OS CLÁSSICOS DA SOCIOLOGIA A SOCIOLOGIA BURGUESA CONSERVADORA 1ª) é coercitivo por natureza, pois exerce pressão sobre os indivíduos, levando-os a conformar-se às regras da sociedade em que vivem; 2ª) é exterior aos indivíduos - existe e atua sobre os indivíduos independentemente de sua vontade; Émile Durkheim (1858-1917) Nasceu a 15 de abril de 1858 em Épinal, na Alsácia, descendente de uma família de rabinos. Ainda adolescente dois fatos históricos foram decisivos na formação de sua personalidade e de seu intelecto: 1°) a humilhante derrota francesa para a Prússia, que consolidou a Unificação Alemã - o II Reich foi proclamado em pleno Palácio de Versalhes em 18 de janeiro de 1871, o imperador francês, Luís Bonaparte, foi tornado prisioneiro de guerra e a França acabou perdendo Alsácia (terra de Durkheim) e Lorena; 2°) dois meses depois, acontece a conquista de Paris pelo proletariado, com a instalação da Comuna de Paris. Estes dois episódios nos fazem entender a essência de sua sociologia: anti-iluminista, anticomunista, nacionalista (embalada pelo revanchismo francês posterior à guerra, logo de fundo imperialista) e positivista, cujo lema é "o amor por princípio, a ordem como meio e o progresso como fim", como diria Augusto Comte. OBS: Reich = império (na língua alemã). Quanto à sua vida acadêmica, iniciou seus estudos filosóficos na Escola Normal Superior de Paris, indo depois para a Alemanha. Lecionou sociologia em Bordéus, primeira cátedra dessa ciência criada na França. Transferiu-se em 1902 para Sorbonne, para onde levou inúmeros cientistas, entre eles seu sobrinho Marcel Mauss, reunindo-os num grupo que ficou conhecido como escola sociológica francesa. Durkheim morre no período da I Guerra Mundial e da Revolução Russa. Suas principais obras foram: "Da divisão do trabalho social", "As regras do método sociológico", "O suicídio", "Formas elementares da vida religiosa", "Educação e sociologia", "Sociologia e filosofia" e "Lições de sociologia" (obra póstuma). Principais idéias e preocupações: - Esforça-se em emancipar a sociologia das demais teorias sobre a sociedade e em constituí-la como disciplina rigorosamente científica. Em livros e cursos, sua preocupação foi definir com precisão o objeto, o método e as aplicações dessa nova ciência. - Em “As regras do método sociológico”, buscou definir, com clareza, o objeto da sociologia: são os fatos sociais, afirmava. - Segundo o mesmo, um fato social possui 3 características fundamentais: 3ª) é social todo fato que é geral - que se repete em todos os indivíduos ou na maioria deles. - para Durkheim, o fato social deve ser tratado como “coisa”, como algo passível de ser conhecido objetivamente. Há de se tomar algumas medidas, no entanto, para que seja exitosa esta empreitada. Manter a maior distância possível do fato e buscar a neutralidade (não se envolver emocionalmente com o fato, não utilizar dos valores, não pré-julgar) - a busca da “neutralidade científica" ou "neutralidade axiológica”. (OBS: Axiológica = “relativo ao estudo ou teoria dos valores”) - Durkheim considera a sociedade um organismo em adaptação, que apresenta estados normais (saudáveis) e patológicos (doentios). É normal (sã) a sociedade que possui regras gerais claras (aceites por todos ou pela grande maioria). À ausência de regras, chamou de estado anômico (anomia = ausência generalizada de respeito a normas sociais, devido a contradições ou divergências entre estas). Considerava que a sociedade francesa de seu tempo sofria de “anomia”. - cria o conceito de consciência coletiva - “conjunto das crenças e dos sentimentos comuns à média dos membros de uma mesma sociedade”. - influenciado pelas ciências biológicas (a classificação dos seres vivos - o sistema taxonômico de Lineu, 1707-78), institui o campo da morfologia social, onde procura classificar as espécies sociais segundo as suas formas de organização (a partir das hordas, passando pelos clãs, tribos etc.). Estabeleceu, assim, que o motor de transformação de toda e qualquer sociedade é a passagem da solidariedade mecânica para a solidariedade orgânica. Vê-se aqui a influência do evolucionismo de Darwin, aplicado ao estudo e classificação da sociedade (organismos inferiores ou superiores, simples ou complexos). - Solidariedade mecânica, para Durkheim, era aquela que predominava nas sociedades pré-capitalistas, onde os indivíduos se identificavam por meio da família, da religião, da tradição e dos costumes, permanecendo em geral independentes e autônomos em relação à divisão do trabalho social. A consciência coletiva exerce aqui todo seu poder de coerção sobre os indivíduos. SOCIOLOGIA - 1º ANO - Apostila nº 2 - Página 1 - Solidariedade orgânica é aquela típica das sociedades capitalistas, onde, pela acelerada divisão do trabalho social, os indivíduos se tornam interdependentes. Essa interdependência garante a união social, em lugar dos costumes, das tradições ou das relações sociais estreitas. Nas sociedades capitalistas, a consciência coletiva se afrouxa. Assim, ao mesmo tempo que os indivíduos são mutuamente dependentes, cada qual se especializa numa atividade e tende a desenvolver maior autonomia pessoal. Na verdade, está implícito aqui a necessidade de um Estado forte (instituições fortes) como forma de superar a crise de consciência ou crise “moral” da sociedade capitalista. Seu caso deve ser lá anotado, pro seu mal ser vigiado, ele requer muita atenção Seu nome deve ser lá anotado, pro seu mal ser vigiado, ele requer muita atenção Pois traz perigo à nossa vida Não dou amparo, nem guarida Dou guaraná com formicida Ou até mesmo pesticida Para acalmar minha dormida Não tô afim de pôr em risco a minha condição - as idéias de Durkheim darão base a escolas sociológicas posteriores, como a escola funcionalista (que trabalha com a concepção durkheimiana de organismo social) e o darwinismo social (que aplica a lei da seleção natural à sociedade - é a falsa idéia de que “sobrevive os mais fortes e melhores” - princípio ideológico que cai como uma luva na Era imperialista, onde a guerra é uma "necessidade"). Onde hoje é tarja preta Lia-se frase otimista E nela se acreditava Do cético ao humanista A ela todos se davam Amor de primeira vista Onde ontem era frase Hoje é uma tarja na vista MÚSICAS RELACIONADAS AO TEMA: Tá Certo, Doutor Gonzaguinha É um atentado à moral e aos bons costumes vigentes, um certo inconveniente Deixar este homem doente perambular pelas ruas a cometer tais falcatruas