SBC – Proceedings of SBGames 2015 | ISSN: 2179-2259 Culture Track – Full Papers Ambiente Virtual 3D baseado em Jogos para Apoiar o Aprendizado de Crianças Hospitalizadas Eunice P. dos Santos Nunes Eduardo M. Lemos Renato Kawakami Cristiano Maciel Raphael Rosa S. Gomes Universidade Federal de Mato Grosso, Instituto de Computação, Brasil Figura 1: Cenário do Ambiente Virtual 3D baseado em jogos – representa um quarto de hospital na ala pediátrica Resumo A concepção de Ambientes Virtuais Tridimensionais que agregam estratégias de interação, baseadas em jogos, tem despertado o interesse de pesquisadores em diversas áreas de conhecimento, especialmente no campo educacional, devido à possibilidade de simular situações reais em diferentes contextos. Para auxiliar na aprendizagem, de forma lúdica e interativa, das crianças que permanecem longos períodos hospitalizadas, este trabalho apresenta a concepção de um Ambiente Virtual de Aprendizagem Tridimensional baseado em jogos. Aplicando o método de revisão sistemática da literatura e técnicas de design participativo, um protótipo do jogo com finalidade educacional foi desenvolvido. De acordo com a equipe de saúde, a qual auxilia na primeira fase de desenvolvimento do projeto, os primeiros resultados do protótipo estão em conformidade com as necessidades das crianças hospitalizadas. A partir das orientações do professor da classe hospitalar, novas fases serão implementadas. aprendizado por meio de Ambientes Virtuais Tridimensionais (AVs 3D). Esta tendência ocorre, devido as técnicas de RV e RA possibilitarem simulações reais em diferentes contextos [Nunes et al. 2012]. No campo educacional, a concepção de AVs 3D que agregam estratégias de interação baseada em jogos, tem despertado o interesse de pesquisadores em áreas específicas do conhecimento em diferentes níveis de escolaridade, haja vista que as escolhas dos jogadores nos ambientes virtuais determinam seus resultados, além de promover o aprendizado por descoberta, a curiosidade e a autonomia. No contexto hospitalar, encontram-se diversas iniciativas de concepção de AVs 3D, baseados em jogos, com propósito educacional, como os trabalhos de Di Fiore et al. [2007], Jorissen et al. [2007] e González-González et al. [2014], uma vez que os longos períodos de internação interrompem o processo de aprendizado e a interação social entre a criança e seus professores e colegas de classe. 1. Introdução Considerando que a continuidade do currículo escolar é um direito da criança e do adolescente hospitalizado, conforme Resolução CONANDA n° 41 de outubro de 1995, na qual prevê o professor da classe hospitalar para acompanhamento do aprendizado em todos os hospitais que dispõem de internação infantil, promover diferentes estratégias de ensinoaprendizagem pode estreitar a distância entre a criança hospitalizada e o ambiente escolar, buscando reduzir o déficit de aprendizado causado pelos longos períodos de internação. O uso de sistemas de Realidade Virtual (RV) e Realidade Aumentada (RA) tem se tornado cada vez mais presentes em diversas áreas de conhecimento, tais como indústria, treinamento tático, medicina e educação, como alternativa de treinamento e Desse modo, buscando integrar recursos tecnológicos diferenciados no processo de ensinoaprendizagem das crianças hospitalizadas, de forma lúdica e interativa, o presente trabalho apresenta uma proposta de concepção de um Ambiente Virtual de Palavras-chave: Realidade Virtual, Jogos, Crianças Hospitalizadas, Ambiente Virtual de Aprendizagem Tridimensional. Contato dos autores: {renatomitsuo36,eunice.ufmt,emartinslemos ,crismac}@gmail.com [email protected] XIV SBGames – Teresina – PI – Brazil, November 11th - 13th, 2015 988 SBC – Proceedings of SBGames 2015 | ISSN: 2179-2259 Culture Track – Full Papers Aprendizagem Tridimensional (AVA 3D) baseado em jogos. pesquisadores das áreas de RV e Jogos os escolhem para o desenvolvimento de aplicações diversas. O AVA 3D proposto neste estudo busca como principal estratégia de interação, os recursos de jogos, pelo fato de ser uma ferramenta facilitadora para o processo de aprendizagem, além de estimular o aprendizado interativo