Referências bibliográficas

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Nárnia e a tal adolescência
Adelle Saboya Pereira
Introdução
O tema proposto para este ensaio gira em torno do meu fascínio por Contos de
Fadas bem como a verificação de sua importância para a constituição do sujeito, desta
forma tentei relacionar a abordagem psicanalítica ao conto O sobrinho do mago que se
encontra na coletânea intitulada As Crônicas de Nárnia.
Muitos são os Contos de Fadas podemos citar como exemplo a Branca de Neve,
João e o pé de feijão, A Bela Adormecida, dentre tantos outros que trabalham com a
fantasia em suas narrativas, porém como já citado anteriormente no pretenso ensaio
focarei as questões em torno do conto O sobrinho do mago. Este conto traz em síntese a
história de duas crianças que moram em Londres e, que certo dia, encontra um mundo
fantástico chamado Nárnia que foi criado por intermédio da magia. Depois de uma série
de aventuras nesse mundo fantástico, elas retornam a Londres o seu mundo real, que em
seu contexto havia passado há pouco tempo por um período de guerra.
Estas histórias míticas trabalham com diversos símbolos e são extremamente
ilustrativas, pois trazem em seu enredo obstáculos a serem superados, personagens em
conflito sempre tendo que escolher entre dois caminhos e a presença dos valores morais
sendo trabalhados em uma espécie de mundo mágico.
Tomando a teoria freudiana sobre a sexualidade infantil como base por
considerar sua literatura de suma importância e também por esta mesma teoria ter sido
trabalhada em vários livros de psicologia do desenvolvimento, mesmo que a psicanálise
não se trate de uma teoria desenvolvimentista, quis averiguar qual é o papel dos Contos
de Fadas no “amparo” do adolescente logo após a evidência da fase fálica dentre as
fases de organização da libido.
Segundo o exposto acima trabalharei o ensaio em dois tópicos. No primeiro
falarei sobre a escolha do conto e discorrerei um pouco sobre o mesmo, no segundo
tópico trarei um pouco da teoria freudiana sobre a sexualidade infantil bem como,
trabalharei a adolescência com relação ao que foi discutido anteriormente.
I. O sobrinho do mago
Duas crianças um menino que é chamado de Digory e uma menina que se chama
Polly passam neste conto por inúmeras aventuras através da entrada e saída de mundos
com o auxílio de anéis mágicos. O menino apresenta um tio que é um misto de mágico e
“cientista”, este é o criador dos anéis que possibilitam as viagens entre Londres e os
mundos encantados, dentre eles Nárnia.
O tio André é o personagem adulto da narrativa e apresenta inúmeras falhas
dentre elas é extremamente medroso e cruel com as crianças, inclusive seu sobrinho
Digory. As crianças da história em questão são muito corajosas e agem com mais
sabedoria do que o tio André que é o principal adulto trabalhado no conto.
A presença de uma feiticeira/rainha em um dos mundos visitados, conhecido
como Charn, mostra uma mulher extremamente vaidosa, dominadora, cruel e esnobe.
Rainha Jadis era a representação da maldade que ameaça os mundos, inclusive o recémcriado mundo de Nárnia.
Nárnia no conto O sobrinho do mago foi criada e sua criação fui literalmente
cantada por um leão chamado de Aslam. Aslam é como um Deus e detêm o poder da
criação. Esta criação de Nárnia na história do conto lembrou-me muito de uma
passagem da bíblia, o Gênesis. Segue o trecho do conto, que despertou minha atenção
em relação ao cristianismo, falado por Aslam:
"– Vejam só, companheiros: antes que o mundo limpo e novo que lhes dei
tivesse sete horas de vida, a força do Mal já o invadiu; despertada e trazida até aqui
por
este
Filho
de
Adão.(...)
– Mas não se deixem abater. O mal virá desse mal, mas temos ainda uma longa
jornada, e cuidarei para que o pior caia em cima de mim. Por enquanto,
providenciemos para que, por muitas centenas de anos, seja esta uma terra de júbilo
em um mundo jubiloso. E, como a raça de Adão trouxe a ferida, que a raça de Adão
trabalhe para saná-la."
As crianças estão sempre sendo postas em conflitos e devem fazer escolhas o
que lembra muito o conceito do livre arbítrio. Na passagem abaixo do conto O sobrinho
do mago pode ser verificado um dos momentos no qual as crianças são testadas e tem
que escolher entre tocar ou não o sino, a despeito de ter que arcar com as consequências
em qualquer uma das suas escolhas.
Ousado aventureiro, decida de uma vez:
Faça o sino vibrar e aguarde o perigo
Ou acabe louco de tanto pensar:
“Se eu tivesse tocado, o que teria acontecido?”
