0 FACULDADE DE MEDICINA VETERINÁRIA Programa de Pós Graduação em Clínica e Reprodução Animal INGRID CATARINA MARTINS CAVALCANTE A PERCEPÇÃO DO PROPRIETÁRIO EM RELAÇÃO À QUALIDADE DE VIDA DE CÃES COM DEFICIÊNCIA VISUAL Rio de Janeiro, 2014 1 INGRID CATARINA MARTINS CAVALCANTE A PERCEPÇÃO DO PROPRIETÁRIO EM RELAÇÃO À QUALIDADE DE VIDA DE CÃES COM DEFICIÊNCIA VISUAL Dissertação apresentada ao Programa de Pós Graduação em Medicina Veterinária, da Universidade Federal Fluminense como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre. Área de concentração: Clínica e Reprodução Animal. ORIENTADORA: PROF.ª DR.ª RITA LEAL PAIXÃO RIO DE JANEIRO 2014 2 INGRID CATARINA MARTINS CAVALCANTE A PERCEPÇÃO DO PROPRIETÁRIO EM RELAÇÃO À QUALIDADE DE VIDA DE CÃES COM DEFICIÊNCIA VISUAL Dissertação apresentada ao Programa de Pós Graduação em Medicina Veterinária, da Universidade Federal Fluminense como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre. Área de concentração: Clínica e Reprodução Animal. Apresentada em 14 de fevereiro de 2014. BANCA EXAMINADORA PROF.ª DR.ª ANA SOARES - UFF PROF. DR. JONIMAR PEREIRA PAIVA- UFRRJ PROF.ª DR.ª RITA LEAL PAIXÃO – UFF NITERÓI 2014 3 Dedico esta dissertação e grande parte da minha vida, à medicina veterinária, esta ciência linda que une seres vivos independente de espécie ou evolução cerebral, que comunicação faz mais do olhar eficiente a com nossos pacientes e do abanar de um rabo a recompensa mais desejada depois de muito trabalho. 4 AGRADECIMENTOS A minha orientadora Professora Doutora Rita leal Paixão por sua generosidade com o ensino, por acreditar e motivar meus projetos, uma profissional ética, comprometida e incrivelmente competente, uma mulher admirável com tantas funções e atributos. A Universidade Federal Fluminense pela oportunidade de compartilhar de seus grandes e generosos mestres, a professora Nádia Almosny, ao professor Walter Lilenbaum, e ao professor Zander. Cada ensinamento constrói o profissional, mas principalmente o ser humano. Ao meu marido João Victor por entender tantas ausências, por ser um grande motivador e a pessoa que melhor representa o sentido de companheiro. Aos meus pais Catarina e Herbert por serem o grande pilar da minha vida, um porto seguro, a motivação, a compreensão, essência da minha personalidade. A minha querida irmã por todo amor incondicional, por sempre vibrar junto. A todos os animais que passaram por minha vida profissional e pessoal, que me deixaram ensinamentos que humano algum seria capaz de dar, mas em especial á Dino por ouvir todos os meus ensaios de aulas, e por ter passado todo o período de desenvolvimento deste trabalho deitado em meus pés. Desde criança, a fragilidade dos animais me comove, eu me sentia responsável pela proteção, queria cuidar de cada cachorro magrelo, a veterinária já morava em mim.... Hoje o exercício de minha profissão me faz muito feliz e apesar do passar de tanto tempo ainda tenho o mesmo sentimento de proteção e comoção em relação a todos os animais... Obrigada a todos que tornam esta felicidade possível! 5 “Mas é preciso ter manha, É preciso ter graça, É preciso ter sonho sempre. Quem traz na pele essa marca Possui a estranha mania De ter fé na vida.. Mas é preciso ter força É preciso ter raça É preciso ter gana sempre Quem traz no corpo essa marca Mistura a dor e a alegria...” 6 RESUMO O interesse pela qualidade de vida dos animais de companhia vem aumentando nas ultimas décadas, principalmente no caso daqueles que convivem com doenças crônicas, que geram limitações para o animal, e que trazem alterações na rotina de seus responsáveis. A perda da função visual é uma condição limitante importante, uma vez que a visão é considerada grande promotora da integração do individuo, sua perda diminui a capacidade de adaptação ao ambiente. Até o momento a literatura veterinária é escassa neste âmbito. A partir deste contexto, o presente trabalho procurou compreender a percepção da qualidade de vida por parte dos proprietários de cães com deficiência visual. Neste estudo 61,29% classificaram seus animais com qualidade de vida boa ou muito boa, no entanto quando questionados sobre o estado atual em relação ao período anterior à deficiência visual, 51,62% disseram que os animais estavam piores ou muito piores, o que sinaliza a percepção por parte dos proprietários, de um decréscimo na qualidade de vida destes animais. Constatou-se também uma parcela considerável de animais inativos e com baixa oportunidade para passeios e brincadeiras. A concepção dos responsáveis pelos cães, é de grande valor já que a maneira como os mesmos interferem na rotina do animal, pode trazer benefícios ou prejuízos. Conhecendo esta percepção, o médico veterinário poderá orientar adequadamente promovendo melhorias na qualidade de vida destes animais. PALAVRAS-CHAVE: Qualidade de vida, cães, deficiência visual, percepção do proprietário. 7 ABSTRACT The interest about the quality of life for companion animals has increased in recent decades, especially for those who live with chronic diseases, that lead to limitations to the animal, and bring changes in the routine of their guardians. The loss of visual function is an important limiting condition, since the vision is considered great promoter of the integration of the individual, their loss diminishes the ability to adapt in society. By the time the veterinary literature is sparse in this area. From this context, the present study sought to understand the perception of quality of life for the owners of dogs with visual disabilities. In this study 61,29% rated their animals life quality with good or very good life, however when asked about the current state compared to the previous period to visual impairment, 51,62% said that the animals were worse or much worse, which signals in owners perception, a decrease in the quality of life of these animals. It was found also a considerable portion of inactive animals and with low opportunity for rides and games. The conception of the dogs owners, is great valuable as the way they interfere in the routine of the animal, can bring benefits or harm. Knowing this perception, the veterinarian can properly orientate promoting improvements in quality of life of these animals. KEY-WORDS: Quality of life, dogs, visual impairment, owner perception. 8 SUMÁRIO LISTA DE ILUSTRAÇÕES, p. 10 LISTA DE TABELAS, p. 12 1 INTRODUÇÃO, p.13 2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA, p. 14 2.1 Relação Homem x Animal, p.14 2.2 Qualidade de Vida e suas definições, p. 16 2.3 Instrumentos de Avaliação, p.18 2.4 Qualidade de Vida nas Doenças Crônicas, p. 21 2.5 O comportamento, p.22 2.6 O apetite, p.25 2.7 A visão, p.26 2.8 A dor, p.28 3 OBJETIVOS GERAIS, p. 31 3.1 Objetivos Específicos, p. 31 4 MATERIAL E MÉTODO, p. 32 4.1 Critérios de Inclusão e Exclusão, p. 32 4.2 Local, p.33 4.3 Coleta de dados, p.33 4.3.1 Utilizando Questionário, p. 33 4.3.2 Avaliação direta do Animal, p. 33 4.3.2.1 Índice de condição corporal, p. 34 4.3.2.2 Indicadores “Índole” e “Estado de Tranquilidade”, p.36 5 RESULTADOS, p.37 5.1 Perfil dos Animais, p.37 5.2 Perfil dos Proprietários, p.38 5.3 Observações do Pesquisador, p. 40 5.4 Relação Proprietário X Animal, p. 42 5.5 Estado geral em relação à visão, p. 45 5.6 Percepção do Proprietário, p. 49 6 DISCUSSÃO, p. 53 7 CONSIDERAÇÕES FINAIS, p. 61 9 8 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS, p. 63 9 APÊNDICES, p. 70 9.1Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, p. 70 9.2 Questionário, p. 71 10 ANEXOS, p. 78 10.1 Declaração do comitê de ética, p. 78 10 LISTA DE ILUSTRAÇÕES Gráfico 1 – Distribuição dos cães de acordo com o sexo e o estado reprodutivo, f. 37 Gráfico 2 – Disposição dos cães de acordo com a raça, f. 37 Gráfico 3 – Representação dos responsáveis de acordo com o sexo, f. 38 Gráfico 4 – Distribuição dos responsáveis de acordo com o estado civil, f. 38 Gráfico 5 – Disposição dos responsáveis conforme o nível de escolaridade, f. 39 Gráfico 6 - Representação do tipo domiciliar habitado pelos cães, f. 39 Gráfico 7 – Disposição das famílias segundo o número de componentes, f. 40 Gráfico 8 - Escore corporal dos cães segundo a escala de Laflamme, f. 40 Gráfico 9 – Avaliação dos cães através dos indicadores índole e estado de tranquilidade, f. 41 Gráfico 10 – Disposição dos animais de acordo com o acesso as dependências internas da casa, f. 42 Gráfico 11 – Representação dos cães avaliados em relação ao tipo de dieta oferecida, f. 42 Gráfico 12 – Distribuição dos cães segundo a frequência anual de visitas ao veterinário, f. 43 Gráfico 13 – Representação da frequência de passeios e brincadeiras na rotina dos animais avaliados, f. 44 Gráfico 14 – Disposição dos cães em conformidade com a presença de outros animais no mesmo domicílio, f. 44 Gráfico 15 – Representação do nível de atividade dos cães segundo a classificação de seus responsáveis, f. 45 Gráfico 16 – Percepção dos responsáveis em relação ao apetite dos cães, comparativo ao período anterior do aparecimento dos sinais clínicos da deficiência visual, f. 45 Gráfico 17 – Representação da reação á estímulos dos cães avaliados, em relação ao período anterior dos sinais clínicos de deficiência visual, f. 46 Gráfico 18 – Percepção dos responsáveis em relação à presença de sinais de ansiedade nos cães avaliados, f. 46 11 Gráfico 19 – Representação dos cães avaliados de acordo com o grau de interação atual do animal com pessoas, comporativo ao período anterior ao aparecimento dos sinais de deficiência visual, f. 47 Gráfico 20 – Percepção dos responsáveis em relação a possibilidade do cão de interagir com outros animais, f. 47 Gráfico 21 – Representação da influência da deficiência visual nas atividades desempenhadas pelos cães avaliados, f. 48 Gráfico 22 – Representação da demonstração de incomodo ao tratamento oftálmico, f. 48 Gráfico 23 – Disposição da preocupação com a visão do cão versus o desejo do proprietário em gastar o tempo de cuidados oftálmicos com outras atividades, f. 49 Gráfico 24 – Representação do tempo que os proprietários dedicam aos cuidados com os olhos do cão, f. 50 Gráfico 25 – Representação da avaliação dos responsáveis em relação à QdV atual do cão, f. 50 Gráfico 26 – Distribuição do estado atual dos cães avaliados, em relação ao momento em que o animal ficou cego, f. 51 Gráfico 27 – Representação da frequência de dificuldades para aplicar o tratamento oftálmico por parte dos responsáveis dos cães avaliados, f. 51 Gráfico 28 – Percepção dos responsáveis em relação ao tratamento do ponto de vista financeiro, f. 52 Gráfico 29 – Percepção dos responsáveis segundo a frequência que o animal sente dor em decorrência do problema oftálmico, f. 52 Gráfico 30 – Representação dos ensejos para brincadeira e passeios versus nível de atividade dos cães avaliados, f. 57 Gráfico 31 – Representação da QdV atual do cão versus o estado atual em relação ao momento anterior ao aparecimento dos sinais de deficiência visual, f. 60 Quadro 1 - Índice de condição corporal para caninos, proposta por Laflamme (1997), f. 34 Fig. 1 – Ilustração do escore corporal canino, f. 35 12 LISTA DE TABELAS TABELA 1 - Representação das famílias que possuem crianças ou adolescentes em sua constituição, f. 59 TABELA 2 - Animais classificados por seus proprietários com qualidade de vida má ou muito má, f. 56 TABELA 3 - Cães