e competitivo, aliado ao entretenimento. Para a modelagem dos personagens, aplicou-se a ferramenta Blender2. Trata-se de uma ferramenta de criação tridimensional que possui diversos recursos para as etapas do processo de criação, como modelagem, animação, renderização etc. Esta ferramenta auxiliou na modelagem dos personagens, por possuir uma ampla paleta de recursos, ser compatível com diversas plataformas e regida por uma licença pública. Salienta-se que o AVA 3D proposto deve ser aplicado com acompanhamento da professora da classe hospitalar e dos demais profissionais de saúde envolvidos no processo de tratamento médico da criança. 2. Metodologia A pesquisa iniciou com uma Revisão Sistemática (RS) na literatura especializada, que incluiu três etapas: planejamento, condução e extração de resultados. Em cada etapa os passos estiveram alinhados com a metodologia PRISMA [Moher et al. 2009]. Dos 178 trabalhos provenientes das bases de dados IEEE, ACM, ISI Web of Knowledge e Springer identificados na fase de condução da RS, 14 trabalhos foram incluídos na fase de seleção final, os quais estão relacionados às seguintes questões de pesquisa: Quais são as estratégias de interação adotadas nos Ambientes Virtuais 3D para estimular o aprendizado de crianças hospitalizadas ou que apenas estejam afastadas do ambiente escolar por motivo de doença? Quais fatores humanos são considerados na concepção e aplicação dos games voltados para assistência às crianças afastadas do ambiente escolar por motivo de doença (hospitalizadas ou não)? Como modelo de desenvolvimento de software optou-se pelo incremental [Sommerville 2011], devido a sua flexibilidade. Durante a fase de especificação de requisitos e prototipação das interfaces, o processo de concepção do AVA 3D proposto adotou técnicas de Design Participativo (DP) [Muller 2002], buscando integrar os profissionais da área de saúde e a equipe de tecnologia em todas as fases do projeto, especificamente em relação à definição das interfaces e interação do usuário com o ambiente virtual, alinhado ao processo de desenvolvimento de software incremental. 3. Trabalhos Relacionados A Figura 2 apresenta uma síntese das principais estratégias de interação identificadas nos estudos incluídos na fase final da RS. Observa-se que dos 14 estudos incluídos, nove trabalhos apresentam jogo como estratégia de interação, sendo que serão apresentados nesta seção quatro trabalhos, considerados mais relevantes para o propósito do estudo. Com base nos resultados da RS e nos dados coletados por meio das entrevistas realizadas com os profissionais de saúde envolvidos no projeto, decidiuse implementar o AVA 3D, baseado em jogos, adaptado para plataformas móveis, especificamente, para dispositivos que usam o Sistema Operacional Android. A plataforma Android oferece um kit de desenvolvimento livre, o que possibilita a implementação do ambiente virtual para dispositivos móveis que adotam esse tipo de Sistema Operacional. Para implementação do ambiente de jogo, utilizou1 se o motor de jogo Unity 5 , por ser um motor de jogo completo, provido de um motor de renderização poderoso e uma ferramenta de workflows intuitivos, além de oferecer uma versão de desenvolvimento livre. De acordo com Popolin Neto et al. [2015], as técnicas gráficas de renderização presentes nos motores de jogo do Unity e o desenvolvimento em alto nível, são algumas das razões pelos quais 1 https://unity3d.com/company XIV SBGames – Teresina – PI – Brazil, November 11th - 13th, 2015 Figura 2: Síntese dos estudos incluídos na fase de seleção final da RS Considerando que os AVAs 3D, baseados em jogos, podem estimular a aquisição de diferentes tipos de conhecimento [Nunes et al. 2013], surge como uma alternativa para superar o déficit de aprendizado apresentado pelas crianças afastadas do ambiente escolar por motivos de saúde, hospitalizadas ou em tratamento domiciliar. Nesse cenário, esta seção apresenta os principais trabalhos que exploram jogos como estratégia de 2 https://www.blender.org/ 989 SBC – Proceedings of SBGames 2015 | ISSN: 2179-2259 Culture Track – Full Papers interação na concepção de AVs 3D, como o trabalho