Baixar este arquivo PDF

Propaganda
Abordagens de desenvolvimento e gestão ambiental no planejamento municipal:
concepções e práticas do paradigma ambiental na gestão municipal de
Ananindeua (PA)
DOI: 10.17552/2358-7040/bag.n1v1p105-123
Tiago Veloso dos SANTOS
________________________________________________
ABORDAGENS DE DESENVOLVIMENTO E GESTÃO AMBIENTAL NO
PLANEJAMENTO MUNICIPAL: CONCEPÇÕES E PRÁTICAS DO PARADIGMA
AMBIENTAL NA GESTÃO MUNICIPAL DE ANANINDEUA (PA)1
105
2
Tiago Veloso dos SANTOS
Resumo
Na atualidade das políticas públicas para o espaço urbano no Brasil, o município tem sido
valorizado enquanto instância de gestão do espaço local, especialmente no período pósConstituição de 1988, que reconhece institucionalmente essa escala enquanto componente
administrativa dotada de autonomia. Consequentemente há um processo de difusão de
agendas e programas de desenvolvimento urbano na estruturação de concepções e práticas de
gestão local. Analisando as cidades amazônicas pelo estudo de caso do município de
Ananindeua (Pa), é possível reconhecer uma dessas abordagens de desenvolvimento, e como
ela ocorre na escala local, notadamente a influência da abordagem ambiental na condução
das políticas públicas em plano local. Este estudo foi fundamentado teoricamente a partir da
contribuição de Souza (1998; 2000) e Santos (2004), e, no aspecto metodológico, adotou
uma abordagem de pesquisa qualitativa, utilizando análise documental e dados primários
provenientes de instituições de planejamento envolvidas no processo de difusão da agenda
urbana na Amazônia e da própria Prefeitura Municipal de Ananindeua.
Palavras-Chave: Gestão; Planejamento Urbano; Desenvolvimento Urbano Sustentável; Ananindeua.
APPROACHES TO DEVELOPMENT AND ENVIRONMENTAL MANAGEMENT IN THE
MUNICIPAL PLANNING: CONCEPTS AND PRACTICES OF ENVIRONMENTAL
PARADIGM IN MUNICIPAL MANAGEMENT ANAND (PA)
Abstract
At present public policies for urban space in Brazil, the city has been valued as a forum for
management of the local policies, especially in the post-1988 Constitution, which recognizes
the scale while institutionally endowed administrative component of local autonomy.
Consequently there’s a diffusion process of urban agenda and development programs in
structuring concepts and practices of local management. Analyzing the Amazonian Brazilian
cities by case study of the municipality of Ananindeua, it’s possible to recognize one of these
development approaches, and how it occurs on a local scale, which is the environmental
approach in the conduct of public policy at the local level. This study was based theoretically
from the contribution of Souza (1998; 2000) and Santos (2004), and the methodological
aspect, adopted a qualitative research approach, using documentary analysis and primary
data from institutions involved in the planning process diffusion of the urban agenda in
Amazon's own and the Town of Ananindeua.
Key-words: Management; Urban Planning; Urban Sustainable Development; Ananindeua.
1
O artigo contou com apoio financeiro e institucional do Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientifico e
Tecnológico – CNPq.
2
Geógrafo, docente do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Pará – IFPA, Doutorando em
Desenvolvimento Sustentável pelo Núcleo de Altos Estudos Amazônicos da Universidade Federal do Pará –
UFPA. e-mail: [email protected] /
Boletim Amazônico de Geografia, Belém, n. 1, v. 01, p. 105-123, jan./jun. 2014.
Abordagens de desenvolvimento e gestão ambiental no planejamento municipal:
concepções e práticas do paradigma ambiental na gestão municipal de
Ananindeua (PA)
DOI: 10.17552/2358-7040/bag.n1v1p105-123
Tiago Veloso dos SANTOS
________________________________________________
INTRODUÇÃO
A política urbana brasileira forjada a partir do processo de redemocratização no final
da década de 1980 está fundamentada em uma estrutura jurídico-institucional que, em aspecto
geral, delega as políticas de planejamento e gestão do espaço urbano para a esfera municipal
da administração pública, especialmente a partir do estabelecimento do município como
unidade constituinte da federação brasileira, dotada de autonomia política.
Também a partir da década de 1980, há significativas alterações na forma como as
cidades são planejadas enquanto espaços para a promoção de políticas de desenvolvimento no
plano local. Novas formas de se pensar perspectivas de desenvolvimento local a partir da
difusão de políticas urbanas baseadas em pressupostos de ver a cidade para além da
modernização de sua infraestrutura física e territorial, ou de seu crescimento econômico e
demográfico strictu sensu. Dentro do perfil destas novas agendas de políticas que orientam as
gestões locais, uma chama a atenção pela capacidade de atração promovida por seu discurso,
a perspectiva ambiental no comando das iniciativas e ações locais. A difusão de uma agenda
ambiental como eixo norteador de políticas urbanas alcança as mais diversas esferas de
administração pública e influência a sociedade civil.
Guardadas as devidas particularidades, pode-se dizer que esta agenda também é válida
para as cidades localizadas na região amazônica. Pela sua localização estratégica no âmbito da
discussão de meio ambiente e cidades, o discurso da agenda ambiental tem repercussões
importantes nos municípios da região. Neste caso, trata-se de compreender o processo de
difusão das ideias de sustentabilidade, meio ambiente e desenvolvimento sustentável, no
contexto de gestões municipais especificas, como no caso da cidade de Ananindeua, terceira
maior cidade da região em aspecto demográfico e componente da região metropolitana de
Belém. Essa perspectiva será melhor contextualizada a partir da percepção de que é
necessário para sua aplicação, um conjunto indissociável de sistemas de objetos e ações, que
norteiam a produção de políticas locais.
A DIFUSÃO DO PARADIGMA AMBIENTAL NA GESTÃO PÚBLICA
De um ponto de vista geral, o que se denomina de abordagens de desenvolvimento
refere-se aquilo que, para além do conteúdo estritamente técnico e instrumental das práticas e
Boletim Amazônico de Geografia, Belém, n. 1, v. 01, p. 105-123, jan./jun. 2014.
106
Abordagens de desenvolvimento e gestão ambiental no planejamento municipal:
concepções e práticas do paradigma ambiental na gestão municipal de
Ananindeua (PA)
DOI: 10.17552/2358-7040/bag.n1v1p105-123
Tiago Veloso dos SANTOS
________________________________________________
políticas de planejamento e gestão, contém os princípios norteadores das políticas públicas, ou
em sentido mais amplo as concepções de fundo político-filosófico norteadoras das ações no
espaço (SOUZA, 2000).