avaliados que apresentavam glaucoma como causa da deficiência visual, f. 57 TABELA 4 - Cães classificados por seus responsáveis como inaptos para a interação com outros animais, f. 58 TABELA 5 - Animais que não conseguem se alimentar sozinhos, f. 60 13 1 INTRODUÇÃO No decorrer das últimas décadas a relação do homem com seus animais de estimação passou por significativas mudanças, o número de animais nos domicílios aumentou e os laços entre os humanos e os animais domésticos ficaram mais estreitos. O desenvolvimento desta nova relação entre o ser humano e o animal de companhia ocorre em conjunto com uma mudança comportamental da própria sociedade, que passou a ter um menor número de filhos e mais recursos em geral. Uma das características da espécie canina que favorecem o vínculo com o ser humano é a interação social e o uso de mecanismos de comunicação. Portanto a espécie canina e o ser humano se desenvolvem na interação com demais componentes de seu meio ambiente social. Assim, o cão adquiriu um importante papel na sociedade contemporânea, sendo foco de fortes vínculos afetivos. (ALTHAUSEN, 2006). Neste cenário a medicina veterinária também vem se modificando, as pesquisas na área de bem-estar animal trazem à tona a preocupação com a qualidade de vida dos animais, principalmente aqueles que convivem com limitações e doenças crônicas. Com isso faz-se necessário conhecer as implicações causadas pelas enfermidades na rotina dos animais e consequentemente na rotina daqueles que os cercam. Doenças oftálmicas são frequentes na clínica veterinária, podem acometer cães de qualquer raça, idade ou sexo. A visão é considerada à grande promotora da integração do indivíduo em atividades motoras, perceptivas e mentais e a perda da mesma pode provocar marcantes alterações, diminuindo sua capacidade de adaptação na sociedade (LUCAS, et.al, 2003). Apesar dos avanços nas pesquisas de bem-estar animal e na oftalmologia veterinária, constata-se até o momento uma grande lacuna na literatura correlacionando estes dois importantes temas. Esta pesquisa dedicou-se a conhecer a perspectiva do proprietário quanto à qualidade de vida do seu cão portador de deficiência visual. Visto que, apesar do aconselhamento veterinário, este é diretamente responsável por tomadas de decisão, e a melhor orientação poderá promover alterações na rotina dos animais minimizando a perda de qualidade de vida apesar da deficiência visual. 14 2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA As doenças que levam à perda visual nos cães têm papel importante na vida dos humanos. Seja pelo fato de poderem ser estudados como modelo para deficiências humanas, como também por interferirem na rotina dos animais usados como cães de trabalho e de companhia (PETERSON-JONES et. al,. 2006). Conhecer a perspectiva do proprietário quanto à qualidade de vida (QdV) do seu cão é de suma importância visto que, apesar do aconselhamento veterinário, este é diretamente responsável por tomadas de decisão, como por exemplo: se vai iniciar o tratamento, se segue as indicações do seu veterinário, se o tratamento não deve ser continuado ou se deve realizar uma eutanásia (MIGALHAS, 2012). A avaliação de qualidade de vida vem crescendo em importância como medida na verificação de intervenções terapêuticas, de serviços e da prática assistencial cotidiana na área da saúde. Tem sido considerada importante indicador devido ao impacto físico e psicossocial que enfermidades, disfunções ou incapacidades podem acarretar para os indivíduos acometidos. A melhoria da qualidade de vida passou a ser um dos resultados esperados das práticas assistenciais e das políticas públicas para o setor no campo da promoção da saúde (BITTENCOURT, 2004). Esta é uma área de conhecimento recente e ainda pouco explorada no campo da medicina veterinária, onde ainda existem poucas ferramentas e as que existem são, na sua maioria, bastante simples (YEATES, MAIN, 2009), não havendo, nenhum padrão-ouro para a sua avaliação (TAYLOR, MILLS, 2007). 2.1 Relação Homen X Animal Os animais de estimação desempenham inúmeros papéis para o individuo, no círculo familiar ou num contexto social mais amplo, representam uma fonte de apego e afeto. Entre os muitos papéis representados pelos animais estão: cão de caça, guarda, pastores de rebanhos, no trabalho policial, guia de portadores de necessidades especiais e outros papéis, ainda objetos de estudos e discussões (SERPEL, 1993). 15 Segundo Honey Niehaus, diretora da American Animal Hospital Association, sete entre dez americanos pensam em seus animais de estimação como filhos (PONTES, et.al., 2003). De acordo com dados apurados pela Associação Brasileira da Indústria de Produtos para Animais de Estimação (ABINPET), em 2012 a população de animais de estimação em todo o mundo chegou a 1,51 bilhão. Desses, 288,2 milhões estão na China, a primeira colocada. O Brasil é o quarto país no quadro geral desde 2008, com 106,2 milhões de pets, atrás dos Estados Unidos e Reino Unido. No entanto, está em segundo lugar quando se trata de cães e gatos (37,1 milhões e 21,3 milhões respectivamente), somente atrás dos Estados Unidos. (ABINPET, 2012) Os benefícios desta interação para os humanos ocorrem no âmbito psicológico e emocional do indivíduo. A maioria dos proprietários de cães e gatos afirmam que a qualidade de vida melhorou após a introdução dos animais de estimação, sendo observado também, uma diminuição das tensões entre os membros da família (BARVER, 1998). Para os animais, a interação social e o companheirismo parecem estar associados com sentimentos agradáveis, e separação e isolamento são associados a sensações desagradáveis. Juntos, esses fortes sentimentos promovem as relações sociais e, dependendo de qual sentimento está ativado, têm o potencial para aumentar ou diminuir a QdV (MCMILLAN, 2003). Para os animais considera-se adequado o contato humano, que pode ser benéfico durante todas as fases do processo de doenças e deve tornar-se parte da rotina de planos de tratamento em hospitais veterinários (MCMILLAN, 1999). Com esta relação tão estreita no ambiente familiar, ficou ainda mais difícil definir padrões de bem-estar para animais de companhia, por serem frequentemente tratados e interpretados como seres humanos (SOARES, et.al., 2010). Atualmente nos Estados Unidos 72,9 milhões (62% dos domicílios) possuem um animal de estimação, dos quais 46,3 milhões têm um cão e 38,9 milhões tem um gato. Além disso, 52% dos adultos com 62 anos ou mais têm pelo menos um animal de estimação. Com mais da metade dos idosos coabitando com um animal de 16 estimação, pode-se considerar que o animal tem seus benefícios para a população idosa. Os animais podem atuar como terapeutas, catalisadores sociais, e companheiros, podem ajudar a diminuir sentimentos de solidão e depressão, também proporcionam uma sensação de conforto. Idosos proprietários de animais fazem menos visitas a médicos e, se hospitalizados, passam menos dias em um ambiente de cuidados intensivos. (KRAUSE-PARELLO, 2012) O estado de saúde pode limitar a capacidade do animal de obter prazer impossibilitando-o de fazer algo, ou de diminuir a sua qualidade de vida indiretamente, uma vez que trazendo um incomodo ao proprietário, o mesmo pode alterar seu comportamento para com o seu animal (MCMILLAN, 2005). Na prática clinica, uma avaliação da qualidade de vida apresenta grandes benefícios. Esta avaliação poderá despertar nos proprietários aspectos relevantes da qualidade de vida do seu animal, o que poderá resultar numa tentativa de corrigir ou melhorar a rotina dos mesmos. Deste modo uma avaliação da qualidade de vida poderá melhorar o conhecimento do proprietário em relação a certos aspectos da vida do seu animal e levar à uma reflexão acerca dos mesmos, o que poderá resultar na sua melhoria( MCMILLAN, 2003). 2.2 Qualidade de Vida e suas definições Nas últimas três décadas o interesse pelo bem-estar animal aumentou significativamente (PAIXÃO, 2001), um construto complexo que envolve aspectos objetivos e subjetivos das condições de vida dos animais (SCOTT, et. al., 2003). Bem-estar estaria relacionado à capacidade e condição individual de um ser vivo em enfrentar e se posicionar no seu ambiente, incluindo suas atitudes e os sentimentos relacionados a esse enfrentamento. Desta maneira não é o ser humano que fornece bem-estar ao animal, o mesmo é inerente à relação animal habitat. No entanto, o bem-estar de uma espécie pode melhorar em decorrência de algo que lhe foi fornecido, mas este algo não é por si só, bem-estar (BROOM, 1996). Na definição de Hurnik (1992), bem-estar seria o estado de harmonia caracterizado por condições físicas e fisiológicas ótimas. A partir desta definição agrega-se o termo “qualidade de vida” (HOLANDA, 2006). 17 Em humanos qualidade de vida (QdV) é associado à inúmeras condições, envolve o bem espiritual, físico, mental, psicológico e emocional, considera os relacionamentos sociais, família e amigos e também a saúde, educação, habitação, saneamento básico. Nota se que é um termo muito extenso e está intimamente relacionado com bem-estar psicológico, felicidade, satisfação de vida, e contentamento. Também refere-se à quão bem as pessoas desempenham suas funções diariamente e a autoavaliação do bem-estar (FERRAZ,2004). Estes conceitos também estão em debate na literatura médica veterinária, as suas definições para os animais ainda são alvo de muitas discussões. O conceito de qualidade de vida é complexo, subjetivo e várias definições na literatura médica e médica veterinária são encontradas. Contudo, para a maioria dos autores, os fatores que compõem a definição de qualidade de vida têm como base o conceito de saúde: saúde é o completo bem-estar físico, mental e social e não meramente a ausência da enfermidade (MCMILLAN, 2003). A saúde pode influenciar a qualidade de vida de diferentes modos, o desconforto causado pelas doenças contribui para sensações desagradáveis em pessoas ou animais em toda sua experiência de vida (MCMILLAN, 2003). A expressão qualidade de vida vem se difundindo e atualmente esta sendo amplamente utilizada em relação aos sentimentos e as emoções, relações pessoais, eventos profissionais, propagandas da mídia, política de saúde, atividades de apoio social, entre outros. Já na perspectiva científica, apresenta numerosos significados na literatura médica (GIL, 1994; PEREIRA et. al., 2006 apud LOURES et. al., 2007). McMillan (2000) define o conceito de qualidade de vida para animais como a ausência ou a presença mínima de desconfortos físicos (náusea, retenção urinária, prurido, dor, tosse, dispnéia) e emocionais (medo, ansiedade, solidão, frustrações). O conceito de bem-estar animal relaciona-se ainda, a outros parâmetros como necessidades, liberdade, felicidade, competição, controle, sensações, sofrimento, dor, ansiedade, medo, estresse, saúde, tédio (BROOM, 1996). As sensações subjetivas de um animal não podem ser desconsideradas, uma vez que são parte integrante da complexidade dos aspectos que envolvem o seu bem-estar (BROOM, 1991). 