PROCESSO Nº : 3.629-3/2010 INTERESSADO : PREFEITURA MUNICIPAL DE POCONÉ ASSUNTO : CONSULTA RELATOR : CONSELHEIRO HUMBERTO BOSAIPO PARECER Nº : 030/2010 Excelentíssimo Senhor Conselheiro: Trata-se de consulta formulada pelo Senhor Clóvis Damião Martins, Prefeito Municipal de Poconé, conforme documento de fls. 02 e 03 TC, quanto à possibilidade de nomear servidor efetivo da área administrativa para responder como contador da Prefeitura, nos seguintes termos: Vimos por meio deste, solicitar de Vossa Excelência, consulta quanto a possibilidade de estar nomeando servidor dos quadros de efetivo da Prefeitura Municipal de Poconé, ocupante do cargo de Assistente Administrativo, mas que possui formação escolar de Técnico em Contabilidade, para responder como CONTADOR nos moldes recomendado por este Egrégio Tribunal, informando que tal servidor reúne todo conhecimento e qualificações necessárias para ocupação da referida função. Não foram juntados documentos complementares. É o relatório. 1. REQUISITOS DE ADMISSIBILIDADE A consulta foi formulada por autoridade legítima, com a apresentação objetiva do quesito e versa sobre matéria de competência deste Tribunal, logo foram preenchidos parte dos requisitos de admissibilidade prescritos no art. 48 da Lei Complementar nº 269/2007 (Lei Orgânica) c/c art. 232 da Resolução n° 14/2007 (Regimento Interno). Em relação ao requisito prescrito no inciso II do art. 232 da Resolução n° 14/2007, segundo o qual a consulta deve ser formulada em tese, observa-se que a questão proposta pelo consulente versa sobre a nomeação de servidor efetivo ocupante do cargo de Assistente Administrativo do quadro de pessoal da Prefeitura Municipal de Poconé para responder pela contabilidade daquele município, tratando-se, pois, de caso concreto. Contudo, considerando que o tema concernente à nomeação do contador em cargo de provimento efetivo tem sido objeto de muitas dúvidas pelos jurisdicionados, principalmente após a iniciativa da presidência deste Tribunal que encaminhou ofício circular às unidade gestores determinando a necessidade do contador ser servidor efetivo, vislumbra-se a presença de relevante interesse público que justifica o conhecimento da consulta pelo Relator, com a observação de que a resposta proferida por este Tribunal não constitui prejulgado do fato ou caso concreto, tudo nos termos do § 2º do art. 232 da Resolução n° 14/2007. Nesses termos, passa-se à análise, em tese, da consulta formulada. 2. MÉRITO Os serviços contábeis possuem natureza permanente junto à Administração Pública, e, em razão disso, este Tribunal firmou entendimento no sentido de que o cargo de contador deverá ser criado por lei e provido por meio de concurso público, nos termos do artigo 37, inciso II, da Constituição Federal, conforme decisões transcritas a seguir: […] no mérito, responder em tese, da impossibilidade de a Câmara Municipal utilizar da prestação de serviços contábeis por parte de servidor da Prefeitura, bem como, orientar o consulente no sentido de criar, por lei, o cargo de contador, no Plano de Cargos e Salários da Câmara Municipal de Alto Garças. (TCE/MT - Acórdão nº 1.589/2007) […] Conhecer - responder em tese - contratação de serviços desempenhados por profissionais especializados não-permanentes ou por pessoa jurídica, através de certame licitatório - serviços permanentes através de concurso público - observadas as exceções previstas em lei. (TCE/MT - Acórdão nº 947/2007) O Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina comunga de posição semelhante à desta Corte, conforme teor do seguinte prejulgado: Em face do caráter contínuo de sua função, o cargo de contador deve estar previsto nos quadros de servidores efetivos da Prefeitura Municipal e da Câmara de Vereadores, quando esta administrar seus próprios recursos, pois a atividade não se coaduna com cargos de livre nomeação e exoneração. O provimento do cargo de contador requer obrigatoriamente prévia aprovação em concurso público, conforme determina o art. 37, II, da Constituição Federal. A prática de registros contábeis e demais atos afetos à contabilidade são atribuições que devem ser acometidas a contabilista habilitado e registrado no Conselho Regional de Contabilidade, sob pena de infração à norma regulamentar do exercício profissional. Excepcionalmente, caso não exista o cargo de contador nos quadros de servidores efetivos da Prefeitura Municipal ou da Câmara de Vereadores, ou houver vacância ou afastamento temporário do contador ocupante de cargo efetivo, as seguintes medidas podem ser tomadas, desde que devidamente justificadas e em