Perfil dos domicílios unipessoais da Região Centro-Oeste: uma análise com base no Censo 2000. Marília Miranda Forte Gomes∗ Palavras-chave: família, domicílios unipessoais, Centro-Oeste. Resumo As mudanças demográficas pelas quais o Brasil vem passando nas últimas décadas têm refletido na forma como os diferentes domicílios têm se estruturado. Nas regiões brasileiras é cada vez maior o percentual de pessoas morando sozinhas, principalmente idosos. A Região Centro-Oeste, compreendida pelos Estados de Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e Goiás, além do Distrito Federal, destaca-se por apresentar uma das mais elevadas quedas do número médio de moradores em domicílios particulares permanentes (-23,36 % entre 1980 e 2000) quando comparada com as demais regiões e com a média nacional (-19,82% entre 1980 e 2000). Este trabalho se propõe a apresentar uma análise exploratória dos domicílios unipessoais da região Centro-Oeste com base nos dados do Censo Demográfico 2000. De um modo geral, os domicílios unipessoais localizados nos Estados de Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e Goiás apresentaram um perfil socioeconômico mais próximo do que foi verificado para o Brasil e inferior ao dos Distrito Federal. O Censo 2000 revelou, principalmente, fortes disparidades quanto ao nível de escolaridade e renda destas famílias. Conhecer o perfil destes domicílios é de fundamental importância para a formulação de programas sociais voltados para as famílias desta região. ∗ Universidade de Brasília – UnB. [email protected] 1 Perfil dos domicílios unipessoais da Região Centro-Oeste: uma análise com base no Censo 2000. Marília Miranda Forte Gomes∗ Introdução As mudanças demográficas pelas quais o Brasil vem passando nas últimas décadas têm refletido na forma como os diferentes domicílios têm se estruturado. Nas regiões brasileiras é cada vez maior o percentual de pessoas morando sozinhas, principalmente idosos. A Região Centro-Oeste, compreendida pelos Estados de Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e Goiás, além do Distrito Federal, destaca-se por apresentar uma das mais elevadas quedas do número médio de moradores em domicílios particulares permanentes (-23,36 % entre 1980 e 2000) quando comparada com as demais regiões e com a média nacional (-19,82% entre 1980 e 2000). Este trabalho se propõe a apresentar uma análise exploratória dos domicílios unipessoais da região Centro-Oeste com base nos dados do Censo Demográfico 2000. Conhecer o perfil destes domicílios é de fundamental importância para a formulação de programas sociais voltados para as famílias desta região. A definição de família segundo o IBGE Para o IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Família é o conjunto de pessoas ligadas por laços de parentesco, dependência doméstica ou normas de convivência, residente na mesma unidade domiciliar, ou pessoa que more sozinha em uma unidade domiciliar. Os censos brasileiros adotam o conceito de Família Censitária que são aquelas que compartilham um domicílio e podem ser classificadas da seguinte forma: Pessoa só: pessoas vivendo sozinhas em um domicílio; Família única: nos domicílios particulares ocupados por uma só família e nos boletins das famílias residentes em domicílios coletivos; Família principal: referente às famílias cujos chefes são os donos, locatários ou responsáveis pelos domicílios particulares onde vive mais de uma família; Família secundária – parente: referente às famílias secundárias, quando entre estas e as principais existirem laços de parentesco; Família secundária – não parente: referente às famílias secundárias, quando entre estas e as principais não existirem laços de parentesco (ALVES e CAVENAGHI, 2004). Apesar deste tipo de definição não entender a família como uma rede de relações entre parentes e não limitar o seu âmbito aos moradores de um domicílio, os censos do IBGE permitem que os pesquisadores possam, a partir dos dados dos moradores de cada