de González-González et al. [2014], no qual propõe a adoção de um ambiente multiplayer baseado em “Digital game-Based Learning” (DGBL) e “ComputerSupported Collaborative Learning” (CSCL). gravadas em vídeo. Os resultados do experimento relativos à eficácia do agente inteligente no AV apontam tendências encorajadoras, considerando o número de crianças que experimentaram o ambiente virtual. O propósito principal é ensinar conteúdo curricular, mas também estimular a comunicação, o trabalho em equipe e a colaboração. As tarefas são conduzidas em grupo como também individualmente, o que torna o aprendizado mais consistente devido à capacidade de transpor os conhecimentos para diferentes contextos por meio das interações. Outro estudo com crianças autistas foi conduzido por Abirached et al. [2011], que apresenta o projeto LIFEisGAME, que se refere a uma abordagem de jogos sérios com propósito de ensinar crianças com autismo a reconhecer expressões faciais que representam emoções. A primeira fase do jogo é reconhecer as diferentes expressões faciais do avatar que representa a própria criança, associando a expressão facial ao tipo de emoção; na segunda fase a criança é estimulada a imitar as expressões faciais do seu avatar; na terceira fase a criança é estimulada a expressar suas próprias emoções por meio de expressão facial, de forma coerente. Considerando o aprendizado de expressões faciais no AV 3D baseado em jogos, espera-se que a criança adote as expressões faciais no seu cotidiano para expressar suas emoções. Os itens avaliados pelos pesquisadores permitiram identificar que os fatores humanos relacionados aos aspectos sociais e emocionais, como aspectos verbais e não verbais (expressões faciais e tempo de resposta), despontam um cenário positivo. O projeto piloto conduzido em um ambiente escolar mostrou-se inspirador para que novas experiências fossem testadas, cuja próxima fase será a condução de experimentos com crianças hospitalizadas. Subsequente, outra iniciativa de concepção de AVs 3D para assistência à criança hospitalizada é apresentada. Contudo, o trabalho de Hoiseth e Giannakos [2013] apresenta os resultados de um estudo que investiga as diretrizes do processo de design de jogos ou aplicações virtuais diversas, que tenham como público alvo crianças hospitalizadas ou em tratamento médico domiciliar. Os autores promoveram um focus group com os profissionais e pesquisadores da área de saúde (enfermeiros, pedagogos, médicos pediátricos e voluntários que cuidam de crianças) e facilitadores (farmacêutico, designers e estudantes universitários das áreas de design e interação), com objetivo de levantar as melhores práticas para estabelecer uma conexão entre os componentes de jogos e o processo de design de AVs 3D. O projeto ECHOES II proposto por Bernardini et al. [2014], apresenta a concepção de um AV baseado em jogos sérios (serious games), desenvolvido para auxiliar crianças com autismo a praticar habilidades de comunicação social. A pesquisa se concentra na concepção e implementação das atividades de aprendizagem que acontecem em um jardim sensorial (cenário 2D) com a presença de um agente inteligente (Humano Virtual 3D), o qual desempenha o papel de parceiro social da criança no AV, a fim de apoiar a aprendizagem. As dificuldades encontradas por crianças com autismo podem ser agrupadas em três fatores humanos principais: comunicação, interação social e comportamentos repetitivos. Logo, as atividades de aprendizagem e o agente inteligente do AV estão embasados nos princípios de boas práticas de autismo. O protótipo foi desenvolvido com a participação de educadores, especialistas da área e crianças com autismo. O experimento contou com 29 crianças, entre 4 e 14 anos, em cinco escolas primárias do Reino Unido que atuam com crianças autistas. As experiências foram XIV SBGames – Teresina – PI – Brazil, November 11th - 13th, 2015 Os autores ressaltam que crianças com autismo tem dificuldade de reconhecer expressões faciais devido a sua limitação cognitiva e emocional, e muitas vezes não conseguem diferenciar o significado das emoções. Logo, o projeto LIFEisGAME é uma importante contribuição