma:
mBJ
 x,

5 2t (r )

 12  (r )
BR 

1
(r )  c x, (r )  (3c  2)
 N
em que,  (r )    i ,
i 1
2
(2.5.3.1)
N 



é a densidade eletrônica, t (r )  (1 2)  i , .  i , é a
i 1
BR

densidade de energia cinética de uma partícula com spin σ e  x, (r ) é o potencial de BeckeRoussel (BR). Na equação (2.5.3.1), c é escolhido de forma que dependa linearmente da raiz


quadrada da média de
:

 1
c    
 Vcell


cell
1
 
2
 (r )  
 d r 
 (r )

(2.5.3.2)
em que α e β são parâmetros livres, com valores α = -0,0012 (adimensional) e β = 1,023
bohr1/2. Por outro lado, Vcell representa o volume da célula unitária do composto em questão.
Uma característica particular do potencial mBJ é que a essência, a qual ele foi obtido,
não permite escrevê-lo na forma usual, Vxc   Exc[  ]   , isto é, o mBJ não é um funcional
energia. Como consequência, os procedimentos de otimização para obter os parâmetros de
rede, “bulk módulos” e suas derivadas com relação à pressão não são possíveis. Isto é uma
consequência do caráter empírico deste potencial. Desta forma, recomenda-se que as
propriedades estruturais sejam calculadas primeiro com algum funcional, GGA, moderno e
daí, então, usar o potencial mBJ para calcular a estrutura eletrônica e as propriedades ópticas.
15
2.6 O Método LAPW (Linear Augmented Plane Waves)
A solução de um problema de estrutura eletrônica, na prática, requer a escolha de
representações matemáticas para orbitais de um elétron. Uma proposta para esta representação
é expandir a função de orbital j em um conjunto de base genérica na seguinte forma:


M
 j (r )   c j  (r ) ,
(2.6.1)
 1
em que M determina o tamanho do conjunto de base, c j são os coeficientes de expansão e

 (r ) é uma função de base escolhida convenientemente. Em sistemas periódicos, tal como
sólidos, o teorema de Bloch deve ser assegurado. Neste caso, as funções de base definidas
anteriormente, devem ser modificadas:


M



 (j ) (r )   c (j ) ( ) (r ) ,
(2.6.2)
 1

 

( ) 
i .r k 
aqui,  indica um vetor da primeira zona de Brillouin e  (r )  e   (r ) são as funções
de Bloch. Vários métodos de expansão de funções de base como solução para um problema
de um elétron foram propostos. Dentre estes, o LAPW é um dos mais precisos e eficientes em
cálculos de estrutura eletrônica de materiais.
O método LAPW é, fundamentalmente, uma modificação de outro método, o APW
(Augmented Plane Waves), o qual foi desenvolvido por Slater em 1937 [22]. Antes de
introduzir o método LAPW, serão expostos alguns aspectos mais relevantes deste outro
método.
O método APW é baseado no modelo de aproximação “muffin-tin” para um potencial

cristalino real, V (r ) : dentro das esferas (denominadas esferas muffin-tin), centradas em cada
sítio atômico, o potencial é assumido como sendo esfericamente simétrico e fora destas, na
região intersticial, o potencial é tomado como constante [23]. Na região esférica o potencial
sentido por um elétron oscila fortemente, enquanto que fora, é mais suave. Isto sugere que se
pode decompor o potencial sentido por um elétron em duas regiões (figura 2.6), tal que
diferentes expansões de funções de base podem ser usadas: a parte esférica é descrita,
eficientemente, com uma combinação linear de funções do tipo orbitais atômicos:
16

 (r )   Al m l m (rˆ) ul (r, El ) ,
(2.6.3)
lm

em que l m (rˆ) são os harmônicos esféricos, r  indica um vetor com origem no centro da

esfera e rˆ especifica a dependência angular de r  em   e   . A função, ul (r, El ) , satisfaz a
equação radial de Schrödinger:
 d 2 l (l  1)
 

 dr2  r 2  V (r )  El  r ul (r )  0 ,


(2.6.4)

em que os autovalores, El , são parâmetros (inicialmente desconhecidos) e V (r ) é o potencial
esfericamente simétrico dentro de cada esfera. Por outro lado, na região intersticial, os
elétrons podem ser considerados como partículas “livres” e suas funções de onda podem ser
aproximadas por uma combinação linear de ondas planas:


G( ) (r )  
1
2
c

G

G

 
e i (  G ) . r .
(2.6.5)

Nesta expressão,  representa o volume da célula unitária,  indica um vetor de onda da

primeira zona de Brillouin e G um vetor da rede recíproca.
Figura 2.6: Divisão da célula unitária em duas regiões, esferas muffin-tin centradas em cada
átomo e intersticial, a qual corresponde ao restante da célula.
Fonte: Adaptada da referência [18].
17
As expressões como definidas anteriormente, em cada região (muffin-tin e
intersticial), não satisfazem as condições de contorno, da continuidade e suavidade, na borda
das esferas. As funções de onda devem ser contínuas tanto em valor quanto em suas
derivadas, nesta fronteira. Parte desta exigência pode ser resolvida especificando, em uma
forma particular, os coeficientes de expansão Al m em (2.6.3). A partir da figura 2.6, vemos



que o raio vetor pode ser escrito como r  r   R . Substituindo este valor na parte
 

  
exponencial da solução em ondas planas, ei (  G ). Rei (  G ). r  , podemos expandir a exponencial,

em r  , como um produto de harmônicos esféricos pela função de Bessel, jl [23]:
  
  

e i ( G ). r   4  i l jl (|   G | r ) l m (r ) l m ( G , G ) .
(2.6.6)
lm
Avaliando esta expressão na superfície de uma esfera de raio, RMT , e impondo a exigência de
que as duas funções devem ser contínuas na superfície desta esfera, obtemos:

Al m (  G) 

4 i
l
 ul ( RMT , El )

c
 G
G
e
  
i (  G ). R
 

jl (|   G | RMT ) l m (  G ,  G ) .
(2.6.7)


Escrito desta forma, os coeficientes Al m (  G) combinam, em cada superfície esférica, os

orbitais muffin-tin com cada componente, G , das ondas planas [24]. No entanto, as funções
APW assim definidas, ainda são descontínuas em suas derivadas sobre a borda das esferas.
Isto leva à resolução de um problema variacional não linear para cada valor esperado de
energia, El , que exige grande custo computacional. Outro impasse com o método APW é o
fato de ul ( RMT , El ) aparecer no denominador da equação (2.6.7). Em geral, existem valores
de energias, El , para os quais ul ( RMT , El ) são nulos na borda das esferas e, por conseguinte,
para estas energias, as ondas planas e as funções atômicas se tornam desacopladas [25].

Para corrigir a dependência não linear das funções ul (r , El ) com a energia, El ,
Andersen [4] formulou o método LAPW no qual as funções de base definidas nas regiões
muffin-tin e intersticial são contínuas tanto em valor quanto em suas derivadas. Esta

continuidade é adquirida adicionando-se às funções radiais, ul (r , El ), certa liberdade
18

variacional. Para isto expande-se em série de Taylor a função ul (r ,  ) a partir de um valor
calculado para alguma energia El :



ul (r ,  )  ul (r , El )  ul (r , El ) ,
(2.6.8)

em que o termo ul (r , El ) satisfaz a seguinte equação:
 d 2 l (l  1)
 


 V (r )  El  r ul (r )  ul (r )
 2 
2
 dr 

r
(2.6.9)
A energia El , expressa em (2.6.8), é escolhida de forma que esteja próxima ao centro da
banda com caráter orbital l. Em resumo, podemos escrever que em termos desta base
(LAPW), as funções de onda são:



  12
cG e i (  G ) .r

 


G
G( ) (r )  
 
 

Al m (  G ) ul (r , El )  Bl m (  G ) ul (r , El )  l m (rˆ)
 lm






Interstici os
(2.6.10)
Muffin - Tin

Os coeficientes Al m (  G) e Bl m (  G) são determinados impondo a condição de que a
função de onda deve ser contínua em valor e em suas derivadas sobre o contorno das esferas.
2.7 Cálculos das Propriedades Estruturais, Eletrônicas e Ópticas dos Sólidos.
Os formalismos e métodos matemáticos explicados nas seções anteriores são
implementados em vários códigos de computadores. Dentre estes, o utilizado nesta
dissertação foi o código Wien2k, desenvolvido por P. Blaha et al em Viena, Áustria [26], para
cálculos de propriedades cristalinas. As propriedades estruturais, eletrônicas e ópticas, as
quais serão apresentadas aqui, são resultados de cálculos executados neste código.
2.7.1 Otimização dos Parâmetros de Rede e das Posições Atômicas
Em cálculos de otimização de parâmetros de rede de um determinado material, buscase uma relação entre a energia total de uma coleção de átomos em uma célula unitária, a
pressão e o volume, para a qual o sistema atinja um valor mínimo de energia. Esta relação é
19
obtida calculando-se a energia total do sistema como função das constantes de rede do
material, Tot  Tot (a1, a2 , a3 ) . Encontrando o mínimo de energia, necessariamente,
determinam-se também os correspondentes parâmetros de rede (e, portanto, o volume e a
pressão) para os quais a energia foi mínima, Tot  Tot (a01, a02 , a03 ) . Para extrair os
parâmetros de rede de equilíbrio, a01, a02 , a03 , é útil pensar em uma forma funcional da
energia, Tot (a1, a2 , a3 ) . Isto pode ser feito por meio de um ajuste polinomial da bem
conhecida, equação de estado de Birch – Murnaghan [17]:
3
2


9V0 B 0   V0  3 
ETot (V )  E0 
    1 B0

16   V 


2
2

 

3
3 
V
V




0
0



    1 6  4    ,
 V 
 
V   

 

2
(2.7.1.1)
a qual é uma forma generalizada da equação de estado de Murnaghan para incluir o termo .

