SOCIOLOGIA É a ciência da sociedade, entendendo por sociedade o campo das relações intersubjetivas. O termo foi criado em 1838 por August Comte para indicar “a ciência de observação dos fenômenos sociais” (Cours de Phil. Positive, IV, 1838) e é usado atualmente para todo tipo ou espécie de análise empírica ou teoria que concerne aos fatos sociais, isto é, as efetivas relações intersubjetivas, em oposição às “filosofias” ou “metafísicas” da sociedade, que pretendem ilustrar, independentemente do fatos, e uma vez por todas, a natureza da sociedade como um todo. Podemos distinguir dois conceitos fundamentais da S., que se seguiram no tempo, a saber: 1º. A Sociologia sintética (ou sistemática) tendo como objeto a totalidade dos fenômenos sociais a pesquisar em seu conjunto, isto é, em suas leis. Essa abordagem sociológica nasceu com Comte, como sistema, como determinação da natureza da sociedade em seu conjunto, através da determinação das leis da mesma. Nessa fase, a S. tenta organizar-se analogamente à física newtoniana: como lei que traça, por meio de leis rigorosas, uma ordem necessária, além do desenvolvimento, também necessário, desta ordem. Portanto, Comte chamava a S. de física social e via a primeira parte da mesma no estudo da ordem social, isto é, na estática e sua segunda parte no estudo do progresso social, isto é, na dinâmica (Cours de phil. Positive, IV, pág. 292). Além disso Comte atribuía à S. a mesma função que se reconhece às outras ciências de pois de Bacon: a de dominar em proveito do homem os fenômenos de que tratam. Consequentemente a S. teria a função de “perceber nitidamente o sistema geral das operações sucessivas, filosóficas e políticas, que devem libertar a sociedade de sua fatal tendência à dissolução iminente e conduzi-la diretamente a uma nova organização, mais progressista e mais firme do que aquela que repousava na filosofia teológica” (Ibid., IV, pág. 7). A sociocracia1 seria assim o efeito inevitável da fundação da S. como ciência. Ainda que isentando a S. desta tarefa de fundação de uma nova humanidade, Spencer conservou-lhe o caráter sistemático. Segundo Spencer ela é uma ciência descritiva que 1 Termo criado por A. Comte para designar o regime político baseado na sociologia, que Comte concebe como análogo ou correspondente à teocracia medieval baseada na teologia. visa determinar as leis da evolução superorgânica, isto é, as leis que regulam o progresso do organismo social. Neste sentido, a S. é o estudo da ordem progressiva da sociedade como um todo (Principles of Sociology, 1876, I). Este conceito inspirou a primeira organização da S. em todos os países do mundo. Adotado em seu sentido otimista de progresso necessário: princípio que inspirou também algumas pesquisas particulares que se ficaram clássicas com, por exemplo, as de Westermark (19006-1908) sobre a Origem e desenvolvimento das idéias morais. Mas a maior realização da S. sistemática é, talvez o Tratado de S. Geral (1916-1923) de Vilfredo Pareto que, porém é, também, sob outro ponto de vista, o início da crise da mesma S. sistemática. Com efeito, Pareto, enquanto quer realizar a S. como um ciência positiva que pesquisa “a realidade experimental pela aplicação dos métodos que já foram postos à prova na física, química, astronomia, biologia e nas demais ciências”, por outro lado repudia toda construção sistemática demasiado complexa, e não hesita em definir como metafísicas e dogmáticas as doutrinas sociológicas de Comte e Spencer (Tratado, 5, 112). O caráter essencial da ciência é, segundo Pareto, o caráter “lógico-experimental” que implica dois elementos: o raciocínio lógica e a observação dos fatos. O objetivo da ciência continua contudo o de formular leis necessárias que descrevem em seu conjunto aquilo que Pareto chama de equilíbrio social e que é comparado por ele ora a um sistema mecânico de pontos, ora a um organismo vivo (Cours d’economie politique, 1896, 619). Mas por outro lado ele insiste também no simples caráter de “uniformidade experimental” da lei e no fato de que todo fenômeno concreto é devido à interrelação de um certo número de leis diferentes; o que quer dizer que toda explicação científica é aproximativa e parcial. E ainda mais, afasta-se do ideal sistemático de S, o corpo das análises que Pareto fornece no Tratado; análises que têm de preferência por objetivo aquelas que ele chama as “ações não lógicas” de que vê os elementos nos resíduos e derivações2. 2º A S. analítica, tem por objeto grupos ou aspectos particulares dos fenômenos sociais e que procede, a partir deles, para generalizações condizentes com eles. Nesta segunda fase a sociologia fragmenta-se numa multidão de orientações de pesquisa, e tem uma certa dificuldade em reencontrar sua unidade conceitual. A passagem da S. sintética para a analítica pode considerar-se marcada pela obra de Emile Durkhein que se afasta 2 Por meio desses termos Pareto designou os dois fatores das teorias não científicas que correspondem aso dois fatores das teorias científicas, isto é, às afirmações experimentais e às deduções lógicas. Os resíduos são os instintos, os sentimentos, os interesses etc., que constituem os materiais das teorias não científicas; e as derivações são as sistematizações lógicas ou pseudológicas dadas a esse material. do pressuposto fundamental da S. sistemática: isto é, o pressuposto de que a