caráter temporário, até que se concluam, em ato contínuo, os procedimentos de criação e provimento do cargo de contador da unidade: […] 3 - Atribuir a responsabilidade pelos serviços contábeis a servidor efetivo do quadro de pessoal […]. É vedada a contratação de escritórios de contabilidade, pessoa jurídica, para a realização dos serviços contábeis da Prefeitura ou da Câmara Municipal, ante o caráter personalíssimo dos atos de contabilidade pública. (TCE/SC – Prejulgado nº 1277, alterado pela Decisão nº 3000/09) Não é outro o entendimento do Tribunal de Contas do Estado do Paraná, que firmou jurisprudência nos seguintes termos: EMENTA: PREJULGADO. REGRAS GERAIS PARA OS CONTADORES E ASSESSORES JURÍDICOS DOS PODERES LEGISLATIVO E EXECUTIVO, AUTARQUIAS, SOCIEDADES DE ECONOMIA MISTA, EMPRESAS PÚBLICAS E CONSÓRCIOS INTERMUNICIPAIS: (1) NECESSÁRIO CONCURSO PÚBLICO, EM FACE DO QUE DISPÕE A CONSTITUIÇÃO FEDERAL. […] (6) HAVENDO SERVIÇO DE CONTABILIDADE OU DE ASSESSORIA JURÍDICA, TANTO NO LEGISLATIVO QUANTO NO EXECUTIVO NO MÍNIMO 01 DOS INTEGRANTES DEVERÁ ESTAR REGULARMENTE INSCRITO NO CRC OU NA OAB. O DEPARTAMENTO PODERÁ SER CHEFIADO POR DETENTOR DE CARGO COMISSIONADO OU SERVIDOR EFETIVO COM FUNÇÃO GRATIFICADA. […] REGRAS ESPECÍFICAS PARA CONTADORES DO PODER LEGISLATIVO: (1) CARGO EM COMISSÃO: IMPOSSIBILIDADE, SALVO SE HOUVER UM DEPARTAMENTO DE CONTABILIDADE. NO MÍNIMO 01 DOS INTEGRANTES DEVERÁ ESTAR REGULARMENTE INSCRITO NO CRC. O DEPARTAMENTO PODERÁ SER CHEFIADO POR DETENTOR DE CARGO COMISSIONADO OU SERVIDOR EFETIVO COM FUNÇÃO GRATIFICADA. POSSÍVEIS […] CONSULTORIAS PARA QUESTÕES CONTÁBEIS QUE E JURÍDICAS: EXIJAM NOTÓRIA ESPECIALIZAÇÃO, EM QUE RESTE DEMONSTRADA A SINGULARIDADE DO OBJETO OU AINDA, QUE SE TRATE DE DEMANDA DE ALTA COMPLEXIDADE, [...], NÃO PODENDO SER ACEITAS PARA AS FINALIDADES DE ACOMPANHAMENTO DA GESTÃO. (TCE/PR – Prejulgado nº 06, Acórdão 1111/2008) Os precedentes acima demonstram que, em regra, o cargo de contador deve estar previsto nos quadros de servidores efetivos dos respectivos entes, a ser provido por meio de concurso público nos termos do art. 37, inciso II, da Constituição Federal, não sendo possível a nomeação do contador não-servidor em cargo de livre nomeação e exoneração, e tão pouco a atribuição da responsabilidade pelos serviços contábeis a prestadores de serviços contratados sob o regime da lei de licitações. A última vedação do parágrafo anterior não impede a contratação de assessorias contábeis e administrativas pala Administração Pública, desde que devidamente justificada pelo interesse público e observado os princípios constitucionais da economicidade, eficiência, legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade, o que, de toda forma, não afastará a responsabilidade do contador provido em cargo efetivo. Por outro lado, a necessidade de provimento do contador em cargo efetivo não impossibilita a atribuição da responsabilidade pelos serviços contábeis a servidor efetivo do quadro de pessoal técnico-administrativo do ente, principalmente em relação aos municípios menores, que possuem dificuldades para prover cargo efetivo de contador, tendo em vista o número reduzido de profissionais que atuam na área da contabilidade pública e a falta de atratividade dos salários oferecidos por alguns municípios. Nesses casos, os princípios constitucionais da economicidade, eficiência, razoabilidade e proporcionalidade, que regem a Administração Pública, autorizam a atribuição da responsabilidade pelos serviços contábeis a servidor efetivo do quadro de pessoal administrativo do ente, desde que devidamente habilitado como contador ou técnico em contabilidade e inscrito no Conselho Regional de Contabilidade, sendo que, no caso de habilitação como técnico de contabilidade, o servidor estará impedido de realizar as atribuições privativas dos contadores, o que não o inibe de promover a escrituração regular de todos os fatos relativos ao patrimônio da entidade, levantar os balanços de qualquer tipo e natureza e organizar os processos de prestação de contas a serem encaminhados aos respectivos órgãos de controle, tudo nos termos dos artigos 1º e 3º da Resolução CFC nº 560/2003. Deve-se observar ainda que na hipótese de atribuição da responsabilidade dos serviços contábeis a servidor efetivo é vedada a ocorrência de desvio de função e a inobservância à segregação de funções, permitido, no entanto, o pagamento de gratificação pelo exercício da função, no caso em que exercer atribuições de direção ou chefia, nos termos do art. 37, inciso V, da Constituição Federal. Em outras palavras, um servidor provido