Revista HUGV 2015 n.1 - Hospital Universitário Getúlio Vargas

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Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
The Journal of Getulio Vargas University Hospital
V.14. N. 1 JAN./JUN. – 2015
UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS
HOSPITAL UNIVERSITÁRIO GETÚLIO VARGAS
Rua Apurinã nº 04 – Praça 14 de Janeiro, Cep: 69020-170 Manaus - AM
Fones: (092) 3305-4708
E-mail: [email protected]
FUNDADORES
Ricardo Torres Santana
Jorge Alberto Mendonça
EDITOR-CHEFE
Fernando Luiz Westphal
LISTA DO CONSELHO CONSULTIVO DA REVISTA HUGV
Ana Wanda Guerra Barreto
Andréa Costa de Andrade
Aristóteles Comte Alencar
Armando de Holanda Guerra Júnior
Celsa Moura
Chang Yen Yin
Cristiano Silveira Paiva
Domingos Sávio Nunes de Lima
Edson de Oliveira Andrade
Ermerson Silva
Eucides Batista da Silva
Fernando César Façanha Fonseca
Fernando Luiz Westphal
Flávio Antunes de Souza
Francisco Mateus João
Gerson S. Nakajima
Ione Rodrigues Brum
Ivan Tramujas da Costa e Silva
Jean Jorge Silva de Souza
José Correa Lima Netto
Julio Mario de Melo e Lima
Juscimar Carneiro Nunes
Kathya Augusta Thomé Lopes
Leíla Inês de A. R. da Camara Coelho
Lourivaldo Rodrigues de Souza
Luís Carlos de Lima
Luiz Carlos de Lima Ferreira
Luiz Fernando Passos
Marcus Vinicius Della Coletta
Maria Augusta Bessa Rebelo
Maria do Socorro Lobato
Maria do Socorro L. Cardoso
Maria Fulgência Costa L. Bandeira
Maria Lizete Guimarães Dabela
Maria Rizelda Vinhote da Silva
Márcia Melo Damian
Marcus Tolentino
Massanobu Takatani
Miharu Magnória Matsuura Matos
Patrícia Bandeira de Melo
Petrus Oliva Souza
Renato Martins
Ricardo Torres Santana
Rodolfo Fagionato
Rosane Dias da Rosa
Rossiclei de S. Pinheiro
Rubem Alves da Silva Júnior
Patrícia Bandeira
Paula Rita da Silva Leite
Sandra Lúcia Euzébio
Taís Freire Galvão
Zânia Regina Ferreira Pereira
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Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
The Journal of Getulio Vargas University Hospital
V.14. N. 1 JAN./JUN. – 2015
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CULTURA
UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS
HOSPITAL UNIVERSITÁRIO GETÚLIO VARGAS
Copyright© 2015 Universidade Federal do Amazonas/HUGV
REITORA DA UFAM
Prof.ª Dra. Márcia Perales Mendes Silva
SUPERINTENDENTE DO HOSPITAL UNIVERSITÁRIO GETÚLIO VARGAS
Dr. Rubem Alves da Silva Júnior
PRODUÇÃO GRÁFICA-EDITORIAL
Fernando de Souza Neto
ORGANIZAÇÃO
Thaís Borges Viana
DIRETORA DA EDUA
Prof.ª Dra. Suely Oliveira Moraes Marquez
EDITOR-CHEFE DA REVISTA
Prof. Dr. Fernando Luiz Westphal
REVISÃO (LÍNGUA PORTUGUESA)
Cátia Taboada
REVISÃO (LÍNGUA INGLESA)
Tamara Coimbra
CAPA
Serviço de Ergodesign
TIRAGEM 300 EXEMPLARES
FICHA CATALOGRÁFICA
Ycaro Verçosa dos Santos – CRB-11 287
R454 Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas.
Revista do Hospital Getúlio Vargas. V. 14, n. 1 (2015) / Manaus: Editora da Universidade
Federal do Amazonas, 2013
81 p.
Semestral
Título da revista em português inglês
ISSN – 1677-9169
1. Medicina-Periódico I. Hospital Universitário Getúlio Vargas II. Universidade Federal do Amazonas.
CDU 61(051)
CDU 61(051)
Sumário
Editorial
Prof. Dr. Dirceu Benedicto Ferreira
Artigos Originais
Grupo Musas: Promoção da Saúde com um Grupo de Mulheres no Âmbito da Estratégia
Saúde da Família na Cidade Manaus-Am
14
Bárbara Misslane da Cruz Castro, Magda Sudário Pinheiro e Érica dos Santos Navegante
Percepções e Significados da Leptospirose entre Trabalhadores da Limpeza Urbana de
Manaus-Am
23
Erika Oliveira Abinader, Maria Luiza Garnelo Pereira
Relato de Caso
Nefrectomia Radical Laparoscópica em Paciente Testemunha de Jeová: Uma Opção de
Tratamento Minimamente Invasiva
30
Marcelo Guedes Halinski; George Lins de Albuquerque; Paulo Cézar de Vasconcelos; Cecília Mello Garcez;
Adriano Maia Siqueira e Cristiano Silveira Paiva
Agenesia de Tronco Celíaco: Relato de Caso
34
Anderson de Almeida Maciel, Sol Gomes Madrigal, Francisco Batista de Almeida, Samara Pontes Soares e Adria
Karina Farias de Aquino
Relato de Caso: Síndrome de Goodpasture
38
Alex Bruno Ferreira Rebelo, Adriana Drumond Sardinha Crispim Rodrigues, Christiany Moreira Almeida,
Rebecca Souza Mubarac Cavalcanti e Antônio Carlos Duarte
Insuficiência Aórtica Crônica Secundária à Dilatação da Raiz da Aorta em Adolescente com
Arterite de Takayasu - Relato de Caso
43
Raisa França Ribeiro, Ana Carolina dos Santos Pinto, Ana Carolina Santos Silva, Carla Diniz Nascimento Santos,
Renayra Tallita Luciano Alonso Coimbra, Gabriela Silva Vasconcelos
Relato de Caso: Malformação Adenomatoide Cística Pulmonar em Paciente Adolescente
49
Vanderlei Pereira Lima, Giselle Macedo de Souza, Diego Costa Matos,Tamara Mendes Ferrugem, Hugo Sanmaronny da Silva Cardoso e Ana Paula Leão
Displasia Fibrosa Craniofacial: Relato de um Caso na Amazônia
Felipe Jezini III, Fábio Arruda Bindá, Marco Antônio Cruz Rocha, Jefferson Moreira de Medeiros, Emily Barbosa
do Nascimento e Lia Mizobe Ono
54
Strongiloidíase Disseminada E Infecção Cutânea por Micobacteriose em Paciente com Lúpus
Eritematoso Sistêmico
60
Karine Gizele S. Pimentel e Domingos Sávio Nunes de Lima
Existe Relação entre Osteogênese Imperfeita e Hipertermia Maligna? Relato de Caso
64
Marco Antônio Fernandes Rabelo, Wendell Jackson de Macêdo Caldas, Christiane Rodrigues da Silva e Rodrigo
dos Reis Ferreira
Perfuração como Complicação de Linfoma Intestinal: Relato de Caso
68
Caroline Lima de Oliveira, Patricia Carvalho Machado Aguiar, Hugo Sanmarony Cardoso, João José Correa
Bergamasco, Rubem Alves da Silva Neto e Felicidad Santos Gimenez
Proteinose Alveolar Pulmonar: Relato de Caso
72
Flavia Matos Salame, Marta Helena Morais, Yuri Gonçalves Maduro e José Correa Lima Netto
Hérnia Diafragmática Congênita de Bochdalek em Paciente Portador da Síndrome de Ehlers
Danlos – Relato de Caso
Fernando Luiz Westphal, Luiz Carlos de Lima, Miriam Blanco Sampietro Pinheiro, Waleska Affonso Salignac
Marcião, Vania Mesquita Gadelha Prazeres, Thaís Caroline Sales Raposo e Maria Alyete Bezerra Moreira
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Contents
Editorial
Prof. Dr. Dirceu Benedicto Ferreira
Original Article
Group Muses: Health Promotion with a Group of Women in the Context of Health Strategy
Family in City Manaus-Am
14
Bárbara Misslane da Cruz Castro, Magda Sudário Pinheiro e Érica dos Santos Navegante
Perceptions and Meanings of Leptospirosis among Workers in Urban Cleaning Manaus-Am
23
Erika Oliveira Abinader, Maria Luiza Garnelo Pereira
Case Report
Laparoscopic Radical Nephrectomy in Patient of Jehovah Witness: A Minimally Invasive
Treatment Option
30
Marcelo Guedes Halinski, George Lins de Albuquerque, Paulo Cézar de Vasconcelos, Cecília Mello Garcez,
Adriano Maia Siqueira, Cristiano Silveira Paiva
Absence of the Celiac Trunk: Case Report
34
Anderson de Almeida Maciel, Sol Gomes Madrigal, Francisco Batista de Almeida, Samara Pontes Soares e Adria
Karina Farias de Aquino
Case Report: Syndrome of Goodpasture
38
Alex Bruno Ferreira Rebelo, Adriana Drumond Sardinha Crispim Rodrigues, Christiany Moreira Almeida,
Rebecca Souza Mubarac Cavalcanti e Antônio Carlos Duarte
Chronic Aortic Regurgitation Secondary to Dilation of the Aortic Root in Adolescents with
Takayasu Arteritis - Case Report
43
Raisa França Ribeiro, Ana Carolina dos Santos Pinto, Ana Carolina Santos Silva, Carla Diniz Nascimento Santos,
Renayra Tallita Luciano Alonso Coimbra, Gabriela Silva Vasconcelos
Case Report: Cystic Adenomatoid Malformation of the Lung in Teenager Pacient
49
Vanderlei Pereira Lima, Giselle Macedo de Souza, Diego Costa Matos,Tamara Mendes Ferrugem, Hugo
Sanmaronny da Silva Cardoso e Ana Paula Leão
Craniofacial Fibrous Dysplasia: A Case Report in the Amazon
Felipe Jezini III, Fábio Arruda Bindá, Marco Antônio Cruz Rocha, Jefferson Moreira de Medeiros, Emily Barbosa
do Nascimento e Lia Mizobe Ono
54
Dissemnated Strongyloidiasis and Cutaneous Mycobacterium Infecction in a Systemic Lupus
Erythematosus Patient
60
Karine Gizele S. Pimentel e Domingos Sávio Nunes de Lima
There Relationship between Osteogenesis Imperfecta and Malignant Hyperthermia?
64
Marco Antônio Fernandes Rabelo, Wendell Jackson de Macêdo Caldas, Christiane Rodrigues da Silva e Rodrigo
dos Reis Ferreira
Perforation as Complication of Intestinal Lymphoma
68
Caroline Lima de Oliveira, Patricia Carvalho Machado Aguiar, Hugo Sanmarony Cardoso, João José Correa
Bergamasco, Rubem Alves da Silva Neto e Felicidad Santos Gimenez
Pulmonary Alveolar Proteinosis: A Case Report
72
Flavia Matos Salame, Marta Helena Morais, Yuri Gonçalves Maduro e José Correa Lima Netto
Bochdalek-Type Congenital Diaphragmatic Hernia in a Patient with Ehlers Danlos Syndrome
– A Case Report
Fernando Luiz Westphal, Luiz Carlos de Lima, Miriam Blanco Sampietro Pinheiro, Waleska Affonso Salignac
Marcião, Vania Mesquita Gadelha Prazeres, Thaís Caroline Sales Raposo e Maria Alyete Bezerra Moreira
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Editorial
Faculdade de Medicina da Ufam – 50 anos
A formação de médicos no estado do Amazonas iniciou-se depois da criação da Faculdade
de Medicina da Universidade do Amazonas (UA, hoje UFAM) através da Resolução do CONSUNI
nº 06/65, de 20/11/1965, instalada em sessão solene em 04/12/1965. Logo depois aconteceu
o primeiro vestibular e em maio do ano seguinte (1966) a primeira turma de alunos iniciou os
estudos. A formatura desses pioneiros aconteceu em 1971, em sessão solene no Teatro Amazonas,
contando com a presença das maiores autoridades do Estado, tal a importância que o curso tinha
para a cidade e para a região amazônica. Naquele ano também aconteceu o credenciamento do
curso junto ao Ministério da Educação (MEC) através do Decreto nº 69609, de 29/11/1971.
Inúmeros acontecimentos históricos marcaram aqueles anos 60 relacionados com a alegria da
população amazonense. Muito se escreveu sobre a infraestrutura predial, professores, alunos,
funcionários, currículo e ocupação do Hospital Getúlio Vargas (HGV, hoje HUGV). Vale lembrar
que vivíamos a época da ditadura militar, início da Zona Franca de Manaus, presenciando-se uma
expansão da cidade para todos os lados e chegada de pessoas de todo o Brasil. Os nossos primeiros
alunos vinham de toda parte! Metade era daqui e a outra metade de diferentes estados brasileiros
(“excedentes”). Muitos deles aqui se fixaram, construíram suas famílias, vidas e profissão. Enfim,
nestes 50 anos de existência já graduamos 3888 (três mil oitocentos e oitenta e oito) médicos. Um
dos fatos marcantes do início (década de 70) foi a doação de grande gleba de terra ao lado do INPA
destinado a albergar o Campus Universitário da UA. Naquele mesmo período cria-se o Instituto de
Ciências Biológicas (ICB) no “Mini-Campus”, nosso maior aliado na formação médica. Os alunos até
hoje iniciam o “ciclo básico” no ICB e depois completam os estudos na Faculdade de Medicina, ao
lado do HUGV. As distâncias nos separam em dois segmentos.
Durante o processo de concepção, criação e implantação do curso, tomaram à frente inúmeros
idealistas, professores, políticos e cidadãos que não caberia à citação neste resumo. Em 1965 era
Presidente do Brasil o General Castelo Branco. Aqui no estado do Amazonas capitaneava e fazia
as interlocuções o Governador Arthur Cézar Ferreira Reis. Dentro da Universidade do Amazonas
destacou-se o Magnífico Reitor Jauary Guimarães S. Marinho. Instalou-se definitivamente a
Faculdade de Medicina pelo Conselho Universitário da época.
Como toda instituição nova, existiram muitas dificuldades iniciais, superadas nos anos sessenta
e setenta. Manaus era uma cidade pequena (cerca de 300.000 habitantes), contava com poucos
médicos (cerca de 80) e era distante dos grandes centros. Além disso, havia profissionais contrários
à sua criação nesta capital. Mesmo com tudo isso, ela iniciou funcionando precariamente nas
dependências de um antigo grupo escolar (“Plácido Serrano”, apelidado de “Tio Patinhas”) aos
fundos do Hospital Getúlio Vargas, que também iniciou suas atividades no ano de 1965. Vários
professores desbravadores e empreendedores fizeram a faculdade funcionar. Presenciávamos
esforços hercúleos e garra descomunal dos estudantes das primeiras turmas. Em 1967 foi construído
o prédio da “escola médica”, o mesmo que ainda utilizamos hoje, na Rua Afonso Pena, 1053, Praça
14 – cruzando com a antiga “Boulevard Amazonas”. Por outro lado, o Hospital Getúlio Vargas (hoje
HUGV), aparelhado junto com seu Pronto Socorro, e um ambulatório (Ambulatório Araújo Lima –
AAL) também começaram a funcionar. Nesses dois locais nossos estudantes tiveram grande parte
dos cenários de prática para o “ciclo profissional”, em especial nas áreas Clínicas e Cirúrgicas.
Outra grande parte de cenários era espalhada pela cidade de Manaus, o que ainda hoje é nossa
realidade.
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O Período Intermediário – Anos 80 e 90
Nos anos seguintes (décadas de 70, 80, 90) passamos por um período de consolidação da Escola.
Foi criada a Faculdade de Ciências da Saúde (FCS) que reunia três cursos: Medicina, Odontologia e
Farmácia. Esta estrutura tornou-se uma das mais complexas da UFAM em todos os sentidos. Visava
otimizar esforços, permitindo realizar práticas multiprofissionais. A estrutura administrativa e
pedagógica ficava fragmentada entre o ICB, Medicina, Odontologia e Farmácia. As práticas eram
espalhadas pela cidade em múltiplos locais, serviços de saúde, hospitais e postos de saúde. Além
disso, iniciavam os estágios no interior do estado do Amazons através do CRUTAC que cresceram e
hoje se apresentam como importante referencial de nossa escola. Em 2007, a FCS foi desmembrada.
A partir daí as três faculdades passaram a atuar separadamente até hoje.
Paralelamente outro fato histórico merece menção. Em 1982 todo o patrimônio do HGV, do estado
do Amazonas, foi transferido para a UFAM, transformando-se no Hospital Universitário Getúlio
Vargas (HUGV). Registre-se que nos anos anteriores tinha havido discussões calorosas sobre o fato
de permanecermos no quarteirão do HUGV ou de nos transferirmos para o Hospital Adriano Jorge
e adjacências, tendo sido vitoriosa a primeira proposta. Esse tema ficou na memória do passado.