sociedade constitui um todo ou um sistema orgânico. Diz Durkheim: “Aquilo que existe, somente aquilo que é dado à observação, são as sociedades particulares que nascem, desenvolvem-se e morrem independentemente uma das outra” (Règles de la méthode sociologique, 1895, 11ª ed., 1950, pág. 20). Paralelamente, Durkheim insistiu no caráter exterior do objeto próprio da ciência social. “Os fatos sociais, disse, consistem em modo de agir, pensar e sentir, exteriores ao indivíduo e dotados de um poder coercitivo pelo qual se lhe impõem (Ibid. pág. 5). Considerar os fatos sociais desse modo significa considera-los com coisas, isto é, independentemente dos preconceitos subjetivos e das vontades individuais (Ibid. págs. 11 e segs.). Os mesmos motivos tiveram sistematização na obra metodológica de Max Weber. Este tem em primeiro lugar o mérito de haver distinguido a S. das outras disciplinas antropológicas e especialmente das historiográficas. Ele identificou o objeto da S. com as uniformidade da atitude humana, enquanto dotadas de sentido, isto é, enquanto acessíveis à compreensão. Mais precisamente, a atitude é aquela ação humana que: a) é referida, segundo a intenção de quem age, à atitude dos outros; b) é determinada sem seu desenvolvimento também por essa referência; c) pode ser explicada por essa referência. A segunda aquisição importante da S. de Max Weber é a nítida separação que ele quis estabelecer, entre a pesquisa empírica ou lógica de um lado, e as avaliações práticas ou éticas, políticas ou metafísicas, do outro. Ainda que, obviamente, esta separação seja mais fácil de ser proposta como exigência do que de ser realizada na pesquisa, ela vale até hoje como uma regra que põe à prova a honestidade do pesquisador. Em terceiro lugar, da obra de Weber jorra a exigência da pesquisa empírica especializada, a única que pode determinar as uniformidades de atitudes que constituem o objeto próprio da sociologia. Estes três pontos permaneceram firmes no desenvolvimento posterior da S. contemporânea. Esta aceitou com entusiasmo o convite de Weber no sentido da pesquisa empírica especializada e da formação de técnicas adequadas à observação. A S. dispõe hoje de um imponente conjunto de técnicas, que podem ser ordenadas em quatro grupos fundamentais: 1) as técnicas de observação (observação direta, livre, ou controlada, observação clínica, observação participante etc.); 2) as técnicas de entrevista que vão deste as entrevistas livres, as semi estruturadas até os questionários; 3) as técnicas de experimentação e as técnicas sociométricas (que descrevem as relações sociais espontâneas consideradas como componentes elementares de todos os grupos), por meio da participação ativa dos próprios sujeitos estudados; 4) as técnicas estatísticas, que a S. condivide com muitas disciplinas sociais. Um grande número de pesquisa de campo foi realizado com o uso destas técnicas nos campos mais diferentes, e desta maneira acumulou-se, sobretudo nos últimos trinta anos um material de observação volumoso e complexo. A pesquisa sociológica não se desenvolveu nas mesmas direções e m todos os países. Na Inglaterra ela se dedicou principalmente a descrever o mundo dos primitivos, suas instituições e seus comportamentos fundamentais - especialmente na obra de G. Frazer, de B. Malinowski e A. R. Radcliff-Brown. Na França, além de descrever a mentalidade dos primitivos, com os escritos de Lévy-Bruhl, ela conservou o caráter teorético dedicando-se ao estudo de problemas fundamentais especialmente pro obra de Gurvitch. Na Itália, depois de haver dado uma contribuição importante à S. sistermática com a obra de Pareto e de outros menores, calou-se no período entre as duas guerras devido à influência negativa da cultura idealista e somente hoje em dia vai readquirindo força e capacidade, pondo-se rapidamente a par dos métodos e dos interesses atuais e começando a estudar a sociedade italiana. É sobretudo nos EUA que a pesquisa sociológica produziu uma quantidade considerável de trabalho nas mais diferentes direções. No Brasil temos Gilberto Freire (1900-1987), Casa-grane e Senzala, Florestan Fernandes (1920-1995) com uma imensa obra de Sociologia Crítica na reflete as desigualdades sociais e Darcy Ribeiro, historiador, que apresenta uma análise sociológica do Brasil ao longo de sua obra. Alguns dos principais autores e suas obras bibliográficas em sociologia: August Comte (1798-1857): Curso de Filosofia Positiva, 1854; e, Sistema de Política Positiva, 1854. David Émile Dukhein (1858-1917): A divisão do trabalho social (1893); As regras do método sociológico (1894); e, O suicídio (1897). Max Weber (1864-1920): A ética protestante e o espírito do capitalismo (1905); e, A economia e a sociedade (1922). Gilberto Freire (1900-1987): Casa-grande e senzala (1933); Sobrados e mocambos (1936); e, Ordem e progresso (1959). Florestan Fernandes (1920-1995): A organização social dos Tupinambá (1949); Fundamento empíricos da explicação sociológica (1959); A sociologia numa era de revolução social (1963); A integração do negro na sociedade de classes (1965); Capitalismo dependente e classes sociais na América Latina (1973); e, A natureza sociológica da Sociologia (1980). Darcy Ribeiro (1922-1997): Os índios e a civilização (1970); O processo civilizatório (1968); O povo brasileiro (1995); Diários índios (1996); Confissões (1997).