B0  B
 , como variável [27]. Nesta expressão, E
P T
0
e V0 são respectivamente a energia e o
volume de equilíbrio, B0 é a compressibilidade (bulk modulus) do material, definida em P = 0
e V denota o volume a ser variado. A aplicação desta equação em um conjunto de dados
requer que E0, V0, B0 e B0 , sejam tomados como parâmetros de ajuste.
Para cálculos de minimização das posições atômicas, o código Wien2k dispõe do
programa MINI, o qual utiliza o script mini lapw, que determina posições para os átomos, a
partir das quais as forças que os núcleos sentem são mínimas. As posições atômicas são
movidas em direção e sentido, tal que as forças sentidas pelos átomos deixem o sistema em
uma configuração mais próxima possível do equilíbrio. Isto é feito minimizando-se a energia

  
total, Tot ( Ri )  Tot ( R1 , R2 , R3 , ....) , para um sistema com M átomos na célula unitária. A
força sobre um átomo, i, é obtida a partir da seguinte equação:


E
Fi  i ETot   Tot .
Ri
(2.7.1.1)
20
Nota-se, desta expressão, que a força sobre um átomo é mínima quando a taxa de variação da
energia total em relação à posição for nula. Este procedimento pode ser realizado por
diferentes métodos implementados no código, por exemplo, PORT e o Mixing [26].
2.7.2 Estrutura de Bandas e Densidade de Estados
O problema de elétrons em um sólido é, em princípio, um problema de muitos corpos.
O hamiltoniano completo do sólido contém, não apenas, o potencial que descreve a interação
de elétrons com os núcleos, mas também o potencial devido às interações do tipo elétron –
elétron. Na aproximação do elétron independente, estas interações são aproximadas por um

potencial efetivo, Veff (r ) . O fato de que os íons em um cristal estão dispostos em um arranjo

periódico regular, implica em uma periodicidade espacial do potencial, Veff (r ) , com respeito a

translações envolvendo vetores da rede de Bravais, Ri . Nas equações de Kohn – Sham isto
significa que:

 
Veff (r )  Veff (r  Ri ) .
(2.7.2.1)
Então, somos levados a trabalhar com equações de um elétron do tipo Schrödinger, dada na
seguinte forma:
 2  2
 
H   
  Veff (r )    .
 2m

(2.7.2.2)
De acordo com o teorema de Bloch, os autoestados,  , do Hamiltoniano, H, (solução
da equação de Kohn – Sham) obedecem a seguinte condição:
 


 n (r )  exp[i . r ] un (r ) ,
(2.7.2.3)

em que  denota um vetor da primeira zona de Brillouin, n o índice de banda e

 
un (r )  un (r  Ri ) uma função com a mesma periodicidade da rede. Pode ser mostrado que
a função de onda,   , pode ser escrita como segue:


 

  (r  Ri )  exp[i . Ri ]  (r ) ,
(2.7.2.4)
21
 2
  2
tal que a densidade de probabilidade,   (r )    (r  Ri ) , é exatamente a mesma. A

periodicidade da função un (r ) , sugere que ela possa ser expandida em termos de um
conjunto especial de ondas planas:
 

un (r )   C G exp [iG . r ] .
(2.7.2.5)

G
Na equação acima, a soma é sobre todos os vetores da rede recíproca, definidos por




G  m1b1  m2b2  m3b3 para valores inteiros de mi e com a propriedade de que para qualquer
  
vetor da rede no espaço real, ai , G. ai  2 mi Combinando as equações (2.7.2.3) e (2.7.2.4),
obtém-se uma forma geral para a função de onda eletrônica em um potencial periódico:


 
 n (r )  
C  G exp[i(  G).r ] .

(2.7.2.6)
G
Introduzindo esta expressão na equação de Schrödinger encontramos que para aplicações do
estado sólido, busca-se resolver um conjunto de equações monoeletrônica, uma para cada
ponto  na primeira zona de Brillouin:
2
  2  1   



ˆ
H n un (r )         Veff (r ) un (r )   n un (r ) .

 2m  i

(2.7.2.7)

Note que em termos do problema de autovalor especificado acima, o vetor de onda  aparece

somente como parâmetro no hamiltoniano, H  . Isto se dá porque, para um sólido,  pode ser

considerada uma variável contínua. Desta forma, a relação entre  n e  determina uma
família de funções contínuas, a partir das quais os níveis de energia de um elétron em um
potencial periódico, são descritos. Tendo em mente que o conjunto de todas as funções de

onda e níveis de energia para dois valores de  que diferem por um vetor da rede recíproca,
devem ser idênticos, pode-se atribuir os índices n aos níveis, de forma que, para dado n, os

autoestados e autovalores sejam funções periódicas de  :


 n,   G (r )   n  (r )
 n,   G   n 
(2.7.2.8)
22

Observe-se desta expressão que para um mesmo valor de  , é possível associar diferentes
valores de energia para um elétron. Daí então a necessidade de atribuirmos o índice de banda,
n, às energias e funções de onda de cada elétron. As informações contidas nas funções,  n  ,
são referidas como estrutura de bandas do sólido. Para cada n, o conjunto de níveis
eletrônicos especificados por  n  é chamado banda de energia [28,10].
Um conceito útil na análise de estrutura de bandas dos sólidos é o de Densidade de
Estados (DOS) como função da energia. A densidade de estados é definida como:
g ( ) 

2
(2 )
3
   (   n  ) d .
(2.7.2.9)
n
Esta quantidade descreve os estados eletrônicos por unidade de volume de um material para
energias no intervalo entre  e   d A soma é sobre todos estados com energias,  n  ,
definidas neste intervalo,    n     d . Isto justifica o uso da função delta,  . O fator 2
leva em conta a degenerescência de spin. Em muitos casos é conveniente converter a integral

sobre o espaço k em uma integral sobre a energia. Isto pode ser feito considerando uma

superfície de energia constante no espaço k , S, sobre a qual  n  é constante e igual a  ,
 n    . Neste caso a densidade de estados, g(ε), se torna:
g ( ) 
2
(2 )
3

n
ε n κ  ε
1
dS .

  n 
(2.7.2.10)
A equação (2.7.2.10) pode ser sempre usada para calcular a densidade de estados, g(ε),
quando a estrutura de bandas do sólido,  n  , é conhecida. As bandas de energia definidas por
cada índice n (banda de valência e de condução) são funções periódicas do espaço recíproco

e, em geral, diferenciável em toda parte. Segue daí que deve haver pontos no espaço k para

os quais   n   0 . Estes pontos são referidos como pontos críticos e introduzem uma
característica importante na função g(ε), às chamadas singularidades de van Hove. Estas
singularidades ocorrem geralmente em pontos de maior simetria na primeira zona de Brillouin
[29,30,31].
23
2.7.3 Propriedades Ópticas
Várias propriedades físicas dos sólidos são estudadas por meio da aplicação de ondas
eletromagnéticas dependentes do tempo em materiais. A resposta à aplicação de tais campos
contém importantes informações sobre a estrutura microscópica e macroscópica dos sólidos, a
partir das quais as propriedades ópticas podem ser determinadas. O cálculo destas
propriedades se resume em determinar as funções resposta do material. Pode-se, por meio das
equações de Maxwell, mostrar que tais funções são grandezas complexas e estão relacionadas
entre si da seguinte forma [32,33]:
 ( )  1 ( )  i 2 ( )
 ( )   1 ( )  i 2 ( )
 ( )   1 ( )  i 2 ( )
(2.7.3.1)
Das funções resposta descritas em (2.7.3.1) a função dielétrica, ε(ω), é particularmente
importante, uma vez que sua parte imaginária, ε2(ω), está diretamente relacionada com a
absorção óptica pelo material [34]. Além disso, o conhecimento de ε2(ω), juntamente com sua
respectiva parte real, 1 ( ) , permite que todas as outras propriedades ópticas sejam obtidas
através das relações de Kramers-Kronig [32].
A partir de argumentos quânticos, é possível chegar a uma expressão aproximada para
a função dielétrica. Para tanto, é preciso ter em mente que a onda incidente interage com
todos os elétrons do cristal. Embora, será considerada, para efeito de cálculo, apenas a
interação da onda com um único elétron. O objetivo é obter as correções de primeira ordem
devido à perturbação do campo eletromagnético no estado fundamental do sistema (estados de
Kohn-Sham). Para este propósito, será utilizada uma aproximação semiclássica, em que a
radiação é tratada de um ponto de vista clássico e o elétron, quântico. Um elétron sujeito a um
campo eletromagnético tem seu momento linear modificado:

 
P  P  eA ,
(2.7.3.2)
tal que o seu hamiltoniano passa a ser escrito na seguinte forma:
H


1 
( p  eA) 2  V (r ) .
2m
(2.7.3.3)
24


Nesta expressão p é o momento do elétron, A é o potencial vetor do campo incidente,  e é

a carga do elétron e V (r ) o potencial periódico sentido pelo elétron devido os íons da rede
(potencial cristalino).
Em geral, é possível separar hamiltoniano em duas contribuições, como segue:
H  H 0  H ,
(2.7.3.4)
em que o primeiro termo descreve o hamiltoniano na ausência do campo perturbativo


p2
H0 
 V (r ) .
2m
(2.7.3.5)
O segundo termo leva em conta a interação do campo eletromagnético com o sistema, ou seja,
o hamiltoniano da perturbação:
H 
e  
( p . ) .
m
(2.7.3.6)

O termo de segunda ordem (proporcional ao  2 ), o qual aparece ao se desenvolver o termo
quadrado na equação (2.7.3.3) foi desprezado porque, no limite da óptica linear, é muito
pequeno frente aos outros [35,34,36].
Tomando o potencial vetor da onda incidente na forma de uma onda plana e levando
em conta sua dependência espacial e temporal, é possível escreve-lo como segue:
 
 
 

 
A(r , t )  e A0 exp[i (k . r  t )]  e A0 exp[ i (k . r  t )] .
(2.7.3.7)


A

A partir da relação, E  
, constata-se que e é um vetor unitário que aponta na mesma
t
direção de polarização do campo elétrico. O primeiro termo do lado direito da equação
(2.7.3.7) origina a absorção óptica pelo material, o qual será considerado nesta dissertação, e o
segundo termo descreve à emissão [34,37].
25
A probabilidade de transição de um elétron inicialmente em um estado,  v e energia


Ev (kv ) , na banda de valência passar para um estado final,  c e energia Ec (kc ) , na banda de
condução, pode ser escrita como [31,29,30]:
 
e2
w( , t , kv , k c )  2 2
m

t
0
   
  2

dt  dr  c (k c , r , t ) p. A v (k v , r , t ) .
V
(2.7.3.8)
Os estados dos elétrons em um sólido cristalino são descritos pelas então conhecidas
funções de Bloch [34]:
 
 
 
 v (kv , r , t )  exp[i(kv r  Evt / )] uv (kv , r )
 
 
 
 c (kc , r , t )  exp[i(kc r  Ect / )] uc (kc , r ),
(2.7.3.9)
em que o teorema de Bloch requer que uv e uc sejam funções com a mesma periodicidade da


A
rede. Das equações (2.7.3.7), (2.7.3.8), (2.7.3.9) e da relação E  
, obtemos:
t
 
e 2 E0 2
w( , t , kv , kc )  2 2
m
t
0
  2
dt  exp[i 1 ( Ec Ev   )t ]e. M cv
(2.7.3.10)
 
tal que E0 é a magnitude do campo elétrico e e .M cv o elemento de matriz projetado na
mesma direção de polarização do campo elétrico:
    
 
 

e. M cv   u exp[ i(kc  k )r ] e .  exp(ikv . r ) uv dr .
V
(2.7.3.11)
 
Note que o cálculo do elemento de matriz, e. M cv , requer o conhecimento das funções uv e
uc , as quais são derivadas dos orbitais atômicos referentes aos átomos constituintes do
material [34,29,37].
A lei de conservação do momento linear exige que a mudança no momento cristalino
do elétron seja igual ao momento do fóton absorvido pelo material:



kc  k  kv .
(2.7.3.12)
26


Aqui, os vetores k v e k c pertencem à primeira zona de Brillouin e denotam o vetor de onda

do elétron na banda de valência e de condução, respectivamente. Por outro lado, k indica o
vetor de onda do fóton da radiação.

Uma vez que o vetor de onda da radiação, k , representa uma fração muito pequena de
4
um vetor da rede recíproca (  10 ), podemos negligenciá-lo:
 
kv  kc ,

k  0.
(2.7.3.13)
Transições eletrônicas desta natureza, em que o vetor de onda do elétron permanece
inalterado, são chamadas transições diretas ou verticais entre bandas. Há outro tipo de
transição, denominado transições indiretas, para a qual a conservação do momento do elétron
no cristal requer à absorção ou emissão de um quantum de vibração da rede (fônon) [30,29].
Integrando a equação (2.7.3.10) em t  , obtemos:
 
e 2 E0 2 exp[i 1 ( Ec  Ev   )t ]  1  
w( , t , kv , kc )  2 2
e. M cv
m
i 1 ( Ec  Ev   )
2
(2.7.3.14)
Desta expressão chega-se, então, a conhecida Regra de Ouro de Fermi, que determina a taxa
de transição (transição por unidade de tempo) de elétrons entre a da banda de valência e a
banda de condução:
wcv 
2
2e 2 E0   2
t e . M cv g ( E )
m 2 2
(2.7.3.15)
2
dwcv
2e 2 E0   2
 Wcv 
e . M cv g ( E ) .
dt
m 2 2
Nota-se, da equação em t, que a probabilidade de transição é proporcional ao tempo de
atuação da perturbação.
Em um sólido, os elétrons não fazem transições simplesmente entre dois estados
discretos de Bloch. As transições ocorrem entre bandas de energias. Neste caso, a densidade
de estados, g (E ) , deve ser interpretada como uma nova quantidade, a “joint density of states”
27
(JDOS), a qual determina uma densidade de pares de estados com diferença de energia 
[31,29,13]:
J cv ( E )dE 
2
(2 )

 [ Ec  Ev   ] dk .
3
(2.7.3.16)
Introduzindo esta quantidade na equação (2.7.3.15) obtém-se a transição total por unidade de
volume e por unidade de energia para elétrons serem excitados da banda de valência para a
banda de condução:
Wcv 
   2
e 2 E0 2
d
k
e. M cv  [ Ec  Ev   ]
2 2 m 2 2 
(2.7.3.17)
Observa-se que o uso da função delta, δ, especifica o requerimento da conservação da
energia e que a probabilidade de transição é diferente de zero somente se a diferença de
energia entre os estados for igual à energia do fóton que causou a transição [31].
A perda de energia pelo campo devido à absorção é escrita como sendo a taxa de
transição multiplicada pela energia de cada fóton:
" power loss" Wcv  .
(2.7.3.18)
Esta perda de energia pode ser expressa em termos da parte imaginária da função dielétrica do
meio,  2 ( ) , notando que a taxa na diminuição da energia do feixe incidente é dada por:

dI c
 ( )
  I  2 2  I,
dt n
n
em que I é a intensidade do feixe,  
(2.7.3.19)
2k
o coeficiente de absorção óptica e n  c o índice
v
c
de refração do meio. A intensidade do feixe está relacionada com o quadrado da amplitude do
campo elétrico, I 
n2 2
E0 , tal que:
8
dI E0 


 2 ( ) .
dt
8
2
(2.7.3.20)
28
Igualando-se as equações (2.7.3.18) e (2.7.3.20) e fazendo uso da expressão (2.7.3.17), chegase a uma expressão para a descrição da parte imaginária da função dielétrica [38,34]:
 2 ( ) 
  2
4 2e2
dk e .M cv  ( Ec  Ev   )
2 2 
m 
(2.7.3.21)
Até o momento, foi assumido (implicitamente) um tratamento sobre um ponto de vista
de um material isotrópico. Isto significa que a  2 ( ) é uma função escalar, ou seja, a resposta
do material é a mesma para diferentes direções de polarização com relação aos eixos
cristalinos do material. Entretanto, muitos materiais são opticamente anisotrópicos e
respondem de forma diferente para diferentes direções de polarização do campo elétrico.
Pode-se descrever a anisotropia óptica de um material considerando que a função


dielétrica está relacionada com o campo elétrico, E , e a polarização, P , da seguinte forma:




D j   ij Ei  Ei  4 Pj
(2.7.3.22)