18 Portanto, avaliar ou medir qualidade de vida é uma tarefa complexa, considerando que até o momento não existe uma definição consensual do seu significado. Além disso, a construção do termo, sofre a influência das expectativas pessoais que os autores estabelecem para as suas vidas, contribuindo para a subjetividade da definição (BANDEIRA,2005 apud LOURES, et. al.,2007). Logo, qualidade de vida é um construto subjetivo que envolve a autopercepção, compõese de múltiplas dimensões positivas, negativas e bidirecionais, como função física e bem-estar emocional e social (DIAS, 2002 apud LOURES, et. al., 2007). Mesmo com as várias propostas de conceito de bem-estar animal, atualmente categorizadas em duas correntes – a escola do funcionamento biológico e a escola dos sentimentos –, existe um consenso sobre a necessidade de se incorporar três questões centrais, como explana Molento, (2007, p. 225): O animal é capaz de apresentar crescimento e funcionamento orgânico normais, boa saúde e manutenção de uma adaptação adequada ao meio na vida adulta? – esfera física do bem-estar; o animal vive em um ambiente consistente com aquele no qual a espécie evoluiu e se adaptou? – esfera comportamental; o animal vive com uma sensação de satisfação mental ou, pelo menos, livre de estresse mental? – esfera mental. A avaliação da qualidade de vida assumiu grande importância nos setores de saúde humana e veterinária, apesar de até o momento não apresentarmos um método padrão-ouro para sua medida (TAYLORS, MILLS, 2007), e a definição do termo ser alvo de debates, sua relevância é inquestionável na avaliação de tratamentos, decisões e principalmente do paciente (LEAL, 2008). 2.3 Instrumentos de Avaliação Os instrumentos de avaliação de qualidade de vida se tornaram cada vez mais importantes na avaliação dos impactos de tratamentos e percepções do paciente, permitem conhecer o efeito de uma doença sobre a vida do indivíduo, avaliar suas disfunções, seus desconfortos físicos e emocionais, contribuindo na decisão, planejamento e avaliação de determinados tipos de tratamentos (LEAL, 2008). Estudos realizados com crianças apresentando deficiência visual, demonstram 19 comprometimento da qualidade de vida, prejuízos emocionais e dependência para a realização das tarefas cotidianas. Pessoas com doenças oculares podem se mostrar mais retraídas, pessimistas, intuitivas e inseguras (SCOTT; 1999). Na literatura médica humana são utilizados inúmeros instrumentos para a avaliação da qualidade de vida. Tanto genéricos, que podem ser aplicados a várias situações, como o Sickness Impact Profile (SIP), o SF 36, e o WHOQOL (World Health Organization Quality of Life), quanto específicos, utilizados para determinada doença ou situação. Na avaliação da qualidade de vida de deficientes visuais, alguns instrumentos foram concebidos para a avaliação de doenças oculares, como o Activities of Daily Vision Scale (ADVS), o Vision Function Questionnaire (VFQ), e o Low Vision Quality-of-Life Questionnaire (LVQOL). (BITTENCOURT, HOEHNE, 2006) Os instrumentos podem ser classificados em genéricos e específicos, os genéricos são multidimensionais, através deles pode se mensurar diversos aspectos como capacidade funcional, aspectos físicos, dor, estado geral de saúde, vitalidade, aspectos sociais, emocionais e saúde mental. Podem ser aplicados em diferentes doenças, intervenções médicas, tratamentos e em culturas e lugares distintos (AGUIAR et. al., 2008). Já os instrumentos específicos, avaliam diversos aspectos quanto à percepção geral da qualidade de vida, sua ênfase é sobre os sintomas, incapacidades ou limitações (LEAL, 2008; AGUIAR et.al., 2008). Logo, determinados estudos necessitam de modelos adequados, condizentes com a população que será avaliada, sendo necessária a construção de instrumentos específicos. Os questionários são os instrumentos utilizados em grande parte das avaliações da qualidade de vida, compreendem um número de itens ou questões, reunidos sob senso comum, chamado de domínio. Um domínio refere-se à área do comportamento ou experiência que se está tentando avaliar (PONTES et. al.,2003). Ao construir um instrumento, de acordo com a psicometria, deve - se enunciar as propriedades características do construto que será avaliado, com base nestas propriedades são definidos comportamentos observáveis que as representam, estes por sua vez, darão origem aos possíveis itens do instrumento de medida (BRAGA, CRUZ, 2006). Desta forma o detalhe da avaliação de cada parâmetro depende do estudo em questão (CHRISTIANSEN, FORKMAN, 2007). 20 Em sua explanação sobre a construção dos construtos Silva, Filho (2006, p.94), elucidam: O que a ciência entende por sensação é um construto, uma concepção baseada em operações objetivas de estimulação e reação. Um construto é um conceito científico, teoricamente embasado, desenvolvido ou construído para descrever ou explicar um comportamento. Nós não podemos ver, ouvir ou tocar os construtos, mas nós podemos inferir sua existência a partir do comportamento manifesto. O comportamento manifesto ao qual os autores se referem pode ser observado através de uma ação ou do produto de uma ação, inclusive através das respostas dadas em um questionário ou teste (SILVA, FILHO, 2006). Em muitos questionários humanos, o padrão-ouro de medida é o autorelato, mas em situações onde o autorelato não é possível (por exemplo, crianças) os instrumentos são realizados por um observador (o tutor ou responsável) que conhece bem o avaliado.(REID; et. al. 2013) Na medicina veterinária, a limitação da incapacidade de comunicação direta com os pacientes, obriga a que esta avaliação seja feita por um terceiro, alguém que está habituado com a personalidade do cão, seu comportamento e rotina diária, o chamado Proxy. Na clínica de pequenos animais, o veterinário tem o proprietário e/ou cuidador do animal como um grande aliado na avaliação das alterações comportamentais, já que estas podem ser graduais e somente perceptíveis a pessoas familiarizadas com o comportamento normal do animal (MIGALHAS, 2012). Cada vez mais, os cientistas veterinários consideram o desenvolvimento de instrumentos para medir a QdV em animais de companhia (YAZBEK, FANTONI, 2005). Estes consistem geralmente de perguntas para o proprietário dos animais, que estão aptos para perceber as mudanças no comportamento e atitudes. O GUVQuest, primeiro instrumento desenvolvido para uso em animais, mede a dor crônica em cães através de seu efeito sobre a QdV (WISEMAN - ORR et al., 2004) . Este instrumento foi validado em cães com condições dolorosas, como a doença articular degenerativa, e em condições não dolorosas como o linfoma (WISEMAN-ORR, 2006). Além disso, uma versão do GUVQuest mostrou que a QdV é reduzida em cães obesos e que melhora após a perda de peso. Assim GUVQuest funciona como um instrumento genérico . 21 2.4 Qualidade de Vida nas Doenças Crônicas A avaliação da qualidade de vida assumiu grande importância nos setores de saúde humana e veterinária (TAYLORS, MILLS, 2007). Em estudo realizado por Oyama, et.al (2008) a qualidade de vida foi indicada por proprietários de cães com doença cardíaca como mais importante que a longevidade destes pacientes. Uma das razões para o rápido desenvolvimento da avaliação da QdV nos cuidados de saúde é o crescimento e reconhecimento da importância dos impactos das intervenções médicas na vida dos pacientes. Particularmente mais importante em pacientes crônicos ou portadores de doenças sem expectativa de cura, os profissionais de saúde passaram a ver a qualidade de vida como a “chave” para o sucesso do tratamento (ADDINGTON-HALL, KALRA, 2001). Em estudo com cães com linfoma durante quimioterapia, observou se que a maior parte dos proprietários (68%) classificou como boa a qualidade de vida dos animais e nenhum considerou a mesma pobre durante o período do tratamento, apesar de 52% ter apresentado algum efeito colateral (MELLANBY, et.al, 2003). Na avaliação de cães paraplégicos utilizando “carrinhos” próprios para locomoção, uma condição que muitas vezes traz complicações como incontinência urinária, lesões de decúbito, entre outras, a percepção dos responsáveis foi avaliada através de questionários e revelou que muitos consideram que seus cães tinham uma boa QdV e que o esforço envolvido nos cuidados do cão “valem à pena”, não havendo um grande impacto sobre a qualidade de vida do proprietário. (BAUER et. al., 1992). Já na avaliação de fatores que afetam as decisões sobre o tratamento de gatos com câncer, o desempenho de atividades como comer, brincar, e se higienizar foram apontadas com alto grau de relevância para os proprietários. A perda da qualidade de vida foi o primeiro fator responsável pela decisão da eutanásia (SLATER, et.al., 1996). Os indicadores apetite, brincadeira, interatividade e nível de atividade foram os mais mencionados por 36 responsáveis de gatos, em relação à percepção da QdV de seus animais (TZANNES, 2008). McMillan (2003) ressalta que a decisão da eutanásia pelo proprietário é baseada, na maioria das vezes, na qualidade de vida do animal. 22 2.5 O Comportamento Um fator limitante na pesquisa de comportamento canino é o fato da literatura ser fracamente baseada em estudos científicos, dificultando a separação dos fatos dentre as opiniões. Contudo, mesmo não havendo uma comunicação direta sobre seus sentimentos e desejos, o estudo do comportamento animal, permite uma avaliação fidedigna do seu bem-estar (BEAVER, 2001). Os problemas comportamentais podem ter relação com a presença de dor. Agressão induzida por dor é o problema primário em aproximadamente 2-3% dos casos de agressão (BEAVER, 2001), as causas comportamentais e abandonos em abrigos levam mais a eutanásia em cães e gatos, do que todas as causas médicas combinadas (LANDSBERG, HUNTHAUSEN, ACKERMAN, 2005). As principais alterações comportamentais encontradas em cães e gatos com dor são alterações de personalidade ou atitude, vocalização especialmente quando manipulado na região dolorida; automutilação; alterações na aparência principalmente na higiene do pelame; alterações na postura e deambulação (YAZBEK, 2008). O estresse gera sensações físicas e mentais, entre elas a ansiedade; ocorre uma sobrecarga nos sistemas de controle do indivíduo, que pode reduzir a sua adaptação. Vários sistemas orgânicos são afetados simultaneamente. Algumas alterações comportamentais e sinais clínicos relacionadas ao estresse são: medo, agitação, excitabilidade, depressão, reclusão, isolamento, mudanças nas preferências e hábitos, alterações no apetite, agressividade, febre, vômito, convulsão, úlcera gástrica, choque psicogênico e catatonia (MOLONE, BROOM, 2004). Por outro lado, o tédio ocorre quando há escassez de estímulos ambientais, também desencadeando alterações comportamentais (LANDSBERG, HUNTHAUSEN, ACKERMAN, 2005), que podem levar à estereotipias, por vezes associadas à ansiedade de separação, comprometendo o bem-estar(SOARES, TELHADO, PAIXÃO, 2007). A vocalização expressa um estado psicológico individual, podendo ser considerada um marcador de qualidade de vida. Isolamento e diminuição da 23 interação com o grupo, anorexia, dormir demais, são também comportamentos indicativos de estresse e dor (MCMILLAN, 2003). Observar o comportamento canino é um dos mais fáceis e não invasivos indicadores de bem-estar; fornece informações sobre as necessidades, preferências, e o estado interno do animal, mudanças podem estar diretamente ligadas à perda de qualidade de vida (YAZBEK, 2008). A avaliação do comportamento possui grande relevância, as informações sobre seus sentimentos consequentemente demostram informações sobre o seu bemestar. Alguns