para a área de saúde, especialmente, no campo do autismo. O estudo foi conduzido com nove crianças entre 4 e 11 anos. As emoções foram retratadas nas expressões faciais considerando diferentes níveis de dificuldade, inclusive ocultando parte do rosto. Após o experimento, os pesquisadores buscaram o feedback das crianças e dos pais. Um ponto inesperado foi a escolha deliberada dos participantes de errar as respostas para observar o feedback negativo, que aparentemente mostrou-se muito agradável a alguns usuários. Para a maioria dos participantes houve aceitação do jogo e algumas sugestões foram indicadas, como a utilização de diversos avatares e cenários para manter a atenção das crianças. A literatura indica diversos projetos de AVs 3D com propósito educacional, como os supracitados. É notável que, de forma geral, as iniciativas alinham entretenimento, principalmente quando utilizam estratégias de interação baseada em jogos, com o conteúdo educacional da aplicação. Se por um lado a educação tradicional possui uma estrutura pedagógica voltada para a transmissão de conteúdos, em ambiente hospitalar ocorre uma dificuldade maior em decorrência da dificuldade de adaptação da criança ao contexto. Torna-se então importante o uso de recursos como o jogo para estimular o aprendizado por meio do “brincar”. O brincar pode assumir o papel maior do que recreação ao encarar esta atividade como um desenvolvimento integral da criança “caracterizando-se como uma das formas mais complexas que a criança tem de comunicar-se consigo mesma e com o mundo" [Oliveira 2000]. 990 SBC – Proceedings of SBGames 2015 | ISSN: 2179-2259 Culture Track – Full Papers O jogo proporciona um “recurso capaz de promover um ambiente planejado, motivador, agradável e enriquecido, possibilitando a aprendizagem de várias habilidades" [Alves e Bianchin 2010]. UFMT, os fatores humanos que podem interferir no processo de aprendizado por meio do ambiente virtual proposto, durante os experimentos a serem realizados com as crianças hospitalizadas. Sob esta perspectiva Piaget explica de forma conclusiva: Os experimentos servirão de base para a validação do jogo e melhorias no protótipo, conforme prevê a metodologia de Design Participativo, uma vez que de acordo com Muller [2002] o DP envolve: “melhoramento da aprendizagem e da compreensão do sistema em desenvolvimento e maior participação entre os interessados do processo”. Sendo assim, as práticas do DP devem ser aplicadas visando tais benefícios. "O jogo é, portanto, sob as suas formas essenciais de exercício sensório-motor e de simbolismo, uma assimilação do real à atividade própria, fornecendo a esta seu alimento necessário e transformando o real em função das necessidades múltiplas do eu. Por isso, os métodos ativos de educação das crianças exigem que se forneça às crianças um material conveniente, a fim de que, jogando elas cheguem a assimilar as realidades intelectuais que, sem isso, permanecem exteriores à inteligência infantil" [Piaget 1976]. A criança ao ser hospitalizada possui um corpo adoecido e carrega consigo não só o seu corpo doente, mas também os seus costumes, sua rotina e sua principal característica: “o brincar” [Silva et al. 2010]. Os jogos identificados na literatura apresentam concordância com o referido autor, pois ao manter o foco educacional de forma lúdica, as aplicações podem oferecer aos usuários a possibilidade de brincar e interagir de forma criativa ao mesmo tempo em que estão adquirindo conhecimento. 4. Proposta do Jogo e Resultados Os resultados da RS e o Modelo de Referência (Figura 3) adotado nesta pesquisa embasaram a concepção do AVA 3D, baseado em jogos, para assistência à criança hospitalizada, que busca contemplar a interdisciplinaridade dos conteúdos curriculares abordados no ambiente virtual. Com a difusão de dispositivos móveis no cotidiano das crianças, o desenvolvimento de aplicações voltadas para este tipo de mídia é cada vez mais desejável quando se considera um amplo universo de usuários. A mobilidade da aplicação e a facilidade de manuseio podem ser imperativos no caso de alguma limitação de movimento como, por exemplo, crianças