Pj  4 1 ( ij  1) Ei
(2.7.3.23)
tal que,
em que ij () representa um tensor dielétrico de segunda ordem simétrico com até seis
componentes independentes,  xx ,  xy ,  xz ,  yy ,  yz e  zz , de acordo com a simetria do cristal.
Além disso, é possível simplificar este tensor por meio de uma rotação conveniente do
sistema de coordenadas cartesianas, tal que x, y e z correspondam aos eixos principais,
característicos de cada substância. Neste caso, ij  0 para i  j e ficamos com os três
elementos,  xx ,  yy ,  zz , na diagonal principal. Então, reescrevendo a expressão definida em
(2.7.3.21) e levando em conta todas as possíveis transições para cada ponto k, da banda de
valência para a banda de condução, resulta [32,36]:

 
 
4 2 e 2
 e .      e .     (     )
 2ij ( ) 
d
k


i
j
c
v
ck
ck
vk
vk
 m2 2 v,c BZ
(2.7.3.24)
29
2.7.4 Constantes Ópticas e as Relações de Kramers-Kronig
A função dielétrica não é uma quantidade diretamente acessível, experimentalmente, a
partir de medidas ópticas. Ela é obtida de outras grandezas. As funções diretamente acessíveis
são: a refletividade, R(ω), o índice de refração, n(ω), e o coeficiente de extinção, k(ω). É
possível mostrar que estas quantidades estão relacionadas com a função dielétrica
[35,34,29,33].
A descrição teórica da propagação de campos eletromagnéticos nos sólidos é fornecida
pelas equações de Maxwell. Considerando-se um meio de propagação isotrópico e não
 
magnético, em que a densidade de carga é zero e então  . E  0 , mostra-se que a equação de
onda, neste caso, toma a seguinte forma [36]:


   2 E 4 E
 E 2 2  2
.
c t
c t
2
(2.7.3.26)
Esta equação tem solução dada por:
 
 
E  E0 exp{i( K . r  t )}
(2.7.3.27)

em que ω é a frequência da luz e K o vetor complexo de propagação, o qual satisfaz a relação
seguinte:
2
K 

c
2
2
i
4
c
2
2

 ~( ) 2 .
c
(2.7.3.28)
Esta relação entre K e ω é denominada de relação de dispersão. Aqui definimos a quantidade,
~ () , como sendo a função dielétrica complexa [35], dada da como segue:
~( )  1  i  2 .
(2.7.3.29)
Define-se também, a partir de (2.7.3.28), a quantidade,
~ () , como o índice de refração
complexo do material,
30
n~  n  i k  ~( ) .
(2.7.3.30)
A parte real de n~ mede a velocidade de fase da onda no material (como pode ser facilmente
verificado das equações (2.7.3.28) e (2.7.3.30)). Por outo lado, a parte imaginária está
relacionada com a taxa a qual a energia da onda é absorvida pelo meio. A partir das
expressões em (2.7.3.29) e (2.7.3.30), chega-se a duas importantes relações:
2
1  n  k
 2  2nk
2
(2.7.3.31)
em que 1 ,  2 , n e k são todos dependentes da frequência. As quantidades n e k são chamadas
de constantes ópticas do sólido, sendo k o coeficiente de extinção. Das equações (2.7.3.29),
(2.7.3.30) e (2.7.3.31) e levando-se em conta o caráter anisotrópico do meio, mostra-se que
[32]:
nii () 
kii () 
~ ()  Re ~ ()
ii
ii
2
~ ()  Re ~ ()
ii
ii
2
(2.7.3.32)
(2.7.3.33)
Estas expressões mostram que ~ e n~ não são varáveis independentes, conhecendo-se  1 e  2 ,
é possível calcular n e k ou vice versa [34]. A reflexão tem dependência com as quantidades,
n e k, e é definida como:
n~  1 (n  1) 2  k 2
Rii ()  ~

.
n  1 (n  1) 2  k 2
(2.7.3.34)
Esta fórmula é conhecida como equação de Beer. Ela determina o coeficiente de reflexão
entre o meio e o vácuo para uma incidência normal.
A partir do conhecimento da componente imaginária do tensor dielétrico,  2ii ( ) , a
correspondente parte real pode ser obtida de [32]:
2  Im ij ()
Re ij  ij  
d .
 0 2  2
(2.7.3.35)
31
Esta equação recebe o nome de relação de Kramers – Kronig. Ela nos diz que: dada uma
quantidade complexa, conhecendo-se uma de suas partes a outra poderá, sempre, ser obtida.
Portanto, com o conhecimento de uma das componentes do tensor dielétrico, todas as outras
constantes ópticas poderão ser obtidas.
III. PROPRIEDADES ESTRUTURAIS, ELETRÔNICAS E ÓPTICAS DO Li2B4O7
3.1 Estado da Arte e Motivação para o Estudo
Nos últimos anos, investigações teóricas e experimentais têm sido realizadas sobre o
tetraborato de lítio, Li2B4O7 (LTB), devido às suas importantes propriedades físicas e ampla
aplicação em vários campos da ciência e tecnologia [8,5,6,7]. O LTB é bem conhecido como
material “hospedeiro” em aplicações de dosimetria termoluminescente (TL) [8]. A presença
de impurezas, como terras raras ou metais de transição, contribui para estimular os processos
radiativos, resultando em picos de TL luminosos e bem acentuados, acima da temperatura
ambiente [39,40,41]. Uma das propriedades de interesse do LTB no que diz respeito aos
materiais termoluminescentes é o fato dele possuir número atômico efetivo Zeff = 7,39
próximo ao do tecido humano Zeff = 7,42, o que lhe confere ampla aplicabilidade no campo da
dosimetria [8]. O LTB possui também, grande potencial quando usado como detector de
nêutrons em virtude da presença dos isótopos 6Li e
10
B, os quais possuem grande sessão de
choque para a captura de nêutrons térmicos [8]. Além de aplicações em dosimetria
luminescente, outros trabalhos foram desenvolvidos acerca do tetraborato de lítio, estudando,
principalmente, suas propriedades fotoluminescentes [41], termoluminescentes [40], radiação
induzida por defeitos e propriedades ópticas [39].
Apesar das ricas propriedades físicas, pouco se sabe, de fato, sobre a estrutura
eletrônica do LTB, em especial, sobre a determinação do gap de energia de forma
experimental. Basicamente, apenas três trabalhos envolvendo cálculos de estrutura eletrônica
do LTB são encontrados na literatura [5,6,7]. No primeiro deles, A. Yu. Kuznetsov et al [6]
fizeram um estudo experimental, por meio de Espectroscopia Fotoeletrônica de Raios-X
(XPS) e teórico, utilizando métodos baseados em química quântica. O espectro de energia
medido experimentalmente (XPS) revelou que os estados da banda de valência estão no
intervalo de energia 2-15 eV abaixo do nível de Fermi e são devido, principalmente, ao grupo
boro-oxigênio, (B4O9). Os cálculos teóricos apresentaram boa concordância com o resultado
experimental.
32
Outro estudo de grande importância neste âmbito foi realizado por Islam et al [5], os
quais investigaram teoricamente as propriedades estruturais e eletrônicas do LTB através de
cálculos baseados em DFT. Neste trabalho foram utilizados diferentes tipos de funcionais de
correlação-troca (XC), diferentes conjuntos de funções de base e diferentes códigos
computacionais. Embora as propriedades estruturais tenham sido
bem descritas,
independentemente do método, conjunto de funções de base e funcionais de XC, mostrou-se
que a estrutura eletrônica do LTB é sensível a tais detalhes. A melhor concordância na
determinação do gap foi encontrada usando funcionais de XC híbridos, que levam em conta
(pelo menos parcialmente) a energia de troca exata do método Hartree-Fock através do
cálculo de integrais de dois centros e são computacionalmente mais exigentes [42]. O gap
calculado, usando tal potencial de XC foi de 8,9 eV, em boa concordância com o valor
experimental, estimado em ≈ 9,0 eV tomando como base um prévio estudo experimentalteórico com um material similar (LiB3O5) ao LTB [5]. Os funcionais locais e semi-locais
frequentemente mais usados, como LDA e GGA, subestimaram severamente os valores do
gap de energia.
Por fim, D. Wooten et al [7] obtiveram experimentalmente em um estudo que
combinou espectroscopia de fotoemissão e fotoemissão inversa, a estrutura eletrônica do LTB
em duas direções de alta simetria, ambas Li2B4O7(110) e Li2B4O7(100). Os resultados obtidos
mostraram que o tamanho do gap muda dependendo de qual direção cristalográfica esteja
sendo analisada, porém em qualquer caso deve exceder 8,8 eV (10,1 ± 0,5 para Li2B4O7(100)
e 9,8 ± 0,5 para Li2B4O7(110)) e que a densidade de estados (DOS) concorda qualitativamente
bem com os resultados obtidos a partir de cálculos da estrutura de bandas do Li2B4O7 na
forma de “bulk” [5,6].
Propriedades ópticas dos materiais são completamente sensíveis a detalhes da estrutura
eletrônica. Quando se estuda compostos puros, deficiências dos potenciais LDA ou GGA na
descrição do gap podem ser corrigidas aplicando o então chamado operador “scissor”, o qual
ajusta a posição do fundo da banda de condução com o objetivo de tornar o gap calculado
igual ao experimental. Por outro lado, se a pretensão é estudar compostos com impurezas e
(ou) defeitos, a aplicação do operador “scissor” não é recomendada, uma vez que ele modifica
a posição das bandas de energia dentro do gap, relativa ao fundo da banda de condução.
Tendo em mente que um campo de grande aplicação do LTB é a dosimetria, a correta
descrição do gap e as bandas de energia em torno deste é de essencial importância. Isto se dá
porque a luminescência dos materiais é originada a partir dos centros de defeitos, os quais
introduzem bandas eletrônicas dentro do gap. A partir das conclusões de Islam et al, defeitos
33
contidos no LTB deveriam ser tratados por meio de funcionais de XC híbridos. O problema é
que estes funcionais são muito caros computacionalmente, no sentido de que requerem muito
memória e alto poder de processamento.
Neste sentido, o presente trabalho é motivado pela busca de uma forma eficiente de
descrever corretamente o gap e as bandas de energia do Li2B4O7, utilizando algum funcional
de XC local ou semi-local. O sucesso permitiria estudar o LTB com defeitos, planejado para o
futuro, com uma maior eficiência e com recursos computacionais não excessivamente caros.
Outra motivação é o fato de não existir na literatura um estudo teórico que descreva as
propriedades ópticas do LTB, apenas trabalhos experimentais são verificados, dos quais a
grande maioria referente a propriedades ópticas não lineares [43,44,45,46]. Um trabalho
experimental (em nível de óptica linear), particularmente interessante, foi feito por Tamotsu
Sugawara et al, [9], os quais obtiveram o índice de refração do LTB em um intervalo de
comprimento de onda de 185 a 2325 nm. Este trabalho servirá como parâmetro de
comparação quanto à confiabilidade dos resultados encontrados no presente estudo.
3.2. Detalhes Computacionais dos Cálculos
Propriedades de “bulk” do LTB (Li2B4O7) foram determinadas autoconsistentemente
com cálculos baseados na DFT utilizando o método LAPW implementado no código
computacional Wien2k. Como explicado na seção 2.6 desta dissertação, neste método as
funções de onda eletrônicas são expandidas em termos de ondas parciais, dentro de esferas
centradas em cada sítio atômico (esferas muffin-tin), e por meio de ondas planas no restante
do espaço (região intersticial). Uma escolha conveniente para os raios muffin-tin (RMT) dos
elementos químicos Li, B e O, em unidades atômicas (a.-u.), foi tomada como 1,61, 1.,5 e
1,34, respectivamente.
Em cálculos desta natureza, alguns parâmetros, tais como o tamanho do vetor de onda