domicílio, realizar diferentes agregações. Sendo assim, todo domicílio particular possui uma família, mesmo que seja uma pessoa morando sozinha ou grupo de pessoas não-parentes (até no máximo de 5 pessoas) (ALVES e CAVENAGHI, 2004). ∗ Universidade de Brasília – UnB. [email protected] 2 Tabela 1. Distribuição percentual das famílias residentes em domicílios particulares, por tipo de família e segundo a situação do domicílio – Brasil, 2000. Tipo de Família Família única Família principal Demais tipos de família Total Urbano 83,2 84,6 85,0 83,4 Rural 16,8 15,4 15,0 16,6 Total 87,3 6,0 6,7 100,0 Fonte: IBGE, Censo Demográfico 2000 De acordo com o Censo 2000, foram registradas 48.262.786 famílias residentes em domicílios particulares no Brasil. Destas, 83,4% viviam em áreas urbanas. Os domicílios particulares ocupados por uma só família representaram 87,3% do total. A Região Centro-Oeste e os Domicílios Unipessoais Em virtude das mudanças demográficas ocorridas nos últimos tempos, novos tipos de arranjos familiares têm surgido alterando os padrões de organização das famílias. É crescente o número de famílias monoparentais, de idosos e principalmente de domicílios unipessoais em todas as regiões do Brasil. A Região Centro-Oeste, em particular, aumentou em 2,76% o número de domicílios unipessoais num intervalo de nove anos, perdendo apenas para a Região Sul como mostra o gráfico 1. Em 1991, 6,25% dos seus domicílios eram habitados por apenas uma pessoa, passando para 9,01% em 2000. A Unidade da Federação desta Região que apresentou maior proporção de domicílios unipessoais foi o Goiás, com 9,42% , seguido do Mato Grosso do Sul, com 8,96% (Tabela 2). Tabela 2. Proporção de domicílios unipessoais – Brasil e Grandes Regiões, 1991 e 2000. Brasil e Grandes Regiões Brasil Região Norte Região Nordeste Região Sudeste Região Sul Região Centro-Oeste Mato Grosso do Sul Mato Grosso Goiás Distrito Federal 1991 Total 2.335.840 105.727 564.399 1.143.573 370.299 151.842 28.091 28.867 68.658 26.226 Fonte: IBGE, Censo Demográfico 2000. 3 % 6,23 4,79 5,75 6,75 6,07 6,25 6,02 5,83 6,50 6,38 2000 Total 4.021.987 185.403 888.154 1.964.264 679.763 304.403 54.592 59.165 139.668 50.978 % 8,33 5,80 7,07 9,14 8,90 9,01 8,96 8,47 9,43 8,63 Gráfico 1. Proporção de domicílios unipessoais – Brasil e Grandes Regiões, 1991 e 2000. Brasil 1991 2000 Região Norte Região Nordeste Região Sudeste Região Sul Região Centro-Oeste 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Fonte: IBGE, Censo Demográfico 2000. 9 Sexo A análise da variável sexo mostra que, em 2000, tanto nos Estados da Região CentroOeste como no Brasil, é maior a proporção de domicílios unipessoais chefiados por homens. Ressalta-se a maior diferença entre o Mato Grosso e Distrito Federal, tendo este último apresentado proporções semelhantes às do Brasil (Tabela 3 e Gráfico 2). Tabela 3. Distribuição percentual dos domicílios unipessoais segundo sexo Região Centro-Oeste, 2000. Sexo Homens Mulheres 50,5% 49,5% 60,8% 39,2% 70,7% 29,3% 57,0% 43,0% 54,2% 45,8% Brasil e Unidades da Federação Brasil Mato Grosso do Sul Mato Grosso Goiás Distrito Federal Fonte: IBGE, Censo Demográfico 2000. 4 Total 100,0% 100,0% 100,0% 100,0% 100,0% Gráfico 2. Distribuição percentual dos domicílios unipessoais segundo sexo – Região Centro-Oeste, 2000. Mulheres Homens Brasil Distrito Federal Goiás Mato Grosso Mato Grosso do Sul 0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100% Fonte: IBGE, Censo Demográfico 2000. 