acamadas, imobilizadas ou em unidades de tratamento que não permitem a utilização de computadores. Pela diversidade de sistemas operacionais presentes nos diversos dispositivos móveis, torna-se necessário prever a interoperabilidade, inclusive com desktops, uma vez que há possibilidade de contar com a infraestrutura dos hospitais que já possuem uma rotina de apoio escolar e uma estrutura física que comporte a adoção de um jogo 3D no laboratório de informática do hospital. Outra questão relevante é armazenar dados em nuvem juntamente com a permissão do acesso via web, cobrindo necessidades de segurança e flexibilidade. A Figura 3 exibe os componentes do Modelo de Referência que são considerados na concepção do jogo aqui proposto. Salienta-se que em relação às estratégias de interação previstas no modelo, o AVA 3D proposto faz uso de estratégias de interação como aprendizagem baseada em jogos e uso de avatar. As estratégias de interação buscam propiciar o aprendizado, o entretenimento e a socialização. Por meio do avatar disponível no jogo, a criança assume o lugar do profissional de saúde e interage com o paciente virtual, representado por um brinquedo. Os fatores humanos considerados no desenvolvimento do cenário do jogo refletem o déficit de aprendizado, devido ao afastamento escolar; a baixa autoestima; sensação de isolamento e falta de comunicação e socialização. Esses fatores humanos são explorados por meio de situações lúdicas como forma de apoio pedagógico, estimulando a imaginação e empatia com os personagens virtuais, bem como também com os profissionais de saúde que passam a fazer parte da rotina terapêutica. Pretende-se ainda investigar, juntamente com os profissionais da área de saúde e da professora da classe hospitalar no Hospital Universitário Júlio Muller da XIV SBGames – Teresina – PI – Brazil, November 11th - 13th, 2015 Figura 3: Modelo de referência para concepção de AVAs 3D para crianças hospitalizadas [Kawakami et al. 2015]. 991 SBC – Proceedings of SBGames 2015 | ISSN: 2179-2259 Culture Track – Full Papers O cenário do AVA 3D, baseado em jogos, inicia em um quarto de hospital, como ilustra a Figura 4, o qual foi modelado a partir das entrevistas realizadas com os profissionais de saúde envolvidos no projeto. Figura 6: Avatar interagindo com o brinquedo “paciente virtual” Figura 4: Cenário inicial do jogo (AVA 3D) A criança inicia a navegação no jogo, escolhendo o seu avatar que irá representá-lo no ambiente virtual. Inicialmente, foram modelados dois avatares (um menino e uma menina) ilustrados na Figura 5. Por meio do avatar, a criança navega no ambiente virtual e interage com os objetos virtuais. Os avatares estão vestidos com jalecos, usados pelos profissionais de saúde, para familiarizá-los com a equipe do hospital. A passagem entre o cenário inicial e o contexto de ensino curricular ocorre por meio de uma interface de transição. O ambiente virtual oferece à criança, representada pelo seu avatar, alternativas de caminhos de estudo apresentados na forma de escorregadores infantis, que as levarão a conteúdos curriculares específicos e interdisciplinares associados a faixa etária da criança, como ilustra a Figura 7, que representa a criança escorregando por meio da interação com uma fruta (objeto 3D). O escorregador virtual leva o avatar da criança, afastar-se do cenário do quarto de hospital e se ver em outro cenário, denominado “sala de aula virtual”. Visando a melhor identificação dos usuários com os personagens do AVA 3D, outro quesito explorado é a personalização. Caetano e Lima [2012] defendem que a personalização é um meio de liberdade dos jogadores perante o enredo e que a capacidade de personalizar o avatar permite uma maior imersão dos jogadores nas narrativas. Os autores declaram ainda que “... ao criar uma identidade própria, os jogadores criam uma ligação mais forte com a sua versão virtual”. Deste modo, o AVA 3D prevê a personalização de algumas características dos avatares, como cor dos olhos, cor dos cabelos, tamanho dos cabelos e acessórios, buscando oferecer as crianças uma identidade própria no mundo virtual. Figura 5: Avatares (feminino e masculino) No cenário