Nesse caso, trabalha-se com a ideia de que existe um processo geral de difusão de
inovações, ideias e de conhecimento, que em determinado momento são apropriados por
agentes sociais relevantes na condução das politicas urbanas. Não é o intuito deste trabalho
aprofundar detalhes de como é difundida uma agenda de política urbana, o que já foi
ricamente tratado em outras análises (CAVALCANTI, 2008). Este texto trata de analisar de
forma aplicada, de que forma a agenda ambiental foi efetivada no plano de uma gestão
municipal especifica, em nosso caso, o município de Ananindeua, no período da gestão
indicada em 2005 e finalizada em 20123, visando ampliar o conhecimento sobre como e por
que uma abordagem em politica urbana é adotada.
Para Cavalcanti (2008), o termo “agenda” indica um conjunto de temas ou objetivos
que influenciam as tomadas de decisão, e que levam à definição de políticas públicas. Os
temas são determinados por atores tomadores de decisão, tanto pertencentes aos governos,
quanto a grupos de atores externos, como técnicos da administração pública, intelectuais e
acadêmico, políticos das diferentes vertentes do espectro político, a sociedade civil com as
Organizações Não governamentais, os movimentos sociais, etc, e que influenciarão nas ações
governamentais.
A difusão de inovações na agenda urbana tem impactado de forma sutil, e às
vezes de forma explícita, a formulação de políticas urbanas nas cidades
brasileiras. Tal aspecto é de fundamental importância para ser investigado e
ampliar o conhecimento acerca do processo de como as políticas são
formuladas; quem são os principais atores envolvidos (direta e
indiretamente) e como as decisões para implementação de programas
urbanos são realizadas (CAVALCANTI, 2008, p. 24).
A partir disso é necessário reconhecer a existência de elementos político-filosóficos
que norteiam as práticas ligadas a efetivação de políticas urbanas4, a fim de compreender a
3
A gestão do Prefeito Helder Barbalho (Partido do Movimento Democrático Brasileiro – PMDB) marcou dois
mandatos consecutivos, correspondendo ao período 2005 – 2012. Eleito em outubro de 2004, assume a prefeitura
em janeiro de 2005. Reeleito em 2008 para seu segundo mandato até o ano de 2012. Sua gestão é finalizada em
2012, com a derrota do candidato a sucessor nas eleições de outubro de 2012.
4
Galbraith (1985) mencionava o fato que “por trás de uma nova estratégia econômica sempre há a influência de
um economista já falecido”. A anedota acerca da influência de determinadas concepções econômicas em
politicas, parece se fazer presente também nas concepções e práticas de políticas urbanas, mudando o fato de que
os agentes por trás das novas noções e concepções de desenvolvimento urbano continuam vivos.
Boletim Amazônico de Geografia, Belém, n. 1, v. 01, p. 105-123, jan./jun. 2014.
107
Abordagens de desenvolvimento e gestão ambiental no planejamento municipal:
concepções e práticas do paradigma ambiental na gestão municipal de
Ananindeua (PA)
DOI: 10.17552/2358-7040/bag.n1v1p105-123
Tiago Veloso dos SANTOS
________________________________________________
lógica em que foram fundamentados e as estratégias de intervenção que advém destas ideias.
De outra forma, trata-se de reconhecer as concepções de desenvolvimento urbano que
orientam as políticas de planejamento urbano, e que estão presentes, de forma implícita ou
explícita, quando da elaboração dos documentos referentes às práticas de planejamento e
gestão.
Souza (1998), em sua proposta de tipologias de abordagens de desenvolvimento
urbano, enfatiza o grau e a natureza da adesão das principais leituras do desenvolvimento
urbano à idéia de desenvolvimento urbano como modernização da cidade. Assim, o autor em
um primeiro momento, privilegiou a oposição entre o que classificou como abordagens
convencionais e abordagens não-convencionais de desenvolvimento. Neste sentido:
As abordagens denominadas convencionais seriam as modalidades de
planejamento e gestão que não apresentassem nenhum nível significativo de
crítica em relação á referida interpretação do desenvolvimento urbano como
modernização da cidade; por outro lado, as abordagens não-convencionais
seriam os enfoques que, em grau e de maneiras diferentes, afastaram-se desta
ortodoxia, seja em nome de considerações de ordem ecológica, seja em
nome de considerações afeitas à busca de maior justiça social nas cidades
(SOUZA, 1998, p. 119).
Em momento posterior, há a construção, pelo autor, de uma proposta mais refinada
acerca da forma de se pensar os modelos ou padrões de desenvolvimento urbano, a partir de
tipos ideais de abordagens de desenvolvimento do espaço urbano.
A tipologia de abordagens proposta por Souza (2002) é do tipo a posteriori, e não a
priori; portanto, as variáveis, ou seja, os critérios para a identificação de tipos de abordagem
utilizados pelo autor, não foram expostos previamente, mas sim definidos após o exame da
realidade. Não há o desejo, por parte do autor, de destacar apenas uma ou algumas poucas
características, superenfatizando uma, duas ou três varáveis que, supostamente dariam conta
da diversidade de posicionamentos e perspectivas existentes. Foram adotados, portanto, oito
critérios para se pensar tais tipologias:
a) Ideia-força central: o elemento que define as intervenções no espaço;
b) Filiação estética: variável importante no caso de modalidades de planejamento mais
arquiteturais e envolvidas com questões de traçado e estilo, notadamente o Urbanismo e o
urban design, mas sem poder discriminador em se tratando de outras abordagens de
planejamento e gestão, que tendem a não focalizar questões estéticas;
Boletim Amazônico de Geografia, Belém, n. 1, v. 01, p. 105-123, jan./jun. 2014.
108
Abordagens de desenvolvimento e gestão ambiental no planejamento municipal:
concepções e práticas do paradigma ambiental na gestão municipal de
Ananindeua (PA)
DOI: 10.17552/2358-7040/bag.n1v1p105-123
Tiago Veloso dos SANTOS
________________________________________________
c) Preocupação: o elemento principal de atendimento das demandas a que a abordagem se
coloca como solução;
d) Escopo: a forma como determinado pensamento sobre a cidade intervém sobre o espaço, se
é estritamente físico-territorial, ou pensa a cidade para além de suas característica físicas
apenas;
e) Grau de interdisciplinaridade: nível de aceitação de trabalho com mais de uma disciplina
cientifica, especialmente a não hegemonia da arquitetura e do urbanismo;
f) Grau de permeabilidade frente à realidade: a forma como a abordagem vê a realidade a
qual pretende intervir, que varia desde o apriorismo, ou seja, considerar somente o modelo,
sem considerar as características espaciais já existentes no urbano; até o semiapriorismo, que
passa a considerar elementos espaciais no contato com a realidade;
g) Grau de abertura para com a participação popular: possibilidades e propostas por
determinada prática de planejamento de participação de atores sociais diversos nas políticas
de planejamento;
h) Referencial no plano-político filosófico: a tendência política e filosófica a que se atém
determinada prática de planejamento e gestão urbana, que pode ser explicita ou
implicitamente verificada em suas ações práticas.