num cargo de natureza técnicoadministrativa, com formação contábil ou de técnico em contabilidade, devidamente inscrito no conselho respectivo, poderá assumir os serviços contábeis do ente, inclusive mediante a percepção de gratificação prevista em lei, quando no exercício de atribuições de chefia ou direção. Porém, tal servidor não poderá exercer outras atividades concernentes às demais fases dos processos administrativos do ente, pois deve-se observar o princípio da segregação de funções. Já o servidor efetivo titular de cargo que não tem natureza técnico-administrativa não poderá assumir os serviços contábeis do órgão, mesmo que possua habilitação e registro profissional para tanto, a exemplo de um professor com formação contábil, pois tal conduta configurar-se-ia desvio de função. 3. CONCLUSÃO Passa-se à resposta da questão suscitada pelo consulente: Vimos por meio deste, solicitar de Vossa Excelência, consulta quanto a possibilidade de estar nomeando servidor dos quadros de efetivo da Prefeitura Municipal de Poconé, ocupante do cargo de Assistente Administrativo, mas que possui formação escolar de Técnico em Contabilidade, para responder como CONTADOR nos moldes recomendado por este Egrégio Tribunal, informando que tal servidor reúne todo conhecimento e qualificações necessárias para ocupação da referida função. Em razão do que prescreve o art. 37, inciso II, da Constituição Federal, e considerando o caráter permanente da função, o cargo de contador deve estar previsto nos quadros de servidores efetivos dos respectivos entes, a ser provido por meio de concurso público, não sendo possível a nomeação de contador em cargo de livre nomeação e exoneração, e tão pouco a atribuição da responsabilidade pelos serviços contábeis a prestadores de serviços contratados sob o regime da lei de licitações. Por outro lado, os princípios constitucionais da economicidade, eficiência, razoabilidade e proporcionalidade, que regem a Administração Pública, autorizam a atribuição da responsabilidade pelos serviços contábeis a servidor efetivo do quadro de pessoal técnicoadministrativo do ente, desde que devidamente habilitado e inscrito no Conselho Regional de Contabilidade, sendo vedada, na hipótese, a ocorrência de desvio de função e a inobservância à segregação de funções, permitido, no entanto, o pagamento de gratificação pelo exercício da função, no caso em que exercer atribuições de direção ou chefia, nos termos do art. 37, inciso V, da Constituição Federal. Ao julgar o presente processo e em comungando este Egrégio Tribunal Pleno deste entendimento, sugere-se a seguinte ementa, com a observação de que a deliberação não constitui prejulgado do fato ou caso concreto (art. 232, § 2º, c/c art. 234, § 1º, da Resolução n° 14/2007), mas terá força normativa e constituirá pré-julgado de tese, caso seja aprovada por maioria dos Membros (art. 238 da Resolução n° 14/2007): Resolução de Consulta nº____/2010. Pessoal. Admissão. Profissionais com profissão regulamentada. Contador. Regra: provimento em cargo efetivo específico. Exceção: atribuição da responsabilidade pelos serviços contábeis a servidor efetivo. 1) O cargo de contador deve estar previsto nos quadros de servidores efetivos dos respectivos entes, a ser provido por meio de concurso público, conforme prescreve o art. 37, inciso II, da Constituição Federal, não sendo possível a nomeação de contador em cargo de livre nomeação e exoneração, e tão pouco a atribuição da responsabilidade pelos serviços contábeis a prestadores de serviços contratados sob o regime da lei de licitações. 2) Os princípios constitucionais da economicidade, eficiência, razoabilidade e proporcionalidade, que regem a Administração Pública, autorizam a atribuição da responsabilidade pelos serviços contábeis a servidor efetivo do quadro de pessoal técnico- administrativo do ente, desde que devidamente habilitado e inscrito no Conselho Regional de Contabilidade, vedada a ocorrência de desvio de função e a inobservância ao princípio da segregação de funções, permitido, no entanto, o pagamento de gratificação pelo exercício da função, no caso em que exercer atribuições de direção ou chefia, nos termos do art. 37, inciso V, da Constituição Federal. Posto isso, submete-se à apreciação do Conselheiro relator para decisão quanto à admissibilidade, sendo encaminhado na sequência ao Ministério Público junto ao Tribunal de Contas para manifestação (art. 236 do RITCMT). Cuiabá-MT, 4 de março de 2010. Bruno Anselmo Bandeira Ronaldo Ribeiro de Oliveira Consultor de Orientação ao Jurisdicionado Secretário-Chefe da Consultoria Técnica