K e o momento angular orbital l (os quais determinam o número de ondas planas na região
intersticial e de ondas parciais nas esferas muffin-tin, respectivamente), e a magnitude do

vetor da rede recíproca G na expansão de Fourier, desempenham um papel fundamental,
tanto na eficiência quanto em precisão, na obtenção de propriedades dos sólidos.
No presente trabalho, as ondas parciais foram expandidas até lmáx.=10, em quanto que
o número de ondas planas foi limitado em K máx.  6,0 / RMT (RMT, nesta expressão, denota o

raio da menor esfera muffin-tin e K máx. , o comprimento do maior vetor de onda) e o vetor G ,
34

na expansão de Fourier, em Gmáx.  12 . A soma sobre o espaço-K foi realizada utilizando uma
rede de 12 e 99 pontos na parte irredutível da primeira zona de Brillouin para o cálculo de
estrutura de bandas e propriedades ópticas, nessa ordem.
Todos os cálculos foram convergidos levando-se em conta critérios de energia total,
para o qual a diferença de energia entre dois ciclos consecutivos foi ΔEtot  10
4
Ry, e de
transferência de carga, para a qual foi tomado que a diferença de carga nas esferas muffin-tin
em dois ciclos consecutivos fosse Δρ  10  4 . Os elétrons de valência de interesse para o
estudo do LTB são: um no orbital 2s1, três nos orbitais 2s22p1 e seis 2s2p4 para Li, B e O,
respectivamente A fim de separar os estados eletrônicos de caroço dos estados de valência foi
adotada uma energia de “corte” padrão, de valor  6,0 Ry . Os parâmetros de rede e todas as
posições atômicas na célula cristalina unitária do LTB foram completamente otimizados a fim
de atingir uma configuração de mínima energia para o sistema.
Os efeitos de correlação e troca para os cálculos de otimização dos parâmetros de rede
e das posições atômicas foram tratados utilizando a aproximação de gradiente generalizado
(GGA) na parametrização de Perdew, Burke e Ernzerhof (PBE) [19]. Por fim, para os cálculos
de estrutura eletrônica e propriedades ópticas, os efeitos de correlação e troca foram levados
em conta utilizando o funcional semi-local de Becke-Johnson, recentemente modificado e
desenvolvido por Tran e Blaha (TB-mBJ) [20]. Esta escolha foi feita devido ao fato de o
funcional de XC de TB-mBJ descrever melhor o gap de energia e as propriedades ópticas de
uma grande variedade de materiais semicondutores e isolantes [20].
3.3 Otimização da Estrutura do Li2B4O7
A estrutura cristalina do tetraborato de lítio (Li2B4O7) é tetragonal pertencente ao
grupo espacial 110 (I41cd) e possui 104 átomos por célula unitária, convencionalmente
construída. Os parâmetros de rede medidos que caracterizam a célula unitária do LTB e
utilizados no início do processo, para a otimização foram a = 9,4544 Å e c = 10,3236 Å, em
que b = a [47].
A figura 3.3.1 mostra uma representação esquemática para a estrutura cristalina do
tetraborato de lítio. A estrutura básica padrão é um complexo de boro-oxigênio [(B4O9)-6], o
qual consiste de dois grupos, sendo um com simetria trigonal planar, B(1)O3 , e outro com
simetria tetragonal, B(2)O4, como ilustrado na parte (a) da figura abaixo. A parte (b) mostra
uma porção esquemática da célula unitária do LTB. Os átomos de lítio ocupam posições
35
intersticiais na estrutura. A rede cristalina do LTB é caracterizada por dois sítios de boro e
quatro sítios de oxigênio cristalograficamente não equivalentes. Todos os lítios são
cristalograficamente iguais. Cada íon de oxigênio tem dois boros vizinhos e cada íon de lítio
tem cinco oxigênios em sua vizinhança.
Figura 3.3.1: Representação esquemática de (a) estrutura básica do LTB na forma de bulk,
[(B4O9)-6], ao longo de uma direção arbitrária e (b) uma porção da célula unitária do Li2B4O7.
Como discutido na seção 2.7.1 do presente trabalho, em cálculos desta natureza (ab
initio) é de grande importância encontrar uma relação entre energia total de uma coleção de
átomos numa célula unitária, a pressão e o volume, para a qual o sistema esteja o mais
próximo possível do equilíbrio. Isto acontece, em princípio, devido à essência a qual a DFT
está formulada (teoremas de Hohenberg-Kohn) e tem implicações diretas quanto à
confiabilidade das propriedades calculadas.
Neste sentido, o primeiro passo deste trabalho consistiu em otimizar os parâmetros de
rede do LTB obtidos a partir de medidas experimentais. O processo de otimização consistiu
na variação do volume experimental da célula unitária do LTB em função da energia, em um
intervalo de valores percentuais de – 4% a + 4%, em passo de 2%. Para cada valor percentual
fixo do volume, c/a foi também variado no mesmo intervalo de valores percentuais, tal como
para o volume. Com isso, encontrou-se uma relação entre a energia total do sistema e valores
de c/a, de forma que para cada valor percentual fixo de volume (– 4%, – 2%, 0%, 2% e 4%)
foi obtido um mínimo local de energia para o sistema. O volume percentual fixo para o qual a
relação entre a energia e c/a gera um valor de menor energia total para o sistema, e, portanto
um mínimo global, corresponde ao volume de maior estabilidade da estrutura cristalina. Este
processo de otimização nos permitiu construir um gráfico da energia total em função dos
volumes percentuais fixos, a partir dos quais pontos de mínimo para o sistema foram obtidos
(figura 3.3.2).
36
Figura 3.3.2: Relação da energia total do Li2B4O7 e os volumes (fixos para cada variação
percentual de c/a), a partir dos quais a estrutura foi otimizada. As setas em preto e azul
indicam os volumes, experimental (0%), o qual foi tomado como dado de entrada no
processo, e computacionalmente otimizado, respectivamente.
De acordo com o gráfico acima, os resultados obtidos mostram que o volume da
estrutura do LTB foi otimizado com um aumento em torno de 2,5% (945,91 Å3), em relação
ao volume medido experimentalmente (922,78 Å3). Os parâmetros de rede que caracterizam o
volume otimizado, a = 9,514 Å e c = 10,450 Å, foram extraídos por meio de um ajuste
polinomial da equação de estado de Birch-Murnaghan, a qual foi apresentada na seção 2.7.1
deste trabalho.
O segundo passo, consistiu em otimizar (ou relaxar) todas as posições atômicas dos
átomos contidos na célula unitária do LTB. Isto se fez necessário, uma vez que após a
convergência dos cálculos com os parâmetros de rede já otimizados ser verificado que as
forças internucleares, as quais os átomos constituintes estavam sujeitos, eram consideradas
superiores ao valor mínimo esperado quanto ao desejo de predizer propriedades do estado
fundamental. Em outras palavras, as coordenadas atômicas nucleares, retiradas do trabalho
[47] e tomadas como dados de entrada para o cálculo, não equivaliam às posições de
equilíbrio do sistema.
O procedimento utilizado para otimizar as posições atômicas foi como descrito na
seção 2.7.1 do presente trabalho. As posições nucleares são movidas em direção e sentido (os
parâmetros de rede são mantidos fixos), de modo que as forças sentidas pelos átomos estejam
minimizadas e levem o sistema para uma configuração mais próxima possível de mínima
37
energia. O critério de convergência foi tomado como sendo 2mRy bohr , para que a força
sentida por qualquer átomo da estrutura seja menor do que esta. A tabela 3.1 mostra os
parâmetros de rede e as coordenadas atômicas da estrutura do LTB, otimizada e comparada
com dados experimentais [47].
Tabela 3.1: Parâmetros estruturais do LTB calculados e comparadas com dados
experimentais.
mk
Comparando os resultados a partir da tabela a cima é possível constatar que os dados
obtidos com a otimização computacional, tanto para os parâmetros de rede quanto para as
coordenadas atômicas, estão em boa concordância com os dados experimentais. Os valores
calculados para os parâmetros de rede, a e c, superestimam o valor experimental em torno de
0,63% e 1,22%, respectivamente. Por outro lado, avaliando a razão entre as coordenadas
nucleares e os parâmetros de rede, observa-se que a diferença entre valores experimentais e
calculados é mínima. Desta forma, têm-se chegado a uma estrutura completamente
optimizada, ou seja, tanto os parâmetros de rede quanto as posições atômicas configuram uma
estrutura o mais próxima possível do equilíbrio. Isto nos garante uma maior confiabilidade na
análise subsequente das propriedades eletrônicas e ópticas do material em estudo.
38
3.4 Estrutura Eletrônica do Li2B4O7