Considerando todos esses elementos como importantes para se pensar as abordagens
de desenvolvimento5, parte-se agora para a verificação in loco de como tais elementos e
conceitos influenciaram a construção de políticas aplicadas em cidades amazônicas. Souza
(2002) identifica ao menos quatro, como as principais abordagens de desenvolvimento
urbano: a) o desenvolvimento como modernização da cidade; b) o desenvolvimento urbano
sustentável; c) o desenvolvimento local endógeno; d) a perspectiva reformista; e) o
desenvolvimento sócioespacial.
A perspectiva do desenvolvimento urbano sustentável é a abordagem privilegiada
neste trabalho. Como essa forma especifica de politica urbana aparece no plano da efetivação
da gestão, cabe o destaque de algumas de suas características principais. Segundo Souza
(2002), a ideia força-central dessa perspectiva reside na junção de modernização das cidades
5
A partir de Souza (2002) é possível identificar ao menos quatro, como as principais abordagens de
desenvolvimento urbano: a) o desenvolvimento como modernização da cidade; b) o desenvolvimento urbano
sustentável; c) o desenvolvimento local endógeno; d) a perspectiva reformista; e) o desenvolvimento
sócioespacial.
Boletim Amazônico de Geografia, Belém, n. 1, v. 01, p. 105-123, jan./jun. 2014.
109
Abordagens de desenvolvimento e gestão ambiental no planejamento municipal:
concepções e práticas do paradigma ambiental na gestão municipal de
Ananindeua (PA)
DOI: 10.17552/2358-7040/bag.n1v1p105-123
Tiago Veloso dos SANTOS
________________________________________________
com a desejável manutenção da sustentabilidade ecológica intraurbana. Tenta-se, a partir
dessa ideia, “ajustar” a necessidade de modernização e crescimento econômico das cidades
com a recomendada sustentabilidade ambiental. A cidade, nessa perspectiva, não é vista
somente a partir de seus aspectos físico-territoriais, apesar da manutenção da necessidade de
crescimento, não só a questão da infraestrutura física urbana é considerada, mas também seus
aspectos socioeconômicos e, principalmente, ambientais. Há um considerável grau de
interdisciplinaridade, participando dos estudos desde os profissionais mais clássicos dos
estudos urbanos (arquitetos, engenheiros, geógrafos), como de estudiosos das questões
ambientais/naturais no espaço urbano (biólogos, engenheiros ambientais, profissionais em
geral ligados à área ambiental) (SOUZA, 2002).
A INFLUÊNCIA DAS ABORDAGENS AMBIENTAIS NA GESTÃO MUNICIPAL DE
ANANINDEUA – CONCEPÇÕES E PRÁTICAS
Localizado no estado do Pará, Ananindeua é um dos sete municípios constituintes da
Região Metropolitana de Belém, sendo atualmente o segundo município mais populoso do
estado, e o terceiro da Região Amazônica. Sua população é estimada em 471.744 habitantes,
segundo dados do IBGE6. O crescimento expressivo da população do município se deu em
virtude da intensificação do processo de metropolização de Belém, que se dispersou em
direção ao município de Ananindeua, desde meados dos anos 1970.
A partir da década de 1970, com o espraiamento da malha urbana de Belém em
direção ao eixo da BR-316, e por conseguinte ao município de Ananindeua, é iniciado a
construção de conjuntos habitacionais do tipo “Cidade Nova”, baseados em programas de
habitação promovidos à época pelo governo federal, sob responsabilidade da Companhia
Habitação do Estado do Pará (COHAB), como espécie de políticas de ordenamento da
periferia imediata da metrópole belenense (RODRIGUES, 1998). As margens desse processo
surgiram as áreas de ocupações espontâneas, localizadas principalmente próximas aos
conjuntos habitacionais. Atualmente a área continental de Ananindeua concentra mais de 90%
da população do município.
O Município de Ananindeua, que a partir de 1975 passa a compor com a
Capital a Região Metropolitana de Belém95, no final da década passou a
apresentar um vigoroso processo de urbanização. Em decorrência da
6
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – Censo 2010.
Boletim Amazônico de Geografia, Belém, n. 1, v. 01, p. 105-123, jan./jun. 2014.
110
Abordagens de desenvolvimento e gestão ambiental no planejamento municipal:
concepções e práticas do paradigma ambiental na gestão municipal de
Ananindeua (PA)
DOI: 10.17552/2358-7040/bag.n1v1p105-123
Tiago Veloso dos SANTOS
________________________________________________
implantação das 600 casas iniciais do Conjunto Habitacional Cidade Nova I,
em 1977, constitui-se naquela região um núcleo que tenderia a se consolidar
e se expandir com a implantação das novas glebas deste empreendimento
habitacional. Também se consolida o eixo da Estrada do Maguari como
vetor de expansão do núcleo urbano da sede municipal. De outro lado, as
localidades de Jaderlândia, Una e Guanabara, estas localizadas nas
proximidades dos limites municipais com a Capital paraense, impunham-se
como um núcleo consolidado e em expansão, em decorrência do
“espraiamento da malha urbana” de Belém. Apesar disso, Ananindeua
caracterizava-se ainda como um município predominantemente rural já que
nestas áreas, em 1980, residiam cerca de 90% da sua população de 65.878
habitantes (ANANINDEUA, 2006a, p. 84).
Por outro lado, apesar da intensificação da urbanização no espaço metropolitano do
qual Ananindeua é um dos municípios constituintes, é considerável a permanência de s áreas
de diversidade ecológica, especialmente na porção insular do território municipal.
O Município, que possui apenas um Distrito e não possui uma divisão oficial
de bairros, é constituído por duas porções de terras distintas: uma insular ao
norte, composta de igarapés e 12 ilhas, sendo a de maior dimensão a Ilha de
João Pilatos, e, ao sul, uma porção continental onde está localizada a sua
sede (ANANINDEUA, 2006a, p. 84).
O processo de urbanização acentuado provocou tendência quase que irreversível de
desmatamento da área continental do município que alcançou 78,03% até o ano de 1986, de
acordo com as imagens LANDSAT-TM, e mais recentemente essa tendência chegou a área
das ilhas, que durante os anos de 2001 e 2006, foi que mais perdeu cobertura vegetal foi a
região, mais precisamente na ilha de João Pilatos e Sororoca.