Incompatível com os estatutos dessa nossa gafieira, Dançar dessa maneira, desrespeitando o salão, ferindo as regras do padrão Fere as normas do edital de formação da nossa firma atual Esse homem está enfermo, nem precisa exame sério, seu mal está constatado Depressa, depressa, põe no hospital! Deve ficar bem isolado, em um quarto bem fechado Sem portas ou janelas, pois pode ser contagiante Dieta mais que rigorosa, medicação bem adequada e muita muita observação Pra que não haja agravante Em tempo hábil deve ter até um centro de controle para testar a sua boa condição, Se está fechada a ferida Tarja Cravada Sérgio Ricardo Vivia como que solta No firmamento estrelado Em cada ponta de estrela Letra por letra apagada Hoje se vê cruz e vela De tanta morte cravada Vinte e um cruzeiros de velas De tanta morte cravada Sob um carimbo redondo A luz de um losango dourado Esmaeceu com o tempo Na sorte do mau olhado Em limbo se desfazendo Já não se dá por achado Sobre o losango um carimbo De tanta morte cravada A noite cobriu a mata Apagando a natureza Que por viver de harmonia Sem verde e sem mais beleza Perdeu a fisionomia Nas rugas dessa tristeza Nas rugas dessa tristeza De tanta tarja cravada SOCIOLOGIA - 1º ANO - Apostila nº 2 - Página 2 A SOCIOLOGIA PROLETÁRIA E REVOLUCIONÁRIA Karl Marx (1818-1883) Karl Marx nasceu na cidade de Treves, na Alemanha. Em 1836, matriculou-se na Universidade de Berlim, doutorando-se em filosofia em Iena. Foi redator de uma gazeta liberal em Colônia. Mudou-se em 1842 para Paris, onde conheceu Friedrich Engels, seu companheiro de ideias e publicações por toda a vida. Expulso da França em 1845, ele foi para Bruxelas, onde participou da recém-fundada Liga dos Comunistas. Em 1848 escreveu com Engels O manifesto do Partido Comunista, obra fundadora do “marxismo” enquanto movimento político e social a favor do proletariado. Com o malogro das revoluções sociais de 1848, Marx mudou-se para Londres, onde se dedicou a um grandioso estudo crítico da economia política. Marx foi um dos fundadores da Associação Internacional dos Operários ou Primeira Internacional. Morreu em 1883, após intensa vida política e intelectual. Suas principais obras foram: A ideologia alemã, A Miséria da filosofia, Para a crítica da economia política, A luta de classes em França, O 18 Brumário de Luís Bonaparte e O capital. Principais ideias e preocupações: - cria o materialismo dialético - base de sua filosofia que aponta para o fato de que a matéria é eterna (sempre existiu), é o dado primeiro e que, portanto, a ideia é produto do desenvolvimento material, aparece posteriormente (para Marx, a ideia é uma forma de manifestação da matéria, produto de reações bioquímicas efetuadas no cérebro humano, condicionada por relações sociais, históricas e culturais que partem do mais simples para o mais complexo). Uma ideia pode ser concreta (estar em conformidade com a realidade material) ou abstrata (errada, que não está de acordo com os fatos, com a realidade em si). O movimento é absoluto (e a matéria só existe em movimento), o repouso é relativo (algo só está parado em relação a um referencial, a alguma outra coisa). - não é a consciência social que determina o ser social, mas sim o contrário: é o ser social que determina a consciência social (princípio do materialismo aplicado à sociologia). - desenvolve o conceito de classes sociais. Segundo Marx, as desigualdades sociais são provocadas pelas relações sociais de produção próprias de um modo de produção n ou m (ex: a Ordem Escravista, Feudal ou Capitalista), que dividem os homens entre exploradores e explorados, em proprietários e nãoproprietários dos meios de produção. Exemplo: no capitalismo é a burguesia que detém os meios de produção de toda a riqueza social, enquanto o proletariado, por não deter estes meios, vê-se forçado a vender sua força de trabalho ao capitalista. - as relações sociais se caracterizam por relações de oposição, antagonismo, exploração e luta entre as classes sociais. Trata-se da luta de classes, que, para Marx, é o motor da história. - Marx desenvolve o conceito de alienação, mostrando que a industrialização, a propriedade privada, o capital e o assalariamento separam o trabalhador dos meios de produção (ferramentas, máquinas, terras e matérias-primas), que são propriedade privada do capitalista. - Outro efeito da alienação é separar o trabalhador do fruto de seu trabalho, que é apropriado pelo capitalista. Essa alienação, que possui base econômica, tende a se refletir em todos os setores da vida do trabalhador (nos setores: social, político e ideológico, onde a religião se apresenta). - Outra ideia importante e que está em conformidade com o fundamento materialista, é o de que a infraestrutura econômica (base material da sociedade) determina, em última instância, a superestrutura política e ideológica, que elaboram as ideias reinantes na sociedade através das instituições sociais e políticas existentes, quais sejam: o Estado (que elabora as leis burguesas e julga segundo o ponto de vista das classes mais ricas e executa políticas que garantem a manutenção do status quo vigente), a Escola (que ensina o proletariado a aceitar sua atual condição de escravo), a Igreja (que ao prometer uma vida pós-morte, elimina a necessidade de uma ação material firme contra o sistema econômico que cria as desigualdades sociais), a Família Burguesa (cada dia mais virtual), os Meios de Comunicação (que não se cansam de repetir mil vezes inúmeras mentiras até que acreditemos, tais como a de que “o capitalismo é o fim da história”). SOCIOLOGIA - 1º ANO - Apostila nº 2 - Página 3 - Note que para Marx, a superestrutura políticoideológica é peça-chave para a manutenção do principal: a infraestrutura econômica (a base de qualquer formação social) de onde brota toda a desigualdade social: a propriedade privada dos meios de produção, garantida por lei. A partir desta garantia dá-se a exploração capitalista, através da extração da mais-valia do operário, seja ele moderno ou pósmoderno, sempre viabilizada pela manutenção de um vigoroso Exército Industrial de Reserva: os desempregados. justa e igualitária, a sociedade socialista, baseada no princípio que diz: “quem não trabalha não come”. - em sua principal obra, O Capital, Marx desvenda a lógica de produção e circulação do capital, partindo do elemento mais simples e presente na sociedade moderna (a mercadoria) até a compreensão das relações econômicas e sociais mais complexas, como