Nas seções 2.7.2 e 2.7.3 deste trabalho, foram introduzidas as bases sobre as quais a
estrutura eletrônica e as propriedades ópticas dos sólidos são estudadas. Foi visto que para
compreensão das propriedades ópticas é imprescindível, primeiro, conhecer e entender a
estrutura de bandas do material quanto ao tamanho e a natureza do band gap fundamental de
energia, bem como a densidade de estados e o caráter orbital eletrônico, por volta deste. O
fato é que a caracterização das propriedades ópticas é fruto das interações da radiação com
elétrons de valência dos materiais.
Neste contexto, a estrutura eletrônica do tetraborato de lítio (Li2B4O7) foi estudada e
determinada teoricamente, em especial sua densidade de estados, a qual foi calculada
computacionalmente e comparada com resultados obtidos do experimento [6]. Antes de
apresentar os resultados para a densidade de estados, será introduzida a análise dos cálculos
obtidos a partir do estudo da estrutura de bandas do Li2B4O7. Para um melhor entendimento,
não há na literatura uma consistência uniforme acerca do valor exato do band gap de energia
do LTB em sua forma de “bulk”. Sabe-se que seu valor é estimado em 9,0 eV [5] ou, como
reportado por Wooten et al [7], que ele deve ser maior do que 8,8 eV. Como será mostrado a
seguir, estes valores concordam com o valor calculado no presente estudo.
A estrutura de bandas do LTB foi calculada ao longo de caminhos que contém um
maior
número
de
pontos
de
alta
simetria
na
primeira
zona
de
Brillouin,
M    X  Z  N . A figura 3.4.1 apresenta a estrutura de bandas do LTB obtida
utilizando o potencial de XC de TB-mBJ. As razões pelas quais este tipo de potencial foi
utilizado foram discutidas em capítulos anteriores. Na parte à esquerda da figura 3.4.1, está
mostrada a estrutura de bandas completa do LTB, calculada em um intervalo de energia que
compreende de -22 a 14 eV. O zero de energia é ajustado ao nível de Fermi (EF). As bandas
de energia localizadas abaixo do nível de Fermi correspondem aos estados de valência do
material enquanto que acima, aos estados de condução. Neste ponto deve-se ter em mente
que, no estado fundamental, todos os elétrons do sistema estão localizados, somente, até o
nível de Fermi e, portanto, na banda de valência do material. A parte à direita da figura 3.4.1,
mostra um esquema para identificar a região de máxima energia (ponto X ), na banda de
valência, e de mínima energia (ponto gama, Γ ), na banda de condução. Essas regiões são
importantes quanto à predição da natureza (se o gap é direto ou indireto) e do tamanho (se o
material é semicondutor ou isolante) do band gap de energia do material.
39
Figura 3.4.1: Estrutura de bandas do Li2B4O7 calculada ao longo dos caminhos que contém
pontos de alta simetria na primeira zona de Brillouin. Os círculos em vermelho identificam os
pontos de máxima energia, no topo da banda de valência (ponto X), e de mínima energia, no
fundo da banda de condução (ponto gama, Γ ).
De acordo com os resultados da figura 3.4.1, o tetraborato de lítio (Li2B4O7) é um
material isolante com um amplo band gap de energia de 9,2 eV. Este valor está em boa
concordância tanto com o valor experimentalmente estimado, 9,0 eV, quanto com o valor
calculado teoricamente, 8,9 eV, por Islam et al [5] utilizando um funcional de XC híbrido.
Ainda da estrutura de bandas mostrada acima, observa-se que a dispersão das linhas na banda
de valência é muito menor do que a dispersão na banda de condução. Este comportamento é
consistente com o estudo de Islam et al [5], os quais sugerem que a massa do buraco é maior
do que a massa do elétron.
Quanto à natureza do gap de energia, os resultados indicam que o LTB possui um
band gap indireto, X   (parte à direita da figura 3.4.1). Em um contexto de propriedades
ópticas de materiais, isto implicaria em dizer que o espectro fundamental de absorção óptica
do LTB é construído, tendo como ponto de partida, transições eletrônicas do tipo indiretas
entre bandas. Este tipo de transição foi reportado na seção 2.7.3 desta dissertação.
A densidade total de estados (TDOS) e a densidade parcial de estados (PDOS) do
tetraborato de lítio (LTB) foram calculadas utilizando o mesmo potencial de XC, TB-mBJ,
como para a estrutura de bandas. As bandas, referentes aos estados de valência e condução,
foram determinadas tomando um intervalo de energia de -25 a 30 eV, tanto para a TDOS
quanto a para PDOS (figura 3.4.2). Como antes, no caso da estrutura de bandas, o zero de
energia foi ajustado ao nível de Fermi (EF). A figura 3.4.2 (a), a seguir, mostra a TDOS do
40
Li2B4O7 e comparada com um espectro de energia experimental, obtido por meio de “X-ray
photoelectron spectroscopy (XPS)” [6] e a PDOS, bem como o caráter orbital referente aos
orbitais eletrônicos dos átomos de Li, B(2) e do B(1), respectivamente. O espectro experimental
(XPS) foi deslocado até o nível de Fermi calculado, o qual corresponde ao topo da banda de
valência no presente caso. A figura 3.4.2 (b), apresenta a PDOS correspondente aos quatro
átomos de oxigênio, O(1), O(2), O(3) e O(4), cristalograficamente diferentes na célula unitária do
LTB. Neste ponto, vale ressaltar que por meio da análise da densidade parcial de estados
(PDOS) pode-se determinar o caráter orbital que predomina em cada banda de energia em
torno do gap do material.
Figura 3.4.2: Total e parcial densidade de estados (TDOS e PDOS) do sólido Li2B4O7. O
topo do gráfico em (a), mostra a TDOS como calculada e comparada com um espectro de
energia experimental, obtido a partir de “x-ray photoelectron spectroscopy” (XPS).
A partir dos resultados obtidos pode-se constatar que a TDOS calculada, apresenta um
bom nível de concordância, seja em comparação com o espectro XPS experimental [6], seja
quando comparada com os resultados da referência [5]. Os intervalos de energias das
principais bandas e a disposição dos picos mais pronunciados são praticamente os mesmos,
para a região de valência do LTB. No que diz respeito à densidade parcial de estados (PDOS),
os resultados também concordam satisfatoriamente com o esperado das referencias já citadas
41
acima [6,5]. A região da banda de valência, compreendida entre -22 e -18 eV (região de quase
caroço) é principalmente formada por orbitais do tipo “s” dos átomos de oxigênio (veja a
figura 3.4.2 (b) acima), em quanto que os estados próximos ao topo da banda de valência, os
quais compreendem o intervalo de energia de -10 a 0 eV, correspondem, em sua maioria, aos
orbitais do tipo p dos oxigênios (embora seja notada uma pequena hibridização com os
orbitais s e p dos átomos de boro, B(1) e B(2)). A contribuição devido aos orbitais atômicos dos
átomos de lítio, Li, pode ser negligenciada.
Analisando as figuras 3.4.2 (a) e 3.4.2 (b), encontra-se que a banda de condução é
formada, predominantemente, pelos estados p decorrentes dos átomos de boro (B(1) e B(2)),
oxigênio (O(1), O(2), O(3) O(4)), e do lítio, Li. Uma característica particularmente interessante a
ser notada é o caráter orbital que predomina no fundo da banda de condução. Como pode ser
visto da figura 3.4.2 (a), esta região é dominada pelos estados p do B(1) (apesar de que seja
observado, da figura 3.4.2 (b), que existe certa hibridização entre estes estados e dos
oxigênios, O(1), O(2) e O(3)). As contribuições dos estados p, tanto dos átomos de lítio quanto
do B(2), ocupam regiões de energias mais altas na banda de condução, os quais se mostram
fortemente hibridizados com orbitais p dos átomos de oxigênio. Isto implica que os orbitais
do Li e B(2) não devem envolver transições eletrônicas de baixa energia, uma vez que suas
respectivas contribuições no fundo da banda de condução são muito pequenas.
Desta forma, chegou-se a uma estrutura eletrônica do LTB bem definida, em que
ficaram determinados o tamanho (9,2 eV) e a natureza (gap indireto) do band gap
fundamental do LTB, bem como o caráter orbital das bandas por sua volta. Todos os
resultados mostram boa concordância, de acordo com o esperado do trabalho de Islam et al
[5]. Levando-se tudo isto em conta, junto com o fato de que os cálculos da densidade de
estados (DOS) concordarem muito bem com espectro experimental obtido por XPS, concluise que o potencial de XC, TB-mBJ, descreve corretamente a estrutura eletrônica do composto,
Li2B4O7. Estas afirmações servem como parâmetros quanto à validade dos cálculos