Nesse caso, é necessário considerar que o município está presente na área de expansão
da Mario região metropolitana da Amazônia, a Região Metropolitana de Belém. O
componente hidrográfico também se revela importante com os rios Guamá ao Sul, fazendo
limite com Belém; o Maguari-Açu, ao Norte e o Benfica a Nordeste limitando com o
município Benevides margeando toda a região metropolitana, conforme pode ser observado
no mapa 01.
Boletim Amazônico de Geografia, Belém, n. 1, v. 01, p. 105-123, jan./jun. 2014.
111
Abordagens de desenvolvimento e gestão ambiental no planejamento municipal:
concepções e práticas do paradigma ambiental na gestão municipal de
Ananindeua (PA)
DOI: 10.17552/2358-7040/bag.n1v1p105-123
Tiago Veloso dos SANTOS
________________________________________________
Mapa 01 – Ananindeua: localização na Região Metropolitana De Belém/Pa
112
UM SISTEMA DE OBJETOS E UM SISTEMA DE AÇÕES QUE ORIENTAM A
GESTÃO MUNICIPAL
Na implantação de uma determinada abordagem de desenvolvimento no espaço
urbano, torna-se necessária a criação ou a readequação de um conjunto de elementos que
viabilizem a aplicação das políticas, e tenha legitimidade política, administrativa e simbólica.
Esses elementos visam a criar uma imagem de ações que se pretendem implantar no espaço.
Estamos denominando esse conjunto de elementos de sistema de objetos e sistema de ações
que são responsáveis por levar adiante as práticas espaciais. Segundo Santos:
O espaço é formado por um conjunto indissociável, solidário e também
contraditório, de sistemas de objetos e sistemas de ações, não considerados
isoladamente, mas como o quadro único no qual a história se dá. No começo
era a natureza selvagem, formada por objetos naturais, que ao longo da
história vão sendo substituídos por objetos fabricados, objetos técnicos,
mecanizados e, depois, cibernéticos, fazendo com que a natureza artificial
tenda a funcionar como uma máquina. Através da presença desses objetos
técnicos: hidroelétricas, fábricas, fazendas modernas, portos, estradas de
Boletim Amazônico de Geografia, Belém, n. 1, v. 01, p. 105-123, jan./jun. 2014.
Abordagens de desenvolvimento e gestão ambiental no planejamento municipal:
concepções e práticas do paradigma ambiental na gestão municipal de
Ananindeua (PA)
DOI: 10.17552/2358-7040/bag.n1v1p105-123
Tiago Veloso dos SANTOS
________________________________________________
rodagem, estradas de ferro, cidades, o espaço é marcado por esses
acréscimos, que lhe dão um conteúdo extremamente técnico. O espaço é hoje
um sistema de objetos cada vez mais artificiais, povoado por sistemas de
ações igualmente imbuídos de artificialidade, e cada vez mais tendentes a
fins estranhos ao lugar e a seus habitantes (SANTOS, 2004, p. 39).
Nesse caso, considera-se enquanto composição de um sistema de objetos e ações na
gestão municipal, um conjunto de decisões, instituições, normas e símbolos, que a partir da
utilização pela gestão de instrumentos de planejamento do desenvolvimento do espaço urbano
municipal, identifica uma abordagem especifica na condução da diretriz de desenvolvimento
urbano no processo de elaboração desses instrumentos. Do ponto de vista das decisões, a
orientação é bastante clara em tornar o desenvolvimento urbano municipal a partir da
orientação do melhor aproveitamento e conservação do meio ambiente, e pode ser visualizado
a partir de três elementos principais que conduzem o fio da meada da gestão: 1) a
normatização
de
instrumentos
de
planejamento
com
enfoque
ambiental;
2)
a
institucionalização de instâncias administrativas ambientais; 3) a utilização de um conjunto de
símbolos prático-sensíveis e concretos para fortalecimento da imagem ambiental da gestão
pretendida. Interpretamos esses elementos a partir da constituição de um sistema de objetos e
ações que orientam a gestão e procuramos analisar cada um deles.
SISTEMA DE AÇÕES: A ELABORAÇÃO DE UM CONJUNTO DE NORMAS E
SÍMBOLOS QUE ORIENTAM A GESTÃO EM DIREÇÃO A ABORDAGEM
AMBIENTAL
No aspecto simbólico, pretendia-se deixar claro que a imagem de desenvolvimento
estaria relacionada para aspectos socioambientais presentes no município. Neste sentido o
primeiro elemento é o próprio símbolo adotado como a marca das ações da Prefeitura,
conforme a figura 01, a árvore que originalmente denomina o município, o Ananin:
Mas não somente de símbolos vive a gestão, a construção de um conjunto de normas
também é relevante para compreender como é aplicada determinada abordagem de
desenvolvimento no espaço urbano. No caso de Ananindeua, esse processo é iniciado com a
Boletim Amazônico de Geografia, Belém, n. 1, v. 01, p. 105-123, jan./jun. 2014.
113
Abordagens de desenvolvimento e gestão ambiental no planejamento municipal:
concepções e práticas do paradigma ambiental na gestão municipal de
Ananindeua (PA)
DOI: 10.17552/2358-7040/bag.n1v1p105-123
Tiago Veloso dos SANTOS
________________________________________________
discussão em torno da necessidade de construção do plano diretor municipal7, a partir de
2006.
O plano diretor é o elemento concreto do processo de planejamento e gestão urbano
brasileiro, configurando-se em um instrumento de ordenamento do desenvolvimento do
espaço. No processo de construção de um plano diretor são necessárias várias fases de
execução até a elaboração final do plano na forma de lei. O relatório de diagnósticos
constitui-se uma importante etapa da construção, sendo caracterizado por ser o produto direto
da fase de leitura da realidade municipal8.
No plano diretor de Ananindeua, finalizado em 2006, há uma preocupação bastante
evidente para com a questão ambiental no âmbito municipal, conforme se pode verificar nos
objetivos básicos da ordenação do território proposto no plano diretor:
Da ordenação do território
Art. 8° – A ordenação da totalidade do território do município de
Ananindeua tem como referência o macrozoneamento ambiental que
objetiva a permanente elevação da qualidade de vida da sua população e da
preservação ambiental, por meio da articulação e da potencialização das
atividades socioculturais e econômicas desenvolvidas nas suas macrozonas
urbanas e rurais.
Parágrafo único - O macrozoneamento do município tem por objetivo definir
as grandes áreas estratégicas do uso do solo municipal, levando em
consideração a preservação ambiental e o controle da ocupação do
território municipal (ANANINDEUA, 2006a, p. 03, grifos nossos).
Nesse caso, fica bastante clara a ideia de gestão do espaço, no aspecto de sua
preservação ambiental, enquanto um componente da legislação. Em parte, essa preocupação
ambiental se deve ao fato de o Município ser constituído de duas porções distintas, a insular e
a continental.