as relações internacionais de troca. >> Combinação dialética do Método Indutivo com o Método Dedutivo. OBS: Marx não foi apenas um sociólogo, foi filósofo, jornalista, economista, historiador e militante político. - como todo e qualquer modo de produção, o socialismo também terá um fim. É quando será substituído pelo Modo de Produção Comunista, que terá por princípio: “de cada um segundo suas possibilidades, para cada um segundo as suas necessidades”. Quando isso acontecer, Marx considera que a humanidade haveria superado seu longo estágio pré-histórico. Max Weber E. Durkheim - “Os homens fazem sua própria história, mas não a fazem como querem, a fazem sob determinadas condições históricas e sociais” e pressionado pelo passado, pois “o cérebro dos mortos oprime, como um pesadelo, o cérebro dos vivos”. (Karl Marx). - estabelece, juntamente com Engels, as bases do socialismo científico, em oposição ao socialismo utópico (representado por várias personalidades, entre as quais Pierre Proudhon, Fourrier, Saint-Simon, Thomas Morus, Robert Owen e Campanella). OBS: utópico - vem de utopia, que significa irrealizável. - “O proletariado é o coveiro do capitalismo”, por ser a classe social produtiva (portanto fértil, a que cria a riqueza), por ser a classe social numericamente superior e por viver condições de exploração (e pobreza) inéditas na História da humanidade, capazes de unificar os pensamentos em torno da necessidade de construção de uma sociedade sem classes sociais. (proletário = trabalhador assalariado) - para Marx, o mundo caminha para o comunismo, e o socialismo é uma etapa intermediária e necessária para alcançá-lo. No socialismo ainda não seria possível abrir mão do Estado (o Estado proletário), que teria papel decisivo na repressão à classe burguesa e na criação das bases de uma sociedade mais fraterna, SOCIOLOGIA - 1º ANO - Apostila nº 2 - Página 4 Karl Marx LITERATURA E MÚSICA RELACIONADA COM O TEMA: Do texto "Os Dias da Comuna", de Bertold Brecht, tradução de Fernando Peixoto. COMUNA DE PARIS "Resolução: Considerando nossa fraqueza os senhores forjaram Suas leis, para nos escravizarem. As leis não mais serão respeitadas Considerando que não queremos mais ser escravos. Considerando que os senhores nos ameaçam Com fuzis e com canhões Nós decidimos: de agora em diante Temeremos mais a miséria do que a morte. Considerando que ficaremos famintos Se suportarmos que continuem nos roubando Queremos deixar bem claro que são apenas vidraças Que nos separam deste bom pão que nos falta. Considerando que os senhores nos ameaçam Com fuzis e canhões Nós decidimos: de agora em diante Temeremos mais a miséria que a morte. Considerando que existem grandes mansões Enquanto os senhores nos deixam sem teto Nós decidimos: agora nelas nos instalaremos Porque em nossos buracos não temos mais condições de ficar. Considerando que os senhores nos ameaçam Com fuzis e canhões Nós decidimos: de agora em diante Temeremos mais a miséria do que a morte. Considerando que está sobrando carvão Enquanto nós gelamos de frio por falta de carvão Nós decidimos que vamos tomá-lo Considerando que ele nos aquecerá Considerando que os senhores nos ameaçam Com fuzis e canhões Nós decidimos: de agora em diante Temeremos mais a miséria do que a morte. Considerando que para os senhores não é possível Nos pagarem um salário justo Tomaremos nós mesmos as fábricas Considerando que sem os senhores, tudo será melhor para nós. Considerando que os senhores nos ameaçam Com fuzis e canhões Nós decidimos: de agora em diante Temeremos mais a miséria que a morte. Considerando que o que o governo nos promete sempre Está muito longe de nos inspirar confiança Nós decidimos tomar o poder Para podermos levar uma vida melhor. Considerando: vocês escutam os canhões Outra linguagem não conseguem compreender Deveremos então, sim, isso valerá a pena Apontar os canhões contra os senhores! A INTERNACIONAL Música: Pierre Degeyter. Letra: Eugene Pottier De pé, ó vitimas da fome! De pé, famélicos da terra! Da idéia a chama já consome A crosta bruta que a soterra. Cortai o mal bem pelo fundo! De pé, de pé, não mais senhores! Se nada somos em tal mundo, Sejamos tudo, oh produtores! Bem unido façamos, Nesta luta final, Uma terra sem amos A Internacional (REFRÃO) Senhores, patrões, chefes supremos, Nada esperamos de nenhum! Sejamos nós que conquistemos A terra mãe livre e comum! Para não ter protestos vãos, Para sair desse antro estreito, Façamos nós com nossas mãos Tudo o que a nós nos diz respeito! (REFRÃO) O crime do rico a lei o cobre, O Estado esmaga o oprimido. Não há direitos para o pobre, Ao rico tudo é permitido. À opressão não mais sujeitos! Somos iguais todos os seres. Não mais deveres sem direitos, Não mais direitos sem deveres! (REFRÃO) Abomináveis na grandeza, Os reis da mina e da fornalha Edificaram a riqueza Sobre o suor de quem trabalha! Todo o produto de quem sua A corja rica o recolheu. Querendo que ela o restitua, O povo quer só o que é seu! (REFRÃO) Nós fomos de fumo embriagados, Paz entre nós, guerra aos senhores! Façamos greve de soldados! Somos irmãos, trabalhadores! Se a raça vil, cheia de galas, Nos quer à força canibais, Logo verá que as nossas balas São para os vossos generais! (REFRÃO) Pois somos do povo os ativos Trabalhador forte e fecundo. Pertence a Terra aos produtivos; Ó parasitas deixa o mundo Ó parasitas que te nutres Do nosso sangue a gotejar, Se nos faltarem os abutres Não deixa o sol de fulgurar! (REFRÃO) SOCIOLOGIA - 1º ANO - Apostila nº 2 - Página 5 ATÉ QUANDO? Gabriel o Pensador, Itaal Shur e Tiago Mocotó Não adianta olhar pro céu, com muita fé e pouca luta Levanta aí que você tem muito protesto pra fazer e muita greve, você pode, você deve, pode crer Não adianta olhar pro chão, virar a cara pra não ver Se liga aí que te botaram numa cruz e só porque Jesus sofreu não quer dizer que você tenha que sofrer Até quando você vai ficar usando rédea? Rindo da própria tragédia? Até quando você vai ficar usando rédea? (Pobre, rico, ou classe média). Até quando você vai levar cascudo mudo? Muda, muda essa postura Até quando você vai ficando mudo? Muda que o medo é um modo de fazer censura. Até quando você vai levando? (Porrada! Porrada!) Até quando vai ficar sem fazer nada? Até quando você vai levando? (Porrada! Porrada!) Até quando vai ser saco de pancada? Você tenta ser feliz, não vê que é deprimente, seu filho sem escola, seu velho tá sem dente Cê tenta ser contente e não vê que é