Estudo da transferência eletrônica direta em modelo de

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Estudo da transferência eletrônica direta em modelo de peroxidase
Daísa de Lima (IC), Wendel Andrade Alves (PQ)
Centro de Ciências Naturais e Humanas, Universidade Federal do ABC, Santo André-SP
A formação das monocamadas de cisteamina (CA) na superfície de ouro foi caracterizada pela utilização de métodos de
espectroscopia e voltametria. A monocamada com o grupo funcional amina tem diferentes cargas elétricas em soluções de valores
diferentes de pH, suas propriedades eletroquímicas mudarão dependendo das condições da solução. Utilizando a interação eletrostática
da monocamada de cisteamina e uma solução de [Fe(CN)6]3−/4−, pôde-se calcular o pKa da superfície Au-CA 7,3. A imobilização da
microperoxidase-11 (MP11) foi demonstrada através de espectroscopia Raman e voltametria cíclica. O eletrodo Au-CA-MP11
apresentou uma excelente resposta eletrocatalítica para a redução de peróxido de hidrogênio (7,26 μAmmol-1Lcm-2, em +50 mV vs.
SCE). O eletrodo ITO foi modificado com nanotubos de peptídeo e microperoxidase-11 e sua superfície foi caracterizada por
voltametria cíclica.
Palavras-chave— microperoxidase-11, eletrodo de ouro, peróxido de hidrogênio, transferência eletrônica, nanotubo de peptídeo
I. INTRODUÇÃO
A
Diabetes mellitus é uma doença cuja decorrência tem
aumentado muito rapidamente. A faixa etária mais
acometida pela doença é a de 45 a 64 anos devido ao avanço
da idade, baixa qualidade de vida, dieta da alimentação nãosaudável e fatores genéticos. No período de 30 anos (20002030) segundo estimativas, a quantidade de pessoas com
diabetes vai aumentar muito no mundo todo e na faixa etária
de 45 a 64 anos, a estimativa de aumento é mais que o dobro
de pessoas com a doença.
Devido ao crescimento mundial do número de diabéticos, a
quantidade de artigos publicados sobre glicose aumentou
vertiginosamente nos últimos anos o que é reflexo do número
de pesquisas realizadas sobre o conhecimento de mecanismos
e desenvolvimento de novos biossensores.
A diabetes é a doença endocrinológica mais comum,
caracteriza-se por hiperglicemia crônica com distúrbios no
metabolismo de carboidratos, lipídeos e proteínas. Existem
dois tipos de diabetes: tipo 1 e tipo 2.
A diabetes tipo 1 atinge aproximadamente 5% das pessoas e
é uma doença auto-imune caracterizada pela destruição das
células beta do pâncreas produtoras de insulina. Isso acontece
por engano porque o organismo as identifica como corpos
estranhos. A sua ação é uma resposta auto-imune. Este tipo de
reação também ocorre em outras doenças, como esclerose
múltipla, Lupus e doenças da tireóide.
A diabetes tipo 2 atinge a maioria dos diabéticos, possui
fator hereditário maior do que no tipo 1 e maior incidência
após os 40 anos. Neste caso, há produção contínua de insulina
pelas células do pâncreas, porém há incapacidade de absorção
das células musculares e adiposas, e por muitas razões a
glicose da corrente sanguínea não é metabolizada
suficientemente, isso é chamado de “resistência insulínica”.
Como a diabetes é uma doença crônica, ela não tem cura
mas pode ser tratada com medicamentos ou até injeção de
insulina subcutânea, para isso é necessário que os níveis de
glicose sejam controlados rigorosamente, dependendo da
gravidade da diabetes, o controle deve ser diário.
Para o controle dos níveis de glicose, são utilizados
glicosímetros portáteis, que são biossensores.
A quantificação dos processos bioquímicos/biológicos são
de extrema importância para médicos, biólogos e aplicações
na bioengenharia. Porém, a conversão das informações
biológicas em sinal elétrico não é tão fácil devido a
complexidade de se conectar um dispositivo eletrônico
diretamente ao meio biológico.
Os biossensores eletroquímicos fornecem um meio
interessante para analisar o conteúdo de uma amostra
biológica devido à conversão direta de um evento biológico a
um sinal elétrico.