comportamentos anormais, como estereotipias e automutilação, ou comportamento excessivamente agressivo indicam que o indivíduo encontra-se em condições de baixo grau de bem-estar (YAZBEK, 2008). Conforme mencionado na pesquisa de Ferreira e Sampaio (2010, p. 23): A avaliação do comportamento é geralmente qualitativa, no que se refere à percepção da presença ou ausência de certo tipo de comportamento. No entanto a normalidade envolve algum grau de variabilidade sendo difícil definir precisamente onde a normalidade termina e anormalidade começa. Assim nos perguntamos: Que padrão de comportamento deve ser considerado: normal ou anormal? Pode se considerar que a constância de um comportamento reativo específico na maioria dos cães, debaixo de condições semelhantes, será uma indicação geral que a resposta observada é considerada normal para aquela situação. Deve-se considerar também se o grau de manifestação da ação executada é apropriado ao propósito biológico e ao estímulo. Se a ação for apropriada à resposta, deve ser considerada como comportamento pertinente; se não for, será então classificado como irrelevante ou simplesmente anormal, um comportamento que está em desacordo ao fim a que se visa e/ou excede a resposta padrão em grau, assume a categoria de anormal (FOX, 1968 apud FERREIRA, SAMPAIO; 2010). A observação do comportamento canino, como a postura, a andadura e o movimento dos olhos, pode trazer informações de grande significância. Por exemplo, uma alta mobilidade do olho em sua órbita sugestiona um estado de ansiedade, enquanto uma baixa mobilidade ou mesmo uma posição fixa do olho pode insinuar sofrimento ou aflição intensa (FERREIRA, SAMPAIO, 2010). Conforme explanam Ferreira e Sampaio (2010, p. 26) em sua pesquisa: “O proprietário quando mantém certa proximidade com o seu animal adquire a 24 capacidade de estabelecer de forma empírica, através de suas observações, certos tipos de comportamento manifestados em situações específicas que envolvem estados emocionais e modos de reação”. Alguns comportamentos são importantes para identificação do animal agressivo e intranquilo: agitação e inquietação com atividade motora excessiva; vocalização excessiva; vigilância e excitabilidade aumentadas; nível mais alto de agressão irritável ou possessiva; maior ocorrência de atividades de deslocamento, estereotipias e atividades vazias; comportamento de alta sensibilidade à dinâmica ambiental como para estímulos novos e súbitos ou para situação estranha e pouco conhecida que induzem a sentimentos de medo, pânico ou ansiedade e, consequentemente, a manifestação de reações de agressão, inibição, evitar o contato corporal e isolamento. O animal pode também apresentar atividade motora reduzida, letargia e sinais de frustração e angústia (FERREIRA, SAMPAIO, 2010). Outros comportamentos podem ser observados em certas condições de agressão defensiva, agressão por medo, agressão territorial e agressão por dominância: rosnar, beliscar, morder, bloquear acesso às dependências da casa e comportamento ativo que desencadeie a resposta de medo ou repreensão do proprietário (FERREIRA, SAMPAIO, 2010). Nos cães idosos os problemas comportamentais são mais frequentes, muitos relacionados com a ansiedade e desordens cognitivas. Estes cães são mais propensos a ter problemas como: fobias, ansiedade de separação, transtornos de ansiedade generalizada, ataques de pânico e disfunção cognitiva (HOSKINS, 2004 apud TULHA, 2010). Como explana Akzona et.al (2009, p.90): O envelhecimento é um processo progressivo de acumulações de alterações corporais, associados ou responsáveis pela doença, perda de eficácia das funções fisiológicas e morte. À medida que os animais envelhecem ficam mais sedentários, menos enérgicos, menos curiosos e ativos, diminui a sua predisposição para a brincadeira, têm tendência a dormir muito e quando são perturbados ficam irritadiços, o humor modifica-se e, por vezes, parecem inquietos. 25 2.6 O Apetite Comer e beber são os mais naturais de todos os comportamentos do animal, eles têm o maior efeito sobre a sobrevivência do indivíduo. Fome e sede podem ser considerados estados motivacionais que referem-se a um comportamento básico e primitivo, sendo os dois primeiros fatores das cinco liberdades que fazem parte do código de recomendação de bem-estar animal (BEAVER, 2001). Faz-se necessário diferenciar um cão que quer comer mas não o faz e um cão que não tem nenhum interesse por comida. No primeiro caso deve-se considerar a possibilidade de dor. (BEAVER, 2001) A nutrição está intimamente relacionada à longevidade e a qualidade de vida dos animais de companhia. Entre os fatores de risco relacionados à nutrição, podemos citar idade, alteração do apetite, nível de atividade, achados anormais no exame físico, índice de condição corporal, mudança de peso inexplicável e doenças existentes. Alguns fatores relacionados ao ambiente podem trazer alterações à alimentação: • Alimentador primário do animal. • Esquema alimentar (ex.: local, frequência). • Problemas com múltiplos animais (competição pelo alimento, ameaças). • Outros fornecedores e fontes de alimento. • Enriquecimento ambiental (ex.: brinquedos, outros animais, abrigos, dispositivos para a distribuição de alimento). • Atividade do animal na casa: Tipo (ex.: caminhadas na coleira, no quintal, passeios livres/espontâneos), frequências (vezes por dia/semana), nível de energia. ● Fatores ambientais estressantes (ex.: mudanças recentes na casa, estímulos externos incontroláveis, conflitos por alimento, conflitos entre os animais, etc.). O ambiente tem um impacto direto sobre a nutrição. Em cães, várias alterações clínicas – como a alimentação competitiva, a coprofagia e a obesidade – foram associadas ao ambiente, assim como a fatores relacionados ao animal e à dieta. O fornecimento de alimento através de brinquedos dispensadores pode ser uma opção para melhorar o bem-estar de animais confinados. Logo mudanças nos 26 comedouros podem ser mais importantes do que geralmente se imagina (WSAVA,S/D). O consumo de energia é fundamental para sobrevivência, deste modo sensações poderosas evoluíram para promover o consumo de alimentos. O sabor agradável dos alimentos e a sensação desagradável de fome motivam o consumo adequado e, no ambiente natural, uma alimentação equilibrada. Comer demais pode causar obesidade, o que prejudica QdV aumentando desconfortos, predispondo a problemas de saúde e limitando algumas atividades. (MCMILLAN, 2003) 2.7 A Visão Os graus de visão envolvem uma ampla gama de possibilidades: desde a cegueira total, até a visão perfeita. A ‘deficiência visual’ considera o espectro que vai da cegueira até a visão subnormal. A visão subnormal ou baixa visão, é a alteração da capacidade funcional decorrente de fatores como a diminuição significativa da acuidade visual, redução do campo visual e da sensibilidade aos contrastes e limitação de outras capacidades. A visão é um importante meio de relacionamento do indivíduo com o mundo exterior. Assim como a audição, ela permite organizar, no nível cerebral, as informações trazidas pelos outros órgãos dos sentidos (BATISTA, 2005). Como explanou Batista, (2005, p. 8): Estudos recentes revelam que enxergar não é uma habilidade inata, ou seja, ao nascer ainda não sabemos enxergar: é preciso aprender a ver. Não é um processo consciente. Embora nem pensemos nisso, estamos ensinando um bebê a enxergar, ao carregá-lo no colo e ir mostrando: Olha o gatinho; Onde está seu irmão? A visão é um importante sentido considerado integrador do indivíduo em atividades motoras, perceptivas e mentais (LUCAS, et. al., 2003). Nos cães afeta suas habilidades em atividades de orientação como obediência, caça e corrida, e a perda da mesma pode provocar a diminuição na sua capacidade de adaptação na sociedade. O olho é um habilidoso órgão dos sentidos, a visão exige a participação conjunta de mecanismos físicos, químicos e biológicos. A sua homeostasia e, 27 consequentemente, o seu perfeito funcionamento, leva à formação de imagem compatível com cada espécie, que em condições extremas pode definir a sobrevivência ou não dos indivíduos, bem como a sua qualidade de vida (GELLAT, 1999). A visão constitui um sistema-guia, os cegos precisam recorrer a outros tipos de sistema-guia, alguns, por exemplo, usam como referência o tipo de calçamento das ruas (asfalto, paralelepípedos etc.), ou as curvas e esquinas das ruas de seu trajeto. Outros recorrem a pistas olfativas, ou auditivas (BATISTA, 2005). Como demonstra Batista, (2005, p. 11): A cegueira, ou perda total da visão, pode ser adquirida, ou congênita. O indivíduo que nasce com o sentido da visão, perdendo-o mais tarde, guarda memórias visuais, consegue lembrar-se das imagens, luzes e cores que conheceu e isso é muito útil para sua readaptação. Quem nasce sem a capacidade da visão, por outro lado, jamais pode formar uma memória visual, possuir lembranças visuais. . Em humanos sabe-se que o impacto da deficiência visual (congênita ou adquirida) sobre o desenvolvimento individual e psicológico varia entre os indivíduos, estando correlacionada á uma série de fatores como: a idade em que ocorreu, o grau da deficiência, a dinâmica geral da família, as intervenções que foram tentadas, a personalidade da pessoa (GIL, 2000). Pesquisas recentes demonstram que os olhos são responsáveis por no mínimo 80% das impressões recebidas através da sensibilidade, o mundo em que vivemos se manifesta de forma predominantemente visual (OLIVEIRA, 1998, BATISTA, 2005). 28 2.8 A Dor Nas diferentes áreas da saúde os profissionais aprendem a avaliar e checar as condições de seu paciente através dos sinais vitais; temperatura, pressão arterial, frequência cardíaca e pulsação. Desde os anos 90, o uso da avaliação e mensuração da dor vem assumindo importante papel na rotina dos profissionais de saúde (SILVA, FILHO, 2006). Atualmente diversas escalas para mensuração da dor em populações especiais como neonatos, crianças e pessoas com dificuldades físicas ou cognitivas, são utilizadas. Algumas escalas para neonatos, como a NIPS (Neonatal Infant Pain Scale), utilizam como indicadores a expressão facial, a presença ou ausência de choro ou resmungos, o padrão respiratório, rigidez muscular de braços e pernas e o estado de consciência do bebê (SILVA,FILHO, 2006). A inabilidade em comunicar dor não significa inabilidade em sentir, alguns dos critérios para a avaliação da habilidade dos animais para sentir dor são: resposta ao tratamento analgésico, e ou alteração do comportamento normal (YAZBEK, 2008). Dor é uma sensação extremamente aversiva e a percepção da dor é parte do estado de um indivíduo (BROOM, 1991), definida pela Associação Internacional de Estudos da Dor como “uma sensação desprazerosa e uma experiência emocional associada com um atual ou potencial dano tecidual”, a sensação de dor tem natureza multidimensional e envolve um componente emocional. Dor e estímulos nocivos provocam respostas biológicas que podem ser usadas para avaliar a presença de dor em animais, nos estudos de anestesia (onde os animais estão inconscientes), observa-se que as respostas biológicas a um problema imediato não requerem percepção consciente da dor, mas apenas simplesmente a ativação de vias nociceptivas (WISEMAN-ORR, 2004). Segundo Wiseman-Orr et al. (2004), a dor pode causar alterações