7
O plano diretor constitui instrumento básico e obrigatório da política de desenvolvimento e expansão urbana,
considerando o território municipal como um todo e sendo parte integrante do processo de planejamento
municipal, a partir da Lei 10. 271 (2001) denominada de Estatuto da Cidade. Por ser um município inserido na
Região Metropolitana de Belém, Ananindeua tem obrigação de realizar o seu plano diretor, conforme disposto
na Lei.
8
De forma geral, a construção de um plano diretor tem 04 (quatro) fases principais: 1) fase de preparação e
metodologia, na qual são escolhidas as metodologias participativas para a elaboração do plano; 2) fase de leitura
da realidade municipal, nesse momento se estabelece o contato com a realidade do município, através da análise
dos dados estatísticos, de fóruns participativos ou de visitas da equipe responsável pela elaboração do plano. E
essa leitura da realidade municipal que dá origem ao relatório de diagnósticos do município; 3) fase de seleção
de temas e propostas, momento de escolha das melhores estratégias e instrumentos de planejamento e gestão
para a resolução / mitigação dos problemas urbanos do município, as escolhas devem ser feitas a partir do
diagnóstico elaborado; e por último a própria promulgação do plano diretor na forma de lei (BRASIL, 2004).
Boletim Amazônico de Geografia, Belém, n. 1, v. 01, p. 105-123, jan./jun. 2014.
114
Abordagens de desenvolvimento e gestão ambiental no planejamento municipal:
concepções e práticas do paradigma ambiental na gestão municipal de
Ananindeua (PA)
DOI: 10.17552/2358-7040/bag.n1v1p105-123
Tiago Veloso dos SANTOS
________________________________________________
A porção insular corresponde a cerca de 33% da extensão territorial de Ananindeua e é
constituída por 12 ilhas, todas cercadas por furos, sendo os mais importantes o do Cotovelo,
Maguari, dos Bragas, das Marinhas, dos Navegantes, Remanso, Bela Vista e Sassunema
(ANANINDEUA, 2006, 108). Os Furos e Igarapés têm grande importância dentro desse
complexo hidrográfico9. Nas ilhas, como há ainda o predomínio da paisagem natural, fica
mais explicita a questão da preocupação do plano diretor para com a temática ambiental.
Outro elemento importante a ser ressaltado é que a questão ambiental no plano diretor
é, em muito, reflexo das demandas de movimentos sociais do Município que pressionaram no
momento dos debates para a aprovação do plano na câmara municipal. Embora os
movimentos sociais não tenham participado com mais afinco na elaboração do relatório de
diagnósticos do plano diretor na fase de discussão, houve pressão para que a preocupação
com os aspectos ambientais do Município ganhasse mais relevância, a ponto de serem
incluídos vários temas referentes a esses espaços e à garantia de sua sustentabilidade
econômica e cultural. Isso fica especialmente referendado em um plano setorial específico
para as ilhas do Município:
Do plano diretor setorial das Ilhas e do Abacatal
Art.189 – O plano diretor setorial das Ilhas e do Abacatal tem por finalidade
assegurar a proteção e conservação das ilhas e do Abacatal, garantindo a
qualidade de vida para as gerações atuais e futuras. (ANANINDEUA, 2006
(a), p. 60)
E a garantia de um programa específico para incentivar a socioeconomia desses
espaços, de acordo com suas características naturais e recursos ambientais:
Art. 82 – O programa de Incentivo ao turismo deverá ter como diretrizes:
I - garantir a inclusão e o desenvolvimento do ecoturismo no plano diretor
setorial das ilhas (ANANINDEUA, 2006 (a), p. 33)
E, somando-se a isso:
Art. 86 – Para atingir o objetivo deste programa, as seguintes diretrizes
devem ser adotadas:
I - garantir a proteção ambiental dos ecossistemas naturais;
9
“O Furo é um canal, sem correnteza própria, que corta uma ilha fluvial. Liga braços de rios no meio de
planícies à beira de rio com lago de várzea, dois lagos de várzea e um paraná com o rio principal ou uma
depressão de lago de várzea. O igarapé é um riacho pequeno, que, em seu baixo curso, cruza florestas de várzea.
Geralmente os igarapés fluem por túneis de vegetação e apresentam águas escurecidas, devido à quantidade de
sedimentos depositados nos leitos e por receberem pouca luminosidade solar” (Retirado de:
http://www.orm.com.br/tvliberal/revistas/npara/edicao2/hidro/lagose.htm. Acesso em 02/01/2014) .
Boletim Amazônico de Geografia, Belém, n. 1, v. 01, p. 105-123, jan./jun. 2014.
115
Abordagens de desenvolvimento e gestão ambiental no planejamento municipal:
concepções e práticas do paradigma ambiental na gestão municipal de
Ananindeua (PA)
DOI: 10.17552/2358-7040/bag.n1v1p105-123
Tiago Veloso dos SANTOS
________________________________________________
II - enriquecer e manejar os recursos naturais do ecossistema das ilhas de
forma a levar o nível sustentado de seu uso;
III - fiscalizar a exploração predatória dos recursos naturais;
IV - regular e normalizar a exploração de recursos naturais;
V - cadastrar e controlar os empreendimentos desta natureza
(ANANINDEUA, 2006 (a), p. 35)
A gestão do espaço municipal, nesse caso, embora não se trate exclusivamente de área
urbana, posto que as características das ilhas são rurais, ainda que na metrópole, é a
preocupação central de legislação especifica para as ilhas. Aqui, há um elemento de gestão
que parte da temática ambiental como componente fundamental da política urbana municipal.
Com efeito, apesar do pouco espaço dado ao quesito participação na elaboração do
plano diretor de Ananindeua, esta, por conta da pressão e das demandas de movimentos
sociais, passa realmente a colaborar na elaboração do planejamento e na gestão urbana. Nesse
aspecto, é importante ressaltar que aqui a participação social se dá com o Estado, visto que
existem caminhos institucionais que a permitem e a valorizam como componente do
planejamento. Mas, ao mesmo tempo, a participação é realizada contra o Estado, visto que ela
só passa a ser realmente reconhecida nas práticas de planejamento no momento em que o
Estado (e, por conseguinte, o governo) é pressionado pelas demandas dos movimentos
sociais.
No caso do plano diretor de Ananindeua, o que ocasionou a incorporação das
demandas do movimento popular foi a pressão exercida sobre os legisladores municipais.