O conto O sobrinho do mago traz inúmeros elementos e personagens que servem
de modelo para crianças e adolescentes compararem sua realidade cotidiana. Segundo
Chauí (1984) contos operam como uma espécie de “rito de passagem”, ao auxiliarem a
criança a administrar o presente, a preparar-se para adversidades futuras e a separar-se
do seu mundo familiar, por consequência, seu ingresso no âmbito adulto.
II. Um pouco sobre as fases da organização da libido e a adolescência
Segundo Freud a criança é fonte de estimulação constante, ele teve que supor
uma energia que chamou de libido. Essa energia tem sua fonte nas zonas erógenas e
encontra-se distribuída de forma desorganizada no corpo das crianças e que
posteriormente encontrará uma organização na busca da satisfação sexual.
As fases de organização da libido ou como são erroneamente denominadas fases
do desenvolvimento psicossocial. Estas fases estão superpostas e não como na maioria
das vezes são interpretadas, quando uma fase termina a outra começa, são as seguintes:
fase oral, fase anal, fase fálica e fase genital.
Destacarei a fase fálica por ser esta a fase que ocorre a organização das pulsões
em torno do falo e as fantasias inerentes à angústia de castração. É nesta fase que ocorre
a diferença de funcionamento psíquico entre os homens e as mulheres o que podemos
chamar de o momento que marca e que dá o suporte para as escolhas dos mesmos na
vida adulta. O Complexo de Édipo marca a entrada do sujeito na linguagem. A fase
genital ocorre no início da puberdade, logo após a evidência da fase fálica (que continua
presente) e a energia libidinal volta o seu direcionamento para os órgãos genitais.
A adolescência não é originalmente um conceito estudado pela psicanálise,
mas nem Freud nem Lacan deixaram de se referir a ela. Não só o psicanalista
não sabe o que é melhor para o adolescente, como também não pretende
explica-lo. No entanto, isso não o impede de pesquisar na história, na
mitologia, na literatura e sobretudo na clínica qual o destino do sujeito no
momento, às vezes aniquilador, do encontro necessariamente faltoso com o
real do sexo. (ALBERTI, 2004, p.9)
Na puberdade a criança passa por mudanças biológicas em seu organismo e
aquele corpo infantil dá lugar a um corpo desconhecido que passa a funcionar de forma
diferente e que demonstra um grande interesse pelo corpo do outro. Suas escolhas agora
mais do que nunca giram em torno do sexo. Trata-se de uma reedição dos interesses da
primeira infância.
Um conto como o discutido neste ensaio, que mostra o quanto o mundo ou
mundos estão cheios de habitantes irresponsáveis e cruéis, serve como uma maneira,
dentre muitas, do adolescente elaborar suas perdas e fazer analogias com o contexto no
qual está inserido. Segundo ALBERTI (2004, p.10) e a adolescência é antes de mais
nada: 1) um longo trabalho de elaboração de escolhas e 2) um longo trabalho de
elaboração da falta no Outro.
Considerações Finais
O conto O sobrinho do mago forma uma ligação entre o mundo diário das
crianças e adolescentes e o mundo mágico relatado no mesmo. As crianças
protagonistas (Digory e Polly) da história vivem muitas aventuras e se destacam por
serem mais sábias que o tio André, personagem adulto e que ilustra como a maioria dos
pais (ou que exercem tal função) na atualidade se posiciona frente ao “adolescer” de
seus filhos e invertem os papéis. Para o adolescente isso poderá gerar um série de
dificuldades característicos da transição na qual o mesmo se encontra.
O trabalho do adolescente hoje em dia é ainda mais complexo, pois o mesmo
além de lidar com as questões relacionadas com o sexo carece de modelos e mais ainda
de quem possa transmitir tais modelos. Para o adolescente só resta o desamparo, ou
melhor, a castração. O sujeito adolescente pode ter no mito ou conto um modelo que
funcione como norteador e que é transmitido pela linguagem escrita de seu “mundo
real”.
Referências bibliográficas
ALBERTI, S. O adolescente e o Outro. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2004.
CHAUÍ, M. (1984). Contos de fadas. In: M. Chauí. Repressão sexual: essa nossa
(des)conhecida. (p. 32-54). São Paulo: Brasiliense.
LEWIS. C.S. As crônicas de Nárnia. São Paulo: Martins Fontes, 2002.
FREUD, S. (1905). Três ensaios sobre a teoria da sexualidade. In: Edição Standard
Brasileira das Obras Psicológicas Completas. Trad. Vera Ribeiro. Rio de Janeiro:
Imago, v.7, 1989.
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