comportamentais importantes em cães com dor crônica secundária a doença articular degenerativa, como redução da mobilidade, atividade, apetite, curiosidade, sociabilidade, disposição para brincadeiras e aumento da dependência, agressividade, ansiedade, comportamentos compulsivos, medo, vocalização e mobilidade. A dor crônica em animais de companhia está muito relacionada a problemas ortopédicos, traumas, cirurgias, mas frequentemente, e muitas vezes 29 negligenciada, está associada também a outras condições, como otites, câncer e enfermidades oculares. Não se pode ver a dor, mas percebemos seus efeitos e alguns deles incapacitam para as atividades cotidianas. (SILVA, FILHO, 2006) A avaliação apropriada de seu tratamento, constitui uma ameaça ao bem-estar dos animais, alguns fatores podem reduzir o uso da analgesia: fatores econômicos, incapacidade de reconhecer a presença da dor e o não reconhecimento do significado e importância do alívio da dor para o bem-estar. A magnitude de seu prejuízo ao bemestar pode ser definida pela incidência, severidade e duração do problema. Em 1998, o Colégio Americano dos Anestesiologistas Veterinários (ACVA) publicou a sua posição em relação ao tratamento da dor em animais: “A dor é uma condição clínica importante que prejudica a qualidade de vida, devendo ser obrigatoriamente prevenida e tratada para que o animal mantenha atividades diárias normais, como sono, lazer, alimentação e higiene adequadas e também interação com o proprietário” (YAZBEK, 2008). Como mencionado por Yazbek, (2008, p.1298): A medicina veterinária “esbarra” na dificuldade da quantificação e do reconhecimento da dor crônica, por ser uma experiência individual, é difícil de ser observada e quantificada. Somente o homem tem a habilidade de expressar e quantificar verbalmente a dor, já em animais o reconhecimento é subjetivo e baseado principalmente nas alterações comportamentais. A mesma dificuldade encontrada pelos médicos veterinários para a avaliação da dor nos animais é enfrentada pelos pediatras, enfermeiras e anestesistas durante a avaliação da dor em crianças de zero a dois anos ou adultos impossibilitados de comunicação verbal. Nestes casos, a avaliação do comportamento por familiares e enfermeiras treinadas ainda é a forma mais eficaz de avaliação de dor. Infelizmente em relação à avaliação da dor crônica a literatura veterinária ainda é escassa (YAZBEK, 2008). Após décadas sendo sub tratada, subestimada e muitas vezes ignorada, a dor atualmente é considerada um fator de grande importância em relação à qualidade de vida tanto no homem quanto nos animais (YAZBEK, 2008). Há uma enorme dificuldade para estabelecermos padrões absolutos que julguem as práticas para promoção de bem-estar animal, porém a importância do médico veterinário se torna evidente neste processo, como difusor de conhecimento 30 e promotor de saúde, e consequentemente, de elevação nos padrões de bem-estar animal (SILVANO, et.al., 2010). O bem-estar animal cabe a todas as áreas de atuação da prática profissional da medicina veterinária, não somente à clínica médica e cirúrgica e à produção animal, e deve ser o princípio norteador do exercício da profissão (SILVANO, et.al., 2010). O relatório divulgado pela ONG PDSA (2012), destaca a falha dos proprietários de animais em compreender até mesmo as necessidades básicas dos animais de estimação, problemas comportamentais e relacionados à dieta foram os mais observados. Nesta pesquisa mais de três quartos dos entrevistados achavam que as necessidades básicas dos animais deveriam ser ensinadas nas escolas assim como a capacitação para cuidados preventivos. Peter Jones o presidente da ONG afirma “Entender o que impulsiona os proprietários bem como as suas atitudes, ajudandoos a compreender as questões de bem-estar e de saúde, deve nos ajudar a esclarecer equívocos na consulta e a mudar comportamentos em casa”. 31 3 OBJETIVOS GERAIS Conhecer a percepção dos proprietários em relação à qualidade de vida de cães com deficiência visual e os possíveis pontos críticos resultantes da falta de entendimento sobre o tema. 3.1 Objetivos específicos Observar como o proprietário percebe o seu animal no âmbito da deficiência visual, a partir de um questionário semiaberto. Estabelecer os pontos críticos na rotina dos animais com deficiência visual. Avaliar a condição corporal destes cães, através de inspeção visual, utilizando a classificação de Laflamme (1997). Avaliar a índole e o estado de tranquilidade em animais com deficiência visual, durante o exame clínico. 32 4 MATERIAL E MÉTODOS A pesquisa foi realizada nas seguintes etapas: Planejamento - Nessa fase, foram definidos o objetivo, o tipo de populaçãoalvo, os tipos de itens e o formato do questionário. Essa etapa foi inicialmente sustentada na extensa revisão de literatura realizada a partir de consulta às publicações acerca do tema. Elaboração do questionário - O questionário foi composto por 29 perguntas semiabertas, que abordaram aspectos de diferentes domínios do comportamento animal discutidos na literatura. Categorias de aspecto clínico como tratamento, implicações e dor, e categorias de avaliação geral de bem-estar como comportamento social, estado mental e funcionalidade foram abordadas. A fim de conhecer a percepção dos proprietários de animais com deficiência visual, e os pontos críticos da rotina destes cães na visão dos mesmos. As perguntas foram agrupadas em diferentes domínios: relação proprietário x animal, estado geral em relação à visão, percepção do proprietário, além dos campos de identificação do proprietário e do animal, e das observações do pesquisador. Aspectos éticos da pesquisa – O projeto desta dissertação foi submetido à Comissão de Ética no Uso de Animais (CEUA) e foi aprovado sob o número 470 como consta a declaração em anexo. Tendo sido também, submetido e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP), sob o número 18885713.9.0000.5243. Aplicação do questionário – Durante consulta veterinária em clínica particular, após o preenchimento do termo de consentimento livre e esclarecido. Análise dos dados - Nesta etapa, os dados passaram pela análise estatística descritiva com dispersão de frequência. . 4.1 Critérios de Inclusão e Exclusão ● Critérios de inclusão nesta pesquisa: apenas animais da espécie canina, adultos (acima de 18 meses), independente de sexo ou raça, que apresentavam cegueira total bilateral adquirida. Todos os animais passaram por exame clínico oftalmológico a título de confirmar a deficiência visual. Este exame constituiu-se da observação da região 33 periocular, oftalmoscopia direta para exame da retina e das estruturas do segmento anterior, observação da córnea quanto à transparência, reflexo pupilar direto e consensual, reflexo de ameaça visual em ambos os olhos e observação do animal em sala de exame iluminada e escura, a fim de observar se havia colisão com obstáculos. ● Critérios de exclusão: cães portadores de outras doenças crônicas concomitantes à cegueira que possam afetar a qualidade de vida do animal, foram excluídos desta pesquisa. 4.2 Local Os dados foram coletados em duas clínicas particulares nas cidades de Niterói e Rio de Janeiro. 4.3 Coleta de dados A coleta de dados ocorreu em 2013. Nesta fase, dois tipos de abordagens foram estabelecidas: 4.3.1 Utilizando questionário (Apêndice 9.2.) Preenchido pelo proprietário no momento do atendimento clínico do animal. 4.3.2 Avaliação direta do animal Com o objetivo de classificar seu escore corporal, estado de tranquilidade e índole. Foram empregadas conjuntamente variáveis de caráter fisiológico e comportamental como indicadores na avaliação do bem-estar. A resposta fisiológica foi representada pelos indicadores ‘condição corporal’ e as comportamentais pelos indicadores ‘índole’ e ‘estado de tranquilidade’. respostas 34 4.3.2.1 Índice de Condição Corporal O Índice de Condição Corporal proporciona uma avaliação rápida da condição física geral do animal. Este índice que se baseia em uma classificação corporal usualmente utilizada em clínica de pequenos animais, apresenta nove graduações, sendo as graduações quatro e cinco consideradas para um animal com o peso ideal (Quadro 1). As limitações desse método envolvem a subjetividade inerente ao sistema de classificação e a variação entre os observadores. Quadro 1 Índice de condição corporal para caninos segundo Laflamme. Condição Escore Características 1 Subalimentado 2 3 Ideal 4 5 6 Sobrealimentado 7 8 9 Costelas, vértebras lombares, ossos pélvicos e todas as saliências ósseas visíveis à distância. Não há gordura corporal discernível. Perda evidente de massa muscular Costelas, vértebras lombares e ossos pélvicos facilmente visíveis. Não há gordura palpável. Algumas outras saliências ósseas podem estar visíveis. Perda mínima de massa muscular. Costelas facilmente palpáveis podem estar visíveis sem gordura palpável. Visível o topo das vértebras lombares. Os ossos pélvicos começam a ficar visíveis. Cintura e reentrância abdominal evidentes. Costelas facilmente palpáveis com mínima cobertura de gordura. Vista de cima, a cintura é facilmente observada. Reentrância abdominal evidente. Costelas palpáveis sem excessiva cobertura de gordura. Abdome retraído quando visto de lado. Costelas palpáveis com leve excesso de cobertura de gordura. A cintura é visível quando vista de cima, mas não é acentuada. Reentrância abdominal aparente. Costelas palpáveis com dificuldade; intensa cobertura de gordura. Depósitos de gordura evidentes sobre a área lombar e base da cauda. Ausência de cintura ou apenas visível. A reentrância abdominal pode estar presente. Impossível palpar as costelas situadas sob cobertura de gordura muito densa ou costelas palpáveis somente com pressão acentuada. Pesados depósitos de gordura sobre a área lombar e base da cauda. Cintura inexistente. Não há reentrância abdominal. Poderá existir distensão abdominal evidente. Maciços depósitos de gordura sobre o tórax, espinha e base da cauda. Depósitos de gordura no pescoço e membros. Distensão abdominal evidente. 35 Figura 1: Ilustração do escore corporal canino. Animais Subalimentados (Escores 1 e 3) Condição Corporal Ideal (Escore 5) Animais com Sobrepeso e Obesos (Escore 7 e 9) Fonte: LAFLAMME (1997) 36 4.3.2.2 Indicadores “Índole” e “Estado de Tranquilidade” Os animais foram classificados quanto à “índole” manso ou agressivo, e o “estado de tranquilidade” aonde foram observados comportamentos como vocalização, latidos intermitentes, agitação e movimentos vazios durante o atendimento veterinário, sendo então classificados como tranquilos ou intranquilos. 37 5 RESULTADOS Durante a coleta de dados 34 animais corresponderam ao perfil desejado para participação nesta pesquisa, destes, 30 foram autorizados por seus proprietários, que preencheram o questionário. 5.1 Perfil dos Animais Dos 30 animais participantes, 51,61% (16) eram machos e 48,39% (14) fêmeas, 64,52% (19) inteiros e 35,48% (11) castrados (Gráfico 1). Gráfico 1 – Distribuição dos cães de acordo com o sexo e o estado reprodutivo. 20 15 10 5 0 Inteiros (19) Machos (16) Fêmeas (14) Castrados (11) As raças presentes neste estudo podem ser consultadas no Gráfico 2. Gráfico 2 – Disposição dos cães de acordo com a raça. 38 Apenas um dos entrevistados não soube dizer a idade do animal pois o mesmo tinha sido adotado já adulto. No entanto a avaliação clínica permitiu constatar que se tratava de um cão com mais de cinco anos de idade. Entre os demais a idade variou de 5 a 18 anos, sendo de 11,4 anos a média de idade. 