Produtores se preparam para mundo pós-petróleo

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O Globo, 22 de abril de 2016
Produtores se preparam para mundo pós-petróleo
Países lançam medidas para diversificar economia e reduzir dependência
Por: Danielle Nogueira
RIO - Com a drástica queda do preço do petróleo nos últimos dois
anos, países dependentes da commodity já começam a traçar estratégias para
diversificar suas economias. Querem não apenas ampliar as fontes de receita
dos Estados — com déficits crescentes devido à menor arrecadação com o
produto — como buscar soluções de longo prazo para a era pós-petróleo. As
medidas vão desde a criação de fundos soberanos — como o da Arábia
Saudita, que será anunciado esta semana e poderá chegar a US$ 2 trilhões —
a corte de subsídios para combustíveis e estímulos para setores inovadores,
como no Kuwait e na Noruega.
O plano mais ousado é o do governo saudita. Nos últimos meses, o
príncipe Mohammed bin Salman tem se reunido com funcionários de alto
escalão para estruturá-lo e aprimorá-lo. O plano final será divulgado esta
semana. São várias ações que buscam elevar em US$ 100 bilhões por ano a
receita da Arábia Saudita a partir de 2020. Esse foi o tamanho do rombo nas
contas públicas do reino em 2015, um recorde.
— É um grande pacote de programas com o objetivo de reestruturar
as receitas de alguns setores — disse Mohammed recentemente em uma
reunião real.
TURISMO E EDUCAÇÃO
Paralelamente, o governo quer fazer a oferta pública de ações (IPO, na
sigla em inglês) da estatal petrolífera Aramco e torná-la uma empresa com
atuação também na petroquímica. Está previsto ainda a criação de um fundo
soberano de US$ 2 trilhões — valor que supera o PIB brasileiro, atualmente
em US$ 1,8 trilhão — para investir em setores que conduzam o país para
uma economia além do petróleo. Um dos focos será investir em energia
renovável. A ideia é que, em 20 anos, o país, que é o maior produtor global
de petróleo, dependa mais dos investimentos feitos pelo fundo do que
dacommodity. No ano passado, a receita de atividades sem vínculo com a
indústria petrolífera cresceu 35%, a US$ 44 bilhões.
Outros países do Golfo Pérsico também vêm adotando medidas para
diversificar suas economias. O Kuwait criou um fundo nacional para
pequenas e médias empresas, com US$ 7 bilhões à disposição de
empreendedores.
O Qatar, por sua vez, toca um programa de US$ 15 bilhões para
estimular o turismo. A estratégia de tornar o setor uma das âncoras do
crescimento passa pelo fortalecimento da companhia aérea nacional, a Qatar
Airways. O governo apoia ainda a Cidade da Educação, um complexo que
reúne filiais de universidades estrangeiras que procura evitar a evasão de
cérebros do país e formar seus próprios especialistas nas mais variadas áreas.
— Os países do Golfo têm se destacado na busca por alternativas para
a era pós-petróleo pois são aqueles com mais dinheiro. Eles sofrem com a
baixa dos preços mas têm reservas elevadas que permitem bancar os
programas — disse Edmar Almeida, especialista em petróleo e gás do
Instituto de Economia da UFRJ.
A principal motivação é a expectativa de que o preço se mantenha
baixo por muito tempo. Após o barril do Brent (referência no mercado) ter
atingido o pico de US$ 146 em 3 de julho de 2008, a cotação caiu
vertiginosamente, especialmente nos últimos dois anos, até a mínima de US$
27,80, em 20 de janeiro deste ano. Ontem, valia US$ 44.
De um lado, a oferta de petróleo aumentou por investimentos feitos na
ampliação da produção. Além disso, os EUA levantaram as sanções relativas
ao programa nuclear do Irã, contribuindo para derrubar mais os preços, uma
vez que o quinto maior produtor mundial voltou ao mercado. No fim de
semana, a reunião da Organização dos Países Exportadores de Petróleo
(Opep) que buscava congelar a produção fracassou justamente porque o Irã
não assumiu o compromisso.
Do lado da demanda, a desaceleração da China também ajuda a manter
os preços baixos. A mediana das estimativas de analistas compiladas pela
Bloomberg aponta o preço do barril abaixo de R$ 50 até 2019. Isso não
significa, porém, que os países do Golfo estão buscando diversificar sua
matriz energética. Alexandre Szklo, professor da Coppe/UFRJ, lembra de
iniciativas como a do Qatar, que tem produzido painéis fotovoltaicos, mas
ressalta que outros países dependentes do petróleo têm projetos tímidos nesse
sentido.
— O maior uso das energias renováveis é estrutural, mas para
pensarmos em uma era sem petróleo é preciso criar uma alternativa para seu
uso no transporte, que é o maior desafio para substituí-lo — afirmou Szklo.
CENÁRIO É DIFERENTE NA ÁFRICA
A Noruega é outro exemplo de país com medidas para reduzir sua
dependência do petróleo. Dona do maior fundo soberano no mundo
atualmente, com patrimônio de US$ 850 bilhões, o país já teve 23% do PIB
atrelados ao setor petrolífero. Segundo o governo, essa fatia vai cair para 1%
em 2050, dependendo da cotação do petróleo. E isso não apenas pelo esforço
de diversificação econômica, como também pela produção declinante.
— A Noruega é um caso diferente dos países do Golfo, já que os
campos estão maduros. A busca pela diversificação é urgente, mesmo que o
preço estivesse alto — avaliou Walter Vitto, analista da consultoria
Tendências.
Situação bem diferente vivem os países africanos. Angola e Nigéria
são os maiores produtores de petróleo no continente. Eles mantêm programas
de exigência de conteúdo local para estimular a indústria nacional mas ainda
não conseguiram se livrar da dependência do petróleo. A Nigéria tem
buscado reforçar seu programa de substituição de importações, mas o
empresariado esbarra principalmente em gargalos de infraestrutura. Já
Angola deve iniciar conversas com o Fundo Monetário Internacional (FMI)
para contratação de crédito que lhe dê fôlego para atravessar a crise.
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