9 Idade Os resultados do Censo Demográfico 2000 revelaram o rápido envelhecimento da população brasileira, em conseqüência, sobretudo, do intenso processo de redução da fecundidade e da queda da mortalidade nas últimas décadas. Caracterizada por uma população predominantemente jovem em 1980, observou-se um aumento de 5 anos na idade mediana da população brasileira, passando de 19,2 anos, em 1980, para 24,2 anos de idade, em 2000. Paralelamente, as famílias vêm sofrendo uma série de alterações devido a estas mudanças. Entre elas, destaca-se a diminuição das famílias extensas e compostas, e o aumento das famílias chefiadas por mulheres e principalmente dos domicílios unipessoais (MEDEIROS, 2002). Analisando a idade das pessoas responsáveis pelos domicílios unipessoais na Região Centro-Oeste, verificou-se que em Mato Grosso do Sul e Goiás, cerca de 25% dos responsáveis por estes domicílios tinham 65 anos ou mais. Por outro lado, 38,84% dos responsáveis por estes domicílios no Distrito Federal tinham entre 25 e 39 anos de idade. Este fato poderia ser explicado pela grande oferta de concursos públicos na capital do país e oportunidades na área de educação. 5 Gráfico 3. Estrutura etária das pessoas responsáveis pelas famílias residentes em domicílios unipessoais Brasil , Região Centro-Oeste e respectivas Unidades Federativas, 2000. REGIÃO CENTRO-OESTE BRASIL 80 anos ou + 80 anos ou + 75 a 79 anos 75 a 79 anos 70 a 74 anos 70 a 74 anos 65 a 69 anos 65 a 69 anos 60 a 64 anos 60 a 64 anos 55 a 59 anos 55 a 59 anos 50 a 54 anos 50 a 54 anos 45 a 49 anos 45 a 49 anos 40 a 44 anos 40 a 44 anos 35 a 39 anos 35 a 39 anos 30 a 34 anos 30 a 34 anos 25 a 29 anos 25 a 29 anos 20 a 24 anos 20 a 24 anos 15 a 19 anos 15 a 19 anos 10 a 14 anos 10 a 14 anos 0 2 4 6 8 0 10 2 4 6 8 10 % % MATO GROSSO MATO GROSSO DO SUL 80 anos ou + 80 anos ou + 75 a 79 anos 75 a 79 anos 70 a 74 anos 70 a 74 anos 65 a 69 anos 65 a 69 anos 60 a 64 anos 60 a 64 anos 55 a 59 anos 55 a 59 anos 50 a 54 anos 50 a 54 anos 45 a 49 anos 45 a 49 anos 40 a 44 anos 40 a 44 anos 35 a 39 anos 35 a 39 anos 30 a 34 anos 30 a 34 anos 25 a 29 anos 25 a 29 anos 20 a 24 anos 20 a 24 anos 15 a 19 anos 15 a 19 anos 10 a 14 anos 10 a 14 anos 0 2 4 6 8 0 10 2 4 6 8 10 12 % % GOIÁS DISTRITO FEDERAL 80 anos ou + 80 anos ou + 75 a 79 anos 75 a 79 anos 70 a 74 anos 70 a 74 anos 65 a 69 anos 65 a 69 anos 60 a 64 anos 60 a 64 anos 55 a 59 anos 55 a 59 anos 50 a 54 anos 50 a 54 anos 45 a 49 anos 45 a 49 anos 40 a 44 anos 40 a 44 anos 35 a 39 anos 35 a 39 anos 30 a 34 anos 30 a 34 anos 25 a 29 anos 25 a 29 anos 20 a 24 anos 20 a 24 anos 15 a 19 anos 15 a 19 anos 10 a 14 anos 10 a 14 anos 0 2 4 6 8 10 12 0 % 2 4 6 8 % Fonte: IBGE, Censo Demográfico 2000. 6 10 12 14 16 Vale ressaltar que a proporção de idosos morando sozinhos é significativa nas demais Regiões e Unidades da Federação (principalmente nas regiões Sul e Sudeste) e no Brasil como um todo. Em estudo recente realizado pelo IBGE, entre os domicílios brasileiros sob a responsabilidade de idosos, os domicílios unipessoais totalizaram, em 2000, 1.603.883 unidades, representando 17,9% do total. Em 1991, a proporção era de 15,4%. 9 Renda e Escolaridade O rendimento familiar é um parâmetro do bem-estar da família, especialmente na sociedade brasileira onde a oferta de serviços básicos como saúde e educação ainda não são suficientes para garantir um desenvolvimento pleno de seus membros (IBGE, 2005). Os domicílios unipessoais localizados no Distrito Federal apresentaram um nível socioeconômico elevado em relação aos outros Estados do Centro-Oeste e em relação à média nacional. De acordo com o recenseamento de 2000, o rendimento nominal médio mensal das pessoas que moravam sozinhas no Distrito Federal, em torno de R$ 1.706,45, era 2,1 vezes mais elevado que o rendimento nominal médio mensal nacional, que era R$ 810,01. Em relação aos Estados de Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e Goiás, esta diferença é ainda maior e a renda média mensal destes moradores no Distrito Federal, em 2000, é pelo menos 2,5 vezes mais elevada. O Goiás apresentou o menor rendimento médio mensal (R$ 588,02). Tabela 4. Rendimento nominal médio mensal familiar (em R$) e proporção dos moradores dos domicílios unipessoais com no mínimo 11 anos de estudo - Região Centro-Oeste, 2000. Brasil e Unidades da Federação Brasil Mato Grosso do Sul Mato Grosso Goiás Distrito Federal Renda em R$ 810,01 656,71 650,82 588,02 1706,45 Proporção de pessoas sozinhas