A partir de 1971 nossos egressos (médicos) passaram a ocupar o vazio profissional existente na
cidade de Manaus, municípios do interior e toda Amazônia Ocidental (Acre, Rondônia, Roraima,
interior do Amazonas e parte do Pará). Deve ser registrado que durante 30 anos a UFAM colocava
no mundo profissional cerca de 100 médicos por ano, sendo a única formadora de médicos para
a Amazônia Ocidental. Muitos de nossos egressos voltaram para suas terras natais para por lá
trabalharem. Hoje existem três escolas médicas em Manaus, que graduam cerca de trezentos
novos profissionais a cada ano. Além disso, é digno ser lembrado que atualmente (2015) existem
19 (dezenove) faculdades de medicina na Região Norte, graduando cerca de 1.200 médicos nesta
região.
Na esteira da história de Manaus (anos 70, 80, 90) vemos a criação de vários hospitais, cuja
“sementeira” foi a nossa Faculdade de Medicina, incluindo-se: Hospital de Moléstias Tropicais
“Dr. Heitor Dourado” (IMT-HVD); FHEMOAM – Fundação Hospitalar Hematologia e Hemoterapia
do Amazonas; FCECON – Fundação Centro de Controle de Oncologia. Mais recentemente entrou
em cena o Hospital Francisca Mendes (HFM), especializado em doenças cardíacas. Os nossos
egressos passaram a ocupar as lacunas vazias dos diversos serviços de saúde pública e privada:
Maternidades, UBS (Unidades Básicas de Saúde), serviços de urgência e emergência, serviços de
Pronto Atendimento e hospitais consolidados na capital (Ex.: Pronto Socorro 28 de Agosto, Pronto
Socorro João Lúcio, FUAM – Fundação Alfredo da Mata – Dermatologia e Venereologia; Hospital
Adriano Jorge, Hospital Beneficente Português, etc), bem como o Instituto de Medicina Legal (IML)
e muitos outros locais.
É relevante também ser lembrado que foram criadas duas novas escolas médicas no Amazonas, as
quais puderam ser consolidadas pela existência de recursos humanos oriundos de nossa UFAM: a
Faculdades de Medicina da Universidade do Estado do Amazonas (UEA) e Faculdade de Medicina
da Universidade Nilton Lins (UniNiltonLins).
Anos Mais Recentes – 2000 a 2015
Muitos e novos desafios aparecem a partir do início deste milênio.
A antiga Manaus da Era da Borracha, a pacata e provinciana cidadezinha que tinha dado o início
à Escola Livre de Manáos fica nas recordações e nas grandiosas construções lendárias. Hoje temos
uma metrópole com quase dois milhões de habitantes onde atuam mais de 3.500 médicos. Existe
uma complexa rede de serviços de saúde, hospitais públicos, clínicas privadas, cooperativas e um
Sistema Único de Saúde (SUS) em estruturação na baixa complexidade, média complexidade e alta
complexidade. Exige-se que a escola médica acompanhe essa evolução, formando profissionais
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voltados para o SUS, em quantidade maior e com excelência na qualidade.
Nossos professores passaram a se qualificar para melhor atender a faculdade e a população. Foram
criados mais de 20 programas de Residência Médica para diferentes especialidades (iniciada em
1978, mas incrementada nos anos mais recentes). Criaram-se a Residência Multiprofissional e outros
Programas de Pós-Graduação lato sensu e stricto sensu (Mestrado). Neste ano (2015) apoiamos a
criação de mais um curso de medicina, na cidade de Coari, uma vez que aderimos ao programa
de expansão proposta pelo Governo Federal, nos moldes das Diretrizes Curriculares Nacionais
(DCN-2014), voltados para o SUS. Deverá estar funcionando em dois anos, com a promessa de
financiamento federal.
Na intimidade de nossos colegiados passamos a discutir profundamente e enfaticamente a Formação
Médica, resultando em profundas mudanças estruturantes em vários aspectos: (1º) sistemas de
entradas: hoje ENEM e PSC; (2º) sistemas de procedimentos pedagógicos: hoje voltadas para
metodologias ativas, centradas nos aprendizes; (3º) sistemas de avaliações: hoje mais flexíveis,
por desempenho de cada estudante, valorizando-se trabalhos em equipe e competências; (4º)
avaliação institucional em sintonia com Planejamento de Desenvolvimento Institucional; (5º)
desafio de se construir um curso no Amazonas, pelo Amazonas e para o Amazonas. Essas discussões
são antigas (década de 80), tendo sido iniciadas nos congressos da Associação Brasileira de
Educação Médica (ABEM) e depois chegaram ao Ministério da Educação e INEP. Do MEC tem vindo
as Diretrizes (DCN-2001 e DCN-2014), passando a exigir formação do médico mais “generalista”,
subordinando-se nas necessidades epidemiológicas locais, priorizando a visão sociocêntrica e a
atuação no SUS, procurando diminuir a atuação hospitalocêntrica (tanto em nível do mundo da
formação, como no mundo do trabalho).
Vieram os Provões do MEC na era FHC (década de 90). Logo a seguir surgiu o SINAES (Sistema
Nacional de Avaliação das Escolas Superiores). Nossos estudantes foram submetidos a rigorosas
avaliações através do ENADE. Outras avaliações foram feitas no projeto pedagógico, corpo docente
e infraestrutura. Fomos surpreendidos com resultados pouco satisfatórios nos anos 2004 e 2007,
razão de visitas e auditorias federais. Tivemos que fazer inúmeras readequações, revitalizações e
melhorias em praticamente todos os nossos procedimentos, incluindo a implantação de um novo
currículo, marcado com forte apoio da UFAM em todos os sentidos. Tivemos um marcante esforço
e trabalho dos professores. Por outro lado os alunos responderam extraordinariamente bem no
próximo ENADE de 2010. O resultado foi exitoso, colocando-nos no 75º lugar entre 200 escolas!
Passamos a ser considerados o melhor curso de medicina do Norte do Brasil.
O que será de nosso futuro? Certamente procuraremos a cada dia a busca da excelência de
qualidade. Preocupa a todos a eterna falta de investimento e poucos recursos governamentais
destinados para a educação, dramaticamente exuberados neste ano de 2015 (governo de Dilma
Roussef), uma vez que não existe educação de qualidade sem recursos, sem investimento.
Prof. Dr. Dirceu Benedicto Ferreira
Diretor da Faculdade de Medicina da UFAM
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GRUPO MUSAS: PROMOÇÃO DA SAÚDE COM
UM GRUPO DE MULHERES NO ÂMBITO DA
ESTRATÉGIA SAÚDE DA FAMÍLIA NA CIDADE DE
MANAUS-AM
GROUP MUSAS: HEALTH PROMOTION WITH A GROUP OF WOMEN IN THE CONTEXT OF
FAMILY HEALTH STRATEGY IN MANAUS CITY
Bárbara Misslane da Cruz Castro,* Magda Sudário Pinheiro,** Érica dos Santos Navegante*
Resumo
Objetivos: Descrever as atividades educativas realizadas com um grupo operativo de mulheres –
MUSAS (Mulheres Saudáveis), criado no âmbito da Atenção Básica, no Módulo de Saúde da Família
Dr. Silas de Oliveira Santos, localizado na zona leste da cidade de Manaus, através da abordagem de
temas referentes à promoção da saúde da mulher, no período de abril a maio de 2013. Metodologia:
Trata-se de um relato de experiência acadêmica vivenciado por enfermeiras, residentes em
enfermagem obstétrica nas atividades do Programa de Pós-graduação em Residência em Área
Profissional da Universidade Federal do Amazonas (UFAM). No desenvolvimento das atividades
do grupo MUSAS realizou-se rodas de conversas, oficinas, palestras e dinâmicas, com ênfase em
terapia comunitária descrita por Paulo Freire e no trabalho com grupos operativos de PichonRivière. Resultados: Os resultados foram positivos, uma vez que dinâmicas proporcionaram um
espaço de diálogo entre as mulheres. As discussões baseadas em dinâmicas facilitaram o processo
de ensino-aprendizagem e de troca de experiências entre as participantes. Percebeu-se, ao longo
dos encontros, que as mulheres encontravam-se mais alegres, empolgadas, empoderadas, com
aspiração a descoberta de novos conhecimentos e práticas em saúde. Conclusão: No grupo –
como espaço que possibilita as formações de vínculos, de identificações e de diferenciações –
trabalha-se com a subjetividade e com a singularidade de cada um de seus integrantes. Os grupos
caracterizam-se por ser um espaço de escuta, em que o coordenador indaga, pontua e problematiza
as falas, dando oportunidade aos seus integrantes pensarem, falarem de si e poderem elaborar
melhor suas próprias questões.
Palavras-chave: da Mulher; Saúde da Família; Promoção da Saúde.
Abstract
Goals: To describe the educational activities carried out at an operating group of women - MUSAS
(Healthy Women), established under the Primary Care in Family Health Module Dr. Silas de Oliveira
Santos, located on the east side of the city of Manaus, through the issues relating to the promotion
of women’s health approach, from April to May 2013. Methodology: This is an academic experience
reported by nurses, residents in midwifery in the activities of the Graduate Program in Housing
Professional Area in the Federal University of Amazonas (UFAM). In the development of the group’s
activities MUSAS held circle conversations, workshops, lectures and dynamic, with an emphasis
on community therapy described by Paulo Freire and working with operative groups of Pichon-
*Enfermeira residente do Programa de Residência em Área profissional em Saúde da Universidade Federal do Amazonas.
** Psicóloga. Especialista em Terapia Cognitivo-Comportamental.
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GRUPO MUSAS: PROMOÇÃO DA SAÚDE COM UM GRUPO DE MULHERES NO ÂMBITO DA ESTRATÉGIA
SAÚDE DA FAMÍLIA NA CIDADE DE MANAUS-AM
Rivière. Results: The results were positive, because dynamics have allowed a dialogue among
women. Dynamic-based discussions facilitated the process of teaching-learning and exchange
of experiences among participants. It was noticed over the meetings, women found themselves
more joyful, excited, empowered with suction the discovery of new knowledge and health
practices. Conclusion: In the group - a space that allows the formation of bonds, identification
and differentiation - we work with subjectivity and the uniqueness of each one of its members.
The groups are characterized by being a listening space, where the coordinator asks, scores and
discusses the lines, giving opportunity to its members think, speak for themselves and are better
able to develop their own questions.
Keywords: Women’s Health; Family Health; Health Promotion
Introdução
sua singularidade, na complexidade, na
integralidade e na inserção sociocultural e
Na década de 1980, a saúde da mulher – como busca a promoção de sua saúde, a prevenção e
uma das prioridades do governo brasileiro – tratamento de doenças e a redução de danos ou
limitava-se ao cuidado voltado para o período de sofrimentos que possam comprometer suas
gravídico-puerperal. Diante dessa contestação, possibilidades de viver de modo saudável.4
em 1984, o Ministério da Saúde criou o Programa
de Assistência Integral à Saúde da Mulher A Estratégia Saúde da Família (ESF) é o modelo
(PAISM), que surgiu da necessidade de ampliar assistencial daAtenção Básica, que se fundamenta
essa política pública visando à consolidação no trabalho de equipes multiprofissionais em um
de estratégias básicas de assistência integral à território adstrito e desenvolve ações de saúde a
saúde da mulher, incluindo ações educativas, partir do conhecimento da realidade local e das
preventivas, de diagnóstico, tratamento e necessidades de sua população. O modelo da
recuperação, aplicadas permanentemente e de ESF busca favorecer a aproximação da unidade
maneira não repetitiva, tendo como objetivo de saúde das famílias, promover o acesso
a melhoria dos níveis de saúde das mulheres aos serviços, possibilitar o estabelecimento
de vínculos entre a equipe e os usuários, a
brasileiras.1
continuidade do cuidado e aumentar – por
Nessa perspectiva, o Ministério da Saúde meio da corresponsabilização da atenção – a
instituiu a Política Nacional de Atenção à capacidade de resolutividade dos problemas de
Saúde da Mulher com base nos princípios da saúde mais comuns, produzindo maior impacto
descentralização das ações, regionalização, na situação de saúde local.5
equidade na atenção e participação comunitária
para modificar e melhorar a assistência à saúde Nesse contexto a ESF é responsável pelo
da mulher brasileira, buscando principalmente desenvolvimento de ações que promovam a
a maior atenção em todas as fases da vida da humanização da assistência à saúde da mulher e
a qualidade da atenção, bem como as condições
população feminina.2
essenciais para o estabelecimento de vínculos
As diretrizes dessa política buscam consolidar os entre sujeitos, ainda que possam apresentaravanços na atenção obstétrica, no planejamento se muito distintos conforme suas condições
familiar, na atenção ao abortamento, no combate sociais, raciais, étnicas, culturais e de gênero.6
à violência doméstica e sexual, agregando,
também, a prevenção e o tratamento de Alguns desafios para a ESF são de garantir a
doenças sexualmente transmissíveis e a atenção qualidade da atenção à saúde da mulher –
às mulheres com HIV, assim como as portadoras respeitando seus direitos humanos, dentro de
um marco ético que garanta a integralidade da
de doenças crônico-degenerativas.3
sua assistência e seu bem-estar –, bem como de
A Atenção Básica considera o sujeito em identificar problemas e dispor de mecanismos
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v.14. n.1 jan./jun. - 2015
Castro et al
resolutivos que possibilitem atender às suas
demandas.6
perímetro de 4.480 metros, divididos em vinte
e uma microáreas.
A escuta, a responsabilização e a criação de
vínculos com a inserção da abordagem de
gênero oferecem à mulher possibilidades de
serem sujeitos e de que devem fazer parte
de um projeto de reorganização das práticas
direcionadas pela integralidade do cuidado.7
A unidade abrange três equipes de Estratégia
Saúde da Família – L111, L112, L138 –,
compostas de vinte e três agentes comunitários
de saúde (ACS), duas enfermeiras, três técnicas
de enfermagem, dois médicos, uma cirurgiãdentista, um auxiliar de consultório dentário e
uma assistente social.
Desse modo, através de uma análise das
características socioculturais de mulheres da
área adstrita do Módulo de Saúde da Família Dr.
Silas de Oliveira Santos emergiu a necessidade
de promover ações em saúde, que fortaleçam
e promovam o empoderamento da população
feminina voltadas ao autocuidado e à qualidade
de vida.
Portanto, esse estudo teve como objetivo
descrever as atividades educativas realizadas
com um grupo operativo de mulheres – MUSAS
(Mulheres Saudáveis) –, criado no âmbito da
Atenção Básica, no Módulo de Saúde da Família
Dr. Silas de Oliveira Santos, localizado no
bairro São José Operário, zona leste da cidade
de Manaus, através da abordagem de temas
referentes à promoção da saúde da mulher,
incluindo temáticas que envolvem autoestima,
autocuidado, importância da realização do
exame colpocitológico e do autoexame das
mamas.
Metodologia
Trata-se de um relato de experiência acadêmica
vivenciado por enfermeiras, residentes em
enfermagem obstétrica nas atividades do
Programa de Pós-graduação em Residência em
Área Profissional da Universidade Federal do
Amazonas (UFAM), junto ao Módulo de Saúde da
Família Dr. Silas de Oliveira Santos, localizado no
bairro São José Operário, conjunto Castanheira,
zona leste da cidade de Manaus-AM. A atividade
foi realizada no período de abril a maio de 2013.
O módulo de Saúde da Família Dr. Silas de Oliveira
Santos foi inaugurado no dia 26 de novembro
de 2007, situado no loteamento castanheira,
bairro São José, zona leste de Manaus. Possui
estrutura de 400 metros quadrados, área
adstrita de 965.860 metros quadrados, em um
A estrutura física da unidade é composta por
uma recepção, uma sala de espera, quatro
consultórios, um consultório ginecológico, uma
sala de vacina, três consultórios odontológicos,
um escovódromo, uma sala de curativo, uma
farmácia, uma sala para ACS, quatro banheiros
e uma sala de almoxarifado.
Durante as atividades assistenciais voltadas à
saúde da mulher, observou-se a necessidade da
criação de um grupo de mulheres, que buscasse
atender além das demandas assistências. A partir
dessa visão ampliada, a equipe de residentes
criou um grupo de mulheres, intitulado MUSAS
–Mulheres Saudáveis –, com o objetivo de tratar
de informações referentes à saúde da mulher.
Para a criação do grupo contou-se com a
participação de profissionais-facilitadores,
na figura das enfermeiras e dos agentes
comunitários de saúde. O grupo MUSAS foi
coordenado por quatro enfermeiras residentes
e duas enfermeiras da unidade.
As atividades educativas aconteceram na
própria unidade, no turno da tarde, com
duração de duas horas. A opção foi pelo período
da tarde, pois as mulheres já cumpriram com
seus “afazeres do lar”, estando disponíveis
para participarem das atividades. Criou-se um
ambiente alegre e descontraído, favorecendo
a participação e a aprendizagem. Buscou-se
fortalecer o autocuidado e a promoção da saúde
das mulheres, contribuindo para o aumento da
autonomia e cidadania.