revoltante, você tá sem emprego e a sua filha tá gestante Você se faz de surdo, não vê que é absurdo, você que é inocente foi preso em flagrante! É tudo flagrante! É tudo flagrante! Refrão A polícia matou o estudante, falou que era bandido, chamou de traficante. A justiça prendeu o pé-rapado, soltou o deputado... e absolveu os PMs de vigário! Refrão A polícia só existe pra manter você na lei, lei do silêncio, lei do mais fraco: ou aceita ser um saco de pancada ou vai pro saco. A programação existe pra manter você na frente, na frente da TV, que é pra te entreter, que é pra você não ver que o programado é você. Acordo, não tenho trabalho, procuro trabalho, quero trabalhar. O cara me pede o diploma, não tenho diploma, não pude estudar. E querem que eu seja educado, que eu ande arrumado, que eu saiba falar Aquilo que o mundo me pede não é o que o mundo me dá. Consigo um emprego, começa o emprego, me mato de tanto ralar. Acordo bem cedo, não tenho sossego nem tempo pra raciocinar. Não peço arrego, mas onde que eu chego se eu fico no mesmo lugar? Brinquedo que o filho me pede, não tenho dinheiro pra dar. Escola, esmola! Favela, cadeia! Sem terra, enterra! Sem renda, se renda! Não! Não!! Refrão Muda, que quando a gente muda o mundo muda com a gente. A gente muda o mundo na mudança da mente. E quando a mente muda a gente anda pra frente. E quando a gente manda ninguém manda na gente. Na mudança de atitude não há mal que não se mude nem doença sem cura. Na mudança de postura a gente fica mais seguro, na mudança do presente a gente molda o futuro! Até quando você vai ficar levando porrada, até quando vai ficar sem fazer nada? Até quando você vai ficar de saco de pancada? Até quando você vai levando? COMPORTAMENTO GERAL Gonzaguinha Você deve notar que não tem mais tutu e dizer que não está preocupado Você deve lutar pela xepa da feira e dizer que está recompensado Você deve estampar sempre um ar de alegria e dizer: tudo tem melhorado Você deve rezar pelo bem do patrão e esquecer que está desempregado Você merece, você merece Tudo vai bem, tudo legal Cerveja, samba, e amanhã, seu Zé Se acabarem com o teu Carnaval? Você merece, você merece Tudo vai bem, tudo legal Cerveja, samba, e amanhã, seu Zé Se acabarem com o teu Carnaval? Você deve aprender a baixar a cabeça E dizer sempre: "Muito obrigado" São palavras que ainda te deixam dizer Por ser homem bem disciplinado Deve pois só fazer pelo bem da Nação Tudo aquilo que for ordenado Pra ganhar um Fuscão no juízo final E diploma de bem comportado Você merece, você merece Tudo vai bem, tudo legal Cerveja, samba, e amanhã, seu Zé Se acabarem com o teu Carnaval? SOCIOLOGIA - 1º ANO - Apostila nº 2 - Página 6 BIS A SOCIOLOGIA BURGUESA LIBERAL Max Weber (1864-1920) Max Weber nasceu na cidade de Erfurt (Alemanha), numa família de burgueses liberais. Seu pai era jurista e político influente. Sua mãe era protestante e exerceu sobre Weber importante influência. Desenvolveu estudos de direito, filosofia, história e sociologia, constantemente interrompidos por uma doença que o acompanhou por toda a vida. Iniciou a carreira de professor em Berlim e, em 1895, foi catedrático na Universidade de Heidelberg. Manteve contato permanente com intelectuais de sua época, como Simmel Sombart, Tönnies e Georg Lukács. Na política, defendeu ardorosamente seus pontos de vista liberais e parlamentaristas e participou da comissão redatora da Constituição da República de Weimar. Sua maior influência nos ramos especializados da sociologia foi no estudo das religiões, estabelecendo relações entre formações políticas e crenças religiosas. Suas principais obras foram: Artigos reunidos de teoria da ciência; Economia e sociedade (obra póstuma) e A ética protestante e o espírito do capitalismo. Principais ideias e preocupações: - Cada formação social adquiriu, para Weber, especificidade e importância próprias. Mas o ponto de partida da sociologia de Weber não estava nas entidades coletivas, grupos ou instituições. Seu objeto de investigação é a ação social, a conduta humana dotada de sentido, isto é, de uma justificativa subjetivamente elaborada. Assim, o homem passou a ter, enquanto indivíduo, na teoria weberiana, significado e especificidade. É ele que dá sentido à sua ação social: estabelece a conexão entre o motivo da ação, a ação propriamente dita e seus efeitos. (princípio liberal burguês) - Para a sociologia positivista, a ordem social submete os indivíduos como força exterior a eles. Para Weber, ao contrário, não existe oposição entre indivíduo e sociedade: as normas sociais só se tornam concretas quando se manifestam em cada indivíduo sob a forma de motivação. Cada sujeito age levado por um motivo que é dado pela tradição, por interesses racionais ou pela emotividade. O motivo que transparece na ação social permite desvendar o seu sentido, que é social na medida em que cada indivíduo age levando em conta a resposta ou a reação de outros indivíduos. - para Weber, ação social é diferente de relação social. Para que se estabeleça uma relação social, é preciso que o sentido seja compartilhado. Exemplo: um sujeito que pede uma informação a outro estabelece uma ação social (ele tem um motivo e age em relação a outro indivíduo, mas tal motivo não é compartilhado). Já numa sala de aula, onde o objetivo da ação dos vários sujeitos é compartilhado, existe uma relação social. - para Weber, o cientista, como todo indivíduo em ação, também age guiado por seus motivos, sua cultura, sua tradição, sendo impossível descartar-se, como propunha Durkheim, de suas pré-noções (para Weber a ciência é limitada). - segundo Weber, os fatos sociais não são coisas, mas acontecimentos que o cientista percebe e cujas causas procura desvendar. A neutralidade durkheimiana se torna impossível nessa visão. - a sociologia weberiana considera que os acontecimentos que integram o social têm origem nos indivíduos... - qualquer que seja a perspectiva adotada pelo cientista, ela sempre resultará numa explicação parcial da realidade (crença de que não é possível conhecer toda a realidade). - para atingir a explicação dos fatos sociais, Weber propôs um instrumento de análise que chamou de tipo ideal. - Definição de tipo ideal - “O tipo ideal não é um modelo perfeito, a ser buscado pelas formações históricas, nem mesmo qualquer realidade observável. É um instrumento de análise científica, numa construção do pensamento que permite conceituar fenômenos e formações sociais e identificar na