A CONSTRUÇÃO DE “O PREÇO DE UMA MEMÓRIA”: relato de uma experiência * MARIA JOSÉ VITAL JUSTINIANO (FACULDADES INTEGRADAS DE PATOS) INTRODUÇÃO O processo da construção textual sempre foi considerado complexo, tanto pelos alunos, como também, pelos professores. Esse fato chama atenção de todos os pesquisadores em geral, no entanto, muitos profissionais em educação não compreendem, ou melhor, não exploram as oportunidades que uma sala de aula pode proporcionar em relação à escritura de um texto. O estudo do processo da escritura - construção de uma narrativa - foi pertinente, pois além de apontar as lacunas referentes às pesquisas nessa área, também, trabalhou a tarefa de os alunos escreverem, reescreverem na tentativa do acerto. Dentro desse quadro, percebeu-se que enquanto o texto estava sendo produzido, ocorria uma busca de palavras que proporcionasse uma montagem viva ao texto, e isso, foi fascinante. Como ponto de partida e objetivo geral procurou-se: descrever sob a perspectiva da Linguística Aplicada o processo da feitura de um texto; pretendeu-se, também, acompanhar in loco o desenvolvimento da construção do texto; demonstrar através de amostras (rascunhos originais) como aconteceu o processo da construção do texto de gênero ficção; apresentar o produto final revisado por professores da mesma Instituição de ensino. O trabalho exigiu o compromisso dos alunos-sujeitos envolvidos no Projeto Leitor Ativo de uma escola particular da cidade de Patos-PB. A experiência foi feita em etapas, semanalmente, com retomada dos rascunhos anteriores para que se conseguisse a realização da obra denominada de “O preço de uma memória”. _________________ *ProfªMs do Curso de Letras das Faculdades Integradas de Patos-(Patos-PB) Profª do Instituto Educacional Vera Cruz-(Patos-PB) FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA O processo da construção textual está inserido nos projetos de interesse lingüístico, já que a linguagem é um eixo da interdisciplinaridade, em que o conhecimento acadêmico, ou não, exige espaço de discursos múltiplos nas variadas áreas em que o texto é o elemento fundamental de produção do conhecimento. Diversos estudiosos têm demonstrado interesse nesse campo e, entre eles destacam-se: Koch, Moita Lopes, Coracini, Mussalim, Bentes que produziram trabalhos de excelente qualidade possibilitando espaços para geração de novas pesquisas. Há uma advertência de Lopes (2002, p. 85): “ Por um lado, temos sugestões para a sala de aula e, por outro, temos a investigação dessas sugestões com foco no resultado da aprendizagem sem que o processo de ensinar e aprender sejam considerados” Acredita-se que o processo da escritura não é “considerado” devido ao tempo em que o professor dedica aos trabalhos disciplinares esquecendo, ele, o professor de se deter à importância da escrita e, é esse exercício da escrita, que vai proporcionar a generalização de aprendizagem no âmbito interdisciplinar apresentando resultados positivos na produção textual. A atividade de produção de texto em sala de aula precisa ser repensada. A proposta é buscar alternativas para que aconteça a escrita, mas não como atividade isolada, ao contrário, buscar vozes de discursos intertextuais e somar à voz do aluno/ autor sua própria identidade na criação de textos de qualquer natureza. Nessa busca de interação pode-se perfeitamente dar oportunidades aos alunos de escrever sem obrigá-lo a seguir paradigmas, pois no intuito de adotar indiscriminadamente modelos, o professor tira do aluno-sujeito-escritor a palavra original. É, pois sob a ótica de inovação baseada em acompanhamento do “construir”, ou melhor, de compreender o processo da construção de um texto, como acontece essa prática de redigir, quais são os recursos lingüísticos utilizados, que acontece o desempenho da escritura. Na visão de Smith (1982), o fator da cognição está interligado aos conceitos de composição e de transcrição em que a atividade de decomposição obedecerá à geração, seleção, organização de idéias e sua tradução em linguagem. Defende esse autor que a atividade de transcrever refere-se ao ato físico de registrar as palavras sua materialização, portanto, está na feitura de um texto. Rocha(1993) esclarece que, na prática, durante a produção do texto, não há uma seqüência linear de procedimentos. Esses procedimentos podem vir desencadeados ao mesmo tempo, por isso, é provável que na estruturação de parágrafos haja interferência de novas idéias e, que pode ocorrer novamente quando acontece a revisão do texto. Buscando trilhar os passos da formação do gênese da construção textual, acredita-se, também, ir ao encontro da compressão o fenômeno da linguagem. Recorrendo aos trabalhos de Barbisam, Giering e Teixeira descritos na (TELA) Textos em Linguística Aplicada ( 2003, p. 10) há uma garantia que Na comunicação lingüística cabe um papel importante [...] tarefa de pesquisa, cabe então a essa lingüística investigar meios e regras de produção e recepção de texto[...] ao contrário, deve verificar que produtos da lingüística são ajustáveis aos fundamentos, às perspectivas de pesquisa e aos métodos próprios da teoria do texto. Ora, tentando buscar nessa teoria de investigação, os lingüistas investem na produção de textos como recurso para compreensão do processo da escrita e montagem textual. Ainda, sob o mesmo ângulo de pesquisas, acredita-se que a mente não consegue apontar para as coisas reais e muito menos explorá-las sem a linguagem. Retomando suporte teórico em Koch ( 1996, p. 30), “ cada ato de linguagem é, pois, constituído [...] falar, dizer, e mostrar”, percebe-se que as situações da escrita tentam mostrar um encadeamento lingüístico para o ato da escrita. Uma das estratégias para se entender as transformações da escrita é o registro no momento em que acontecem os fatos e a sua reescritura. Só com esse procedimento pode-se reconhecer o processo da escrita. Os estudos de Mesquita (2001, p. 17) revelam que “ devemos ter em mente a situação comunicativa em que os textos são produzidos, ou seja, é preciso levar em conta quem o produz, com que objetivo em que momento e para quem produzir”. Para a mesma autora a escritura e reescritura são fatores de construção onde o significado representa o processo primordial para o texto. Pensando na facultas agendi é que o ser humano transforma e redescobre seu potencial de inteligência, buscando no seu conhecimento e interagindo com outros conhecimentos, respostas para essa questão relevante - compreender o processo da produção textual. METODOLOGIA O desenvolvimento do trabalho obedeceu aos seguintes procedimentos: no primeiro momento houve convite para 10 (dez ) alunos do Ensino Médio para participarem do projeto Leitor Ativo que funciona em sala própria, na mesma escola no horário oposto ao regularmente obrigatório dos estudos. As inscrições foram realizadas pela coordenadora do projeto que visitava as salas do Ensino Médio para convocação de estudantes interessados no projeto. Foram realizadas inscrições com dez alunos, no entanto, só seis alunos persistiram no projeto até o final do ano letivo. O segundo momento ou etapa do trabalho foi o acompanhamento semanal com encontros das oito horas até as 11horas sempre nas terças-feiras. Após várias propostas de produção textual, o grupo de alunos escolheu o gênero narrativo para elaboração de um texto. A escolha dos personagens, cenários, enredo, capa sempre eram momentos de grandes debates para que se chegasse a um consenso. As leituras dos rascunhos eram imprescindíveis para o prosseguimento dos capítulos e eliminação dos elementos desnecessários para o processo da construção textual. Essa feitura do texto, esse processo de construção transformava os encontros em verdadeiras oficinas, pois quando necessitava de substituição de termos já colocados anteriormente, havia uma busca exaustiva de outros termos. A terceira etapa era reservada para o estudo aprofundado das dificuldades encontradas pelos alunos no processo da reescritura do texto. Isso pode ser verificado com as cópias dos originais do rascunho em que as rasuras, palavras riscadas, bem como anotações laterais eram constantemente feitas pelos escritores. As letras diferenciadas nos esboços demonstram a participação de todos na escrita. As ilustrações da obra, também, foram organizadas pelos alunos que em todo encontro lançavam novidades em relação a alguma mudança nas ações dos protagonistas da história criada. Alguns professores revisaram o texto parabenizando a equipe com aprovação completa e compreensão do conflito que envolveu a história. Após votação e com muitas opções para a escolha do título “O PREÇO DE UMA MEMÓRIA” a obra foi concluída. CONCLUSÃO O relato dessa experiência resgata pontos para reflexões no contexto de produção textual. A experiência de escritura e reescritura de textos por um grupo de alunos prova que trabalhar com orientação de um(a) professor(a) produz efeitos positivos no aspecto de exercício da escrita, bem como a capacidade de promoção da criatividade literária. O PREÇO DE UMA MEMÓRIA é uma obra que merece ser lida, pois a experiência relacionada a sua produção foi ímpar e merecedora de publicação para que todos tenham conhecimento do enredo literário, bem como, da capacidade de seis jovens do Ensino Médio demonstrarem estilo, persistência e criatividade. Obviamente, destaca-se nesse contexto, o apoio da direção da escola e todos que direta ou indiretamente estavam envolvidos neste trabalho. O tempo de dedicação foi de dez meses. Destacou-se o grande compromisso como fator de excelente desempenho dos alunos envolvidos revelando, que vale a pena investir na criatividade, pois, somente através de alternativas de exercitar a escrita aliada aos aspectos de estruturação textual, raciocínio, exploração de vocabulário, entusiasmo é que realmente se conseguem resultados de qualidade seja na leitura/literatura ou na produção textual. Vale ressaltar, que o tempo empregado na produção do texto foi extremamente bem aproveitado, no sentido interação grupal, redescoberta de valores individuais de colegas do próprio grupo, melhor relacionamento com a professora, desprendimento e disponibilidade, além da aprendizagem e anseio pela fabricação – início, meio e fim de uma obra infanto-juvenil. REFERÊNCIAS BARBISAN et al. Lingüística do texto. (Tela)( Textos em Linguística Aplicada ) CD 2 ed. PELOTAS :Educat, 2003. KOCH, Ingedore Villaça. Argumentação e linguagem. São Paulo: Cortez,1996. MOITA, Lopes, L.P. Oficina de Linguística aplicada. Campinas: Mercado de Letras,2002. MUSSALIM F.; BENTES,A.C. (orgs). INTRODUÇÃO À LINGUÍSTICA: domínios e fronteiras.vol 2. São Paulo: Cortez, 2001. PRESTES, Maria Luci Mesquita de. LEITURA E (RE) ESCRITURA DE TEXTOS: subsídios teóricos e práticos para o ensino. São Paulo: Rêspel, 2001. ROCHA, Lúta Lernhe Vieir et al. Curso de Atualização em língua portuguesa: fundamentos para a pratica da leitura e produção de texto.Fortaleza: SEDUC, 1993. SMITH, Frank. Leitura significativa. Porto Alegre: Artes Médicas, 1999.