do quarto, o avatar pode assumir o papel do profissional de saúde e interagir com os brinquedos, que “no imaginário da criança” podem se tornar um paciente virtual, como ilustra a Figura 6. Os objetos 3D disponíveis no ambiente virtual se tornam uma chave lúdica para ingressar nos conteúdos curriculares explorados nos diferentes cenários e narrativas do jogo. XIV SBGames – Teresina – PI – Brazil, November 11th - 13th, 2015 Figura 7: Exemplo do escorregador por meio da interação com a fruta Os conteúdos inicialmente tratados no jogo integram as áreas de ciências naturais, matemática e português, de forma interdisciplinar. As atividades planejadas nesta primeira etapa envolvem o estudo de contagem e separação de elementos em conjuntos, ordens de grandeza, classes de palavras, entre outros tópicos. Em um cenário ao ar livre, contrapondo o cenário inicial do quarto hospitalar, as atividades propostas apresentam desafios interdisciplinares. Um exemplo é atividade de coleta de frutas com pesos diferenciados e a separação dos alimentos entre frutas, verduras e outros tipos de alimentos, bem como a comparação de valores. Os conteúdos abordados incluem conhecimentos sobre matemática, língua portuguesa e ciências. Quando a criança cumprir a tarefa que lhe foi atribuída, será encaminhada a próxima fase. No cenário da “sala de aula virtual”, o jogo prevê diferentes níveis de dificuldades, como domínio sobre operações matemáticas básicas (soma, subtração, 992 SBC – Proceedings of SBGames 2015 | ISSN: 2179-2259 Culture Track – Full Papers multiplicação, divisão) e identificação de classe de palavras (verbo, substantivo, adjetivo, etc). medalhas e alcance o maior nível de conquista previsto no jogo. As missões propostas no jogo variam em relação ao contexto da situação, mas os exercícios relacionados aos tópicos se repetem, haja vista que o jogo é um espaço de aprendizagem. De acordo com Piccini [2012], a repetição é uma forma comum de melhorar determinadas habilidades em jogos e, consequentemente, na aprendizagem do conteúdo abordado no ambiente. A utilização deste recurso apresenta a vantagem de explorar pequenas variações da mesma situação enquanto sedimenta o conhecimento ou a aquisição de saberes. O autor versa ainda sobre o aprendizado por meio de side quests, que são missões secundárias, oferecendo liberdade à criança de escolher ou não a missão, sem interferir no enredo principal do jogo, o que caracteriza mais uma motivação para o aprendizado em relação ao ensino tradicional. As atividades educativas propostas no jogo, em geral, são sobre as demandas já supridas nas classes hospitalares, porém espelhadas em um AVA 3D com registro das atividades de interação. Tal registro possibilita uma posterior avaliação do professor sobre o conhecimento adquirido. Como o propósito deste trabalho é apresentar, de forma geral, a proposta do jogo, tais conteúdos e a dinâmica do aprendizado não serão detalhados neste artigo. Para tarefas em níveis de maior complexidade, o avatar da criança interage no jogo com um mascote (personagem virtual), o João Pinto (Figura 8), personagem do livro “Binje” publicado por psicólogas que promovem atividades lúdicas com as crianças hospitalizadas no Hospital Universitário Júlio Muller da UFMT [Freire 2013]. O mascote envolvido no contexto é provido de inteligência para interagir com a criança, por meio do seu avatar, e oferecer dicas quando a criança apresentar dificuldades na realização das atividades, especialmente, em níveis mais complexos. O propósito da interação com o mascote é o posterior compartilhamento das experiências com pedagogos e psicólogos envolvidos no tratamento da criança para analisar os fatores humanos sociais e emocionais externados pelas crianças durante a navegação no jogo. Figura 8: Mascote do Projeto [adaptado de Freire 2013] A criança e o mascote compartilham de linguagem própria, na qual podem trocar confidências e exercitar a imaginação, com maior liberdade de expressão, buscando reduzir a carga de estresse oriunda de sua condição física e psicológica no contexto hospitalar. Como forma de recompensar as conquistas das crianças no jogo, o avatar