realidade observada suas manifestações. Permite ainda comparar tais manifestações” (Costa, Cristina. In: “Sociologia: Introdução à ciência da sociedade”. p. 75) - pode-se dizer que em “A ética protestante e o espírito do capitalismo”, Weber discute com o materialismo histórico de Marx. Procura mostrar que o protestantismo teve um papel decisivo na formação do comportamento típico do capitalismo ocidental moderno. Pretende, com isso, refutar a tese marxista que afirma que o econômico é determinante. Análise histórica e método compreensivo Weber teve uma contribuição importantíssima para o desenvolvimento da sociologia. Em meio a uma SOCIOLOGIA - 1º ANO - Apostila nº 2 - Página 7 tradição filosófica peculiar, a alemã, e vivendo os problemas de seu país, diversos dos da França e da Inglaterra na mesma época, pôde trazer uma nova visão, não influenciada pelos ideais políticos nem pelo racionalismo positivista de origem anglo-francesa. Sua contribuição para a sociologia tornou-se referência obrigatória. Mostrou, em seus estudos, a fecundidade da análise histórica e da compreensão qualitativa dos processos históricos e sociais. Embora polêmicos, seus trabalhos abriram as portas para as particularidades históricas das sociedades e para a descoberta do papel da subjetividade na ação e na pesquisa social. Weber desenvolveu suas análises de forma mais independente das ciências exatas e naturais. Foi capaz de compreender a especificidade das ciências humanas como aquelas que estudam o homem como um ser diferente dos demais e, portanto, sujeito a leis de ação e comportamento próprios. Outros sociólogos alemães puseram em prática o método compreensivo de Weber, como Sombart, também um estudioso do capitalismo ocidental. Weber desenvolveu também trabalhos na área de história econômica buscando as leis de desenvolvimento das sociedades. Estudou ainda, com base em fontes históricas, as relações entre o meio urbano e o agrário e o acúmulo de capital auferido pelas cidades por meio dessas relações. (ibdem) MÚSICA RELACIONADA: MUNDO CÃO Sérgio Britto (Titãs) Você pode se iludir Mas ilusão custa caro Pode até se divertir Como um animal adestrado Você tem direito a ter um advogado Você pode falar Mas é melhor ficar calado A verdade é cruel Mas é melhor que seja dita Eu vou cuspir pro céu Que ao menos me refresca a vista Você pode pensar o que bem entender Mas é melhor tomar cuidado Que alguém pode se ofender Mundo cão, mundo cão Não estou vendo nada novo Mundo cão, todos estão Com uma coleira no pescoço Mundo cão, mundo cão Não estou vendo nada novo Mundo cão, todos estão Com uma coleira Ninguém mandou ficar de quatro Ninguém mandou (2x) Você pode ir em frente Mas não pode olhar pros lados Pode até comprar O que não queria ter comprado Pode ter razão mas não pode estar certo Você pode se mexer Mas é melhor ficar quieto A verdade liberta A verdade é essa Você pode querer mais mas tudo tem a dose certa Pode reclamar Ninguém tem nada a ver com isso Pode ler o que quiser Mas vão queimar todos os livros Mundo cão, mundo cão Não estou vendo nada novo Mundo cão, todos estão Com uma coleira no pescoço Mundo cão, mundo cão Não estou vendo nada novo Mundo cão, todos estão Com uma coleira Ninguém mandou ficar de quatro Ninguém mandou (2x) Você pode gritar Você pode latir Pode aguardar na fila, não adianta insistir Pague os impostos, vá brincar no quintal Finja de morto, obedeça o sinal Faça o favor de não falar, faça o favor de se humilhar Pode esperar a sua vez, não adianta reclamar Pegue o jornal, compareça à audiência Leve uma vida normal, ainda role no chão Mundo cão, mundo cão Não estou vendo nada novo Mundo cão, todos estão Com uma coleira no pescoço Mundo cão, mundo cão Não estou vendo nada novo Mundo cão, todos estão Com uma coleira Ninguém mandou ficar de quatro Ninguém mandou (4x) SOCIOLOGIA - 1º ANO - Apostila nº 2 - Página 8 NA TELINHA DA SUA CASA VOCÊ É CIDADÃO? - MÍDIA E CULTURA NO CAPITALISMO GLOBALIZADO A partir da II Revolução Industrial no século XIX e da predominância das regras do mercado capitalista, as artes, a cultura e a mídia foram submetidas à ideologia da indústria cultural. Ou seja, os produtos de criação da cultura dos homens foram submetidos à idéia de consumo, como produtos fabricados em série. As obras de arte se transformam em meras mercadorias, produtos de consumo, onde a maioria dos bens artísticos não são criados para a contemplação, para a busca do belo, e, sim, para a obtenção do lucro. A indústria cultural massifica a cultura e as artes para o consumo rápido no mercado da moda e na mídia. Massificar é banalizar as artes e a produção das idéias e, também, vulgarizar os conhecimentos. Marilena Chauí (1995) nos dá um exemplo disso afirmando: "A indústria cultural vende cultura. Para vendê-la, deve seduzir e agradar o consumidor. Para seduzi-lo, não pode chocá-lo, provocá-lo, fazê-lo pensar. Fazê-lo ter informações novas que perturbem, mas deve devolverlhe, com nova aparência, o que ele já sabe, já viu, já fez". Daí surgem as revistas de fofocas, o teclado, o MSN, os programas de TV sobre futilidades, os comerciais que tentam vender produtos sem qualidades, mas com ótima produção de marketing. O poder da mídia - Expressão máxima da indústria cultural são os meios de comunicação de massa, ou mídia escrita ou eletrônica. Aqui vale destacar o poder da mídia enquanto manipulação, formação de opinião, infantilização e condicionamento de mentes e produção cultural do grotesco visando a despolitização. Essas características da mídia se expressam particularmente através da TV, rádio, jornais e revistas, que são de fácil acesso à grande maioria das pessoas. Muitos estudiosos, jornalistas e políticos costumam dizer que a mídia - ou meios de comunicação de massa representa um quarto poder (além dos poderes governamentais do judiciário, do legislativo e do executivo). Isto porque influencia comportamentos, opiniões e atitudes de forma constante e permanente. minutos de programa e a desconcentrá-la durante as pausas para a publicidade." "Pouco a pouco isso se torna um hábito. Artistas de teatro afirmam que, durante um espetáculo, sentem o público ficar desatento a cada sete minutos. Professores observam que seus alunos perdem a atenção a cada dez minutos e só voltam a se concentrar após uma pausa que dão a si mesmos, como se dividissem a aula em 'programa' e 'comercial'." "Ora, um dos resultados dessa mudança mental transparece quando criança e jovem tentam ler um