posteriores, referentes às propriedades ópticas do tetraborato de lítio.
3.5 Propriedades Ópticas do Li2B4O7
Nesta seção serão apresentados os resultados obtidos dos cálculos computacionais
referentes às propriedades ópticas do Li2B4O7. Foram estudadas as características da função
dielétrica,  ( ) , e do índice de refração, n( ) , quanto à resposta óptica do material frente á
aplicação de ondas eletromagnéticas.
42
Foi reportado em capítulos anteriores (seções 2.7.3 e 2.7.4), que as propriedades
ópticas de um material podem ser descritas por meio da função dielétrica complexa. Mostrouse que sua respectiva parte imaginária se relaciona diretamente com a absorção óptica pelo
material e que, junto com a parte real, permite calcular tanto o índice de refração, o qual está
associado com a mudança da velocidade da onda no material, quanto o coeficiente de
extinção, o qual está ligado com o quão a onda é atenuada no meio, e por consequência, a
refletividade. Neste sentido, a resposta óptica do tetraborato de lítio foi obtida considerando o
caráter anisotrópico desta substância.
Em simetrias cristalinas de estruturas tetragonais, tal como é a do Li2B4O7, a parte
imaginária da função dielétrica pode ser representada por um tensor simétrico de segunda
ordem, escrito na seguinte forma matricial:
 2 xx
 2ij  0
0
0
0
 2 xx
0
0
(3.5.1)
 2 zz
em que, as componentes,  2 xx e  2 yy , são equivalentes. Cada componente desta matriz foi
computada por meio da equação definida em (2.7.3.24).
Para que melhor se compreenda, não foram encontrados na literatura trabalhos teóricos
sobre as propriedades ópticas do LTB. Entretanto, alguns trabalhos experimentais foram
verificados, embora a maioria deles seja sobre as propriedades ópticas não lineares
[43,45,46,44], as quais não servem como parâmetros de comparação com os resultados
obtidos no presente estudo, uma vez que os mesmos estão no limite da óptica linear. Um
trabalho experimental (em nível de óptica linear), particularmente interessante, foi realizado
por Tamotsu Sugawara et al, [9], em que foram determinados os índices de refração, ordinário
e extraordinário, do LTB em um intervalo de comprimento de onda de 184,887 a 2325,42 nm.
Como serão mostrados a seguir, os valores calculados para o índice de refração estão em boa
concordância com os resultados determinados por este trabalho experimental.
A parte imaginária do tensor dielétrico,  2ij ( ) , do LTB foi computada em um
intervalo de energia de 0 a 40 eV levando em conta todas as possíveis transições eletrônicas
entre as bandas de valência e condução, as quais compreendem energias de -22 a 30 eV (veja
a figura 3.4.2 (a) acima). A sua correspondente parte real, 1ij ( ) , foi obtida a partir das
relações de Kramers-Kronig.
43
A figura 3.5.1 mostra, a seguir, a parte real e imaginária da constante dielétrica do
LTB calculada em função da energia do fóton da radiação incidente. Como pode ser visto
nesta figura, a luz é polarizada ou ao longo da direção x ou ao longo da direção z (paralelos
aos eixos cristalinos), de modo que tanto a parte imaginária, quanto a parte real exibem uma
clara anisotropia na faixa de energia ultravioleta, próximo de 9 a 15 eV. Outra característica
importante a ser observada é a região de energia para a qual a radiação no LTB começa a ser
absolvida. De acordo com os resultados, o LTB inicia sua atividade óptica em cerca de 9.0
eV, ou seja, na faixa de energia do ultravioleta. Ainda sobre a figura 3.5.1, a constante
dielétrica estática ( 1ij (  0) ) ao longo dos dois eixos principais foi encontrada como sendo
2,16 e 2,03 para 1xx (0) e 1zz (0) , respectivamente.
Figura 3.5.1: Parte real, 1ij ( ) , e imaginária,  2ij ( ) , do tensor dielétrico do LTB para a
onda eletromagnética incidente polarizada ao longo das direções cristalográficas a e c.
Considerando o espectro de absorção óptica do LTB, a parte imaginária,  2ij ( ) , do
tensor dielétrico apresenta dois picos proeminentes bem definidos decorrentes das transições
eletrônicas entre estados ocupados, na banda de valência e vazios, na banda de condução. O
primeiro pico, relativamente estreito, compreende a faixa de energia de 9 a 11 eV, tal que
pode ser considerado como a borda de absorção do composto. De acordo com a figura 3.4.2
mostrada abaixo, este pico origina das transições eletrônicas, predominantemente, entre os
44
estados p (populados), dos átomos de oxigênio e estados p (vazios), dos átomos de B(1), isto é,
corresponde ás transições que ocorrem principalmente no grupo de simetria trigonal, B(1)O3.
Isto corrobora com o fato encontrado para a estrutura eletrônica, em que no fundo da banda de
condução predominam os estados p do B(1). O segundo pico, correspondente a todo resto do
espectro de absorção, compreende ao intervalo de energia de 11 a 40 eV.
Em conformidade com o constatado para a estrutura eletrônica do LTB, a região de
energias mais altas da banda de condução consiste, em sua totalidade, de orbitais atômicos do
tipo p fortemente hibridizados, decorrentes de todos os átomos constituintes do material. Isto
confere certa dificuldade ao se analisar, em termos de transições eletrônicas, quais as
contribuições dos estados de cada átomo separadamente para a formação do espectro absorção
nesta região. O fato é que o segundo pico origina-se de uma mistura de transições entre os
átomos nos grupos de simetrias trigonal, B(1)O3, e tetragonal, B(2)O4, bem como transições dos
estados 2p dos oxigênios, O(1), O(2), O(3) e O(4), para estados 2p, dos átomos de lítio, Li.
Figura 3.5.2: Interpretação do espectro de absorção óptica do Li2B4O7. As setas indicam,
claramente, que o primeiro pico no espectro é dominado pelas transições eletrônicas dos
estados p dos oxigênios para estados p, dos átomos de boro, B(1).
Uma vez determinada a constante dielétrica do LTB, estamos aptos a calcular as suas
correspondentes constantes ópticas. Neste sentido, o índice de refração, n( ) , do Li2B4O7 foi
derivado levando-se em conta os efeitos da polarização da luz ao longo das duas diferentes
45
direções cristalográficas do LTB, tal como para a parte real e imaginária do tensor dielétrico.
A figura 3.5.3, abaixo, apresenta o índice de refração calculado em função da energia do fóton
da radiação incidente. O intervalo de energia utilizado é o mesmo como para a obtenção do
tensor dielétrico, 0 a 40 eV. Analisando a forma do espectro do índice de refração do LTB,
constata-se que ela é bem parecida com o espectro da parte real do tensor dielétrico, isto surge
da definição, a qual o índice de refração foi derivado (veja seção 2.7.4). Como nos casos de
1ij ( ) e  2ij ( ) , uma clara anisotropia na faixa de energia que compreende de 9 a 15 eV
pode ser observada. Isto indica que a velocidade de propagação da onda no material varia de
acordo com sua polarização. A intensidade dos dois primeiros picos referentes à n _ xx e
n _ zz na figura 3.5.3 abaixo, revela que a luz é polarizada ao longo da direção x com menor
velocidade (n  c v) .
Figura 3.5.3: Espectro do índice de refração do LTB calculado em função da energia da
radiação incidente polarizada ao longo dos dois eixos principais.
Outro fato que corrobora com a mudança da velocidade da luz polarizada ao longo dos
diferentes eixos cristalográficos é o valor encontrado para o índice de refração estático do
LTB. De acordo com nossos resultados o índice de refração estático, nij (0) , do LTB está em
torno de 1,47, quando a luz é polarizada ao longo da direção x ( n _ xx ) e por volta de 1,43
46
quando polarizada ao longo de z ( n _ zz ). Estes valores distintos de índice de refração estático
comprovam que o Li2B4O7 é um cristal opticamente anisotrópico.
A seguir, na figura 3.5.4, são mostrados resultados dos cálculos do índice de refração,
expressos em função do comprimento de onda do fóton da radiação incidente e comparados
com dados experimentais extraídos da referência [9]. Como reportado no trabalho de Tamotsu
et al, o índice de refração do LTB foi medido em 15 valores diferentes de comprimentos de
onda para ambos feixes de radiação, ordinário e extraordinário, em um intervalo que vai de
184,887 a 2325,420 nm a uma temperatura de 25°C. Os termos, ordinário e extraordinário,
utilizados pelos autores, fazem alusão às direções de polarização da radiação incidente no
LTB. O índice de refração medido para a direção ordinária equivale a dizer, no presente caso,
 