Ainda assim, das cerca de 30 (trinta) propostas elencadas pelo FMRU, somente 13 (treze)
foram incorporadas à redação final do projeto do plano diretor, bem como em sua
promulgação. Conforme relatos e documentação acerca do processo de tramitação do plano
na câmara municipal de Ananindeua, houve forte participação do movimento social
denominado “Fórum Metropolitano da Reforma Urbana (FMRU)”, especialmente do grupo
de trabalho do Município de Ananindeua. Segundo lideranças do próprio FMRU:
O FMRU desde 2005 tem incidido nos debates e discussões sobre o
planejamento urbano de Ananindeua, segunda maior cidade do Pará com
meio milhão de habitantes. Ananindeua saltou de 62 mil habitantes em 1982
a 500 mil nesta década. Ano passado foi elaborado e aprovado o Plano
Diretor de Ananindeua. Apesar da aprovação pelos vereadores, 70% das
propostas contidas no PDA precisam ser feitas por Leis Complementares,
principalmente na parte de regularização fundiária, já que em Ananindeua se
encontram as maiores e mais populosas ocupações do Estado, causadas pela
falta de planejamento territorial (ANANINDEUA, 2009, p. 01).
Boletim Amazônico de Geografia, Belém, n. 1, v. 01, p. 105-123, jan./jun. 2014.
116
Abordagens de desenvolvimento e gestão ambiental no planejamento municipal:
concepções e práticas do paradigma ambiental na gestão municipal de
Ananindeua (PA)
DOI: 10.17552/2358-7040/bag.n1v1p105-123
Tiago Veloso dos SANTOS
________________________________________________
O Fórum chegou a propor um conjunto de emendas ao projeto de lei do Plano Diretor
de Ananindeua, um anteprojeto de lei que colocava em contradição algumas proposições
advindas do relatório de diagnóstico e do próprio projeto de lei proposto pela prefeitura de
Ananindeua. No caso, quando da discussão sobre a aprovação do plano diretor de Ananindeua
pela câmara municipal, algumas emendas trazidas pelo FMRU foram ensejadas no documento
final do plano diretor.
Entretanto, apesar de o plano diretor de Ananindeua avançar no âmbito da participação
social, sua proposta, na condição de plano de desenvolvimento municipal, apresenta uma
grande deficiência dessa abordagem ambiental, que é a sua limitação no que concerne à
dimensão socioespacial metropolitana.
A questão ambiental é colocada no plano diretor apenas como defesa do patrimônio
natural/ambiental de uma área bastante específica do Município (no caso, as ilhas), não se
considerando sua inter-relação com a dinâmica urbana municipal e muito menos
metropolitana. Assim, bem de acordo com uma visão “ambientalista” dos processos
socioespaciais, privilegia as questões naturais em detrimento da problemática metropolitana e
não coloca as questões de acordo com a dimensão de sustentabilidade metropolitana com a
qual poderia ser relacionada.
SISTEMAS DE OBJETOS: A CONSTRUÇÃO DE UMA INSTITUCIONALIDADE E
ESPACIALIDADE URBANA - AMBIENTAL EM TERRITÓRIO MUNICIPAL
Em aspecto institucional, reforçando o caráter da abordagem da gestão ambiental, o
município cria uma verdadeira estrutura para tratar do tema nas diretrizes de gestão. Esse
processo é iniciado ainda no primeiro ano de gestão, com a criação da Secretaria Municipal de
Meio Ambiente (SEMA), em 2005. No mesmo ano, através da Lei 2154/2005, o município
institui uma política própria de meio ambiente, que tem como orientações e competências a
formulação, execução e avaliação da Política Ambiental Municipal, bem como todos os
planos, programas, projetos desenvolvidos nessa área (ANANINDEUA, 2006). Há também
preocupação em dotar essas ações e projetos de desenvolvimento urbano e ambiental
municipal de capacidade econômica e orçamentária, para isso estrutura-se um instrumento
especifico no ordenamento institucional, que é denominado de Fundo Municipal de Meio
Ambiente (FMA) de Ananindeua:
Art. 1º - O Fundo Municipal de Meio Ambiente – FMA, instituído através do
Art. 16 da Lei nº 2.154 de 08 de julho de 2005, passará a operar de acordo
com as diretrizes e normas estabelecidas por este Decreto.
Boletim Amazônico de Geografia, Belém, n. 1, v. 01, p. 105-123, jan./jun. 2014.
117
Abordagens de desenvolvimento e gestão ambiental no planejamento municipal:
concepções e práticas do paradigma ambiental na gestão municipal de
Ananindeua (PA)
DOI: 10.17552/2358-7040/bag.n1v1p105-123
Tiago Veloso dos SANTOS
________________________________________________
Art. 2º - O FMA de natureza contábil especial, tem por finalidade apoiar em
caráter suplementar a implementação de projetos ou atividades necessárias à
preservação, conservação, recuperação e controle do meio ambiente para
melhorias da qualidade de vida no Município de Ananindeua.
Art. 3º - O FMA será constituído por: I - Transferências feitas pelos
Governos Federal e Estadual e outras entidades públicas; II - Dotações
orçamentárias específicas do Município; III - Produto resultante de
convênios, contratos, patrocínios e acordos celebrados com entidades
públicas ou privadas nacional e internacionais; IV - Rendas provenientes de
multas por infrações às normas ambientais; V - Rendas provenientes das
taxas de licenciamento ambiental; VI - Doações e quaisquer outros repasses
de bens e direitos, materiais ou imateriais, monetários ou não, efetivados por
pessoas físicas ou jurídicas; VII - Resultado de operações de crédito; VIII Outros recursos, créditos e rendas que lhes possam ser destinados.
Art. 4º - Os recursos do FMA serão alocados de acordo com as diretrizes e
metas do Plano Estratégico e Plano de Ação de Meio Ambiente, aprovado
pelo Conselho Municipal de Meio Ambiente – COMAM (ANANINDEUA,
2006, p. 01-02).
Além do ordenamento jurídico – institucional que legitima no interior da administração as
diretrizes estabelecidas, há de forma concomitante, a construção de uma espacialidade urbanoambiental a partir de algumas experiências localizadas, conforme pode ser visualizado no quadro 01.
A primeira delas é a inauguração de um Parque Ambiental, o primeiro localizado na Região
Metropolitana de Belém, no corredor principal de acesso que corta o município de Ananindeua, a BR316. O Parque Ambiental “Antônio Danúbio” serviu como referência para elementos paisagísticos de
conservação e preservação no município, mobilizando a administração e a população na construção da
imagem ambiental pretendida.
A segunda vem com a construção de espaços educacionais que seguem a diretriz ambiental,
mostrando que esta não é restrita aos setores ambientais da administração, mas sim um elemento
articulador de uma cadeia de ações. Nesse caso, há uma interlocução entre a área ambiental e
educacional, na construção da “Escola Municipal de Ensino Fundamental e Médio José Maria Moraes
e Silva”, considerada modelo de escola ecologicamente correta, demonstrando a possibilidade de
abordagens ambientais estarem presentes em outros espaços da gestão municipal.