livro: não conseguem ler mais do que sete a dez minutos de cada vez, não conseguem suportar a ausência de imagens e ilustrações no texto, não suportam a idéia de precisar ler 'um livro inteiro'. A atenção e a concentração, a capacidade de abstração intelectual e de exercício do pensamento foram destruídas. Como esperar que possam desejar e interessar-se pelas obras de artes e de pensamento?" "Por ser um ramo da indústria cultural e, portanto, por ser fundamentalmente uma vendedora de cultura que precisa agradar o consumidor, a mídia infantiliza. Como isso acontece? Uma pessoa (criança ou não) é infantil quando não consegue suportar a distância temporal entre seu desejo e a satisfação dele. A criança é infantil justamente porque para ela o intervalo entre o desejo e a satisfação é intolerável (por isso a criança pequena chora tanto)." "Ora, o que faz a mídia? Promete e oferece gratificação instantânea. Como o consegue? Criando em nós os desejos e oferecendo produtos (publicidade e programação) para satisfazê-los. O ouvinte que gira o dial do aparelho de rádio continuamente e o telespectador que muda continuamente de canal o fazem porque sabem que, em algum lugar, seu desejo será imediatamente satisfeito." "Vale a pena, também, mencionar dois outros efeitos que a mídia produz em nossas mentes: a dispersão da atenção e a infantilização." Além disso, como a programação se dirige ao que já sabemos e já gostamos, e como toma a cultura sob a forma de lazer e entretenimento, a mídia satisfaz, imediatamente nossos desejos porque não exige de nós atenção, pensamento, reflexão, crítica, perturbação de nossa sensibilidade e de nossa fantasia. Em suma, não nos pede o que as obras de arte e de pensamento nos pedem: trabalho sensorial e mental para compreendêlas, amá-las, criticá-las, superá-las. A cultura nos satisfaz se tivermos paciência para compreendê-la e decifrá-la. Exige maturidade. A mídia nos satisfaz porque nada nos pede, senão que permaneçamos para sempre infantis." "Para atender aos interesses econômicos dos patrocinadores, a mídia divide a programação em blocos que duram de sete a dez minutos, cada bloco sendo interrompido pelos comerciais. Essa divisão do tempo nos leva a concentrar a atenção durante os sete ou dez (Trecho extraído do livro: "Sociologia para jovens do século XXI", de OLIVEIRA, Luiz F. de & COSTA, Ricardo Cesar R. da) Vejamos essa passagem do livro Convite à Filosofia, de Marilena Chauí (1995): SOCIOLOGIA - 1º ANO - Apostila nº 2 - Página 9 A ideologia Alemã Karl Marx e Friedrich Engels (Trechos extraídos da edição da Boitempo) MATERIALISMO E HISTÓRIA Na medida em que Feuerbach é materialista, nele não se encontra a história, e na medida em que toma em consideração a história ele não é materialista. Nele, materialismo e história divergem completamente... Em relação aos alemães, que se consideram isentos de pressupostos, devemos começar por constatar o primeiro pressuposto de toda a existência humana e também, portanto, de toda a história, a saber, o pressuposto de que os homens têm de estar em condições de viver para poder 'fazer história'. Mas, para viver, precisa-se, antes de tudo, de comida, bebida, moradia, vestimenta e algumas coisas mais. O primeiro ato histórico é, pois, a produção dos meios para a satisfação dessas necessidades, a produção da própria vida material, e este é, sem dúvida, um ato histórico, uma condição fundamental de toda a história, que ainda hoje, assim como há milênios, tem de ser cumprida diariamente, a cada hora, simplesmente para manter os homens vivos. Mesmo que o mundo sensível, como em São Bruno, seja reduzido a um cajado, a um mínimo, ele pressupõe a atividade de produção desse cajado. A primeira coisa a fazer em qualquer concepção histórica é, portanto, observar esse fato fundamental em toda a sua significação e em todo o seu alcance e a ele fazer justiça. Isto, como é sabido, jamais foi feito pelos alemães, razão pela qual eles nunca tiveram uma base terrena para a história e, por conseguinte, nunca tiveram um historiador... O segundo ponto é que a satisfação dessa primeira necessidade, a ação de satisfazê-la e o instrumento de satisfação já adquirido conduzem a novas necessidades e essa produção de novas necessidades constitui o primeiro ato histórico. Por aqui se mostra, desde já, de quem descende espiritualmente a grande sabedoria histórica dos alemães, que, quando lhes falta o material positivo e quando não se trata de discutir disparates políticos, teológicos ou literários, nada nos oferecem sobre a história, mas sim sobre os 'tempos préhistóricos', contudo sem nos explicar como se passa desse absurdo da 'pré-história' à história propriamente dita - ainda que, por outra parte, sua especulação histórica se detenha em especial sobre essa 'préhistória', porque nesse terreno ela se crê a salvo da interferência dos 'fatos crus' e, ao mesmo tempo, porque ali ela pode dar rédeas soltas aos seus impulsos especulativos e produzir e destruir milhares de hipóteses. A terceira condição que já de início intervém no desenvolvimento histórico é que os homens, que renovam diariamente sua própria vida, começam a criar outros homens, a procriar - a relação entre homem e mulher, entre pais e filhos, a família. Essa família, que no início constitui a única relação social, torna-se mais tarde, quando as necessidades aumentadas criam novas relações sociais e o crescimento da população gera novas necessidades, uma relação secundária (salvo na Alemanha) e deve, portanto, ser tratada e desenvolvida segundo os dados empíricos existentes e não segundo o 'conceito de família', como se costuma fazer na Alemanha. Ademais, esses três aspectos da atividade social não devem ser considerados como três estágios distintos, mas sim apenas como três aspectos ou, a fim de escrever de modo claro aos alemães, como três 'momentos' que coexistiram desde os primórdios da história e desde os primeiros homens, e que ainda hoje se fazem valer na história. A produção da vida, tanto da própria, no trabalho, quanto da alheia, na procriação, aparece desde já como uma relação dupla -, social no sentido de que por ela se entende a cooperação de vários indivíduos, sejam quais forem as condições, o modo e a finalidade. Segue-se daí que um determinado modo de produção ou uma determinada fase industrial estão sempre ligados a um determinado modo de cooperação ou a uma determinada fase social - modo de cooperação que é, ele próprio, uma 'força produtiva'. - que