A pesquisa ocorreu por meio de observação
participante, ou seja, “o pesquisador inserese no grupo observado tornando-se parte dele,
buscando compartilhar o cotidiano dos sujeitos
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GRUPO MUSAS: PROMOÇÃO DA SAÚDE COM UM GRUPO DE MULHERES NO ÂMBITO DA ESTRATÉGIA
SAÚDE DA FAMÍLIA NA CIDADE DE MANAUS-AM
de modo a captar os seus conflitos e tensões e
sentir-se na mesma situação.”
Na observação participante a interação social
deve ser compreendida, sendo preciso atentar
para o aspecto ético e o perfil íntimo das
relações sociais, ao lado de suas tradições,
costumes e a importância que lhe são atribuídos
os sentimentos do grupo na compreensão de sua
vida, verbalizado pelos próprios.8
pela jornada tripla do dia a dia – de mãe, esposa
e trabalhadora. Participaram do grupo quinze
mulheres, com média de idade entre 20 a 65
anos.
A dinâmica desse encontro intitulou-se O
que me representa como pessoa. Utilizou-se
uma caixa com vários objetos: maquiagem,
perfume, secador de cabelo, panela, óculos,
celular, brinco, pulseiras, lingerie, chupeta,
mamadeira, fogão, carteira, gravata etc. Estes
No desenvolvimento das atividades do grupo objetos visavam representar o cotidiano da
MUSAS realizou-se rodas de conversas, oficinas, mulher em seus diversos papéis na sociedade.
palestras e dinâmicas, com ênfase em terapia A caixa passava pelas mãos de cada mulher e
comunitária descrita por Paulo Freire e no cada uma delas escolhia um objeto que mais a
trabalho com grupos operativos de Pichon- representassem.
Rivière.16-20
O tema do segundo encontro foi O que eu sou?
As mulheres que compuseram o grupo operativo, Nesse encontro contou-se com a participação de
denominado MUSAS, eram provenientes das vinte e três mulheres, com idade entre 25 a 53
consultas de enfermagem. Sendo o referido anos. A dinâmica desse encontro foi intitulada
grupo um espaço de diálogo aberto entre Dinâmica do conhecimento do eu interior.
profissional e cliente, o que remetia a Utilizou-se uma caixa com um espelho fixado
necessidade de informações em saúde por meio ao fundo. A caixa passava pelas mãos de cada
de uma escuta atenta e qualificada.
mulher com o propósito de induzir as mesmas
a se virem no espelho e interpretarem a sua
Nas consultas eram oferecidas às mulheres autoimagem através do reflexo do espelho.
convites com atividades pré-agendadas e
temáticas pré-definidas. No processo de Observou-se – na primeira dinâmica – que a
divulgação os agentes comunitários de maioria das mulheres escolheu objetos que
saúde tiveram papel relevante, visto que faziam alusão as figuras de mãe e de esposa.
na oportunidade das visitas domiciliares Alguns relatos verbais referiram a preocupação
entregavam convites do grupo nas residências. com a família (situação conjugal, brigas etc.)
No primeiro encontro foi firmado um contrato e com os filhos (escolaridade, profissão,
com o grupo – constituído por quinze mulheres –, constituição de caráter e de pessoa).
de que a demanda seria espontânea, com quatro
encontros quinzenais, no período vespertino, Os resultados foram positivos, uma vez
com duração de duas horas.
que as duas dinâmicas, acima descritas,
proporcionaram um espaço de diálogo entre
As temáticas foram abordadas e as dinâmicas as mulheres. Todas participaram ativamente
construídas de acordo com a participação no grupo. Muitas referiram esquecer-se de
das mulheres envolvidas nesse processo, si mesmas e projetavam seus objetivos no
sendo os valores e os saberes de cada mulher crescimento e desenvolvimento dos filhos,
valorizados e reconhecidos, exercendo papel de quando não se dedicavam ao lar e ao marido.
potencialidade dentro do grupo.
Através da realização dessas atividades
pudemos observar que muitas têm problemas
conjugais, que são mulheres subjugadas, sem
Resultados
empoderamento de suas próprias vidas.
O tema do primeiro encontro foi Resgatando
a Deusa Interior. Tratando-se do resgate da No terceiro encontro participaram vinte e sete
autoestima da mulher, muitas vezes esquecida mulheres, com idade entre 19 a 47 anos. Utilizou| 17 |
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Castro et al
se como método de abordagem a temática da
prevenção do câncer de mama e a importância
do autoexame. Foram utilizados dois aventais
com protótipos de mamas, dispostos no centro
de um círculo. Conforme os aventais eram
repassados às mulheres, uma a uma os vestiam.
De olhos fechados as mulheres eram indagadas
sobre a representatividade daquelas mamas
para a sua vida, durante todo o seu ciclo de
crescimento, desenvolvimento e reprodutivo.
Como último momento da atividade, as mulheres
eram solicitadas a apalparem “suas mamas”
(protótipos), e com base nos “achados” da
palpação eram indagadas sobre o diagnóstico
de câncer de mama.
da mulher sem receber necessariamente uma
valorização especial.
No quarto encontro foi abordada a temática
do câncer de colo de útero e a importância
do exame de Papanicolau (preventivo) através
da dinâmica Fala Sério ou Com Certeza.
Inicialmente as mulheres foram dispostas
sentadas em cadeira sob a forma de um júri. Para
cada participante foram dadas duas plaquinhas,
uma na cor verde e outra na cor vermelha. A
atividade foi coordenada por duas facilitadoras,
onde uma fez a contagem dos pontos de cada
participante e a outra, as perguntas.
A facilitadora – responsável pela atividade – fez
Na retratação da autoimagem das mamas, as perguntas sobre as condições para a realização
mulheres descreveram o modo como o corpo do exame preventivo e a importância da
se apresenta para elas. Pudemos observar que prevenção. De acordo com a resposta certa, na
grande parte das participantes descreveu a concepção das mulheres, as mesmas levantavam
importância das mamas na adolescência como a plaquinha verde (“com certeza”), quando a
descoberta da sexualidade, o crescimento e o resposta era considerada errada levantavam a
desenvolvimento do corpo, o uso de sutiã, o plaquinha vermelha (“fala sério”).
atrativo para os parceiros e o sentido de ser
mulher. Já no período reprodutivo-gestatório Percebeu-se, portanto, nesse último encontro,
a retratação das mamas ganhou outra visão, que as mulheres pouco conheciam sobre os
considerada fonte de alimentação ao bebê, em efeitos devastadores do câncer de colo de útero.
virtude da dependência de outro ser.
Elas acreditavam que a realização do exame
preventivo era primordial para o diagnóstico de
Os seios simbolizam a maternidade e a vaginoses e doenças sexualmente transmissíveis,
sensualidade feminina, o que justifica o temor compreendendo em menor importância a
das mulheres de perdê-los.9 Nesse sentido, realização para fins de detecção e prevenção
buscou-se desvelar os sentimentos das mulheres do câncer de colo de útero. A dinâmica permitiu
com suposto diagnóstico de câncer de mama elucidar a importância do exame, bem como as
em relação à sua autoimagem e autoestima. condições e periodicidade para sua realização,
Ao apalparem as próteses de mamas e se virem desmistificando mitos e inverdades.
com nódulos, as mulheres relataram muito
medo do câncer de mama, por conta da sua
Discussão
alta frequência e, principalmente, pelos efeitos
psicológicos devastadores, que afetam a visão
A Estratégia da saúde da família (ESF) é
que têm de sua feminilidade.
caracterizada
pela
multidisciplinaridade
do
trabalho
em
equipe.
Uma das principais
Relatos referentes à preocupação de rejeição
dos maridos e/ou namorados foi constante ferramentas para promoção da saúde,
na fala das pacientes. As falas mostraram a prevenção (primária e/ou secundária) de
representatividade da mama para a mulher como doenças e integralidade é o trabalho em grupo,
símbolo de beleza e erotismo.19 Ao contrário em especial dos grupos operativos.
dessa representatividade, alguns depoimentos
refletiram um outro significado. Nesses, as Nos cotidianos dos serviços de saúde observamamas eram percebidas como uma estrutura se a carência de grupos operativos, seja pela
que, juntamente com outras, compõe o corpo demanda e sobrecarga de serviços de saúde,
seja pela descontinuidade na participação pela
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GRUPO MUSAS: PROMOÇÃO DA SAÚDE COM UM GRUPO DE MULHERES NO ÂMBITO DA ESTRATÉGIA
SAÚDE DA FAMÍLIA NA CIDADE DE MANAUS-AM
própria comunidade.
A técnica de grupos operativos descrita por
Pichon-Rivière consiste em um trabalho com
grupos, cujo objetivo é promover o processo
de aprendizagem para os sujeitos envolvidos.
“Aprender em grupo significa uma leitura
crítica da realidade, uma atitude investigadora,
uma abertura para as dúvidas e para as novas
inquietações”.10
participarem de um grupo com outras mulheres
do bairro, por si, já contribui para a promoção
da saúde das mulheres, pois o grupo promove,
além de tudo, a integração e socialização das
pessoas.12
Nos encontros, buscou-se identificar os
interesses e necessidades das participantes, que
devem ser valorizados. Os temas das atividades
educativas devem partir da própria realidade
dos envolvidos e não devem ser previamente
Os grupos trabalham na dialética do ensinar- estabelecidos pelos profissionais, a demanda
aprender; o trabalho em grupo proporciona deve ser colocada de forma espontânea e a
uma interação entre as pessoas, onde elas partir das necessidades do grupo.13
tanto aprendem como também são sujeitos do
saber, mesmo que seja apenas pelo fato da sua Cada encontro propiciou um espaço de trocas,
experiência de vida; dessa forma, ao mesmo em que as mulheres tiveram liberdade para
tempo que aprendem, ensinam”.11
compartilhar e trazer suas queixas relacionadas
ao casamento, tais como: dificuldade de
Pode-se pensar os grupos voltados para a comunicação com o cônjuge, falta de prazer
promoção da saúde, como estratégias ou nas relações sexuais, perda de autoestima,
espaços, onde possa se fazer uma escuta, para desvalorização como mulher, maternidade,
as necessidades das pessoas. Os grupos devem dificuldade de relacionamento familiar e
se configurar, como espaços onde as pessoas sintomas de depressão.
possam falar sobre seus problemas, e buscar
soluções, conjuntamente com os profissionais, A dinâmica sobre retratação da autoimagem das
de forma que a informação circule, da mamas foi a que causou maior impacto sobre
experiência técnica à vivência prática das o ponto de vista das mulheres. O objetivo da
pessoas que adoecem.9
atividade era de promover o entendimento da
importância da prevenção e do autocuidado,
A mulher é a usuária mais assídua dos serviços além de despertar a mulher para o “mundo”
de saúde, seja na figura de cliente seja como que é vivenciar todo o processo de adoecimento
acompanhante. Assume também o papel de e recuperação, para ter respaldo quanto ao
cuidadora na sociedade – de familiares e até enfrentamento da doença, valorizando a vida e
mesmo dos vizinhos. Partindo do pressuposto de amando a si mesma.
que essa mulher sofre discriminação nas suas
relações de trabalho e sobrepeso de tarefas A importância atribuída às mamas faz com que
domésticas, acaba tornando-se mais vulnerável exerçam forte influência na vida da mulher. Pelos
não só pelos fatores biológicos, mas também seus atributos da beleza feminina compõem a
pelos sociais.12
imagem corporal da mulher, fazem parte da sua
identidade sexual e são indispensáveis à função
Assim sendo, o grupo MUSAS teve utilidade e da maternidade.14
representação como um espaço de diálogo
entre mulheres e profissionais de saúde. Ao Na dinâmica do Fala Sério ou Com Certeza? Foi
mesmo tempo em que os encontros tiveram utilizada uma abordagem diferenciada, através
papel significativo no processo de ensino- de um jogo de perguntas e respostas. Essa
aprendizagem
que
eles
representaram, proposta propiciou as mulheres o esclarecimento
também, um momento terapêutico e de lazer de dúvidas e questionamentos sobre a prevenção
para as mulheres, que diariamente têm uma do câncer de colo de útero. Observamos que
rotina cansativa e estressante no cuidado com o método lúdico favorece o estreitamento de
o seu lar e com a família. Portanto, o fato de laços entre os sujeitos e o compartilhamento de
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Castro et al
experiências de vida, sendo considerada uma
ferramenta importante no processo de ensino e
aprendizagem.15
então, oferecer subsídios para a complementação
desses saberes e/ou transformar saberes
preexistentes. Para que as pessoas possam fazer
escolhas mais saudáveis de vida, é necessário
Foi prazeroso ver a interação das mulheres e que haja um processo de interação entre o
a troca de experiências. As mesmas puderam, conteúdo teórico e a experiência de vida de
então, expor suas queixas e dúvidas sobre o cada um e o estabelecimento da confiança e da
tema, o que possibilitou o estabelecimento de vinculação do usuário ao serviço de saúde e ao
uma dialética em grupo de modo a construir o profissional.17
saber necessário à prevenção e à longevidade
com mais qualidade de vida. Dessa forma, as As mulheres relataram suas intenções para
atividades de educação em saúde prosseguiram mudanças de atitudes que favoreçam a
no sentido de possibilitar às mulheres da prevenção do câncer de colo de útero e de
comunidade construir um saber a respeito desse mama, embasadas no conhecimento constituído
tema por meio de um diálogo capaz de desvelar no encontro, mediante as dinâmicas aplicadas.
o conhecimento científico sobre o tema à Esses métodos de abordagem podem ser
população local.
classificados como elementos constituintes da
Terapia Comunitária (TC) descrita por Paulo
As dinâmicas foram propostas de acordo com Freire.18
as técnicas de grupo operativo e de terapia
comunitária.
Na Terapia Comunitária os sujeitos compartilham
experiência de vida (medos, angústias, receios
No grupo operativo há a presença e intervenção etc.), onde uns aprendem com os outros, ninguém
de um coordenador, que indaga e problematiza, ensina ninguém, o aprendizado é construído.
estabelecendo algumas articulações entre as A cada encontro novas experiências e ideias
falas e os integrantes, sempre direcionando o vão surgindo acompanhadas de possibilidades
grupo para a tarefa comum e um observador de enfrentamento diante de sofrimentos e/ou
que registra o que ocorre na reunião, resgata carências.18-20
a história do grupo e depois analisa com
o coordenador os pontos emergentes, o Acredita-se que a experiência foi de grande
movimento do grupo em torno da tarefa e os importância como exemplo de ação para
papéis desempenhados pelos integrantes.16
promoção da saúde da mulher, permitindo
troca de experiências entre os profissionais e a
A técnica de grupo operativo foi utilizada população feminina, retomando a importância
com o objetivo de articular a integração do autocuidado e da qualidade de vida. Sem
das participantes em grupo. A coordenadora dúvida, a proposta dos grupos operativos de
do grupo, dentro das MUSAS, atuou como Pichon-Rivière e a terapia comunitária – sob a
facilitadora do processo de interação, utilizando perspectiva de Paulo Freire – são instrumentos
a terapia comunitária como pressuposto da capazes de construir redes sociais solidárias,
construção coletiva.
de fortalecimento das competências dos atores
sociais e do despertar desses sujeitos para o seu
As discussões baseadas em dinâmicas facilitaram papel transformador.
o processo de ensino-aprendizagem e de troca de
experiências entre as participantes. Percebeu- Os encontros não têm, necessariamente,
se, ao longo dos encontros, que as mulheres um direcionamento para temas específicos.
encontravam-se mais alegres, empolgadas, As pessoas falam livremente, estabelecem
empoderadas, com aspiração a descoberta de interações umas com as outras e partilham
novos conhecimentos e práticas em saúde.
experiências comuns. No grupo – como espaço
que possibilita as formações de vínculos, de
As discussões valorizaram o conhecimento prévio identificações e de diferenciações – trabalha-se
dos sujeitos, identificando seus saberes, para, com a subjetividade e com a singularidade de
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GRUPO MUSAS: PROMOÇÃO DA SAÚDE COM UM GRUPO DE MULHERES NO ÂMBITO DA ESTRATÉGIA
SAÚDE DA FAMÍLIA NA CIDADE DE MANAUS-AM
cada um de seus integrantes.
Os grupos caracterizam-se por ser um espaço de
escuta, em que o coordenador indaga, pontua
e problematiza as falas, dando oportunidade
aos seus integrantes pensarem, falarem de
si e poderem elaborar melhor suas próprias
questões.
Sem dúvida a escuta, a responsabilização e a
criação de vínculos com a inserção da abordagem
de gênero oferecem à mulher possibilidades
de serem sujeitos e devem fazer parte de
um projeto de reorganização das práticas
direcionadas pela integralidade do cuidado.