As peroxidases são enzimas presentes em todos os animais
e plantas e que possuem, em comum, grupos prostéticos
denominados genericamente como grupo heme. O grupo heme
consiste em uma estrutura molecular em forma de anel, a
protoporfirina. Foi demonstrado que as peroxidases fazem
transferência direta de elétrons e a microperoxidase, um tipo
de peroxidase, tem sido utilizada com sucesso na construção
de biossensores. As peroxidases também podem ser utilizadas
como mediadores para detecção amperométrica de H2O2 em
biossensores de glicose, pois elas contém um átomo de ferro
(III) que é oxidado na presença de peróxido de hidrogênio a
ferro óxido (Fe=O)IV, que é regenerado na superfície do
eletrodo no potencial de ~ +50 mV, conforme o esquema
abaixo.
Esta enzima catalisa a redução de peróxidos, por meio de
um mecanismo complexo de reações:
[(HN)FeIII] + H2O2  [(HN)FeIV=O]·+ + H2O (1)
[(HN)FeIV=O]·+ + e- + H+  [(HN)FeIV-OH] (2)
[(HN)FeIV-OH] + e- + H+  [(HN)FeIII] + H2O (3)
No trabalho de Lötzbeyer, foi feita a imobilização covalente
e orientada da microperoxidase-11 no eletrodo de ouro
modificado com cisteamina, utilizado para ligar a proteína
anisotropicamente em conformação adequada para que haja
transferência direta de elétrons com a superfície do eletrodo.
Foi demonstrada uma transferência de elétrons rápida, direta e
reversível entre o sítio ativo da microperoxidase e o eletrodo
de ouro modificado com cisteamina. Além disso, foi
observada uma alta atividade bioeletrocatalítica na redução de
peróxido de hidrogênio em potenciais altos.
2
Neste trabalho, o eletrodo de ouro modificado com
cisteamina e microperoxidase-11 foi caracterizado por
técnicas eletroquímicas e espectroscopicas, além disso foi feita
a quantificação do material na superfície do eletrodo.
Posteriormente, este eletrodo pode ser utilizado como modelo
mimético da enzima peroxidase no processo de transferência
eletrônica entre o sítio ativo da enzima glicose oxidase e a
superfície do eletrodo.
II. PARTE EXPERIMENTAL
Reagentes: Os reagentes Cisteamina, Microperoxidase-11,
Hepes, EDC, peptídeo Phe Phe e álcool 1,1,1,3,3,3Hexafluor-2-propanol
(HFP)
são
de
procedência
Sigma/Aldrich. Para o preparo das soluções tampão fosfato de
diferentes pHs foram utilizados K2HPO4.3H2O e KH2PO4 de
procedência Sigma e KCl da Synth. Os reagentes K 3Fe(CN)6 e
C6FeK4N6 são de procedência Sigma Aldrich. Foram usadas
também suspensões de alumina (polimento do eletrodo) nº 2
(0,03 μm), nº 3 (0,5 μm) e nº 4 (1 μm) de procedência
Panambra. Para o experimento de dessorção redutiva foi feita
solução com NaOH de procedência Synth. Para a modificação
do eletrodo de ITO foi utilizado poli(alilamina) hidroclorada
(PAH) de procedência Aldrich.
Aparelhagem: As medidas de voltametria cíclica e
impedância
foram
obtidas
através
de
um
Potenciostato/Galvanostato (Autolab). As medidas de
espectroscopia Raman foram efetuadas em um espectrômetro
Renishaw Ramanscope 3000 com detector CCD, equipado
com um microscópio Olympus BTH2. Como radiação
excitante utilizou-se a linha em 632,8 nm de um laser de HeNe Spectra Physic modelo 127. E para aferir o pH das
soluções tampão foi utilizado um pHmetro (Metrohm 827
pHLab). Para a montagem da célula eletroquímica foram
utilizados eletrodos de referência calomelano (Hg/HgCl) e
auxiliar de platina.
As medidas de microbalança foram realizadas em um
equipamento que consiste em um frequencímetro modelo
SR60 da Stanford Research Instruments e uma fonte de tensão
alternada modelo GP322 da Dual.
A espectroscopia na região do UV-Vis foi feita em um
espectrofotômetro Varian (Cary 50) com eletrodo de
quartzo.A centrífuga utilizada é da marca MPW Med.