5.2 Perfil dos Proprietários As mulheres 86,67% (26) responderam pela grande maioria dos entrevistados, como demonstra o Gráfico 3. Gráfico 3 – Representação dos responsáveis de acordo com o sexo. Nesta amostra 40% (12) se declararam solteiros, 40% (12) casados e 20% (6) em outros estados civis (Gráfico 4). Gráfico 4 – Distribuição dos responsáveis de acordo com o estado civil. 39 A idade dos responsáveis variou de 24 a 83 anos de idade. Quanto á escolaridade, grande parte dos participantes declarou ter nível superior 66,66% (20), (Gráfico 5). Gráfico 5 – Disposição dos responsáveis conforme o nível de escolaridade. O tipo de habitação predominante foi a casa 73,33% (22), os apartamentos representaram 26,67% (8) do tipo de moradia dos entrevistados. (Gráfico 6). Gráfico 6 – Representação do tipo domiciliar habitado pelos cães. 40 A composição familiar dos participantes pode ser observada no gráfico 7. Gráfico 7 – Disposição das famílias segundo o número de componentes. Uma das famílias apresentava um adolescente, outra família possuía em sua constituição duas crianças, e outras duas famílias tinham uma criança em sua composição familiar. A maior parte dos entrevistados já tinham tido animais antes 93,33 % (28). 5.3 Observações do Pesquisador: O escore corporal dos animais avaliados foi representado no Gráfico 8. Gráfico 8 - Escore corporal dos cães segundo a escala de Laflamme (1997). 41 Quanto à avaliação da índole, 90% (27) dos animais eram mansos e 10% (3) agressivos. Em relação ao estado de tranquilidade, 83,33% (25) eram tranquilos e 16,67% (5) intranquilos (apresentavam algum tipo de inquietação, como vocalização, latidos e/ou movimentos repetitivos) (Gráfico 9). Gráfico 9 – Avaliação dos cães através dos indicadores Índole e Estado de Tranquilidade. O tempo decorrido do diagnostico da deficiência visual, variou entre trinta dias e oito anos. Sendo que quinze animais já estavam cegos há dois anos ou mais. Como causa da cegueira foram encontradas as seguintes enfermidades: atrofia do globo ocular, ceratite pigmentar, catarata unilateral e bilateral, catarata congênita, enucleação, atrofia progressiva de retina, descolamento da retina, glaucoma e ceratite pigmentar. Na maior parte dos casos os animais apresentavam mais de uma patologia ocular concomitante. Dos trinta animais avaliados, quatorze não estavam mais em tratamento no momento da entrevista, entre os demais o tempo de tratamento baseado em colírios e pomadas oftálmicas variou de um mês a um ano. 42 5.4 Relação Proprietário X Animal Dos entrevistados 90% (27) afirmaram que o animal tinha acesso as dependências internas da casa, enquanto 10% (3) responderam que o cão não podia entrar na parte interna do domicílio (Gráfico 10). Gráfico 10 – Disposição dos animais de acordo com o acesso as dependências internas da casa. Em relação ao manejo alimentar a ração predominou entre os avaliados 73,33% (22), 6,66% (2) tinham a comida caseira como dieta e 20,01% (6) dos animais possuíam uma alimentação mista, como demonstra o gráfico 11. Gráfico 11 – Representação dos cães avaliados em relação ao tipo de dieta fornecida pelo responsável. 43 O item frequência de visitas ao veterinário teve um grande índice de respostas em branco; 56,66% (17) não souberam responder quantas vezes por ano levavam seus cães ao veterinário, ou apresentaram respostas evasivas como: sempre que necessário. Dos demais, 30% (9) disseram levar seus cães ao atendimento médico de duas a quatro vezes por ano, 10% (3) mencionaram levar o cão ao veterinário uma vez ao ano, e 3,34% (1) disseram ir com o cão ao atendimento mais de dez vezes ao ano. Estes dados podem ser visualizados no gráfico 12. Gráfico 12 – Distribuição dos cães segundo a frequência anual de visitas ao veterinário. Quando perguntados sobre a oportunidade de brincar com seus cães, 19,35% (6) pessoas responderam nunca brincar, 16,13% (5) mencionaram ser raro, 29,03%(9) apresentavam ensejo para brincar ás vezes, 25,81% (7) tinham oportunidade de brincar frequentemente, 6,45% (2) disseram sempre ter disponibilidade para brincar e 3,23%(1) não responderam a pergunta. Quanto a passear com seu cão, 38,71% (12) dos entrevistados afirmaram nunca passear com seu animal, 22,58% (6) disseram ser raro, 22,58% (7) responderam que passeavam às vezes, 12,9% (4) passeavam frequentemente, e 3,23% (1) disseram passear sempre. O gráfico 13 ilustra o ensejo para passeios e brincadeiras na rotina dos cães. 44 Gráfico 13 – Representação da frequência de passeios e brincadeiras na rotina dos cães avaliados. A maior parte dos animais que participaram desta pesquisa, dividiam seu domicílio com outro animal 76,66% (22), e 23,34% (8) eram os únicos animais aonde residiam (Gráfico 14). Gráfico 14 – Disposição dos cães em conformidade com a presença de outros animais no mesmo domicílio. 45 5.5 Estado geral em relação à visão Dos proprietários que participaram desta pesquisa, 53,33% (16) classificaram seus cães como ativos, 26,66% (8) como inativos e 20,01% (6) muito inativos. O nível de atividade pode ser observado no gráfico 15. Gráfico 15 – Representação do nível de atividade dos cães segundo a classificação de seus responsáveis. Ao serem questionados sobre o apetite de seus animais, em relação ao período anterior ao aparecimento dos sinais clínicos da deficiência visual, 73,33% (22) afirmaram estar normal, para 6,66% (2) a pergunta não se aplica já que o animal nasceu cego ou já foi adotado cego, 3,33% (1) afirmaram que o apetite estava diminuído, 3,33% (1) muito diminuído, 6,66% (2) relataram que o apetite aumentou, e 6,66% (2) disseram que o apetite aumentou muito. (Gráfico 16) Gráfico 16: Percepção dos responsáveis em relação ao apetite dos cães, comparativo ao período anterior do aparecimento dos sinais clínicos de deficiência visual. 46 Quanto a reação à estímulos em relação ao período anterior ao aparecimento dos sintomas: 50% (15) responderam que a resposta à estímulos estava normal, 33,34% (9) mencionaram que a resposta estava diminuída, 10% (3) disseram que a resposta estava muito diminuída, 3,33% (1) resposta aumentada, 3,33% (1) ausência de resposta e 3,33% (1) a resposta não se aplica. (Gráfico 17) Gráfico 17 – Representação da reação á estímulos dos cães avaliados, em relação ao período anterior dos sinais clínicos de deficiência visual. Em relação à ansiedade do cão, por exemplo ao ser deixado sozinho, 63,33% (18) disseram não observar tal comportamento e 36,67% (12) observavam sinais de ansiedade. (Gráfico 18) Gráfico 18 – Percepção dos responsáveis em relação à presença de sinais de ansiedade nos cães avaliados. 47 No gráfico 19, podemos observar o grau de interação atual do animal com as pessoas, em relação ao período anterior ao aparecimento dos sintomas da deficiência visual, 60,02% (17) afirmaram que a interação atual estava normal, 16,66% (6) achavam que o animal interagia pouco, 16,66% (5) declararam que o cão interage muito pouco, 3,33% ( 1) disseram que o cão não interage, e para uma pessoa a pergunta não se aplica já que o animal nasceu cego. Nenhum entrevistado mencionou a opção “interage mais”. Gráfico 19 – Representação dos cães avaliados de acordo com o grau de interação atual com pessoas, comparativo ao período anterior ao aparecimento dos sinais de deficiência visual. Entre os entrevistados 73,33% (21) disseram que o animal tinha condições de interagir com outros animais, e 26,67% (9) achavam que não (Gráfico 20). Gráfico 20 – Percepção dos responsáveis em relação a possibilidade do cão de interagir com outros animais. 48 Em relação á habilidade de alimentar-se sozinho, 93,33% (28) responderam que sim, o cão conseguia comer sozinho, apenas 6,66% (2) mencionaram que o animal não consegue alimentar-se sem auxilio. Dos cães avaliados 73,33% (22) esbarravam em mobílias, pessoas e paredes no seu dia a dia, 26,67% (9) não demonstravam este comportamento. Quanto a tropeçar em degraus ou meio fio, 80% (24) relataram que sim o cão tropeça em degraus, e 20% (6) não apresentavam esta dificuldade. No gráfico 21 pode-se observar a ilustração destes dados. Gráfico 21 – Representação da influência da deficiência visual nas atividades desempenhadas pelos cães avaliados. Ao serem perguntados se o cão demonstrava incomodo ao ser tratado com medicação oftálmica, 40% (12) relataram que nunca, 40% (12) disseram que raramente, 10% (3) frequentemente, e 10% (3) sempre. (Gráfico 22) Gráfico 22 – Representação da demonstração de incomodo ao tratamento oftálmico. Incomodo ao ser tratado Sempre 10% 0 10 20 Frequente mente 10% 49 5.6 Percepção do Proprietário Sobre a preocupação do proprietário com o globo ocular do cão, 74,19% (23) disseram se preocupar sempre, 16,13% (5) se preocupavam frequentemente, 6,45% (2) se preocupavam às vezes, 3,23% (1) disseram nunca se preocupar, e nenhum entrevistado marcou a opção “raramente”. Os proprietários foram questionados se gostariam de gastar este tempo dedicado ao tratamento oftálmico do animal com outras atividades, 63,33% (19) responderam que nunca, 16,68% (5) raramente, 10% (3) responderam que ás vezes, 6,66% (2) frequentemente, para 3,33% (1) a resposta não se aplica. Nenhum dos entrevistados marcou a opção “sempre”. Os dados sobre a preocupação do proprietário com a visão do cão e o desejo de utilizar o tempo dedicado ao tratamento oftálmico com outras atividades, podem ser vistos no gráfico 23. Gráfico 23 – Disposição da preocupação com a visão do cão versus o desejo do proprietário em gastar o tempo de cuidados oftálmicos com outras atividades. 50 O tempo gasto para cuidar dos olhos do animal, foi ilustrado através do gráfico 24. Gráfico 24 – Representação do tempo que os proprietários dedicam aos cuidados com os olhos do cão. Sobre a qualidade de vida atual de seu animal, 43,34% (13) acreditavam ser boa, 16,66% (5) razoável, 20% (6) muito boa, 10% (3) má e 10% (3) muito má. (Gráfico 25) Gráfico 25 – Representação da avaliação dos responsáveis em relação a qualidade de vida atual do cão. 51 Quanto ao estado atual em relação ao momento no qual o cão ficou cego, 43,33% (13) achavam que o animal estava pior, 40% (12) consideraram que o animal estava no mesmo estado, 6,66% (3) classificaram o estado do animal como muito pior, 3,33% (1) acharam que o animal estava muito melhor, e para 3,23% (1) a pergunta não se aplica já que o animal nasceu cego (Gráfico 26). Gráfico 26 – Distribuição do estado atual dos cães avaliados, em relação ao momento em que o animal ficou cego. A maior parte dos entrevistados, responderam não ter problemas para aplicar o tratamento oftálmico 93,34% (28), para 3,33% (1) a pergunta não se aplica e para 3,33% (1) o tratamento oftálmico foi classificado como difícil. (Gráfico 27) Gráfico 27 – Representação da frequência de dificuldades para aplicar o tratamento oftálmico por parte dos reponsáveis dos cães avaliados. 