Nesse sentido, faz-se necessário que o
profissional de saúde aborde a mulher a sua
inteireza, considerando a sua história de
vida, os seus sentimentos e o ambiente em
que vive, estabelecendo uma relação entre
sujeito e sujeito e valorizando a unicidade e
individualidade de cada caso e de cada pessoa.
Muitos dos sintomas manifestos pela mulher
mascaram problemáticas subjacentes. Por isso,
em vez de fazer uma série de rápidas perguntas,
específicas e fechadas é importante encorajar a
mulher a falar de si.
A partir deste estudo com um grupo operativo
de mulheres, esperamos contribuir com a
construção e a implementação de um novo
modelo de prática de educação em saúde no
âmbito da estratégia saúde da família, revelando
resultados positivos com metodologias de
ensino-aprendizagem construídas com base no
diálogo e na participação dos sujeitos.
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PERCEPÇÕES E SIGNIFICADOS DA
LEPTOSPIROSE ENTRE TRABALHADORES DA
LIMPEZA URBANA DE MANAUS-AM
PERCEPTIONS AND MEANINGS OF LEPTOSPIROSIS AMONG WORKERS IN
URBAN CLEANING IN MANAUS-AM
Erika Oliveira Abinader,* Maria Luiza Garnelo Pereira**
Resumo
A Leptospirose, classicamente, tem sido associada a determinadas categorias ocupacionais como:
trabalhadores em abatedouros, tratadores de animais, médicos veterinários e da limpeza urbana.
O risco de exposição a determinado agravo é influenciado pelos juízos individuais, porque os
seres humanos possuem distintas percepções acerca dos riscos aos quais estão expostos. O presente trabalho teve como objetivo analisar as percepções e significados da Leptospirose entre os
trabalhadores da limpeza urbana no município de Manaus-AM, através de um estudo descritivo,
transversal, junto aos trabalhadores que atenderam aos critérios de inclusão. As percepções e
significados da Leptospirose entre os trabalhadores foram diversos, desde interpretações confusas
e evasivas, a condenação à morte com a aquisição da doença. Verifica-se que há necessidade de
novos estudos que ampliem o entendimento dos riscos laborativos daqueles engajados nas ações
de limpeza urbana pública de Manaus.
Palavras-chave: Leptospirose; significados; trabalhadores; limpeza urbana.
Abstract
Leptospirosis, classically, has been linked to certain occupational categories as workers in
slaughterhouses, animal handlers, veterinary physician and urban cleaning. The risk of exposure
to a particular grievance is influenced by the individual judgments, because humans have different
perceptions about the risks to which they are exposed. This study aimed to analyze the perceptions
and meanings of Leptospirosis among workers in urban cleaning in Manaus city (AM), through a
descriptive, cross-sectional study with workers who fit the inclusion standard. Perceptions and
meanings of Leptospirosis among workers was different: from confused and evasive interpretations
to the death sentence with the acquisition of disease. It confirms that there is need for further
studies that increase understanding of employees’ risks those engaged in public urban cleaning
actions of Manaus.
Keywords: Leptospirosis; meanings; workers; urban sanitation.
*Aluna do Programa de Pós-graduação em Biologia Urbana pela Universidade Nilton Lins.
** Pesquisadora da Fundação Oswaldo Cruz em Manaus e professora visitante da Philips University fo Marburg, Alemanha e membro do corpo docente do Programa Multiinstitucional (UFAM/FIOCRUZ) de Pós Graduação Saúde, Sociedade e Endemias na Amazônia
Apoio: Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (FAPEAM).
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PERCEPÇÕES E SIGNIFICADOS DA LEPTOSPIROSE ENTRE TRABALHADORES DA LIMPEZA URBANA DE MANAUS-AM
Introdução
do gênero, classe social, escolaridade, cultura
e outras variáveis sociais que modulam a
Leptospirose é uma doença infecciosa aguda exposição ao risco. Assim, não há como
que acomete o homem e animais, causada por conceber uma avaliação de riscos desconexa das
micro-organismos do gênero Leptospira. Sua crenças, interpretações e reações dos sujeitos
transmissão acontece em humanos, por meio envolvidos.6
do contato com a urina de animais selvagens
ou domésticos, infectados por esses micro- Como a transmissão desse agravo é mediada,
não somente pelas condições de trabalho, mas
organismos.1
também pelo conhecimento dos trabalhadores
A Leptospirose ocorre em áreas urbanas e sobre o problema e pela percepção que fazem
rurais, principalmente em regiões tropicais dele, os estudos de percepção do risco são
e subtropicais. No Brasil, ocorre durante relevantes para a pesquisa. O risco varia de
todos os meses do ano em todas as regiões acordo com a percepção de cada indivíduo,6
do país, predominantemente nos meses com uma vez que os seres humanos possuem distintas
elevados índices pluviométricos principalmente percepções acerca dos riscos aos quais estão
em centros urbanos, onde há aglomeração expostos. O estabelecimento do risco pode
populacional de baixa renda, em condições ser objetivo,7 mas a percepção e aceitação
inadequadas de saneamento e alta infestação dependem dos aspectos culturais e pessoais
de cada indivíduo. A percepção do risco, as
por roedores.2
ideias8 e ações empreendidas para prevenção,
A Leptospirose tem sido associada3 a são fenômenos culturalmente construídos e
determinadas categorias ocupacionais como: interpretados.
trabalhadores em abatedouros, tratadores de
animais, médicos veterinários e saneamento A produção de pesquisas correlatas a esse
ambiental. Profissionais envolvidos com enfoque representa um aporte capaz de
atividades de saneamento apresentam risco suplementar a tomada de decisões no âmbito
considerável de contrair Leptospirose, pois das políticas públicas. Este trabalho tem por
têm contato direto com elementos do meio objetivo, analisar as percepções e significados
ambiente, facilmente contamináveis pela urina da Leptospirose dentre os trabalhadores da
limpeza urbana do município de Manaus-AM.
de roedores.4
Em relação aos serviços de saneamento, estão
expostos à infecção não só os trabalhadores da
rede de abastecimento de água e de esgotos,
como também os da limpeza pública, coletores
de lixo e varredores. No Brasil essas atividades
costumam ser manualmente executadas,
sem apoio de equipamentos de segurança
e de proteção individuais, por mão de obra
desqualificada e mal remunerada, o que
aumenta ainda mais o risco dos trabalhadores
contraírem a infecção.4
Métodos
Trata-se de pesquisa descritiva, de corte
transversal, realizada no período de setembro
de 2013 a maio de 2014 no município de
Manaus-AM. Os dados foram coletados por meio
de entrevista semiestruturada, com perguntas
abertas e fechadas, aplicada aos trabalhadores
ocupados na limpeza urbana da cidade.
A população de estudo, fornecida pela Secretaria
Municipal de Limpeza e Serviços Públicos
Os seres humanos possuem uma peculiar (Semulsp), era constituída por trabalhadores
capacidade de alterar o ambiente a seu favor, que realizavam atividades de limpeza urbana
bem como para responder a ele, gerando e nos seguintes locais: aterro sanitário; banheiros
reduzindo ou criando riscos à saúde.5 As atitudes públicos; cemitérios; compostagem; capina e
frente à exposição ao risco variam de acordo pintura; limpeza dos igarapés e na varrição de
com a percepção que cada indivíduo tem sobre ruas, totalizando na época 732 participantes.
ele, porque ela é bastante variável a depender
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PERCEPÇÕES E SIGNIFICADOS DA LEPTOSPIROSE ENTRE TRABALHADORES DA LIMPEZA URBANA DE MANAUS-AM
Foram incluídos na pesquisa todos os
trabalhadores dos locais acima mencionados
e que aceitaram participar da pesquisa.
Foram excluídos os trabalhadores da área
administrativa, os que possuíam desvio de
função, além dos trabalhadores que não
aceitaram responder ao questionário.
éticos da pesquisa, havendo concordância em
participar, era entregue, para assinatura, o
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
As respostas quantificáveis foram registradas em
planilha Excel, por meio do qual foram aplicados
os procedimentos de análises estatísticas
descritivas (média, desvio-padrão, frequência)
Para compor a amostra, a população foi com a finalidade de caracterizar a amostra.
estratificada conforme os locais de trabalho,
utilizando margem de erro de 5% e nível A análise das resposta descritivas baseou-se na
de confiança de 95% e a distribuição da proposta de análise de conteúdo de determinado
amostra foi feita considerando a amostragem autor.10
estratificada pelas proporções. Com base nesse
procedimento, participaram da pesquisa 193 Este estudo fez parte da dissertação de mestrado
profissionais que estavam em pleno exercício da Análise e percepção de riscos à saúde em
função, após serem devidamente esclarecidos. trabalhadores da limpeza urbana no município
Destes, foram avaliados a percepção de 176 de Manaus-AM apresentada ao Programa de Póspessoas que disseram que já ouviram falar em Graduação em Biologia Urbana da Universidade
Leptospirose.
Nilton Lins, Manaus-AM, Brasil, em agosto de
2014. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de
A entrevista semiestruturada continha três Ética em Pesquisa da Universidade Nilton Lins
grandes categorias de análise (Identificação; recebendo parecer favorável nº 380.094 em 02
Informações laborativas e de percepção de de setembro de 2013, tendo sido seguido todos
risco; Medidas de Proteção), as quais foram os requisitos da Resolução nº 466/2012-CNS.
distribuídas perguntas abertas e fechadas
que compunham o roteiro de investigação. O Resultados
roteiro utilizado foi adaptado do utilizado por
determinado autor.9
Os principais dados sobre a percepção de riscos
A aplicação da entrevista ocorreu em diversos
pontos da cidade onde os participantes estavam
escalados para realizar as tarefas. Antes de
iniciar a entrevista, os trabalhadores eram
informados sobre os objetivos e os aspectos
estão apresentados na Tabela 1, na qual se
observou que 170 (88,1%) dos participantes
acham que o seu trabalho pode lhe causar algum
problema de saúde e 157 (81,3%) acreditam que
o seu trabalho está relacionado a algum tipo de
risco à vida e à saúde.
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Abinader et al
Tabela 1: Indicadores Sociais e Percepção de Risco pelos Entrevistados
A Tabela 2 apresenta o panorama de percepção
dos 176 trabalhadores que disseram que já
ouviram falar em Leptospirose.
Tabela 2: Os conhecimentos sobre Leptospirose. Frequência das respostas dos trabalhadores (n= 176).
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PERCEPÇÕES E SIGNIFICADOS DA LEPTOSPIROSE ENTRE TRABALHADORES DA LIMPEZA URBANA DE MANAUS-AM
As respostas sobre a fonte de informação acerca
de Leptospirose estão sistematizadas na Tabela
3.
Tabela 3: Sobre a Leptospirose. Fonte de Informação sobre a doença.
Frequência das respostas dos trabalhadores (n= 176).
Discussão
âmbito, é muito elevado o conhecimento
dos entrevistados sobre a possibilidade de
Na divisão dos trabalhadores por sexo, transmissão da mesma em seu labor diário,
o predomínio é de mulheres (62,2% dos já que 91% dos entrevistados, afirmaram ter
entrevistados), corroborando a constatação ouvido falar em Leptospirose, que é reconhecida
da literatura, que aponta maior presença de através de codificantes populares (doença do
mulheres em trabalhos mais precários, com xixi do rato, doença do mijo do rato, doença do
menor remuneração e sem perspectivas de rato, dentre outras), adequados para descrever
a principal característica do mecanismo de
ascensão funcional e social.11
transmissão da doença.
Os achados relativos à escolaridade são
congruentes com o esperado para tarefas com
baixa valorização social, havendo predomínio de
pessoas com menos de oito anos de escolaridade
e até mesmo analfabetos (totalizando 68,5%
dos respondentes nessa condição). O perfil
encontrado é similar ao de outros estudos de
percepção de risco,12,13 sendo que, em Manaus,
os índices de escolarização são ainda mais baixos
que os encontrados pelos autores supracitados.
A prevalência de percepção negativa do estado
de saúde pelos entrevistados em Manaus (64,2%)
foi bem mais elevada que a encontrada em
outro estudo14 (11,8%) que avaliou a percepção
do estado de saúde e fatores associados em
industriários de Santa Catarina. Cabe ressaltar,
que se entende como percepção negativa, o
juízo negativo do trabalhador sobre determinado
agravo, juízo este, que é influenciado pelas
características socioeconômicas e relacionado
ao contexto ao qual o sujeito está inserido na
sociedade.
A ocorrência de Leptospirose é agravo de
interesse para este tipo de trabalhador. Nesse
Entre os trabalhadores, a periculosidade da
Leptospirose é bem reconhecida e expressa
mediante o uso de termos como “veneno”,
“leva para o buraco,” “não tem remédio” e
outros. São achados similares aos achados da
literatura15 que afirma, pela intensidade da fala
do gari, forte expressão de medo de contrair
alguma infecção na lide com os resíduos;
naquela pesquisa os trabalhadores se referem
a tais doenças como estados graves e não
passíveis de cura com o uso de medicação e/
ou tratamento. Em Manaus, os entrevistados
identificam a Leptospirose como uma doença
incurável, que não existe tratamento e leva à
morte.
Se fizermos uma analogia com os critérios
de outro estudo sobre percepção16 podemos
inferir que houve uma leitura distante do
trabalhador acerca da Leptospirose, que podem
estar inclusas dentro das respostas confusas e
evasivas, perfazendo uma frequência total de
41 repetições (Tabela 2). Tal fato é comprovado
na fala: “Essas doenças atacam muito os ossos,
né? As juntas, e é essa doença que eu sofro, de
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v.14. n.1 jan./jun. - 2015
Abinader et al
manhã as juntas incham”. Ressalta-se aqui, que
se buscou saber qual a leitura dos participantes
acerca de Leptospirose. Os participantes
informaram que já ouviram sobre o agravo
em diversos meios (conforme Tabela 3), mas
ainda assim, possuíam leituras distantes, sobre
a questão, corroborando com o fato de que
a percepção é influenciada por contextos de
escolaridade, e inserção social do indivíduo.
Conclusão
Verifica-se que há necessidade de novos
estudos que ampliem o entendimento dos riscos
laborativos daqueles engajados nas ações de
limpeza urbana pública de Manaus, com vistas
à subsidiar implantação de medidas efetivas
de prevenção à Leptospirose e outras doenças,
aprimorando a proteção à saúde desses
trabalhadores.
Agradecimentos
À FAPEAM, pela concessão da bolsa de estudos,
fundamental, para custear as despesas da
execução da pesquisa. À Universidade Nilton
Lins, por proporcionar o Programa, para a
realização do curso de Mestrado. A todos os
funcionários da Semulsp, que foram essenciais
para a execução do trabalho.
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PERCEPÇÕES E SIGNIFICADOS DA LEPTOSPIROSE ENTRE TRABALHADORES DA LIMPEZA URBANA DE MANAUS-AM
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revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.14. n.1 jan./jun. - 2015
NEFRECTOMIA RADICAL LAPAROSCÓPICA EM
PACIENTE TESTEMUNHA DE JEOVÁ: UMA OPÇÃO
DE TRATAMENTO MINIMAMENTE INVASIVA
LAPAROSCOPIC RADICAL NEPHRECTOMY IN PATIENT OF JEHOVAH WITNESS:
A MINIMALLY INVASIVE TREATMENT OPTION
Marcelo Guedes Halinski; George Lins de Albuquerque; Paulo Cézar de Vasconcelos; Cecília Mello Garcez;
Adriano Maia Siqueira; Cristiano Silveira Paiva.
Resumo
A nefrectomia laparoscópica foi introduzida no cenário urológico há mais de uma década, tendo uma
aceitação crescente, pois mimetiza a cirurgia aberta no que toca aos princípios oncológicos além
de proporcionar uma melhora dos parâmetros funcionais, fazendo com que o acesso laparoscópico
constitua atualmente no tratamento padrão das patologias renais e adrenais benignas e malignas1,2.
Relataremos o caso de uma paciente Testemunha de Jeová cujos preceitos religiosos sustentam a
recusa da transfusão de sangue sendo feita a opção pela nefrectomia radical laparoscópica.
Palavras-chave: Nefrectomia Radical laparoscópica, Tumor renal, Testemunha de Jeová.
Abstract
The laparoscopic nephrectomy was introduced in urological setting for more than a decade, there
is an increasing acceptance in the urological community because it mimics open surgery with
regard to the principles cancer, but aims to an improvement of the functional parameters, causing
the laparoscopic procedure constitutes, currently, a preferable alternative for the patient. We
will discuss this case report, a Jehovah’s Witness patient whose religious precepts sustain the
refusal of blood transfusion.
Keywords: Laparoscopic Radical Nephrectomy, kidney cancer, Jeovah Witness.