a soma das forças produtivas acessíveis ao homem condiciona o estado social e que, portanto, a 'história da humanidade' deve ser estudada e elaborada sempre em conexão com a história da indústria e das trocas... Mostra-se, portanto, desde o princípio, uma conexão materialista dos homens entre si, conexão que depende das necessidades e do modo de produção e que é tão antiga quanto os próprios homens - uma conexão que assume sempre novas formas e que apresenta, assim, uma 'história', sem que precise existir qualquer absurdo político ou religioso que também mantenha os homens unidos. Somente agora, depois de já termos examinado quatro momentos, quatro aspectos das relações históricas originárias, descobrimos que o homem tem também 'consciência'. Mas essa também não é, desde o início, consciência 'pura'. O 'espírito' sofre, desde o início, a maldição de estar 'contaminado' pela matéria, que, aqui, se manifesta sob a forma de camadas de ar em movimento, de sons, em suma, sob a forma de linguagem. A linguagem é tão antiga quanto a consciência - a linguagem é consciência real, prática, que existe para os outros homens e que, portanto, também existe para mim mesmo; e a linguagem nasce, tal como a consciência, do carecimento, da necessidade de intercâmbio com outros homens. Desde o início, portanto, a consciência já é um produto social e continuará sendo enquanto existirem homens. A consciência é, naturalmente, antes de tudo a mera consciência do meio sensível mais imediato e consciência do vínculo limitado com outras pessoas e coisas exteriores ao indivíduo que se torna consciente; SOCIOLOGIA - 1º ANO - Apostila nº 2 - Página 10 ela é, ao mesmo tempo, consciência da natureza que, inicialmente, se apresenta aos homens como um poder totalmente estranho, onipotente e inabalável, com o qual os homens se relacionam de um modo puramente animal e diante do qual se deixam impressionar como o gado; é, desse modo, uma consciência puramente animal da natureza (religião natural) - e, por outro lado, a consciência da necessidade de firmar relações com os indivíduos que o cercam constitui o começo da consciência de que o homem definitivamente vive numa sociedade. Esse começo é algo tão animal quanto a própria vida social nessa fase; é uma mera consciência gregária, e o homem se diferencia do carneiro, aqui, somente pelo fato de que, no homem, sua consciência toma lugar do instinto ou de que seu instinto é um instinto consciente. Essa consciência de carneiro ou consciência tribal obtém seu desenvolvimento e seu aperfeiçoamento ulteriores por meio da produtividade aumentada, do incremento das necessidades e do aumento da população, que é a base dos dois primeiros. Com isso, desenvolve-se a divisão do trabalho, que originalmente nada mais era do que a divisão do trabalho no ato sexual e, em seguida, divisão do trabalho que, em consequência de disposições naturais (por exemplo, a força corporal), necessidades, casualidades etc. etc., desenvolve-se por si própria ou 'naturalmente'. DIVISÃO DO TRABALHO E PROPRIEDADE PRIVADA A divisão do trabalho só se torna realmente divisão a partir do momento em que surge uma divisão entre trabalho material e [trabalho] espiritual. A partir desse momento, a consciência pode realmente imaginar ser outra coisa diferente da consciência da práxis existente, representar algo realmente sem representar algo real - a partir de então, a consciência está em condições de emancipar-se do mundo e lançar-se à construção da teoria, da teologia, da filosofia, da moral etc. 'puras'. (...) Além do mais, é completamente indiferente o que a consciência sozinha empreenda, pois de toda essa imundície obtemos apenas um único resultado: que esses três momentos, a saber, a força de produção, o estado social e a consciência, podem e devem entrar em contradição entre si, porque com a divisão do trabalho está dada a possibilidade, e até a realidade, de que as atividades espiritual e material - de que a fruição e o trabalho, a produção e o consumo - caibam a indivíduos diferentes, e a possibilidade de que esses momentos não entrem em contradição reside somente em que a divisão do trabalho seja novamente suprassumida (=superada, atinja o supra-sumo, o cume)... Com a divisão do trabalho, na qual todas essas contradições estão dadas e que, por sua vez, se baseia na divisão natural do trabalho na família e na separação da sociedade em diversas famílias opostas umas às outras, estão dadas ao mesmo tempo a distribuição e, mais precisamente, a distribuição desigual, tanto quantitativa quanto qualitativamente, do trabalho e de seus produtos; portanto, está dada a propriedade, que já tem seu embrião, sua primeira forma, na família, onde a mulher e os filhos são escravos do homem. A escravidão na família, ainda latente e rústica, é a primeira propriedade, que aqui, diga-se de passagem, corresponde já à definição dos economistas modernos, segundo a qual a propriedade é o poder de dispor da força de trabalho alheia. Além do mais, divisão do trabalho e propriedade privada são expressões idênticas - numa é dito com relação à própria atividade aquilo que, noutra, é dito com relação ao produto da atividade. DIVISÃO DO TRABALHO E COMUNISMO Além disso, com a divisão do trabalho, dá-se ao mesmo tempo a contradição entre o interesse dos indivíduos ou das famílias singulares e o interesse coletivo de todos os indivíduos que se relacionam mutuamente; e, sem dúvida, esse interesse coletivo não existe meramente na representação, como 'interesse geral', mas, antes, na realidade, como dependência recíproca dos indivíduos entre os quais o trabalho está dividido. (...) Logo que o trabalho começa a ser distribuído, cada um passa a ter um campo de atividade exclusivo e determinado, que lhe é imposto e ao qual não pode escapar; o indivíduo é caçador, pescador, pastor ou crítico crítico, e assim deve permanecer se não quiser perder seu meio de vida - ao passo que, na sociedade comunista, onde cada um não tem um campo de atividade exclusivo, mas pode aperfeiçoar-se em todos os ramos que lhe agradam, a sociedade regula a produção geral e me confere, assim, a possibilidade de hoje fazer isso, amanhã aquilo, de caçar pela manhã, pescar à tarde, à noite dedicar-me à criação de gado, criticar após o jantar, exatamente de acordo com a minha vontade, sem que eu jamais me torne caçador, pescador, pastor ou crítico. Esse fixar-se da atividade social, essa consolidação de nosso próprio produto num poder objetivo