recebe medalhas ou insígnias de tipos diferentes para cada grupo de habilidades e conhecimentos adquiridos, com variação por nível de complexidade, como forma de premiação. Espera-se que a criança tente completar todos os grupos de XIV SBGames – Teresina – PI – Brazil, November 11th - 13th, 2015 Desse modo, como principal resultado desta pesquisa, tem-se a proposta do AVA 3D, baseado em jogos, desenvolvido a partir do Modelo de Referência apresentado por Kawakami et al. [2015]. Os cenários estimulam “o brincar” ao mesmo tempo em que promovem o aprendizado de conteúdos curriculares interdisciplinares que passam por níveis de dificuldades diversos, conforme a evolução das crianças nas atividades do jogo. 5. Conclusões A pesquisa conduzida com uso de AVAs 3D, baseados em jogos, voltados para crianças hospitalizadas foi o foco deste trabalho e está em consonância com necessidades apontadas por profissionais da saúde e outros trabalhos relacionados previamente. Os estudos preliminares e o atual estágio de desenvolvimento da aplicação contam com a participação dos envolvidos, utilizando-se de métodos que orientam os passos futuros da pesquisa, de forma que possa haver acompanhamento dos resultados obtidos. Nesse sentido, cabe salientar que a pesquisa precisa ainda considerar características de acessibilidade e o controle da aplicação pelo usuário. Incidentes que interferem na captação de dados de entrada ou na interação do usuário como, por exemplo, uma limitação temporária devido a um procedimento médico ou acidente, podem ser remediados ao prever alteração nos meios de entrada e saída ou mesmo alterando o estado do sistema. Ciente das limitações da versão preliminar desenvolvida até o momento, a construção acompanhada dos módulos do jogo possuem observações acerca do comportamento esperado dos pacientes baseado nas experiências do hospital e seus profissionais. Os meios de atuação encontrados normalmente foram extrapolados na versão virtual para apresentar um ambiente lúdico correspondente à imagem trabalhada nas diversas atividades de educação hospitalar. Dessa forma, itens específicos referentes à identificação dos usuários ganham matizes de forma a retratar contextualização adequada. Espera-se que estas especificidades possam contribuir para desenvolvimento de outras aplicações de ambientes 993 SBC – Proceedings of SBGames 2015 | ISSN: 2179-2259 similares, independente do tipo de tratamento a que o paciente seja submetido. O protótipo inicial foi validado pelos profissionais da área de saúde envolvidos no processo de design do ambiente. Em etapa posterior, espera-se a participação dos pacientes (crianças) em testes, para a melhoria da aplicação. Pretende-se também aplicar o jogo em situações reais de aprendizagem com crianças hospitalizadas, buscando investigar o nível de aquisição de conhecimento adquirido por meio do jogo. Ainda, reforça-se que, considerando o público alvo e a atenção dispensada em relação aos AVAs 3D, percebe-se a necessidade de novos estudos em relação à proposta, que atuem, especialmente, nos déficits de aprendizado oriundos de longos períodos de internação. Agradecimentos Os autores agradecem ao Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC/PIBITI/PIBICAf) da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), pelo apoio financeiro e à equipe da ala pediátrica do Hospital Universitário Júlio Muller pelo trabalho conjunto. Referências ABIRACHED, B., ZHANG, Y., AGGARWAL, J. K., TAMERSOY, B., FERNANDES, T. AND CARLOS, J., 2011. Improving communication skills of children with ASDs through interaction with virtual characters. In: IEEE 1st Int. Conf. Serious Games Appl. Heal., Braga, 16-18 November 2011. ALVES, L. AND BIANCHIN, M. A., 2010. O jogo como recurso de aprendizagem. In: Revista Psicopedagogia [online]. 27 (83) 282-287. Disponível em <http://pepsic.bvsalud.org/pdf/psicoped/v27n83/13.pdf>. [Acesso em 15 jul. 2015]. BERNARDINI, S., PORAYSKA-POMSTA, K. AND SMITH, T. J., 2014. ECHOES: An intelligent serious game for fostering social communication in children with autism. In: Information Sciences, 264, 41-60. 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