Mais recentemente, em agosto de 2012, é inaugurado um outro espaço que segue as diretrizes
da abordagem ambiental da qual o município é objeto, o espaço em questão é o “Museu do Seringal”,
aliando traços da cultura, da história e da natureza amazônica.
Boletim Amazônico de Geografia, Belém, n. 1, v. 01, p. 105-123, jan./jun. 2014.
118
Abordagens de desenvolvimento e gestão ambiental no planejamento municipal: concepções e práticas do paradigma ambiental
na gestão municipal de Ananindeua (PA)
DOI: 10.17552/2358-7040/bag.n1v1p105-123
Tiago Veloso dos SANTOS
________________________________________________
Quadro 01 – Sistemas de objetos urbanos e ambientais
PARQUE AMBIENTAL ANTONIO DANÚBIO: Criado a partir da restauração de antiga área de
vazio urbano e que estava deteriorada na área central do município ao longo da BR – 316, o parque
hoje possui lago que estava a beira do assoreamento, servindo de habitat para um jacaré da espécie
jacaré tinga. É garantida presença de equipe multidisciplinar
em atenção aos visitantes (pedagogos,
119
geógrafos, biólogos e veterinários, além de engenheiros agrônomos e florestais), envolvida no
funcionamento do Parque. A área reproduz plantas frutíferas da região (bacaba, buriti e cupuaçu).
Também por isso, a área do parque se tornou um refúgio para aves e animais terrestres de pequeno
porte, que se alimentam dessas frutas. O espaço é adequado para a realização de todo tipo de atividade.
O Parque é considerado espaço de lazer multiuso, com objetivos de: I - manter o ecossistema natural de
importância regional e local; II - garantir a preservação e a proteção da fauna e da flora ali existentes;
III - promover a utilização dos componentes naturais na educação ambiental, com a finalidade de tornar
a comunidade parceira na conservação do patrimônio natural do município; IV - proporcionar à
população condições de exercer atividades culturais, educativas, recreativas e de lazer em um ambiente
natural equilibrado.
MUSEU PARQUE SERINGAL: Primeiro museu do município de Ananindeua, Região
Metropolitana de Belém, o espaço foi incluído no Cadastro Nacional de Museus pelo Instituto
Brasileiro de Museus (IBRAM) do Ministério da Cultura, além de já constar no Cadastro Nacional de
Unidades de Conservação (CNUC) do Ministério do Meio Ambiente. Agora, como
Museu Parque Seringal de Ananindeua, a unidade classificada como de relevante interesse ecológico, é
voltada para o lazer, preservação e educação ambiental, contando com reservas de exemplares de
seringueiras, cultivadas no período do Ciclo da Borracha, além de anfiteatro, academia de ginástica ao
ar livre, lanchonete, playground e outros espaços com visitação gratuita. Alia aspectos históricos,
culturais e naturais da região amazônica, configurando um espaço multidisciplinar.
Boletim Amazônico de Geografia, Belém, n. 1, v. 01, p. 105-123, jan./jun. 2014.
Abordagens de desenvolvimento e gestão ambiental no planejamento municipal: concepções e práticas do paradigma ambiental
na gestão municipal de Ananindeua (PA)
DOI: 10.17552/2358-7040/bag.n1v1p105-123
Tiago Veloso dos SANTOS
________________________________________________
ESCOLA MODELO: A Escola Municipal de Ensino Fundamental e Médio José Maria Moraes e
Silva, foi projetada em termos arquitetônicos como modelo de escola ecologicamente correta. O prédio
possui oito salas e tem como funções utilizar em seu pátio teto transparente para aproveitamento de
iluminação natural e água da chuva, que é reaproveitada
120para consumo na limpeza do ambiente. A
escola foi projeto conjunto das Secretaria Municipal de Educação e de Meio Ambiente de Ananindeua.
Com intuito de articular esse espaço como modelo de inovações de um novo conceito escolar. “Vamos
poder mostrar para os alunos na prática como deve ser feito o reaproveitamento e a preservação da
natureza”. Ainda para ela, a escola terá o ensino educacional sistêmico que irá envolver os alunos e
seus familiares. “A escola consolida tudo que o prefeito vem fazendo pelo ensino do município”
(ANANINDEUA, 2011).
Fontes: Ananindeua (2006a, 2006b, 2011, 2012; Jornal “Diário do Pará”; Portal da Prefeitura Municipal de Ananindeua – várias inserções – ano base 2013).
Organização: Tiago Veloso dos Santos
Boletim Amazônico de Geografia, Belém, n. 1, v. 01, p. 105-123, jan./jun. 2014.
Abordagens de desenvolvimento e gestão ambiental no planejamento municipal:
concepções e práticas do paradigma ambiental na gestão municipal de
Ananindeua (PA)
DOI: 10.17552/2358-7040/bag.n1v1p105-123
Tiago Veloso dos SANTOS
________________________________________________
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O contexto do processo de redemocratização, em meados da década de 1980, permitiu
novas formas de se pensar a realidade urbana brasileira e trouxe um novo marco regulatório
das políticas urbanas, via promulgação da nova Constituição em 1988. A legislação instituída
para tratar da política urbana propiciou à esfera municipal de governo a primazia da
elaboração da política territorial enquanto responsável pelo ordenamento urbano nacional. O
instrumento maior de promoção de ordenamento territorial urbano não foge a esse contexto. O
plano diretor, nesse sentido, é o instrumento básico da política de expansão, planejamento e
desenvolvimento urbano.
É nesse contexto que se colocam as novas diretrizes de planejamento e
desenvolvimento urbano em escala local, especialmente os município no caso brasileiro, que
refletem a importância do entendimento do referencial político – filosófico – ideológico que
inspira a construção destes instrumentos de planejamento do desenvolvimento, considerando
que para além das atribuições técnicas, são as escolhas das abordagens e diretrizes que irão
condicionar o tipo de desenvolvimento urbano expresso e que será mais ou menos seguido
pela gestão urbana.
Nesse sentido, há um processo de difusão de agendas e programas de desenvolvimento
urbano na estruturação de concepções e práticas de gestão local. Analisando as cidades
amazônicas pelo estudo de caso do município de Ananindeua, é possível reconhecer uma
dessas abordagens de desenvolvimento, e como ela ocorre na escala local, notadamente a
influência da abordagem ambiental na condução das políticas públicas em plano local.
Estruturado em torno da contribuição de Souza (1998; 2000) e Santos (2004), e
utilizando uma abordagem de pesquisa qualitativa com análise documental e dados primários
provenientes de instituições de planejamento envolvidas no processo de difusão da agenda
urbana na Amazônia e da Prefeitura Municipal de Ananindeua, verificamos que em
Ananindeua, houve a partir do inicio da gestão municipal que durou o período de 2005-2012
uma intensa adoção de uma abordagem de desenvolvimento e planejamento urbano em
âmbito municipal inspirada a partir da consideração do meio ambiente e da sustentabilidade
ambiental.