52 Na avaliação do tratamento ocular sob o ponto de vista financeiro, 63,33% (19) disseram que achavam os custos altos, porém consideravam o tratamento necessário, 26,66% (8) achavam os custos razoáveis, 3,33%(1) consideraram os custos baixos, e para 6,66% (2) a pergunta não se aplicava já que eram funcionários da casa e apesar de cuidarem e conviverem diretamente com os animais, não arcavam com custos de tratamento (Gráfico 28). Gráfico 28 – Percepção dos responsáveis em relação ao tratamento do ponto de vista financeiro. Os proprietários também foram questionados se achavam que o animal sentia dor em decorrência do problema oftálmico e 50% (15) disseram que nunca, 30,02% (9) às vezes, 13,32% (5) raramente, 6,66% (2) acham que os animais sentem dor sempre e nenhum dos entrevistados marcou a opção “frequentemente”. (Gráfico 29) Gráfico 29 – Percepção do responsável segundo a frequência que o animal sente dor em decorrência do problema oftálmico. 53 6 DISCUSSÃO A avaliação do bem-estar merece uma abordagem minuciosa e individualizada. As muitas definições do termo e a interpretação individual a cerca do mesmo, influenciam o proprietário na avaliação de seu animal. Ainda assim, não desmerecem o “avaliador” que por seu íntimo contato está apto a detectar as mais simples alterações na rotina do seu “companheiro”. A coleta de dados desta pesquisa ocorreu durante atendimento especializado de oftalmologia veterinária. Desta maneira esta amostra sofreu uma “seleção” de proprietários mais comprometidos com a saúde de seus animais. Nesta pesquisa a maior parte dos entrevistados apresentou alto grau de escolaridade, 66,66% declarou possuir ensino superior completo. Apesar disso, alguns aspectos sinalizam que a importância de algumas informações sobre a posse responsável não estão satisfatoriamente difundidas nesta amostra. Por exemplo, ao observarmos que 66,66% dos animais avaliados não eram esterilizados. Na clínica de pequenos animais, a esterilização é considerada como um método de controle populacional efetivo e seguro, possui caráter preventivo contra o câncer de mama (RODRIGUES, 2008) e outras patologias do trato reprodutivo de machos e fêmeas. A ausência de um controle reprodutivo adequado favorece o aumento do índice de abandono de animais, e consequente aumento do número de animais errantes (SOTO et. al., 2006). As mulheres corresponderam pela maior parte dos entrevistados 86,67%, assim como o encontrado por Vanees, et.al (2012), sugerindo que as mulheres estejam mais envolvidas com os cuidados do animal da casa. Apenas quatro animais coabitavam com crianças ou adolescentes (tabela 4). Dentre os animais que dividiam o lar com crianças (três cães) observou se que o nível de atividade e a QdV atual foram consideradas satisfatórias por seus proprietários. Os responsáveis por dois destes cães, também consideraram que eles apresentavam o mesmo estado em relação ao período anterior à deficiência visual. Nenhum deles declarou observar sinais de ansiedade no animal. Em estudo sobre a os fatores que influenciam a QdV dos gatos Adameli, et. al., (2005) demonstra que o 54 comportamento dos gatos sofre influências de fatores inerentes ao proprietário, como a presença de crianças, número de membros na família, idade etc. A presença de crianças no ambiente pode estar relacionada à maior oferta de estímulos ambientais tornando o habitat mais estimulante e menos previsível para o animal. Tabela 1: Representação das famílias que possuem crianças ou adolescentes em sua constituição. O tipo de domicilio predominante foi a casa com 73,33%, o que pode ser visto como justificativa para baixa incidência de passeios. A idade avançada dos animais que participaram do estudo é um ponto a ser considerado em relação ao alto percentual de animais com baixo nível de atividade. Inativos e muito inativos somaram 46,67%. Fator também encontrado no estudo de Mullan e Main, (2007), aonde os proprietários correlacionaram a idade do cão negativamente com os níveis atuais de atividade, conforto, agilidade e mobilidade. A avançada idade dos animais com cegueira bilateral que chegaram até a clínica, também corroborou para a dificuldade de conseguir uma amostra maior, 55 considerando que apenas os animais livres de doenças concomitantes podiam ser incluídos na pesquisa. Dos 30 animais participantes, seis foram avaliados por seus proprietários com qualidade de vida má ou muito má, as características atribuídas a cada um deles podem ser visualizadas na tabela 1. O indicador de bem-estar fisiológico representado pelo escore corporal apresentou-se alterado em quatro dos seis animais. As respostas comportamentais observadas pelos indicadores índole e estado de tranquilidade também estavam alteradas em três animais, dois mansos e intranquilos e um agressivo e intranquilo. Logo, dos seis animais classificados nas piores categorias de bem-estar por seus proprietários, quatro realmente possuíam pelo menos um dos indicadores de bemestar alterado. Tabela 2: Animais classificados por seus proprietários com qualidade de vida má ou muito má. Dentre as doenças responsáveis pela cegueira dos animais avaliados, o glaucoma estava presente em seis cães. Esta condição oftálmica está associada a dor em todas as suas fases, quando aguda é responsável por dor grave e se não for 56 tratada dá lugar a dor crônica de grau mais baixo (SLATTER, 2005). As condições destes cães na percepção dos proprietários, podem ser observadas na tabela abaixo: Tabela 3: Cães avaliados que apresentavam glaucoma como causa da deficiência visual. Os entrevistados que declararam possuir ensejo para brincadeira nunca, raramente ou ás vezes somaram 64,51%, quando perguntados sobre a frequência de passeios 83,87% afirmaram que passeavam às vezes, nunca ou raramente. Deste modo percebemos que os animais avaliados eram em sua maioria privados da rotina de passeios e brincadeiras, ambas são atividades de caráter físico, lúdico e social, de grande importância para a manutenção da qualidade de vida dos cães. Esta escassez de estímulos pode ter como consequência o tédio, também gerando alterações comportamentais (LANDSBERG, HUNTHAUSEN, ACKERMAN, 2005). Porém ao compararmos o nível de atividade dos animais que passeiam com frequência com aqueles que passeiam nunca ou raramente, constatamos que passear pode trazer outros benefícios que o “quintal” não parece oferecer, já que a 57 maior parte dos cães que tinham ensejo para brincadeiras e passeios com frequência apresentaram níveis de atividade maior, como podemos visualizar no gráfico 30. Gráfico 30 – Representação dos ensejos para brincadeiras e passeios versus nível de atividade do cão avaliado. A inatividade está presente em 46,67% dos animais avaliados, também observamos o baixo ensejo para passeios e brincadeiras, fatores que não parecem ter pesado na avaliação de QdV dos responsáveis, possivelmente por este fato não trazer consequências a rotina do ambiente familiar. O estudo de Vaness (2012), demonstrou que o responsáveis tendem a adotar mais facilmente certos cuidados quando são informados da relação destes com os benefícios para a saúde, e que os proprietários que possuem uma vida social compartilhada com seus cães são mais inclinados a oferecer cuidados veterinários com mais frequência. Quanto à possibilidade de interagir com outros animais, nove cães não foram considerados aptos por seus proprietários para esta interação, as condições dos mesmos pode ser visualizada na tabela 3. Todos eles conseguiam se alimentar sozinhos, e seis coabitavam com outros animais. Em cinco deles a interação com as pessoas estava preservada. McMillan (2003), resalta que a interação social através das relações com humanos e outros animais deve ser abundante, e que estímulos 58 mentais insuficientes podem levar ao tédio e ao estresse. Atividades variadas, como brincadeiras com petiscos, e novos objetos devem ser estimuladas. Tabela 4: Cães classificados por seus responsáveis como inaptos para a interação com outros animais. Dois proprietários declararam que seus animais não conseguiam se alimentar sozinhos. Comer e beber são comportamentos naturais do animal, que têm efeito sobre a sobrevivência do indivíduo. Fome e sede são ainda comportamentos básicos e primitivos, sendo os dois primeiros fatores das cinco liberdades que fazem parte do código de recomendação de bem-estar animal (BEAVER, 2001). 59 Tabela 5: Animais que não conseguem se alimentar sozinhos. A maior parte dos animais consegue se alimentar sozinho, 93,33% (28), 26,67%(9) não esbarram em mobílias, pessoas e paredes no seu dia a dia, e 20% (6) relatam que o cão não tropeça em degraus e meio fio. A capacidade de adaptação é um fenômeno com considerável influencia na qualidade de vida. No entanto, o mecanismo de funcionamento da adaptação não é ainda bem compreendido. Este mecanismo permite manter a QdV num nível superior ao esperado em casos de limitação prolongada. Em doenças crônicas, à medida que a doença progride, não existe necessariamente uma diminuição na QdV devido a este mesmo fenômeno. A importância dos diversos fatores que afetam a qualidade de vida também não se mantém ao longo da vida, dificultando mais uma vez a sua medição (MCMILLAN, 2005). Quando perguntados sobre a qualidade de vida atual de seus cães, 63,34% classificaram a mesma como boa ou muita boa, no entanto, em relação ao estado atual comparado ao período anterior ao aparecimento dos sinais de deficiência visual, 49,99% relatou que o cão estava pior ou muito pior. Através destes índices podemos observar que o proprietário identifica um decréscimo na qualidade de vida de seu cão (Gráfico 31).Como afirmam Broom e Molento, (2004), “O bem-estar de um animal doente é sempre mais pobre que o bem-estar de um animal que não está doente; porém, muito ainda há de ser estudado sobre a magnitude dos efeitos de doença sobre o bem-estar. Pouco se sabe sobre o grau de sofrimento associado a muitas doenças”. Estes dados também reforçam a explanação de Ferreira, Sampaio, (2010): “O proprietário quando mantém certa proximidade com o seu animal adquire a capacidade de estabelecer de forma empírica, através de suas observações, certos 60 tipos de comportamento manifestados em situações específicas que envolvem estados emocionais e modos de reação”. Gráfico 31 – Representação da Qualidade de Vida atual do cão versus o Estado atual em relação ao momento anterior ao aparecimento dos sinais de deficiência visual. Dois entrevistados que classificaram a qualidade de vida de seus cães como boa ou muito boa, também responderam achar que o cão sentia dor em decorrência do problema oftálmico sempre. Reforçando a necessidade da orientação veterinária no sentido de proporcionar uma reflexão do proprietário em relação ao modo como seu cão vive, e transmitir elucidações relevantes, como a definição de McMillan (2000), que estabelece que a qualidade de vida nos animais ocorre com a ausência ou a presença mínima de desconfortos físicos (náusea, retenção urinária, prurido, dor, tosse, dispnéia), e emocionais ( medo, ansiedade, solidão, frustrações). A classificação da qualidade de vida atual elevada na visão dos proprietários, assim como o estado atual não ter se modificado na opinião da maioria, pode estar relacionada com a comparação feita com o momento anterior ao tratamento, aonde a dor aguda é mais facilmente percebida. E ainda, pelo fato de todos estarem, no momento da avaliação, em terapêutica oftálmica adequada, dentre os objetivos terapêuticos esta a eliminação da dor ocular (BROOKS, 2008). 