Instruments e modelo MPW-350.
Modificação e quantificação do eletrodo de ouro com
cisteamina: O eletrodo de ouro foi colocado em uma solução
de cisteamina 100 mmol L-1 por 24 horas no escuro. A
quantificação da cisteamina adsorvida foi feita através de
dessorção redutiva com NaOH 0,5 M, cada dessorção foi feita
após a variação do tempo de modificação.
Modificação e quantificação do eletrodo de ouro com a
Microperoxidase-11: Após o eletrodo ter sido modificado com
cisteamina, este é colocado em solução de microperoxidase-11
10-3 mol L-1, EDC 10 mmol L-1 em tampão fosfato 0,1 M pH
7,0 na geladeira por aproximadamente 24 horas.
Síntese do nanotubo de peptídeo (PNTs): Para uma
concentração de 100 mg/ml foram utilizados 2 mg de
Phe Phe e 20 µL de álcool HFP e 380 µL de água. Depois, a
solução é centrifugada por 5 minutos a uma velocidade de
2000 rpm e lavada com água.
Síntese do nanotubo de peptídeo modificado com
microperoxidase-11: A síntese pode ser feita de duas formas:
- Na primeira forma é feita a síntese de nanotubo em
concentração de 5 mg/ml, assim, foram pesados 2 mg de
Phe Phe e 50 µL de álcool HFP e 950 µL de uma solução de
microperoxidase-11 de concentração 40 µM.
- Na segunda forma, é feita a síntese dos nanotubos de
peptídeos e depois uma solução de microperoxidase-11 de
concentração 40 µM é adicionada na lavagem.
Modificação do eletrodo de ITO e placa de quartzo com
PAH e microperoxidase-11: Foram usados dois tipos de
material pois o eletrodo de ITO foi utilizado para se analisar o
comportamento eletroquímico da adsorção e a placa de
quartzo foi utilizada para análise de espectrofotometria da
modificação da superfície. Depois de limpo, os materias
citados acima são
imersos em uma solução de
poli(hidrocloreto de alilamina) (PAH) 0,5 g/L pH 6,0 por
aproximadamente 15 minutos, depois são retirado, lavados em
solução tampão fosfato pH 7,0 (0,1 M) e secos em nitrogênio.
Depois de secos, são imersos em uma solução de
microperoxidase-11 de concentração 1,074∙10-2 mg/mL
também por aproximadamente 15 minutos. E esse processo é
repetido sucessivamente até que seja atingido o número de
camadas desejado. Neste experimento, tanto para o eletrodo de
ITO e para placa de quartzo foram adsorvidas 4 camadas de
cada reagente.
III. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Modificação e quantificação do eletrodo de ouro com
cisteamina: Para eletrodos de ouro modificados com uma
monocamada de cisteamina, foram realizados estudos de
variação de pH, os quais mostraram que a velocidade de
transferência de elétrons para a superfície do eletrodo que
pode ser afetada. Em soluções ácidas pôde-se observar um
comportamento mais reversível. Esse fato pode ser explicado
pela interação eletrostática entre a carga positiva do
grupamento amino na superfície do eletrodo (-NH3+) com a
espécie [Fe(CN)6]3-/4- o que facilita o processo de transferência
de carga. Foi feita uma curva de titulação através de
experimentos de espectroscopia de impedância eletroquímica,
com ferro-ferri 10-3 M e solução tampão fosfato 0,1 M em
diferentes pHs na mesma proporção. Além disso, foi feita
quantificação de cisteamina na superfície do eletrodo de ouro,
onde pôde-se notar que a saturação da superfície ocorre após
30h do eletrodo em solução de cisteamina para sua adsorção.
Modificação e quantificação do eletrodo de ouro com a
microperoxidase-11: A MP11 foi condensada sobre a
superfície do eletrodo de ouro modificado previamente com
cisteamina. Para isso, utilizou-se a carbodiimida EDC para
ativação dos grupos carboxílicos da MP11 e com isso ela se
liga ao grupo amino (-NH2) da superfície.