Assim, a partir da diretriz adotada, houve uma verdadeira composição de um sistema
de objetos e ações na gestão municipal, que orientou um conjunto de decisões, instituições,
Boletim de Geografia da Amazônia, Belém, n. 1, v. 01, p. 105-123, jan./jun. 2014.
121
Abordagens de desenvolvimento e gestão ambiental no planejamento municipal:
concepções e práticas do paradigma ambiental na gestão municipal de
Ananindeua (PA)
DOI: 10.17552/2358-7040/bag.n1v1p105-123
Tiago Veloso dos SANTOS
________________________________________________
normas e símbolos, que a partir da utilização pela gestão de instrumentos de planejamento do
desenvolvimento do espaço urbano municipal, identifica uma abordagem especifica na
condução da diretriz de desenvolvimento urbano no processo de elaboração desses
instrumentos.
Do ponto de vista das decisões, a orientação é bastante clara em tornar o
desenvolvimento urbano municipal a partir da orientação do melhor aproveitamento e
conservação do meio ambiente, e pode ser visualizado a partir de três elementos principais
que conduzem o fio da meada da gestão: 1) a normatização de instrumentos de planejamento
com enfoque ambiental; 2) a institucionalização de instâncias administrativas ambientais; 3) a
utilização de um conjunto de símbolos prático-sensíveis e concretos para fortalecimento da
imagem ambiental da gestão pretendida. Interpretamos esses elementos a partir da
constituição de um sistema de objetos e ações que orientam a gestão e procuramos analisar
cada um deles.
Nesse caso, Já na elaboração do plano diretor de Ananindeua, a abordagem de
desenvolvimento urbano que se destaca é mais ligada à temática ambiental, com influência da
perspectiva de desenvolvimento urbano sustentável. Essa diretriz é espraiada para outras
esferas da administração, conduzindo toda a administração em torno desse programa de
conservação e preservação ambiental, o que leva a constituição de um verdadeiro sistema de
objetos e ações para a condução destas políticas, que se materializam no espaço urbano
municipal de diferentes formas, seja no aspecto simbólico, normativo, institucional e no
ordenamento de uma verdadeira espacialidade que reflete essas políticas adotadas.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ANANINDEUA. Lei nº 2.154. Política Municipal de Meio Ambiente de Ananindeua. 2005(a).
______. Lei nº 2.147. Secretaria Municipal de Desenvolvimento de Meio Ambiente de
Ananindeua. 2005(b).
______. Relatório de Diagnósticos do Plano Diretor de Ananindeua. 2006(a).
______. Lei nº 2.237. Plano Diretor de Ananindeua. 2006(b).
______. Fórum Metropolitano da Reforma Urbana. Propostas ao Plano Diretor de
Ananindeua, 2006(c).
______. Lei nº 2.231. Secretaria Municipal de Agronegócios e Meio Ambiente de
Ananindeua. 2006(d).
______. Decreto nº 5.523. Fundo Municipal de Meio Ambiente (FMA) de Ananindeua.
2006(e).
______. Lei Nº 2381. 2009.
Boletim de Geografia da Amazônia, Belém, n. 1, v. 01, p. 105-123, jan./jun. 2014.
122
Abordagens de desenvolvimento e gestão ambiental no planejamento municipal:
concepções e práticas do paradigma ambiental na gestão municipal de
Ananindeua (PA)
DOI: 10.17552/2358-7040/bag.n1v1p105-123
Tiago Veloso dos SANTOS
________________________________________________
______. Lei Complementar nº 2.517. Secretaria Municipal de Meio Ambiente de Ananindeua.
2011.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: Brasília, DF: Senado, 1988.
______. Ministério das Cidades. Planos diretores participativos: guia para elaboração pelos
municípios e cidadãos. Brasil. Brasília, DF, 2004.
CAVALCANTI, A. C. R. A difusão da agenda urbana das agências multilaterais de
desenvolvimento na cidade de Recife. Dissertação (Mestrado), 2008. Recife: Universidade
Federal de Pernambuco, Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Urbano, 2008.
DIÁRIO DO PARÁ. Ananindeua cresce no IDEB e supera metas. Caderno Pará. Jornal
Diário do Pará. Belém. Publicado em 17/08/2012.
GALBRAITH. J. K. O Novo Estado Industrial. São Paulo: Nova Cultural, 1985 (Coleção Os
Economistas).
SANTOS, M. A urbanização brasileira. São Paulo: Edusp, 2004b.
SANTOS JR. O. A. Reforma urbana: por um novo modelo de Planejamento e Gestão das
Cidades. Rio de Janeiro: FASE .UFRJ-IPPUR.
SOUZA, M. L. Desenvolvimento Urbano: a problemática renovação de um conceito
“problema”. Revista Território. N. 5. P. 5-29, 1998.
______. O desafio metropolitano: um estudo sobre a problemática socioespacial nas
metrópoles brasileiras. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2000.
______. Mudar a cidade: uma introdução crítica ao Planejamento e à Gestão Urbanos. Rio de
Janeiro: Bertrand Brasil, 2002.
RIBEIRO, L. C. Q. A (In) Governabilidade da Cidade? Avanços e Desafios da Reforma
Urbana. In: VALADARES, L; COELHO, M. P. (Org.). Governabilidade e pobreza no Brasil.
Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1995.
RODRIGUES, E. J. Banidos da Cidade e unidos na condição: Cidade Nova: espelho da
segregação social em Belém. Dissertação (Mestrado). Núcleo de Altos Estudos Amazônicos,
Universidade Federal do Pará: Belém, 1998.
TRINDADE JR, S. C. A cidade dispersa: os novos espaços de assentamentos em Belém e a
reestruturação metropolitana. 1998. metropolitana. 1998. Tese (Doutorado) – Faculdade de
Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo.
______. Malhas socioespaciais e desafios da gestão metropolitana no Brasil: reflexões a
partir da Região Metropolitana de Belém (RMB). Apresentação oral no X Simpósio Nacional
de Geografia Urbana, Manaus, 2005. IX Simpósio Nacional de Geografia Urbana. Manaus,
2005.
VELOSO, T. Fronteiras de papel: análise da perspectiva metropolitana em planos diretores
da Região Metropolitana de Belém. Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal do Pará,
Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Programa de Pós-Graduação em Geografia, Belém,
2010, 157 p.
Artigo Recebido em: 20 de abril de 2014.
Artigo Aprovado em: 14 de julho de 2014.
Boletim de Geografia da Amazônia, Belém, n. 1, v. 01, p. 105-123, jan./jun. 2014.
123
Download