61 Em diversas categorias os responsáveis apontam fatores incompatíveis com o bem-estar do animal, no entanto classificam os mesmos com um bom nível de qualidade de vida atual. Estes achados condizem com os encontrados por Mullan e Main, (2007), aonde os proprietários demonstraram uma desconexão entre o bemestar, estimulação mental e interação com as pessoas. Pode ser que os proprietários não considerem a autonomia (capacidade de fazer escolhas para si mesmo) como uma parte importante da saúde física e emocional de seus cães, ou pode ser que, os donos considerem bem-estar relacionado à saúde, principalmente física. Demonstrando a necessidade de se ensinar ao proprietário, a perceber QdV no espectro do animal. Oyama et.al., (2008) aponta que quanto mais informado está o responsável sobre a doença e o tratamento do seu animal, mais facilidade ele têm para aceitar limitações e aderir os cuidados indicados pelo veterinário. 7 CONSIDERAÇÕES FINAIS O bem-estar animal como ciência é uma novidade, uma vez que se pode atribuir a esta área acadêmica somente cerca de três décadas de existência. Em animais de companhia, percebe-se na atuação do médico veterinário clínico de pequenos animais a oportunidade de exercer a profissão priorizando o paciente, seu trabalho promove claramente bem-estar animal (MOLENTO, 2007). Os responsáveis envolvidos nesta pesquisa demonstraram perceber alterações na rotina de seus animais em consequência da deficiência visual. Porém a necessidade de informação prática e conceitual sobre o que é e o que representa a qualidade de vida para os animais constitui uma necessidade clara que precisa ser suprida durante o aconselhamento veterinário. Segundo Broom e Molento, (2004) os profissionais da área têm o desafio de aprimorar as formas de se medir bem-estar nos animais, para que estas mensurações aprimorem as relações entre humanos e animais até que se alcancem níveis considerados apropriados por uma sociedade informada e justa. 62 Grande parte dos entrevistados mencionou que após participarem da pesquisa passaram a dedicar mais tempo à observação das dificuldades do seu animal na rotina da casa, muitas vezes carregando o mesmo ao ambiente em que as pessoas ficavam reunidas, chamando o animal e motivando-o a participar da interação com os demais familiares. Pode-se concluir que através de simples informações e um pequeno período de reflexão sobre como vivem seus animais e quais necessidades os afligem, podemos melhorar a rotina destes cães. Trazer satisfação ao proprietário por desfrutar de melhores momentos ao lado de seus animais e assim contribuir para melhor qualidade de vida de todos os envolvidos. Os atendimentos de oftalmologia representam parcela considerável do atendimento clínico, a dor e as restrições impostas pelas doenças oftálmicas na rotina dos animais não devem ser desconsideradas durante a orientação veterinária. Para a melhor compreensão das implicações oftálmicas na vida dos animais, pelos proprietários e até mesmo pelos profissionais da área, faz-se necessário que estudos correlacionando oftalmologia veterinária e bem-estar ocorram com maior frequência. É preciso encorajar o proprietário a manter este animal incluído socialmente, em atividades com a família, com outros animais e na prática de atividades físicas. Preservar este cão não só do sofrimento físico, mas também do sofrimento mental são os alvos de uma medicina veterinária que não se limita apenas as necessidades físicas do paciente, mas também é capaz de se voltar à promoção de saúde através do bem-estar animal. 63 8 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABINPET Associação Brasileira de Indústria dos Produtos para Animais de Estimação.Disponível em: <http://abinpet.org.br/imprensa/noticias/populacao-depets-cresce-5-ao-ano-e-brasil-e-quarto-no-ranking-mundial>Acesso em: 22 jan. 2014. ADAMELLI, S.; MARINELLI, L.; NORMANDO, S. BONO, GOwner and cat features influence the quality of life of the cat,Applied Animal Behaviour Sciencev.94 p.8998, april.2005 ADDINGTON-HALL J., KALRA L., Education and debate,Medical HumanitiesBMJv. 322, p. 1417-1420, june, 2001. AGUIAR, C.C., VIEIRA, A.P.G.F.; CARVALHO, A.F. ET AL. 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Pesquisador Responsável: INGRID CATARINA MARTINS CAVALCANTE Instituição a que pertence o Pesquisador Responsável: UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE Responsável pelo Cão:______________________________________ Telefones para contato: (__) ____________ - (___) _______________ Idade: _______anos R.G. _________________ O(A) Sr. (ª) está sendo convidado(a) a participar do projeto de pesquisa “PERCEPÇÃO DOS POPRIETÁRIOS EM RELAÇÃO À QUALIDADE DE VIDA DE CÃES COM DEFICIÊNCIA VISUAL", de responsabilidade da pesquisadora INGRID CATRINA MARTINS CAVALCANTE. O objetivo desta pesquisa é conhecer a percepção dos proprietários em relação à qualidade de vida de cães com deficiência visual. A participação neste estudo não apresenta riscos ao paciente ou ao proprietário, nem mesmo altera o tratamento indicado quando for o caso. Não cabendo indenização ou reparo de danos. Os dados desta pesquisa serão utilizados única e exclusivamente para fins acadêmicos, as informações acerca da identificação dos proprietários será confidencial. Eu, __________________________________________, RG nº _______________________, responsável pelo animal ____________________________, raça ________, sexo_____________ declaro ter sido informado e concordo com a participação, como voluntário, no projeto de pesquisa acima descrito. Niterói, _____ de ____________ de _______. _________________________________________________ Nome e assinatura do responsável. 70 9.2 Questionário 1-Identificação Nome do cão:.............................. Sexo ( ) Raça:............................... Idade:........................Castrado: Identificação do Proprietário Data : ....................... Telefone:................................................... Nome do proprietário:................................................................................ Endereço: ....................................................................................................... Sexo do proprietário: ( ) masculino ( ) feminino Estado civil: ( ) Solteiro ( ) Casado Idade:_______ ( ) Outros Número de pessoas no domicílio: _____ Adulto _____ Criança _____ Adolescente 2. Escolaridade do proprietário (Segundo critério da ANEP) ( ) Ensino fundamental incompleto ( ) Ensino Fundamental completo / Ensino médio incompleto ( ) Ensino médio completo/ Superior incompleto ( ) Superior completo 3. Tipo de habitação: ( ) Casa ( ) Apartamento 4. Já teve outros animais de estimação antes? ( ) Sim ( ) Não 71 2-Observações do Pesquisador Avaliação corporal: Score: ( ) caquético ( ) magro ( ) ideal ( ) sobrepeso ( ) obeso Avaliação da Índole: ( ) manso ( ) agressivo Avaliação do Estado de tranquilidade: ( ) tranquilo ( ) intranquilo Data do diagnóstico oftálmico:__________________________ Diagnóstico oftálmico: ______________________________________ Doenças concomitantes:_________________________ Data do inicio de tratamento (se estiver fazendo) e medicação em curso:_______________________________________________________________ __________________________________________________ ______________________________________ 72 3- Relação proprietário x animal 1. Acesso às dependências internas da residência: ( ) sim ( ) não 2. Manejo alimentar: ( ) ração ( ) comida caseira 3. Frequência de visitas ao veterinário: 4. Ensejo para brincadeira: ( ) nunca ( ) raramente ( ) às vezes ( ) frequentemente ( ) sempre 5. Passeia com o seu animal: ( ) nunca ( ) raramente ( ) às vezes ( )frequentemente ( ) sempre 6. Possui outros animais no mesmo local: ( ) sim ( ) não 4. Estado geral em relação à visão 1. Classifique o nível de atividade do seu cão. ( ) Muito Inativo ( ) Inativo ( ) Ativo ( ) Hiperativo 73 2. Em relação ao período anterior ao aparecimento dos sinais clínicos da deficiência visual como classifica o apetite do seu cão: ( ) Muito diminuído ( ) Diminuído ( ) Normal ( ) Aumentado ( ) Muito Aumentado 3. Em relação ao período anterior a aparição dos sinais da deficiência visual como classifica o grau de reação aos estímulos do seu cão (ex:quando alguém entra em casa, quando se chama o cão...) ( ) Ausência de resposta ( ) Resposta muito diminuída ( ) Resposta diminuída ( ) Resposta normal ( ) Resposta aumentada 4. Nota um aumento de ansiedade no seu cão (ex: quando é deixado sozinho)? ( ) Sim ( ) Não 74 5. Em relação ao período anterior a aparição dos sinais da deficiência visual, como classifica o grau de interação atual do seu cão com as pessoas: ( ) Não interage ( ) Interage muito pouco ( ) Interage pouco ( ) Interage de maneira normal ( ) Interage mais 6) O seu cão tem possibilidade de interagir com outros animais? ( ) Sim ( ) Não 7) Como a visão de seu cão afeta as atividades dele? Por favor, indique o quanto são difíceis para o seu cão as atividades descritas abaixo, por causa do seu problema visual: a. Meu cão consegue alimentar-se sozinho. ( )Sim ( ) Não b. Meu cão esbarra nas pessoas, paredes ou mobília. ( )Sim ( ) Não c. Meu cão tropeça em degraus ou no meio fio. ( ) Sim ( ) Não 75 8. Meu cão fica incomodado quando tratado (por exemplo, quando recebe colírios). ( ) Nunca ( ) Raramente ( ) Frequentemente ( ) Sempre ( ) Não se aplica 5-Percepção do proprietário 1. Você se preocupa com a visão de seu cão? ( ) Nunca ( ) Raramente ( ) Às vezes ( ) Frequentemente ( ) Sempre 2. Quanto tempo você gasta para cuidar da visão de seu cão (tais como: consultas com oftalmologista, colírios, terapia)? ( ) Uma vez ao mês ou menos (ou nunca) ( ) Uma vez por semana ( ) Uma vez por dia ( ) Poucas horas do dia ( ) A maior parte do dia 76 3. O tempo que você gasta com a visão de seu cão (consultas com o oftalmologista, colírios, terapia) toma o tempo que você gostaria de gastar com sua família ou outras atividades? ( ) Nunca ( ) Raramente ( ) Às vezes ( ) Frequentemente ( ) Sempre 4.Como avalia a qualidade de vida atual do seu cão? (“Muito Boa” refere-se à deficiência não ter efeito na vida do cão). ( ) Muito má ( ) Má ( ) Razoável ( ) Boa ( ) Muito Boa 5.Como avalia o estado atual em relação ao momento em que seu cão ficou cego? ( ) Muito pior ( ) Pior ( ) Mesmo estado ( ) Melhor ( ) Muito melhor 77 6. Eu tenho problema para aplicar o tratamento (por exemplo, instilar colírio). ( ) sim ( ) Não ( ) Não se aplica 7. Do ponto de vista financeiro como você considera o tratamento? ( ) Os custos são baixos ( ) Os custos são razoáveis ( ) Os custos são altos porém o tratamento é necessário ( ) Os custos são altos e por isso não posso fazer o tratamento 8. Você acha que o seu animal sente dor, em decorrência do problema oftálmico? ( ) nunca ( ) raramente ( ) as vezes ( ) frequentemente ( ) sempre 78 10 ANEXO 10 ANEXO Serviço Público Federal Universidade Federal Fluminense Pró-Reitoria de Pesquisa, Pós-Graduaço e Inovação Comissão de Ética no Uso de Animais Certificamos que o projeto n° 470, intitulado “A percepção do proprietário em relação à qualidade de vida de cães com deficiência visual” sob a orientação da Profª. Dr. Rita Leal Paixão do Instituto Biomédico, está de acordo com os Princípios Éticos na Experimentação Animal da SBCAL e obteve a aprovação da Comissão de Ética no Uso de Animais em 10 de outubro de 2013. Este certificado é válido por três anos. Niterói, 10 de outubro de 2013. _________________________________________ Coordenador da CEUA