3
50
40
30
20
10
i / A
Foram obtidos os voltamogramas cíclicos do eletrodo
modificado com a microperoxidase-11 em diferentes
velocidades, mostrando um par redox -400 mV (versus SCE)
atribuído ao íon de ferro do grupo heme da MP11, conforme já
descrito na literatura. Indicando a imobilização deste
composto na superfície do eletrodo de ouro.
0
-10
-20
-30
1,0 V
1,5 V
2,0 V
-40
100
-50
-2
-60
-0.8
-0.7
-0.6
j / Acm
50
-0.5
-0.4
-0.3
-0.2
-0.1
0.0
0.1
E / V (versus SCE)
0
Figura 4 - Voltametria cíclica do eletrodo modificado com PAH+PNTs+
microperoxidase-11 em diferentes velocidades de varredura: __ 1,0, __ 1,5 e __
2,0 Vs-1
-50
-100
-0.60
-0.45
-0.30
-0.15
0.00
E / V (versus SCE)
Figura 1 - Voltametria cíclica do eletrodo modificado com cisteamina e
microperoxidase-11 em diferentes velocidades de varredura:
__
0,25, __ 0,50 e __ 1 Vs-1.
0,00
-(j-j0) / Acm
-2
1,2
-0,05
i / A
cisteamina e microperoxidase
a eletroredução de H2O2, 7,26
Este potencial foi escolhido
na detecção do peróxido de
Sensibilidade / A.mmol-1.L.cm -2
O eletrodo modificado com
apresentou sensibilidade frente
μAmmol-1Lcm-2 a + 50 mV.
devido a maior sensibilidade
hidrogênio.
-0,10
0,9
0,6
0,3
0,0
0,00
0,08
0,16
0,24
[H2O2] / mmol.L
-0,15
-1
-0,20
8.0
900
1200
1500
O eletrodo de ITO foi modificado com PAH e
microperoxidase-11 e caracterizado por voltametria cíclica
onde aparece o par redox em -450 mV característico da
microperoxidase-11.
7.0
6.0
5.0
4.0
3.0
2.0
1.0
-0,25
600
-0.10
1800
-0.05
0.00
0.05
0.10
E / V (versus SCE)
tempo / s
Figura
2Determinação
amperométrica de peróxido de
hidrogênio em solução tampão
fosfato pH 7,0 (0,1 mol.L-1),
potencial aplicado +50 mV (vs
SCE).
Figura 3- Gráfico da sensibilidade
em função do potencial aplicado em
solução tampão fosfato 0,1 molL-1
em pH 7,0.
Tabela 1 – Quantificação de MP11 na superfície do
eletrodo de ouro.
Experimento
Figura 5 – Representação do nanotubo de peptídeo sendo modificado com
microperoxidase-11.
Freqüência
Freqüência
de
de
ressonância
ressonância
f
(Hz)
Massa
de
microperoxidase11 (µg)
inicial (Hz)
final (Hz)
1
5973226
5973166
60
0,93
2
5967349
5967284
65
1,008
3
5975283
5975230
63
0,977
Os valores de massa são baixos, porém justificáveis, já que
na superfície do ouro existe apenas uma monocamada de
cisteamina e consequentemente, uma monocamada de
microperoxidase-11.
Modificação do eletrodo de ITO com nanotubo de peptídeo
e microperoxidase-11:
IV. CONCLUSÃO
O eletrodo de ouro foi modificado com com a formação de
uma monocamada de cisteamina. A cisteamina da superfície
deste eletrodo foi caracterizada e quantificada por meio de
técnicas eletroquímicas e espectroscópicas. Em seguida,
realizou-se a condensação com a microperoxidase-11 sobre a
superfície do eletrodo Au-cisteamina. E novamente, a
superfície foi caracterizada e quantificada por meio de
técnicas eletroquímicas e espectroscópicas. Além disso, o
eletrodo Au-CA-MP11 mostrou sensibilidade frente à
eletroredução do peróxido de hidrogênio (7,26 μA∙mmol1
∙L∙cm-2) a + 50 mV (versus SCE) e por meio deste
experimento pôde-se calcular também os valores de imax e Km.
Sendo imax= 434,8 nA e Km= 0,22 mM. A sensibilidade
máxima do eletrodo modificado foi de 1,97 mAmol-1∙L.
V. AGRADECIMENTOS
UFABC, CNPq, FAPESP
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