Introdução
Diversas técnicas têm sido utilizadas para o
tratamento da perda volêmica transoperatória
em pacientes Testemunhas de Jeová, pois
estes recusam recebimento de sangue e
hemoderivados.3 A otimização de um nível
adequado de hemoglobina no perioperatório
associado à abordagem cirúrgica minimamente
invasiva são importantes fatores para se
evitar transfusões sanguíneas nesse grupo
de pacientes.4,5 Será relatado
paciente Testemunha de Jeová
massa sólida em rim esquerdo
nefrectomia radical por acesso
sem necessidade de transfusão
operatório.
um caso de
portadora de
submetida a
laparoscópico
trans e pós-
Relato de Caso
Paciente MNBL, 62 anos, gênero feminino,
natural do Ceará e procedente de Manaus (AM),
Instituição: Hospital Universitário Getúlio Vargas / Serviço de Urologia.
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v.14. n.1 jan./jun. - 2015
NEFRECTOMIA RADICAL LAPAROSCÓPICA EM PACIENTE TESTEMUNHA DE JEOVÁ: UMA OPÇÃO DE
TRATAMENTO MINIMAMENTE INVASIVA
parda, viúva, Testemunha de Jeová, referindo
há 6 meses dor em andar superior do abdome
com irradiação para região lombar esquerda
associada a perda ponderal de 6 kg desde
o início do quadro. Negava comorbidades e
história familiar de neoplasias. Ultrassonografia
de abdômen total, demonstrando imagem
hipoecóica de textura sólida medindo 5,0 x 3,8
cm, localizada em terço médio renal.
O estudo da lesão foi complementado com
tomografia helicoidal de abdômen a qual
evidenciou nódulo de contornos lobulados e
realce irregular pós-contraste endovenoso,
mais evidente em periferia na fase arterial,
interessando o terço médio do rim esquerdo,
abaulando os contornos da face lateral,
medindo 3,9 x 3,7 x 3,4 cm. (Figura 1). Foi
também realizado estudo vascular renal por
meio de angiorressonância dos vasos abdominais
(Figura 2) indispensável para programação da
abordagem minimamente invasiva – nefrectomia
parcial ou radical laparoscópica. A escolha do
acesso laparoscópico levou em consideração
uma menor possibilidade de sangramento,
transfusão e a religião da paciente, que proíbem
o uso de sangue e seus derivados e mesmo
transfusões autólogas.
Figura 1: TC - Imagem Hipodensa com realce periférico ao contraste
Figura 2: Angio-RM – demonstrando artéria renal única à esquerda e dupla à direita
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Halinski et al
No pré-operatório da paciente, sua hemoglobina
e hematócrito eram respectivamente 12,8 g/dl
e 36,6%. Foram tomadas algumas precauções
para melhor otimização hematológica: ácido
fólico, vitamina B12 e sulfato ferroso 30 dias
antes do procedimento elevando os níveis de
hematócrito e hemoglobina para 41,7% e 13,9 g/
dl respectivamente. A cirurgia transcorreu sem
intercorrências com identificação da artéria e
veia renal esquerda procedendo-se a ligadura
primeiramente da artéria para um melhor
A
controle hemostático seguido da ligadura da
veia renal (Figura 3) e exérese da peça cirúrgica
com endo-bag. O tempo de cirurgia foi de 2h
com um sangramento de 220 ml. A paciente
recebeu alta hospitalar no 2º dia após a cirurgia
com hemoglobina de 12,5 g/dl e hematócrito
de 36,5%. A histologia demonstrou carcinoma
de células renais do tipo células claras, grau II
de Fuhrman, estádio patológico pT1aNxMx.
B
Figura 3: Clampeamento prévio da artéria renal D (A),
seguido do clampeamento venoso (B), com hem-o-lock
Discussão
de eritropoietina recombinante, vitamina
B12, ácido fólico e sulfato ferroso, também
Os tumores sólidos renais são tratados contribuem para uma menor taxa de transfusão
efetivamente através de cirurgia radical, visto em cirurgias dos pacientes testemunhas de
serem neoplasias resistentes aos protocolos Jeová.3,4 Durante a cirurgia, pode ser utilizada a
atuais de quimioterapia, imunoterapia e modalidade de recuperação celular (“cell saver”),
radioterapia.6,7 A nefrectomia laparoscópica que se trata de um processo automatizado, em
foi introduzida no cenário urológico há mais de que o sangue é colhido diretamente do campo
uma década, tendo uma aceitação crescente, operatório, centrifugado, lavado, filtrado e
pois mimetiza a cirurgia aberta no que toca aos reinfundido no doente. Porém, em cirurgias
princípios oncológicos além de proporcionar oncológicos e infectadas, este procedimento
uma melhora dos parâmetros funcionais e deve ser contraindicado, pois esse dispositivo
baixas taxas de transfusão, fazendo com que não esteriliza ou elimina as células tumorais do
o acesso laparoscópico constitua atualmente sangue a ser reinfundido.3 Nossa paciente fez
no tratamento padrão das patologias renais e uso prévio somente de vitamina B12, sulfato
ferroso, ácido fólico e hemodiluição no transadrenais benignas e malignas.8
operatório.
Um criterioso controle hemostático durante a
cirurgia é um fundamento básico, notadamente Neste relato, como se tratava de um tumor
em pacientes Testemunhas de Jeová cuja localizado de 3,9 x 3,7 x 3,4 cm, onde poderia
religião não permite o uso de sangue e seus ter sido utilizada a nefrectomia parcial
derivados como terapia de reposição.3 Técnicas aberta ou laparoscópica, sendo descrita na
de hemodiluição, uso pré e pós-operatório literatura atual como abordagem de escolha
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NEFRECTOMIA RADICAL LAPAROSCÓPICA EM PACIENTE TESTEMUNHA DE JEOVÁ: UMA OPÇÃO DE
TRATAMENTO MINIMAMENTE INVASIVA
nos tumores T1 (<7 cm) porém, com maior
risco de complicações hemorrágicas trans e
pós-operatórias.8 Por opção da paciente, o
procedimento realizado foi nefrectomia radical
por acesso laparoscópico sem necessidade
de transfusão, sendo mantidos os princípios
oncológicos e uma ótima recuperação da
paciente. Os trabalhos atuais comparando
os acessos aberto e minimamente invasivos
para realização de nefrectomias radicais e
parciais, deixam claros uma menor taxa de
dor, necessidade analgésico, de ambulação
e períodos de internação mais reduzidos e
convalescença mais precoces.7,8,9,10 Os acessos
laparoscópico e laparoscópico assistido por
robô e single port, vêem sendo empregados
cada vez mais na prática urológica moderna,
tendo em vista os resultados e benefícios a
curto e longo prazo,9,10 assim como a redução
da morbidade pós-operatória e os melhores
resultados estéticos, inclusive após remoção de
grandes peças cirúrgicas.
3. Pasic M, D’Ancona G, Unbehaun A,
Hetzer Roland - Bloodless third complex heart
operation in a Jehovah’s Witness patient with
extremely low preoperative haemoglobin level.
Interact CardioVasc Thorac Surg 14: 692-693,
2012.
Apesar
dos
resultados
iniciais
serem
encorajadores, séries maiores utilizandose técnicas
minimamente
invasivas na
abordagem de pacientes Testemunha de Jeová
são aguardadas no sentido de se oferecer
um tratamento cada vez mais seguro e
individualizado para esse grupo de pacientes.
7.
Pietzak EJ, Guzzo TJ - Advancements in
Laparoscopic Partial Nephrectomy: Expanding
the Feasibility of Nephron-Sparing - Review
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Del Pizzo JJ, Scherr DS - Laparoscopic and Open
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fundamental para o manejo de pacientes
Testemunhas de Jeová submetidos a cirurgias de 9.
Bazzi WM, Stroup SP, Kopp RP, Cohen
grande porte, associado à utilização de técnicas SA, Sakamoto K, Derweesh IH - Comparison
minimamente invasivas (acesso laparoscópico) of Laparoendoscopic Single-site and Multiport
comprovadamente associado a menores índices Laparoscopic Radical and Partial Nephrectomy:
de sangramento e necessidade de transfusão.
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AGENESIA DE TRONCO CELÍACO:
RELATO DE CASO
AGENESIS OF THE CELIAC TRUNK: CASE REPORT
Anderson de Almeida Maciel,* Sol Gomes Madrigal,** Francisco Batista de Almeida,***Samara Pontes Soares,****Adria Karina Farias de Aquino*****
Resumo
O tronco celíaco, ramo da artéria aorta abdominal, fornece suprimento arterial aos principais
órgãos do compartimento abdominal supracólico: fígado, estômago, pâncreas, baço e parte superior do duodeno. O padrão usual de sua ramificação é a trifurcação, porém, pode haver ainda divisão incompleta ou bifurcação e mais raramente ausência completa de tronco celíaco. O conhecimento de uma anatomia variável, tem significado clínico importante no planejamento e execução
em cirurgias abdominais, como em transplante hepático, cirurgias laparoscópicas; procedimento
arterial invasivo e procedimentos radiológicos no abdome superior. O objetivo através deste relato é apresentar uma rara condição: a ausência congênita do tronco celíaco; diagnóstico, neste
caso, feito através de angiotomografia computadorizada multslice.
Palavras-chave: Artéria Celíaca, Tronco Arterial, anormalidades, Artéria Esplênica, Artéria Mesentérica Superior, tomografia computadorizada multidetectores.
Abstract
The celiac trunk, first major branch of the abdominal aorta, supplies the main anatomic structures
of the foregut with arterial blood: liver, stomach, spleen, pancreas and superior half of the
duodenum. The usual pattern of its branching consists in three main divisions, although it can
be presented with two branches or complete absence. The knowledge of anatomic variations of
this important structure is vital on the planning and execution of a large variety of abdominal
surgeries, liver transplant, endovascular and interventional radiology procedures of the upper
abdomen. The objective of this case report is to present a rare condition: the congenital absence
of celiac trunk diagnosed by computed tomography angiography.
Keywords: Celiac Artery, Artery Trunk, abnormalities, Splenic Artery, Superior Mesenteric Artery,
multidetector computed tomography.
Introdução
O tronco celíaco é um ramo visceral ímpar
da artéria aorta abdominal, que se origina
imediatamente abaixo do hiato aórtico do
diafragma, ao nível da 12ª vértebra torácica-1ª
vértebra lombar.¹,² Tem sido referido como um
tronco curto e calibroso, variando, nos diferentes
estudos, de cinco a 40 milímetros (mm) de
comprimento e cinco a dez mm de diâmetro.³
Em pelo menos metade dos casos, após uma
trajetória de um a três centímetros (cm), a
*Residente do segundo ano de Cirurgia Geral pela Fundação Hospital Adriano Jorge
**Residente do segundo ano de Cirurgia Geral pela Fundação Hospital Adriano Jorge e pós-graduado em Medicina da Família e Comunidade
***Médico Urologista pós-graduado em Medicina do Trabalho e pós-graduado em Ultrassonografia.
****Aluna de graduação em Medicina pela Universidade do Estado do Amazonas (UEA)
*****Residente do primeiro ano de Cirurgia Geral pela Fundação Hospital Adriano Jorge
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AGENESIA DE TRONCO CELÍACO: RELATO DE CASO
frente e acima da borda superior do pâncreas,
ele se divide em três ramos: artérias gástrica
esquerda, hepática comum e esplênica ou
linear (lienal).1-5 O padrão usual é a trifurcação,
porém, pode haver ainda divisão incompleta ou
bifurcação e mais raramente ausência completa
de tronco celíaco. As variações anatômicas e
seu padrão de ramificação têm sido relatados
por muitos autores.2,4,5 Qualquer um desses
ramos pode originar-se separadamente da
aorta ou da artéria mesentérica superior.¹ O
tronco celíaco fornece suprimento arterial aos
principais órgãos do compartimento abdominal
supracólico: fígado, estômago, pâncreas, baço e
parte superior do duodeno.6 O objetivo através
deste relato é apresentar uma rara condição: a
ausência congênita do tronco celíaco, achado
ocasional durante exame tomográfico.
Relato de Caso
Paciente do sexo masculino, 33 anos, tabagista
e etilista, relata que há +/- sete meses
iniciou quadro de dor abdominal que se
apresentou, durante a evolução, inicialmente
em flanco direito, evoluindo após alguns
meses difusamente pelo abdome e referida
posteriormente em epigástrio e mesogástrio.
Durante o período, foi submetido a exames de
imagem – ultrassonografia de abdome total,
trânsito e morfologia do delgado e tomografia
computadorizada de abdômen, apendicectomia
e a videolaparoscopia diagnóstica em busca
da etiologia da dor, sem sucesso. Após cinco
meses de investigação, seguindo então com
a busca da etiologia da dor, o paciente foi
submetido a doppler das artérias celíaca e
mesentérica superior que mostrou importante
distúrbio do fluxo na artéria celíaca e seus
ramos (VPS = 357cm/s; VDF = 60,2cm/s; IR =
0,83), sugestivo de estenose (>70%) da arteria
celíaca; e complementado com angiotomografia
computadorizada multislice com contraste
(Figura 1), de aorta abdominal que revelou,
como variante anatômica, ausência de
formação do tronco celíaco. Em sua topografia
originavam-se, praticamente no mesmo nível,
as artérias hepática comum e esplênica, sendo
a hepática mais inferior cerca de 3,0 mm, com
imagem de redução focal de calibre (estenose
<50%) em sua origem, sem causa aparente ao
método. A artéria gástrica esquerda originavase da artéria esplênica logo após sua origem.
Figura 01: Reconstrução em 3D de Angiotomografia computadorizada de artéria aorta abdominal
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Maciel et al
Discussão
sangue da aorta abdominal. O conhecimento
de uma anatomia variável, como a do caso por
Embora muitas variações anatômicas tenham nós apresentado, não parece ter relação com a
sido descritas em diversos estudos, o padrão queixa do paciente, em vista de que as variantes
de trifurcação do tronco celíaco em artéria anatômicas do tronco celíaco não costumam ter
gástrica esquerda, hepática comum e esplênica repercussões clínicas e por ter sido um achado
descrito pela primeira vez em 1756, era e ainda incidental, porém, tem significado clínico
é considerado o aspecto normal.4,7 Relatórios importante no planejamento e execução em
nas diversas populações apresentam achados uma cirurgia abdominal, como em transplante
similares, o padrão usual de trifurcação foi hepático, cirurgia laparoscópica; procedimento
encontrado entre 87,6%-90,70% dos indivíduos, arterial invasivo e procedimentos radiológicos
enquanto a divisão incompleta ou bifurcação no abdome superior. Além disso, aumenta a taxa
é vista entre 12,2%-17,9%, ausência de tronco de sucesso e diminui o risco de complicações.4,6,9
celíaco é visto em 0,19-0,2% dos casos.2,6,8
O primeiro caso de agenesia do tronco celíaco
foi descrito em 1832 e desde então houve apenas
14 casos de tal variação relatados na literatura
médica. Mostrando dessa forma, a raridade do
caso por nós relatados.4
O tronco celíaco é a artéria da parte caudal
do intestino anterior.¹ As artérias vitelinas,
inicialmente, um número de vasos emparelhados
que suprem o saco vitelino, gradualmente
fundem-se e formam as artérias localizadas
no mesentério dorsal do intestino. Em adultos
são representadas pelo tronco celíaco, artéria
mesentérica superior e mesentérica inferior.
Estes vasos suprem os derivados do intestino
anterior, intestino médio e intestino posterior,
respectivamente.3-6,8 A ausência de tronco
celíaco tem sido considerada uma alteração
de base embriológica, devido à persistência
das raízes dos segmentos ventrais arteriais que
originam os três ramos que formam o tronco
celíaco e o desaparecimento da anastomose
longitudinal ventral que as comunica.4,6,8 No
presente estudo, é possível que as raízes dos
segmentos ventrais não tenham regredido, e
as anastomoses longitudinais tenham regredido
completamente, sem os conectar. A origem
separada dos ramos celíacos, partindo da aorta
abdominal, pode ser devido à persistência da
segunda e terceira raízes.
O tronco celíaco é uma estrutura cirurgicamente
significativa, proveniente da aorta abdominal;
os ramos deste tronco arterial suprem os
principais órgãos intra-abdominais supracólicos
e por ele passa um volume significativo de
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RELATO DE CASO: SÍNDROME DE
GOODPASTURE
CASE REPORT: GOODPASTURE SYNDROME
Alex Bruno Ferreira Rebelo,* Adriana Drumond Sardinha Crispim Rodrigues,* Christiany Moreira Almeida,**
Rebecca Souza Mubarac Cavalcanti,** Antônio Carlos Duarte***
Resumo
A síndrome de Goodpasture (SG) é uma doença rara, que consiste classicamente no quadro de
hemorragia alveolar difusa (HAD) associada à insuficiência renal aguda (IRA), traço nefrítico no
sedimento urinário e proteinúria subnefrótica, mais a presença de anticorpos antimembrana basal
circulantes (anti-MBG). O diagnóstico é realizado por biópsia, mas testes sorológicos podem ser
usados como a imunofluorescência indireta e ELISA. Os anticorpos anticitoplasma de neutrófilos (ANCA) podem ser positivos, estando ou não associados a vasculites ANCA-relacionadas em
atividade. O tratamento com plasmaférese, prednisona e ciclofosfamida deve ser prontamente
instituído evitando dano renal permanente. Pacientes não tratados têm prognóstico ruim, com
elevada chance de evolução para insuficiência renal crônica (IRC) dialítica em alguns meses, ou
mesmo óbito. Relataremos um caso de SG em um homem de 63 anos, iniciando com sintomas
atípicos seis meses antes do diagnóstico, anticorpo anti-MBG negativo, ANCA+, mas com biópsia
positiva para enfermidade.