que a luz está sendo polarizada ao longo da direção x (   C ) enquanto que o índice de
refração medido para o feixe extraordinário corresponde a dizer que a luz é polarizada ao
 
longo da direção z (  // C ), ou seja, ao longo do eixo óptico do composto.
Figura 3.5.4: Índice de refração calculado teoricamente e comparado com dados
experimentais [9].
Analisando as curvas para o índice de refração mostradas na figura 3.5.4, é possível
constatar que os resultados obtidos concordam em bom nível com os dados experimentais [9].
A diferença entre os valores calculados e medidos experimentalmente se mantem
praticamente constante ao longo das curvas. Os valores obtidos para os índices de refração
47
estático (correspondentes aos maiores comprimentos de onda) do experimento são 1,56 e 1,52
para n0 (ordinário) e ne (extraordinário), respectivamente, em quanto que o calculado
resultou em 1,47 para n _ xx e 1,43 para n _ zz (estes resultados foram mencionados
anteriormente em conformidade com a figura 3.5.3).
Uma
comparação
entre
os
resultados
revela
que
os
valores
obtidos
computacionalmente diferem apenas de 0,09 dos valores experimentais, seja para o índice
refração ordinário, n0 , seja para o extraordinário, ne . Pode-se atribuir esta pequena
disparidade ao fato de os dados experimentais terem sido medidos à temperatura ambiente
(25°C), já que o formalismo (DFT), para o qual os cálculos deste trabalho foram obtidos, não
prediz propriedades as quais levem em conta efeitos de temperatura. Além disso, como
apontado no trabalho de Tamotsu et al [9], as medidas de gradiente de temperatura dos
índices de refração n0 e ne indicam que os mesmos devem diminuir seus valores para baixas
temperaturas, se aproximando ainda mais dos valores teóricos.
Outra razão quanto à confiabilidade nas propriedades ópticas calculadas do LTB, pode
ser entendida avaliando a faixa para os comprimentos de onda menores, abaixo de 250 nm.
Em conformidade com o band gap fundamental de energia, o espectro de absorção óptica do
LTB começa a ser formado por volta de 9,0 eV (figura 3.5.1) ou, em termos de comprimentos
de onda, cerca de 135 nm. Embora os comprimentos de onda experimentais tenham sido
medidos somente até 184 nm (aproximadamente), com base na figura 3.5.4, a curva
experimental apresenta a mesma tendência de crescimento que a obtida teoricamente. Este
fato nos confere uma informação importante, no sentido de que nos permite concluir que a
borda de absorção óptica real do Li2B4O7 está em excelente concordância com o valor do
band gap de energia determinado no presente trabalho.
48
IV CONCLUSÃO
No presente trabalho foram estudadas, teoricamente, as propriedades estruturais,
eletrônicas e ópticas do tetraborato de lítio, Li2B4O7, puro. Como ferramenta teórica foi
utilizado o método ab-initio LAPW baseado na DFT e implementado no código
computacional Wien2k.
Os cálculos começaram com a otimização computacional da estrutura cristalina do
LTB. Os valores calculados para os parâmetros de rede, a e c, para o volume da célula
unitária e as posições atômicas dentro dela, estão em boa concordância com valores
experimentais [47]. Os parâmetros de rede, a e c, superestimaram os parâmetros
experimentais em apenas 0,63% e 1,22%, respectivamente, enquanto que o volume da célula
unitária foi aumentado em aproximadamente 2,5%.
Com base nos cálculos da estrutura eletrônica, o Li2B4O7 é um material isolante com
um amplo band gap de 9,2 eV. Este valor está em excelente concordância com os valores
encontrados por Wooten et al [7], os quais afirmam que o valor do gap deve ser maior que 8,8
eV e também pelo trabalho teórico de Islam et al [5]. Quanto à natureza do gap, os resultados
indicaram que o LTB possui gap indireto, X  Γ . O cálculo da densidade de estados total
(TDOS) e parcial (PDOS) revelou o espectro da distribuição das bandas de energia, bem
como seu caráter orbital por volta do band gap. A TDOS calculada computacionalmente está
em pleno acordo, seja em comparação com o espectro XPS experimental [6], seja com os
resultados obtidos teoricamente da referência [5]. No topo da banda de valência predominam
estados p dos átomos de oxigênio e o fundo da banda de condução é formado, em sua maioria,
por estados p dos átomos de boro B(1).
Considerando as propriedades ópticas do Li2B4O7, foram estudadas as características
do tensor dielétrico,  ij ( ) , e do índice de refração, nij ( ) , quanto à resposta óptica deste
material à aplicação de ondas eletromagnéticas. Analisando a parte imaginária do tensor
dielétrico, foi possível interpretar, em termos de transições eletrônicas, o espectro de absorção
óptica do LTB. Os resultados revelaram que a borda de absorção se encontra perto da energia
de 9,2 eV e que o primeiro pico é decorrente das transições eletrônicas entre os estados O-p e
B-p dentro do grupo trigonal, B(1)O3. A constante dielétrica estática referente à luz polarizada
ao longo das direções cristalográficas, a e c, foi encontrada como sendo 2,16 e 2,03 para
1 xx (0) e 1 zz (0) , nessa ordem. A análise do índice de refração calculado revelou que o
Li2B4O7 é um material opticamente anisotrópico. Os valores calculados para o índice de
refração estático do LTB foram 1,47 e 1,43 para n _ xx e n _ zz , respectivamente, os quais
49
concordam muito bem com os valores 1,56 para n0 (ordinário) e 1,52 para ne
(extraordinário), experimentais obtidos da referência [9]. Embora os comprimentos de onda
experimentais tenham sido medidos somente até 184 nm, a curva experimental apresenta a
mesma tendência de crescimento que a obtida teoricamente. Este fato nos confere uma
informação importante, no sentido de que nos permite concluir que a borda de absorção óptica
real do Li2B4O7 está em excelente concordância com o valor do band gap de energia
determinado no presente trabalho.
De acordo com estudo apresentado nesta dissertação, tem-se chegado a uma excelente
e confiável descrição das propriedades estruturais, eletrônicas e ópticas do Li2B4O7 puro, as
quais contribuirão de forma significativa para o conhecimento do gap fundamental de energia
e das propriedades ópticas do LTB.
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