situado acima de nós, que foge ao nosso controle, que contraria nossas expectativas e aniquila nossas conjecturas, é um dos principais momentos no desenvolvimento histórico até aqui realizado. DIVISÃO DO TRABALHO E ALIENAÇÂO O poder social, isto é, a força de produção multiplicada que nasce da cooperação dos diversos indivíduos condicionada pela divisão do trabalho, aparece a esses indivíduos, porque a própria cooperação não é voluntária mas natural, não como seu próprio poder unificado, mas sim como uma potência estranha, situada fora deles, sobre a qual não sabem de onde veio nem para onde vai, uma potência, portanto, que não podem mais controlar e que, pelo contrário, percorre agora uma sequência particular de fases e etapas de desenvolvimento, independente do querer e do agir dos homens e que até mesmo dirige esse quere e esse agir. [Essa 'alienação', para usarmos um termo compreensível aos filósofos, só pode ser superada, evidentemente, sob SOCIOLOGIA - 1º ANO - Apostila nº 2 - Página 11 dois pressupostos práticos. Para que ela se torne um poder 'insuportável', quer dizer, um poder contra o qual se faz uma revolução, é preciso que ela tenha produzido a massa da humanidade como absolutamente 'sem propriedades' e ao mesmo tempo, em contradição com um mundo de riqueza e de cultura existente, condições que pressupõem um grande aumento da força produtiva, um alto grau de seu desenvolvimento - e por outro lado, esse desenvolvimento das forças produtivas (no qual já está contida ao mesmo tempo, a existência empírica humana, dada não no plano local, mas no plano histórico mundial) é um pressuposto prático, absolutamente necessário, pois sem ele apenas se generaliza a escassez e, portanto, com a carestia, as lutas pelos gêneros necessários recomeçariam e toda a velha imundície acabaria por se restabelecer; além disso, apenas com esse desenvolvimento universal das forças produtivas é posto um intercâmbio universal dos homens e, com isso, é produzido simultaneamente em todos os povos o fenômeno da massa 'sem propriedade' (concorrência universal), tornando cada um deles dependente das revoluções do outro; e, finalmente indivíduos empiricamente universais, históricos mundiais, são postos no lugar dos indivíduos locais... O comunismo, empiricamente, é apenas possível como ação 'repentina' e simultânea dos povos dominantes, o que pressupõe o desenvolvimento universal da força produtiva e o intercâmbio mundial associado a esse desenvolvimento.] (...) No desenvolvimento das forças produtivas advém uma fase em que surgem forças produtivas e meios de intercâmbio que, no marco das relações existentes, causam somente malefícios e não são mais forças de produção, mas forças de destruição (maquinaria e dinheiro) - e ligada a isso, surge uma classe que tem de suportar todos os fardos da sociedade sem desfrutar de suas vantagens e que, expulsa da sociedade, é forçada à mais decidida oposição a todas as outras classes; uma classe que configura a maioria dos membros da sociedade e da qual emana a consciência da necessidade de uma revolução radical, a consciência comunista, que também pode se formar, naturalmente, entre as outras classes, graças à percepção da situação dessa classe... AS IDEIAS DOMINANTES As ideias da classe dominante são, em cada época, as ideias dominantes, isto é, a classe que é a força material dominante da sociedade é, ao mesmo tempo, sua força espiritual dominante. A classe que tem à sua disposição os meios da produção material dispõe também dos meios da produção espiritual, de modo que a ela estão submetidos aproximadamente ao mesmo tempo os pensamentos daqueles aos quais faltam os meios da produção espiritual. As ideias dominantes não são nada mais do que a expressão ideal das relações materiais dominantes, são as relações materiais dominantes apreendidas como ideias; portanto, são a expressão das relações que fazem de uma classe a classe dominante, são as ideias de sua dominação. Os indivíduos que compõem a classe dominante possuem, entre outras coisas, também consciência e, por isso, pensam; na medida em que dominam como classe e determinam todo o âmbito de uma época histórica, é evidente que eles o fazem em toda a sua extensão, portanto, entre outras coisas, que eles dominam também como pensadores, como produtores de ideias, que regulam a produção e a distribuição das ideias de seu tempo; e por conseguinte, que suas ideias são as ideias dominantes da época. SOCIEDADE CIVIL A palavra sociedade civil surgiu no século XVIII, quando as relações de propriedade já haviam se libertado da comunidade antiga e medieval. A sociedade civil como tal, desenvolve-se somente com a burguesia; com este mesmo nome, no entanto, foi continuamente designada a organização social que se desenvolve diretamente a partir da produção e do intercâmbio e que constitui em todos os tempos a base do Estado e da restante superestrutura idealista. IDEOLOGIA A consciência não pode jamais ser outra coisa do que o ser consciente e o ser dos homens é o seu processo de vida real. Se, em toda a ideologia, os homens e suas relações aparecem de cabeça para baixo como numa câmara escura, este fenômeno resulta do seu processo histórico de vida, da mesma forma como a inversão dos objetos na retina resulta do seu processo de vida imediatamente físico. Totalmente ao contrário da filosofia alemã, que desce do céu à terra, aqui se eleva da terra ao céu. Quer dizer, não se parte daquilo que os homens dizem, imaginam ou representam, tampouco dos homens pensados, imaginados e representados para, a partir daí, chegar aos homens de carne e osso; parte-se dos homens realmente ativos e, a partir de seu processo de vida real, expõe-se também o desenvolvimento dos reflexos ideológicos e dos ecos desse processo de vida. Também as formações nebulosas na cabeça dos homens são sublimações necessárias de seu processo de vida material, processo empiricamente constatável e ligado a pressupostos materiais. A moral, a religião, a metafísica e qualquer outra ideologia, bem como as formas de consciência a elas correspondentes são privadas, aqui, da aparência de autonomia que até então possuíam. Não têm história nem desenvolvimento; mas os homens, ao desenvolverem sua produção e seu intercâmbio materiais, transformam também, com esta sua realidade, seu pensar e os produtos de seu pensar. Não é a consciência que determina a vida, mas a vida que determina a consciência... SOCIOLOGIA - 1º ANO - Apostila nº 2 - Página 12