Palavras-chave: Síndrome de Goodpasture, Síndrome Pulmão-rim, hemorragia pulmonar, insuficiência renal aguda.
Abstract
Goodpasture syndrome (GPS) is a rare disease which is classically in the context of diffuse alveolar
hemorrhage (DAH) associated with acute kidney injury, nephritis and non-nephrotic proteinuria,
plus the presence of circulating antibodies anti-glomerular basement membrane (anti-GBM ab).
The diagnosis is made by biopsy, but serological tests can be used as indirect immunofluorescence
and ELISA. The Anti-neutrophil cytoplasmic antibodies (ANCAs) can be positive, whether or not
associated with vasculitis ANCA related. The treatment with plasmapheresis, prednisone and
cyclophosphamide should be administered promptly to avoid permanent renal damage. Untreated
patients have poor prognosis, with a high chance to progression for dialysis and Chronic kidney
disease (CKD) in a few months, or even death. We report a GPS case in a 63 years man, beginning
with atypical symptoms six months before diagnosis, negative anti-GBM antibody, ANCA+, but with
positive biopsy for disease.
Keywords: Goodpasture syndrome, diffuse alveolar hemorrhage, Chronic kidney disease.
*Médico residente de Clínica Médica do HUGV - UFAM
** Médica residente de Nefrologia do HUGV - UFAM
***Médico Nefrologista / preceptor e assistente da residência de clínica médica e Nefrologia
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RELATO DE CASO: SÍNDROME DE GOODPASTURE
Introdução
O tratamento com plasmaferese, prednisona e
ciclofosfamida deve ser prontamente instituído,
pois melhoram a função renal e reduzem a
mortalidade que é extremamente elevada
nesses pacientes.10
Espectro da Síndrome pulmão-rim (SPR), a SG
é caracterizada pela presença de anticorpos
anti-MBG, resultando em glomerulonefrite
rapidamente progressiva (GNRP) e HAD.1,2 Os
anticorpos produzidos são geralmente da classe Objetivamos demonstrar um caso de SG no qual
IgG, contra o domínio NC1 da cadeia alfa-3 do apesar do tempo entre o início dos sintomas
e diagnóstico, e anticorpo anti-MBG negativo,
colágeno tipo IV.3,4
apresentava história clínica compatível e
A incidência aproximada é 1 caso para cada 1 biópsia característica desta enfermidade.
milhão de pessoas por ano, com aparecimento
bimodal em consoante à idade e diferenças com Relato de Caso
relação ao gênero: primeiro pico em homens na
3a década de vida e segundo pico igual em ambos Paciente do sexo masculino, 63 anos, previamente
os sexos, a partir da 6a década.2,4 Jovens têm hígido, apresentando, há 6 meses, quadro de
mais quadros clássicos e idosos têm mais nefrite hemoptise acompanhado de febrícula vespertina
isolada. Infecções virais, o uso de cocaína, associado a náuseas com início há quatro meses.
tabagismo e exposição a hidrocarbonetos são Realizou várias consultas médicas, uma das
considerados possíveis fatores desencadeantes.5 quais foi iniciado tratamento para tuberculose
com COXCIP-4, sem melhora. Dois meses antes
O acometimento renal da SG é similar a da internação hospitalar, constatou-se perda
outras formas de GNRP.6 As lesões pulmonares da função renal e apresentação de sintomas
manifestam-se clinicamente por dispneia, urêmicos. Ex-etilista social e ex-tabagista,
tosse e hemoptise.7 Por existir casos sem abstêmio há aproximadamente 6 meses e 20
acometimento pulmonar (40% dos casos), ou anos, respectivamente.
com lesão pulmonar isolada (5%), chama-se
Doença de Goodpasture (DGP) apenas casos Na admissão, encontrava-se em bom estado
com lesão renal mais HAD associada e anti-MBG geral, anictérico, acianótico, hipocorado,
positivo (50%).1
hidratado, sem linfoadenomegalias e sem
edemas. Estável hemodinamicamente. Aparelho
Pacientes com quadro clínico sugestivo devem respiratório com murmúrio levemente diminuído
ser encaminhados à biopsia renal. Em raríssimos em bases com subcrepitantes. Demais aparelhos
casos a biópsia pulmonar indicada.8 Outros dentro da normalidade.
testes como imunofluorescência indireta ou
ELISA podem ser usados, caso a biópsia esteja Exames laboratoriais: anemia normocrômica
contraindicada ou por outros motivos deva ser e normocítica; leucograma e plaquetograma
atrasada; levando em consideração a variável normais. Creatinina 4,93mg/dL, ureia de 74
acurácia dos testes sorológicos dependentes mg/dL, potássio de 5,6 mEq, velocidade de
dos kits utilizados e do quantitativo de sedimentação de 14 mm/h. FAN: não reagente,
anticorpos circulantes nos pacientes. Por anti-DNA não reagente, c-ANCA: reagente.
conta das manifestações clínicas parecidas e p-ANCA: negativo. Complemento e crioglobulina
frequente associação com as vasculites, testes dentro da normalidade. Gasometria venosa
para anticorpo anti-citoplasma de neutrófilos sem alterações e pesquisas negativas para HIV,
(ANCA) devem ser realizados em todos os hepatites B e C. Ausência de BAAR no escarro
casos.9 Diagnósticos diferenciais dessa síndrome em 2 amostras.
incluem Lupus Eritematoso Sistêmico (LES),
Granulomatose de Wegener (GW), Síndrome Urina I: 8 piócitos/campo, incontáveis hemácias
de Henoch-Schönlein, Poliarterite Nodosa e por campo. Urina 24h: Diurese: 1560 ml.
Crioglobulinemia.
Depuração de Creatinina: 11,6ml/min/1,73m2.
Proteinúria 24h: 797mg/24h. Teste com ácido
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Rebelo et al
sulfossalicílico urinário revelou ++ de proteína.
Exames de imagem: radiografia de tórax com
infiltrado bilateral inespecífico. Tomografia
computadorizada de tórax apresentando
imagem em vidro fosco e consolidações lobares
(Figura A e B). A ultrassonografia renal mostrou
rins isoecogênicos em relação ao fígado e
relação córtico-medular preservada. Rim direito
medindo 9,3 cm e o esquerdo 8,9 cm.
internação submetido a corticoterapia com
metilprednisolona 1000 mg/dia, por três dias
consecutivos, mantendo após prednisona
60mg/dia. Na terceira semana de internação
foi submetido a 1ª sessão de plasmaférese por
não apresentar melhora da função renal, e
não se ter o resultado do anticorpo anti-MBG.
Em dois meses foi submetido a 14 sessões de
plasmaferese enquanto aguardava resultado do
anti-MBG, que veio negativo após esse período.
Feita biópsia renal mostrando 60% dos glomérulos Nesse período evoluiu com infecção da
esclerosados e fibrose intersticial (Figura C). corrente sanguínea relacionada a cateter de
A imunofluorescência direta foi positiva para duplo lúmen fazendo uso de antibioticoterapia
anticorpo antimembrana basal glomerular, com com Vancomicina 1g a cada 48h por 14 dias e
depósitos difusos lineares de C3 e intensos de picos tensionais elevados, com melhora após
IgG (Figura D).
uso de losartana potássica. Recebeu alta com
diagnóstico de GP, estável, com necessidade
Tratamento, evolução, intercorrências e de programa regular de hemodiálise e uso de
desfecho durante a internação: foi mantido prednisona 60mg/dia. Não houve recuperação
em hemodiálise, iniciada há uma semana da função renal.
da admissão hospitalar e no sétimo dia de
A
B
Figura A e B - Tomografia computadorizada de tórax - opacidade em vidro fosco em lobos inferiores,
mais espessamento de septos interlobulares e consolidação em lobo superior esquerdo e médio direito,
sugerindo hemorragia alveolar.
C
D
Figura C: biópsia renal – presença de glomérulos esclerosados (60%) e outros com necrose segmentar
do tufo capilar e crescentes fibrocelulares. O interstício apresentava fibrose em 30% da amostra,
envolvendo túbulos atróficos, com focos de infiltrado linfomononucleado. Os demais túbulos apresentavam
vacuolização, por vezes com cilindros hemáticos. Nas artérias havia fibrose intimal, além de hialinização
das arteríolas. Figura D: Imunofluorescência direta - presença de anticorpo antimembrana basal glomerular,
com depósitos difusos lineares de C3 e intensos de IgG.
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RELATO DE CASO: SÍNDROME DE GOODPASTURE
Discussão
Apresentações
clínicas
atípicas
ou
oligossintomáticas e doenças com evoluções
mais arrastadas tendem a ser desafiadoras para
o médico investigador. Por outro lado, períodos
de incubação menores e quadros com maior
número de sintomas facilitam às descobertas
diagnósticas, na grande maioria das vezes
infelizmente já com a doença avançada e
limitações ao tratamento.
No caso apresentado, os sintomas iniciais
sugeriam fortemente localização predominante
de origem pulmonar, fato que motivou a busca
de doenças como a tuberculose, descartadas
durante a investigação. Com a consequente
perda da função renal em ritmo acelerado, a
constelação clínica compositora da SPR tornouse mais evidente, buscando-se enfermidades
como LES, GW, Síndrome de Henoch-Schönlein,
Poliarterite Nodosa, Crioglobulinemia e SG.
Após a negatividade do anticorpo anti-MBG e
presença de c-ANCA, o diagnóstico de GW foi
proposto, tamanha a relação deste anticorpo
com GW.11 Em uma revisão com 88 pacientes que
apresentavam hemorragia pulmonar e nefrite, 6
apresentaram somente anticorpos anti-MBG, 7
tinham ambos os anticorpos, e 48 apresentaram
apenas ANCA+.12 Além disso, em uma série de
casos publicados, a DGP foi responsavel por
menos de 20% dos casos de GNRP.13 Apenas com a
realização da biópsia, exibindo padrão clássico
histológico, o diagnóstico SG foi definido.14
Observar que mesmo na ausência de anti-MBG,
a SG pode estar presente.15 A detecção no soro
de ANCA sugere associação com vasculites
sistêmicas, mas nem sempre manifestas,15 como
no relato.
Tanto em SG como GW a base do tratamento
é indução da remissão com terapia
imunossupressora, e manutenção do tratamento
por um período variável; ressaltando a
necessidade da plasmaférese no caso da SG.16,17,18
Segundo alguns relatórios, desfechos para IRC
ou morte foram 40% menor quando tratados
com plasmaférese mais imunossupressão. Em
contrapartida, somente um pequeno percentual
de pacientes é diagnosticado precocemente. Em
uma série de casos descritos com 67 pacientes,
diálise ou morte ocorreram em mais de 90%.19
Noutro, de 32 pacientes com a síndrome de
Goodpasture, 29 evoluíram para IRC em menos
de seis meses.20
O prognóstico é pior naqueles com oligúria,
fibrose avançada (mais de 50% de crescentes na
biópsia renal), creatinina superior a 5,7 mg/mL
ou a necessidade de diálise.2 Neste relato em
questão, a demora no diagnóstico (6 meses) e
retardo do início do tratamento foi fundamental
para perda definitiva da função renal.
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INSUFICIÊNCIA AÓRTICA CRÔNICA SECUNDÁRIA
À DILATAÇÃO DA RAÍZ DA AORTA EM
ADOLESCENTE COM ARTERITE DE
TAKAYASU - RELATO DE CASO
CHRONIC AORTIC REGURGITATION SECONDARY TO DILATION OF THE AORTIC ROOT IN
ADOLESCENTS WITH TAKAYASU ARTERITIS - CASE REPORT
Raisa França Ribeiro*, Ana Carolina dos Santos Pinto*, Ana Carolina Santos Silva*, Carla Diniz Nascimento Santos*,
Renayra Tallita Luciano Alonso Coimbra*, Gabriela Silva Vasconcelos**
Resumo
A Insuficiência aórtica (IA) é uma condição em que existe refluxo de sangue da aorta para o
ventriculo esquerdo (VE) durante a diástole ventricular, devido a uma incompetência do mecanismo
de fechamento valvar aórtico. Relata-se o caso de um paciente, adolescente, admitido com
quadro clínico sugestivo de IA importante e com comprometimento da função cardíaca. Exames
complementares confirmaram, posteriormente, o dignóstico de IA secundária à dilatação da raiz
da aorta, sendo Arterite de Takayasu a doença de base. Segue-se uma revisão sobre o assunto,
dando-se ênfase sobre as possíveis condições associadas à dilatação da raiz aórtica.
Palavras-chave: Insuficiência aórtica; Arterite de Takayasu; Dilatação da raiz da aorta.
Abstract
Aortic insufficiency (AI) is a condition in which there is a backflow of blood from the aorta to the
left ventricle (LV) during ventricular diastole due to an incomplete closing of the aortic valve
mechanism. We report a case of a teenager patient admitted with clinical conditions suggestive
of an important AI and with damage of cardiac function. Investigations confirmed later the
diagnosis of IA secondary to dilatation of the aortic root, being Takayasu arteritis the underlying
disease. The following is a review of the subject, with emphasis on the possible conditions
associated with dilation of the aortic root.
Keywords: Ovary; Teratoma; Ovarian neoplasms. Aortic insufficiency; Takayasu arteritis; Dilation
of the aortic root
Introdução
A IA crônica geralmente se desenvolve de maneira
lenta e insidiosa, com uma morbidade muito
baixa durante uma longa fase assintomática.
Alguns pacientes permanecem assintomáticos
por décadas e raramente necessitam de
abordagem terapêutica. Outros, no entanto,
exibem progressão da lesão regurgitante com
desenvolvimento gradual de disfunção sistólica
* Residente de Clínica Médica no Hospital Universitário Getúlio Vargas
**Residente de Reumatologia do Hospital Universitário Getúlio Vargas
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INSUFICIÊNCIA AÓRTICA CRÔNICA SECUNDÁRIA À DILATAÇÃO DA RAÍZ DA AORTA EM ADOLESCENTE COM
ARTERITE DE TAKAYASU - RELATO DE CASO
do VE e eventualmente insuficiência cardíaca
(IC)1.
deformidades, ventrículo direito palpável,
íctus de VE visível e palpável no sétimo espaço
intercostal esquerdo, na linha axilar anterior. À
Essa condição pode manifestar-se como uma ausculta, ritmo cardíaco regular em 3 tempos
complicação da Arterite de Takayasu (AT), uma (presença de terceira bulha), segunda bulha
vasculite de grandes vasos, autoimune, que hipofonética, sopro sisto-diastólico audível
afeta preferencialmente a artéria aorta e seus em foco aórtico, 6+/6+, com irradiação para
principais ramos.
fúrcula, carótidas e todo o precórdio, com
frêmito palpável. Pulmões com murmúrio
Este relato tem o objetivo de retratar o caso de vesicular fisiológico e crepitações em bases,
um paciente que esteve internado no HUGV com mais evidentes à direita. Abdome com sopro
clínica de IA e que preencheu, posteriormente, audível em topografia de aorta abdominal.
critérios diagnósticos de AT.
Extremidades sem edemas, pulsos periféricos
simétricos e em martelo d’água, boa perfusão
capilar, com presença do Sinal de Quincke.
Relato de Caso
Paciente, masculino, 18 anos, cursando há 2
meses com tosse produtiva e dor em ardência
em região retroesternal intermitente, que
melhorava ao decúbito ventral. Negava febre,
perda ponderal ou outros sintomas. Evolui
com hemoptóicos e dor torácica precordial
atípica, sendo admitido no HUGV. Ao exame
físico apresentava-se em bom estado geral,
acianótico, eupneico em repouso, com presença
de Sinal de Musset e sinais vitais estáveis (dentre
eles a concomitância entre as Pressões arteriais
de ambos os membros superiores). Tórax sem
Radiografia de tórax evidenciava cardiomegalia
e sinais de aumento atrial esquerdo - Sinal
da bailarina e duplo contorno (Figura 1).
Eletrocardiograma com ritmo sinusal, FC: 83
pbm, intervalo PR de 0,20 segundos, eixo do
complexo QRS entre +60 e +90 graus, sinais
de sobrecarga ventricular e atrial esquerda.
Exames laboratorias de admissão (Hemograma,
ionograma, bioquímica, provas de atividade
inflamatória) dentro da normalidade e sorologias
(Anti-HIV, VDRL e hepatites virais) negativas.