com 11 anos ou mais de estudos 24,56 20,78 19,64 17,87 48,21 Fonte: IBGE, Censo Demográfico 2000. Quanto às classes de rendimento médio mensal domiciliar per capita, pode-se afirmar que 30% dos domicílios unipessoais no Brasil em 2000, eram ocupados por pessoas com rendimento familiar de até um 1 SM1. Os Estados de Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e Goiás apresentaram um comportamento próximo ao registrado para o Brasil (31%, 28,6% e 33,9% dos domicílios respectivamente). Já no Distrito Federal, apenas 10,7% dos domicílios unipessoais possuíam renda inferior a 1 SM. Na capital do Brasil, o maior percentual destes domicílios possuía renda média superior a 10 SM. Quanto ao nível de escolaridade destas famílias, o Censo de 2000 revela fortes disparidades. Enquanto que quase 50% dos responsáveis pelos domicílios unipessoais no Distrito Federal tinham no mínimo 11 anos de estudo, esta proporção era de 20,78% no Mato Grosso do Sul, 19,64% no Mato Grosso e apenas 17,87% no Goiás. 1 O salário mínimo era de R$ 151,00 em 2000. 7 De um modo geral, os domicílios unipessoais localizados nos Estados de Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e Goiás apresentaram um perfil sócioeconômico mais próximo do que foi verificado para o Brasil como um todo e inferior ao dos Distrito Federal. Este destaque poderia ser explicado pelo fato do Distrito Federal apresentar, entre as Unidades Federativas do Brasil, um dos mais elevados Índices de Desenvolvimento Humano (IDH = 0,844). Talvez uma análise mais detalhada do aglomerado urbano do Distrito Federal, nos revelasse domicílios unipessoais com características mais próximas do que foi observado para o Brasil e os demais Estados da Região Centro-Oeste. Conclusão O último período intercensitário, 1991 – 2000, revelou um aumento de 2,1% no número de domicílios unipessoais no Brasil. Segundo os dados do Censo 2000, a Região Centro-Oeste se destaca das demais, com 9,01% dos seus domicílios habitados por apenas uma pessoa. Dentro desta região, os Estados de Goiás e Mato Grosso do Sul apresentaram maior proporção de domicílios unipessoais (9,42 % e 8,96% respectivamente). Analisando os domicílios unipessoais localizados na Região Centro-Oeste, verificou-se que a diferença é mais acentuada entre o Distrito Federal e os demais Estados. De um modo geral, os domicílios unipessoais localizados nos Estados de Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e Goiás apresentaram um perfil socioeconômico mais próximo do que foi verificado para o Brasil e inferior ao dos Distrito Federal. O Censo 2000 revelou, principalmente, fortes disparidades quanto ao nível de escolaridade e renda destas famílias. Vale ressaltar que a proporção de idosos morando sozinhos é significativa em todo o Brasil. Entre 1991 e 2000, o número de domicílios unipessoais sob a responsabilidade de idosos aumentou em 2,5%. Este crescimento é ainda mais acentuado entre as mulheres idosas. Para estes domicílios, a elaboração de políticas públicas que visam a melhoria das condições habitacionais e investimentos em infra-estrutura e serviços serão de grande importância e contribuíram para melhorar as condições de vida destas pessoas e a reduzir a pobreza. Conhecer os tipos de famílias é de grande importância para caracterizar a vida da maioria das pessoas e para entender as políticas públicas específicas. Referências Bibliográficas ALVES, José Eustáquio Diniz; CAVENAGHI, Suzana. Questões conceituais e metodológicas relativas a domicílio, família e condições habitacionais. In: Anais do I Congresso da Associação Latino Americana de População, ALAP, realizado em Caxambu/MG – Brasil, de 18 a 20 de setembro de 2004. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA – IBGE, http://www.ibge.gov.br . 8 INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Síntese de Indicadores Sociais 2004. Estudos e Pesquisas, informação demográfica e socioeconômica, n.15. 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