Figura 1: Radiografia de tórax
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INSUFICIÊNCIA AÓRTICA CRÔNICA SECUNDÁRIA À DILATAÇÃO DA RAÍZ DA AORTA EM ADOLESCENTE COM
ARTERITE DE TAKAYASU - RELATO DE CASO
O Ecocardiograma transtorácico revelou
dilatação da raiz de aorta (52 mm) com
regurgitação importante; aumento de cavidades
esquerdas com disfunção sistólica global de grau
moderado (Fração de ejeção de 39% pelo método
Teicholz); Aumento das dimensões de átrio
esquerdo de grau leve (41mm) e Hipertensão
pulmonar de grau moderado (Pressão sistólica
da artéria pulmonar estimada em 62 mmHg).
evidenciou: Espessamento e calcificações
parietais da aorta e dos troncos supraaórticos, com aspecto bastante sugestivo de
doença do colágeno; Aneurisma fusiforme
da Aorta ascendente, incluindo o seio de
Valsalva; Aneurismas no tronco braquiocefálico
e na artéria subclávia esquerda; úlceras
ateroescleróticas penetrantes na croça da
aorta; Dilatação aneurismática difusa dos
segmentos descendentes médio e distal da
Confirmado, portanto, diagnóstico de IA aorta, estendendo-se ao segmento abdominal
secundária à dilatação de raiz da aorta com até a altura aproximada do tronco celíaco e
insuficiência cardíaca sistólica de VE.
dilatação aneurismática fusiforme da aorta
infrarrenal (Figura 2).
Solicitada angiotomografia de aorta, que
Figura 2: Angiografia de Aorta
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Ribeiro et al
Na ocasião aventou-se a hipótese diagnóstica
de AT, já que o mesmo preenchia 4 critérios
de classificação para tal, de acordo com
a Classificação do American College of
Rheumatology (ACR), de 19902 (Tabela 1):
Idade de instalação da doença inferior a 40
anos, sopro sobre artéria aorta em topografia
abdominal,
alterações
na
arteriografia
(estreitamento/espessamento da aorta) e
claudicação de extremidades (evidenciada
durante o acompanhamento ambulatorial com o
serviço de Reumatologia) permitindo, portanto,
a conclusão diagnóstica dessa vasculite como
sendo a causa da IA apresentada pelo paciente.
Durante o acompanhamento ambulatorial
foi mantido o tratamento com Captopril,
Furosemida e Carvedilol e iniciado Prednisona
e Metotrexate, objetivando um melhor controle
sintomatológico e redução das recidivas das
agudizações do quadro.
Discussão
A AT é uma vasculite crônica de etiologia
desconhecida que envolve artérias de grande
e de médio calibres, incluindo a aorta e seus
principais ramos, além de artérias pulmonares
e coronárias. O gênero mais acometido é
o feminino (80 a 90% dos casos), com faixa
etária de início entre 10 a 40 anos de idade.
Tal informação corrobora a importância
deste relato, que chama a atenção para o
acometimento masculino, não usual.
A AT, em suas fases iniciais, apresenta
manifestações inespecíficas, como febre, malestar, artralgias e emagrecimento. Nesta fase,
o diagnóstico é muito difícil de ser feito, mas,
com a evolução e quando as manifestações
do acometimento vascular dominam o quadro
clínico, essa possibilidade diagnóstica não pode
ser esquecida.3
A fase inicial dessa vasculite caracteriza-se
pelo espessamento da parede da aorta, com ou
sem alterações do lúmen arterial. O processo
inflamatório é destrutivo/degenerativo e
leva, numa fase tardia, a alterações do lúmen
arterial, caracterizadas por estenose, oclusão/
trombose, coarctação atípica, dilatação e/
ou aneurismas. Com frequência predominam
a estenose e obstrução, mas dilatação e
aneurismas não são raros.4 O caso em questão
apresenta além do espessamento da aorta,
dilatações aneurismáticas de vários segmentos
dessa artéria, assim como aneurisma de artéria
subclávia esquerda.
Para o diagnóstico dessa condição, segue-se a
proposta da ACR2, que desenvolveu os critérios
a seguir. A positividade de 3 ou mais desses
critérios apresenta uma Sensibilidade de 90.5%
e Especificidade de 97.8% para o diagnóstico
desta Vasculite.
Critério
Tabela 1: Critérios de Arterite de Takayasu.2
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INSUFICIÊNCIA AÓRTICA CRÔNICA SECUNDÁRIA À DILATAÇÃO DA RAÍZ DA AORTA EM ADOLESCENTE COM
ARTERITE DE TAKAYASU - RELATO DE CASO
A IA, que tem inúmeras outras causas, é
caracterizada por uma falha na coaptação dos
folhetos da valva aórtica durante a diástole,
provocando refluxo de sangue da aorta para o
VE.5
No caso em questão, uma das queixas mais
frequentes do paciente era dor torácica atípica
e já demonstrava, no momento da internação,
sinais de IC.
As manifestações clínicas da IA dependem da
severidade da lesão, do tempo de evolução,
de patologias concomitantes e da função
ventricular esquerda.5 O paciente pode
queixar sintomas inespecíficos como sensação
de desconforto por percepção de batimentos
cardíacos ou dor torácica atípica devido a uma
interação mecânica entre o coração e a parede
torácica, bem como pode apresentar sinais e
sintomas decorrentes IC esquerda como dispnéia
de esforço, ortopnéia, dispnéia paroxística
noturna, e eventualmente edema pulmonar.9
Já o tratamento da AT é baseado em análises
observacionais e em relatos de casos.
Corticosteróides e imunossupressores são
amplamente utilizados na tentativa de se
induzir a remissão ou de se evitar a progressão
das lesões arteriais na AT, mas sem comprovação
por ensaios clínicos controlados e randomizados.
Grande parte da dificuldade em se produzir
evidências para o tratamento da AT reside na
falta de parâmetros confiáveis para se avaliar
a atividade da doença e por essa entidade ser
bastante rara e muitas vezes subdiagnosticada.10
O exame físico em pacientes com IA crônica
As principais etiologias variam de acordo é muitas vezes sugestivo e frequentemente
com a população de estudo e em até 35% dos estabelece o diagnóstico. O pulso arterial na IA
casos a causa é desconhecida.5 Nos países em crônica grave tem a característica de ter uma
desenvolvimento, a causa mais comum de IA é elevação ampla e um colapso abrupto, dando
a doença reumática, porém nos desenvolvidos, o aspecto palpatório do pulso em Martelo
está mais frequentemente relacionada à d’água (pulso de Corrigan). Outras alterações
dilatação da raiz da aorta ou presença de observadas são: pulsação da cabeça (Sinal de
valva aórtica bicúspide congênita.6 No caso Musset), pulsação da úvula (Sinal de Muller),
em questão, não foram visualizadas alterações pulsação de capilares subungueais (Sinal
valvares ao ecocardiograma transtorácico, de Quincke) entre outros.1,9 Algumas dessas
apenas dilatação significativa da raiz da aorta. alterações foram observadas no paciente,
demonstrando a gravidade da IA.
A aterosclerose da aorta ascendente é uma
causa comum de IA crônica em adultos, tendo A terapêutica depende da causa base, função
como principais fatores de risco a hipertensão cardiaca e da presenca ou não de sintomas.
arterial sistêmica e dislipidemia. Doenças Na IA crônica, o tratamento medicamentoso
degenerativas da camada média são as causas é baseado no uso de drogas vasodilatadoras
mais comuns de dilatação envolvendo a arteriais pelos benefícios hemodinâmicos
aorta torácica proximal. Apesar de a maioria como a redução da pós carga do VE, com
dos casos ser de origem idiopática, certas consequente aumento do volume sistólico e
desordens genéticas podem estar associadas, diminuição do volume regurgitante. Os mais
como a Síndrome de Marfan. Acredita-se que os utilizados são os bloqueadores dos canais de
casos de dilatações idiopáticas da raiz aórtica cálcio diidropiridínicos, hidralazina e inibidores
representariam formas frustras dessa síndrome.7 da enzima de conversão da angiotensina. O
Outras doenças do tecido conjuntivo associadas tratamento cirúrgico, mesmo em pacientes
a necrose cística média são a síndrome de com acentuada redução da função ventricular
Ehlers-Danlos e ectasia ânulo-aórtica.8
esquerda, leva a um aumento da FE e da sobrevida
da maioria dos pacientes, sem progressão da
Outras condições que acometem a raiz da aorta IC. Constitui o procedimento de escolha para
são espondilite anquilosante, osteogênese tratamento da IA em pacientes sintomáticos ou
imperfeita, atrite reumatoide, arterite de com disfunção ventricular,1 como o do caso em
células gigantes e doença de Beçet.
questão.
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Ribeiro et al
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RELATO DE CASO: MALFORMAÇÃO
ADENOMATOIDE CÍSTICA PULMONAR EM
PACIENTE ADOLESCENTE
CASE REPORT: CYSTIC ADENOMATOID MALFORMATION OF THE
LUNG IN TEENAGER PACIENT
Vanderlei Pereira Lima*, Giselle Macedo de Souza*, Diego da Costa Matos*, Tamara Mendes Ferrugem*, Hugo Sanmarony*, Ana Paula Leão**
Resumo
As malformações congênitas do pulmão são raras e variam muito na sua forma de apresentação
clínica e gravidade, dependendo principalmente do grau de envolvimento pulmonar e de sua
localização na cavidade torácica. Elas podem se manifestar em qualquer idade e podem ser fonte
de importante morbidade e mortalidade em lactentes e crianças. O objetivo deste estudo foi
relatar o caso clínico de paciente do sexo masculino, com 12 anos de idade apresentando dispneia e
pneumonias de repetição desde período lactente, diagnosticado com malformação adenomatoide
cística pulmonar e operado no Serviço de Cirurgia Pediátrica do Instituto da Saúde da Criança do
Amazonas (ICAM), em Manaus.
Palavras-chave: Malformação Adenomatoide Cística Pulmonar; Dispneia; Pneumonia; Adolescente.
Abstract
Congenital malformations of the lung are rare diseases and they have several ways of clinics
presentations and severities that depends on the degree of pulmonary involvement and location
in the chest cavity. The clinical symptoms may appear at any age and they can be a significant
source of morbidity and mortality in infants and children. We present a case of 12-years old
male patient who complained of dyspnea and recurrent pneumonia since childhood, diagnosed
with pulmonary cystic adenomatoid malformation and operated in Pediatric Surgery Department
of Child Institute Amazon (ICAM) in Manaus.
Keywords: Cystic Adenomatoid Malformation of Lung; Dyspnea; Pneumonia; Teenager.
Introdução
100.000 habitantes por ano ou de 0,06-2,2% dos
pacientes internados em hospitais gerais. As
MACs são responsáveis por aproximadamente 2530% das malformações pulmonares congênitas,
com um risco de insuficiência respiratória ao
nascer em torno de 30% dos casos.2
A malformação adenomatoide cística pulmonar
congênita é uma anomalia do desenvolvimento
pulmonar e foi descrita como uma entidade
clinica distinta em 1949.1 Alguns autores
sumarizaram, pela primeira vez, em 1962, os
critérios microscópicos usados na sua definição.1 Alguns autores definem a malformação
adenomatoide cística congênita (MACC) do
A incidência das malformações pulmonares pulmão como uma anormalidade hamartomatosa
congênitas varia de 30-42 casos para cada da árvore brônquica, outros defendem como
*Médico Residente de Cirurgia Geral do Hospital Universitário Getúlio Vargas
**Médica Cirurgião Pediátrica do Instituto da Criança do Amazonas
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RELATO DE CASO: MALFORMAÇÃO ADENOMATOIDE CÍSTICA PULMONAR EM PACIENTE ADOLESCENTE
uma interrupção no desenvolvimento da
árvore brônquica fetal com obstrução das vias
aéreas. É a malformação pulmonar ressecável
cirurgicamente mais comum em crianças.3-4
A lobectomia é o procedimento de escolha,
o desfecho cirúrgico é favorável e apresenta
complicações tratáveis.1,2
familiares, apresentava episódios de dispneia
aos moderados esforços e pneumonias de
repetição desde o período de lactação. Além
disso, informou dificuldade de ganho de peso.
Ao exame físico apresentava pectus excavatum,
ausculta pulmonar diminuída e com estertoes
crepitantes em ápice pulmonar. Realizou
radiografia de tórax (Figura 1) e tomografia de
A seguir relatamos o caso de um paciente, tórax que evidenciou redução volumétrica do
adolescente, diagnosticado com malformação pulmão esquerdo caracterizada por opacidade
adenomatoide cística pulmonar que foi amorfa fibrocicatricial com brônquios dilatados
submetido a lobectomia de lobo superior de permeio associado à elevação da cúpula
esquerdo, realizado no Instituto da Criança do frênica correspondente (Figura 2). Internado na
Amazonas.
enfermaria cirúrgica do ICAM com diagnóstico
de malformação adenomatoide cística pulmonar
tipo I, submetido à toracotomia posterolateral
Relato de Caso
esquerda com lobectomia superior de pulmão
Paciente do sexo masculino, 12 anos, estudante, esquerdo e dupla drenagem de tórax esquerdo
natural e procedente de Parintins-AM. Segundo em selo d’água.
Figura 1: Radiografia de Tórax demonstrando nível hidroaéreo em macrocisto
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RELATO DE CASO: MALFORMAÇÃO ADENOMATOIDE CÍSTICA PULMONAR EM PACIENTE ADOLESCENTE
Figura 2: Tomografia de tórax evidenciando área fibrocicatricial com brônquios dilatados
Paciente realizou o pós-operatório imediato em
unidade de terapia intensiva, sendo admitido
em ventilação mecânica. No 1º dia pósoperatório - DPO foi extubado com sucesso e
realizou radiografia de tórax que evidenciou boa
expansibilidade pulmonar (Figura 3). Recebeu
alta da unidade de terapia intensiva no 2º DPO.
Na enfermaria realizou fisioterapia respiratória.
Foram retirados os drenos de tórax no 14º
DPO, momento no qual não se evidenciava
fuga aérea. Evolui sem intercorrências e
apresentou evolução clínica satisfatória,
recebendo alta hospitalar no décimo sétimo
dia de pós-operatório. No acompanhamento
ambulatorial, paciente encontra-se sem queixas
ou intercorrências.
Figura 3: Radiografia de tórax: demonstrando boa expansibilidade pulmonar e
presença de drenos de tórax bem posicionados
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Lima et al
Discussão
As malformações congênitas pulmonares formam
um espectro de doenças pouco frequentes,
ocorrendo a partir do desenvolvimento do
intestino primitivo e da sua diferenciação
em sistema respiratório.5 A malformação
adenomatoide cística pulmonar (MACP) é
caracterizada por anomalia de desenvolvimento
do epitélio bronquiolar endodérmico e seu
mesênquima adjacente originando a proliferação
excessiva das estruturas respiratórias terminais.
Esta falha embrionária ocorre entre a 6ª e a 8ª
semana após a concepção, sendo que algumas
lesões podem se desenvolver mais tardiamente
entre a 14ª e a 18ª semana da gravidez.6
As MACPs são consideradas como lesões
de tipo hamartoma, com displasia focal e
desenvolvimento anômalo e é caracterizada por
uma massa multicística de tecido pulmonar com
proliferação de estruturas brônquicas e tecido
pulmonar mostrando arquitetura aberrante e
diferenciada, com graus variados de formação
cística.2
A MACP foi classificada em cinco tipos2, com
base em características clínicas e patológicas.
Em recém-nascidos e crianças, o diagnóstico de
MACP é usualmente feito através de radiografia
simples, embora a TC de tórax ainda seja
recomendada. Cada um dos tipos principais
possui uma aparência característica.
Tipo 0: MACP é letal ao nascimento e o
diagnóstico é feito na necrópsia.
Tipo 1: MACP aparece como uma única lesão
com um ou poucos cistos grandes que podem
ser inteiramente cheios de ar ou ter nível de
fluido e ar.
Tipo 2: MACP tem imagem radiográfica
semelhante ao tipo 1. Contudo apresenta
numeroso pequenos cistos mais homogêneos,
tem uma aparência “borbulhante”.
Tipo 3: MACP frequentemente aparece como
uma massa grande, sólida e homogênea.
Geralmente apresenta desvio do mediastino
para o lado contralateral a lesão e hipoplasia
pulmonar ipsilateral devido ao efeito de massa.
Tipo 4: MACP pode se manifestar ao nascimento
ou na infância com pneumotórax hipertensivo,
infecção ou como um achado incidental.7
As MACPs normalmente são detectadas no
período neonatal ou no início da infância. Com
avanços no diagnóstico, o tratamento da MACP
pode iniciar até no período pré-natal. Em países
em desenvolvimento, um grande número de
crianças com lesões pulmonares congênitas são,
inicialmente, atendidas e tratadas em hospitais
periféricos antes de serem encaminhadas a
centros de nível terciário. O diagnóstico pode
ser tardio, e o início do tratamento apropriado
pode ser atrasado como visto neste relato de
caso.8
A Cirurgia fetal é efetuada em raros centros, pois
implica uma técnica altamente especializada.
A principal indicação para cirurgia fetal é a
presença de hidropsia; no entanto, a colocação
de drenagem pleuroamniótica pode ser uma
alternativa eficaz. A lobectomia eletiva é o
tratamento de escolha mesmo nos pacientes
assintomáticos.1,2,5,8 A maioria dos autores
recomenda a ressecção pós-natal da MACP, pois
ela permite evitar complicações como infecções
recorrentes, pneumotórax e o potencial de
degenerescência maligna na vida futura.1,2
Em conclusão, podemos afirmar que a
malformação adenomatoide cística pulmonar é
uma patológica rara e a principal representante
das malformações pulmonares congênitas.
O seu espectro clínico varia entre pacientes
assintomáticos, que apresentam dificuldade
respiratória ou fetos hidrópicos. O seu
tratamento de escolha é a lobectomia da área
acometida e é realizado principalmente na
infância. A importância deste relato se deve ao
fato de poucos dados na literatura e da idade da
intervenção cirúrgica e da excelente evolução
clínica do paciente, tais condutas adotadas
podem servir de exemplo para outros casos.
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cinco centros. Rev Port Pneumol 2007; XIII (4):
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DISPLASIA FIBROSA CRANIOFACIAL:
RELATO DE UM CASO NA AMAZÔNIA
CRANIOFACIAL FIBROUS DYSPLASIA: A CASE REPORT IN THE AMAZON
Felipe Jezini III,* Fábio Arruda Bindá,* Marco Antônio Cruz Rocha,**Jefferson Moreira de Medeiros,**
Emily Barbosa do Nascimento,***Lia Mizobe Ono****
Resumo
A Displasia Fibrosa Óssea é uma doença benigna, caracterizada pela proliferação de tecido
ósseo imaturo, levando a deformidades estéticas e, em alguns casos, a dor. É frequentemente
diagnosticada durante a infância ou adolescência. Existem duas formas de apresentação, a
monostótica em que um único segmento ósseo é afetado e a poliostótica, quando acomete mais
de um osso. O distúrbio atinge igualmente ambos os sexos. Os sinais e sintomas são decorrentes
geralmente do efeito compressivo nas estruturas vizinhas. Podem ser detectadas pelo exame
de Raio-X, TC ou RNM. O diagnóstico de certeza é conhecido pelo exame anatomopatológico,
que evidencia excesso de matriz fibrosa, formando um padrão semelhantes à letra C da escrita
chinesa. O tratamento da DFO pode variar desde procedimentos conservadores, até condutas
cirúrgicas mais radicais. As cirurgias conservadoras são reservadas para pacientes jovens com
deformidades estéticas, sem outros sintomas. Já as cirurgias radicais são imperativas quando
se tem compressão nervosa gerando dor, disfunção visual ou auditiva. Este artigo apresenta um
caso de displasia fibrosa de região craniofacial, enfocando os aspectos clínicos, imaginológicos,
laboratoriais, histopatológicos, diagnóstico diferencial e tratamento.
Palavras-chave: Displasia Fibrosa Monostótica, Displasia Fibrosa óssea, face, seio maxilar, displasia
fibrosa poliostótica.
Abstract
The Fibrous Dysplasia is a benign bone disease characterized by the proliferation of immature
bone tissue, leading to cosmetic deformities and in some cases, to the pain. It is often diagnosed
during childhood or adolescence. There are two forms of presentation, monostotic, where a
single bone segment is affected, and polyostotic, when it affects more than one bone. The
disorder also affects both sexes. Signs and symptoms usually arise from compressive effect on
neighboring structures. They can be detected by examining X-ray, CT or MRI. The definitive
diagnosis is known for pathological examination, which shows excess fibrous matrix, forming a
pattern similar to the letter C of Chinese writing. Treatment of CFD can range from conservative
procedures, to more radical surgical procedures. Conservative surgery is reserved for young
patients with cosmetic deformities without other symptoms. As for the radical surgery it is
imperative when you have nerve compression causing pain, visual or hearing impairment. This
paper presents a case of fibrous dysplasia of craniofacial region focusing on the clinical, imaging,
laboratory, histopathology, differential diagnosis and treatment.diagnosis of IA secondary to
dilatation of the aortic root, being Takayasu arteritis the underlying disease. The following is a
review of the subject, with emphasis on the possible conditions associated with dilation of the
aortic root.
*Residente do programa de cirurgia de cabeça e pescoço da Fundação Centro de Controle de Oncologia – FCECON
**Cirurgião de cabeça e pescoço, professor da Universidade do Estado do Amazonas - UEA, preceptor do programa de residência em cirurgia de
cabeça e pescoço da Fundação Centro de Controle de Oncologia do Amazonas – FCECON.
***Aluna do sexto ano de medicina da Universidade Federal do Amazonas – UFAM
****Pesquisadora, doutora e Cirurgiã dentista da Fundação Centro de Controle de Oncologia – FCECON
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DISPLASIA FIBROSA CRANIOFACIAL: RELATO DE UM CASO NA AMAZÔNIA
Keywords: Monostotic fibrous dysplasia, fibrous dysplasia of bone, face, maxillary sinus,
polyostotic fibrous dysplasia.
Introdução
Na radiografia referente ao caso relatado,
A Displasia Fibrosa Óssea (DFO) é uma doença pode-se observar velamento do seio maxilar
benigna, pseudotumoral, caracterizada pela esquerdo e do seio etmoide. A nasofibroscopia
substituição gradativa do trabeculado ósseo evidenciava lesão proveniente do teto da fossa
normal por tecido fibroso e ósseo imaturo, nasal revestida por mucosa.
disposto desorganizadamente, levando a
deformidades e, em alguns casos, a dor.1 As imagens observadas pela tomografia
Representa
aproximadamente
2,5%
das computadorizada de face evidenciaram lesão
desordens ósseas e 7% dos tumores ósseos de 4,0 x 3,1 cm com densidade de partes moles
benignos, portanto não é uma desordem localizado na fossa nasal esquerda, promovendo
destruição da parede orbitária e compressão da
incomum.2
musculatura extrínseca da órbita.
Com relação à etiopatogenia, várias teorias foram
propostas, como: congênita, embriológica, No presente caso, decidiu-se lançar mão do uso
neurológica, alterações de desenvolvimento, da RNM (Figura 1), em função da abrangência
distúrbios endócrinos e traumatismos.3 Essa da lesão. Esta revelou lesão em contato com
patologia é frequentemente diagnosticada o músculo reto medial e inferior da órbita
durante a infância ou adolescência, pois é uma deslocando anterior e lateralmente o globo
ocular. Apresentando ainda nível líquido no seu
lesão do esqueleto em crescimento.1
interior.
Foi descrito uma variante que está presente em
cerca de 3% dos pacientes com DFO poliostótica
e que é mais frequente no gênero feminino,
marcada pela presença de múltiplas áreas de
pigmentação cutânea tipo “café com leite” e
hiperfunção autônoma de uma ou mais glândulas
endócrinas levando a puberdade precoce e
distúrbios do crescimento. Esta ficou conhecida
como síndrome de McCune-Albright.2
Será descrito um caso de displasia fibrosa, que
se destaca pelo acometimento craniofacial,
bem como serão discutidos os aspectos clínicos,
imaginológicos, laboratoriais, histológicos e
conduta.
Relato de Caso
Paciente do sexo feminino, parda, seis anos,
natural e residente em Manaus-AM. Foi
encaminhada ao Serviço de Cabeça e pescoço
da Fundação Centro de Controle de Oncologia
(FCECON) com queixas de dor e aumento de
volume da hemiface esquerda acompanhamento
de diplopia e dificuldade de movimentação
ocular.
Figura 1: RNM evidenciando lesão expansiva com epicentro na fossa nasal e seio maxilar esquerdo
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Jezini III et al
osteoblástica e osteoclastos multinucleados
A paciente foi submetida à biopsia da lesão sob e lamelas concêntricas semelhante a corpos
anestesia geral com resultado histopatológico psamomatosos. A Imuno-histoquímica dessa
apresentando proliferação de tecido conjuntivo peça confirmou o diagnóstico de displasia
fibroso, além de trabéculas ósseas com atividade fibrosa (Figura 2).
Figura 2: Exame histopatológico de biópsia local evidenciando proliferação fibro-óssea, caracterizada por
trabéculas ósseas dispostas desorganizadamente
A paciente foi submetida à cirurgia, sendo
realizado o swing de maxila com exérese da
lesão e preservação do soalho da órbita esquerda
(Figura 3).
Figura 3: Imagem do intraoperatório evidenciando lesão em cavidade nasal esquerda
destruindo o soalho da órbita
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DISPLASIA FIBROSA CRANIOFACIAL: RELATO DE UM CASO NA AMAZÔNIA
Discussão
diagnóstico, em busca de lesões em outros
sítios.10
A displasia fibrosa óssea ocorre no período da
infância e adolescência, evoluindo de forma
lenta e progressiva, tornando-se inativa quando
o crescimento do esqueleto é completado.1
Os hormônios sexuais, estradiol, testosterona
e dihidrotestosterona exercem uma forte
influência no seu crescimento.4
Existem duas formas de apresentação: a
monostótica, onde um único segmento ósseo é
afetado e representa 80 a 85% dos casos; e a
poliostótica, quando acomete mais de um osso,
e essa forma representa 15 a 20% dos casos.5
O distúrbio atinge igualmente ambos os sexos,
e as localizações mais comuns são: costelas,
fêmur, tíbia e ossos do crânio.2
O diagnóstico diferencial inclui lesões
malignas como sarcoma e lesões osteoblásticas
metastáticas; e benignas como doença de
Paget e cisto ósseo aneurismático.11, 12 No
entanto, o fibroma ossificante é o principal
diagnóstico diferencial da forma monostótica,
pela semelhança clínica, radiográfica e
anatomopatológica.7
O diagnóstico de certeza é conhecido pelo
exame
anatomopatológico
que
mostra
fibroblastos e osteoblastos produzindo excesso
de matriz fibrosa.13 As trabéculas ósseas formam
um padrão emaranhado que frequentemente
assumem formas curvilíneas semelhantes à
letra C, lembrando escrita chinesa.12,13
A localização craniofacial ocorre em cerca
de 10 a 30% das formas monostóticas e 50 a
100% das formas poliostóticas. Podem assumir
características loco regionais de malignidade.6
Inicialmente a doença é assintomática. Os sinais
e sintomas são dependentes da localização da
lesão e do efeito compressivo nas estruturas
vizinhas.4 À medida que a lesão progride
podem ocorrer assimetria e deformidade facial,
fraturas patológicas, alteração dos movimentos
oculares, além de diplopia e exoftalmia.7
O tratamento da DFO pode variar desde
procedimentos conservadores, até condutas
cirúrgicas
mais
radicais.3 As
cirurgias
conservadoras são reservadas para pacientes
jovens com deformidades estéticas, sem
outros sintomas.7 Já as cirurgias radicais
são imperativas, quando se tem compressão
nervosa, gerando dor, disfunção visual ou
auditiva, fazendo-se a excisão completa da
lesão prevenindo a recidiva.14
O estreitamento dos forames pode resultar no
encarceramento de nervos cranianos levando a
deficiência visual e auditiva.8 No caso relatado,
o paciente apresentava evidente assimetria
facial, dificuldade de movimentação ocular e
diplopia.
Alguns autores são da opinião que a cirurgia
só deve ser realizada quando do final do
desenvolvimento ósseo do esqueleto, devido ao
desenvolvimento da lesão até essa faixa etária.3
No caso relatado, optou-se pelo tratamento
cirúrgico precoce, devido ao comprometimento
do globo ocular e a dor local.
Marcadores do metabolismo ósseo estão
geralmente correlacionados com diferentes
níveis da atividade da doença e são eles:
fosfatase alcalina (FA), osteocalcina e
paratormônio (PTH).3
Alguns estudos mostram evidências de que
bifosfonato intravenoso reduz a dor e o
turnover ósseo levando a melhora radiológica e
bioquímica.15,16 No primeiro ano é realizado o
pamidronato 1 mg / kg em 3 dias consecutivos
a cada 4 meses. E no segundo ano, o ácido
zoledrônico 0,05 mg / kg uma vez a cada 6
meses.15
A maioria das lesões da DF são assintomáticas
e, geralmente, são detectadas pelo exame de
Raios-X, TC ou RNM.9 A principal característica
radiográfica é uma discreta opacificação
intramedular semelhante a um vidro despolido A radioterapia está contraindicada, não só por
ou vidro fosco.9 O cintilograma do esqueleto ser o tumor radio resistente, como pelo provável
pode ser utilizado como método complementar aumento da capacidade de transformação
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revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
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Jezini III et al
sarcomatosa, que se calcula menor que 1% em
sua evolução natural, para aproximadamente
44% após radioterapia.17
O seguimento clínico e radiológico por TC é
fundamental nos pacientes com DF, pelo elevado
índice de recidiva dessas lesões, podendo chegar
a 37% segundo alguns autores.7,10
Em conclusão, podemos ver neste trabalho que
a displasia fibrosa craniofacial reveste-se de
importância pelo fato da doença afetar ossos
da face e do crânio, causando deformidades e
disfunções. Apesar de seu caráter benigno, os
sinais e sintomas resultantes da compressão de
estruturas nobres na base do crânio e órbita
podem gerar dúvidas diagnósticas quanto à
possibilidade de uma lesão maligna.
No caso descrito a DFO ocasionou deformidade
facial importante, associado à diplopia e
dor local. Foi diagnosticada ainda durante a
infância, sendo detectada apenas uma lesão
(forma monostótica).
O tratamento cirúrgico deve ser realizado após
cessar o período de crescimento, porém, no caso
apresentado, houve acometimento severo no
aspecto estéticos, clínico e funcional, optandose por intervir antes da idade adulta.
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DISPLASIA FIBROSA CRANIOFACIAL: RELATO DE UM CASO NA AMAZÔNIA
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STRONGILOIDÍASE DISSEMINADA E INFECÇÃO
CUTÂNEA POR MICOBACTERIOSE EM PACIENTE
COM LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO
DISSEMNATED STRONGYLOIDIASIS AND CUTANEOUS MYCOBACTERIUM INFECCTION
IN A SYSTEMIC LUPUS ERYTHEMATOSUS PATIENT
Karine Gizele S. Pimentel,* Domingos Sávio Nunes de Lima**
Resumo
A infecção por Mycobacterium haemophylum e a disseminação da Strongyloides stercoralis,
ocorrem em pacientes imunodeprimidos. Nos casos graves, pode evoluir para a forma
disseminada, principalmente se houver utilização prolongada de glicocorticóides ou medicamentos
imunodepressoras. Relata-se paciente do sexo feminino, 27 anos, proveniente de Manaus, estado
do Amazonas, Brasil, com diagnóstico de Lúpus Eritematoso Sistêmico há 5 anos. Fazia uso de
imunossupressores, o qual resultou infecção pela micobactéria atípica e pelo parasito intestinal
ambos de forma disseminada. Paciente, mesmo grave, respondeu a antibioticoterapia, tendo
resultado favorável. Ficou evidenciada a importância do diagnóstico precoce e preciso de ambas
as doenças, que se não tratadas precocemente, pode resultar em óbito.
Palavras-chave: Lúpus Eritematoso Sistêmico, Mycobacterium Haemophylum, Stongiloidíase,
Infecção.
Abstract
Mycobacterium haemophilum infection and disseminated Strongyloides stercoralis occur in
immunocompromised patients. In severe cases, it can progress to disseminated form, especially
if there are long-term use of glucocorticoids or immunosuppressive drugs. We report a female
patient with 27 years old, from the city of Manaus (Amazonas, Brazil), diagnosed with systemic
lupus erythematosus for 5 years. She had made use of immunosuppressants, which resulted
infection by atypical mycobacteria and the intestinal parasite both disseminated. Patient, even
severe situation, responded to antibiotic therapy, with good results. The authors emphasize
the importance of early and accurate diagnosis of both diseases, which if not treated early, can
result in death.
Keywords: Systemic Lupus Erythematosus, Mycobacterium Haemophylum, Strongyloidiasis,
Infecction.
Introdução
O Lúpus
Eritematoso Sistêmico (LES) é
uma doença sistêmica, de caráter autoimune,
e sua principal morbidade é a infecção.
Devido à necessidade de medicamentos
imunossupressores, pacientes estão predispostos
a infecções causadas por agentes típicos ou
atípicos, como helmintos e micobactérias
respectivamente.1 O norte do Brasil é uma
região endêmica em tuberculose, onde a
espécie mais frequente é a Mycobacterium
*Residente de Reumatologia do Hospital Universitário Getúlio Vargas (UFAM)
**Doutor em Medicina - Reumatologia. Médico assistente do Hospital Universitário Getúlio Vargas (UFAM)
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STRONGILOIDÍASE DISSEMINADA E INFECÇÃO CUTÂNEA POR MICOBACTERIOSE EM PACIENTE COM LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO
tuberculosis.2 O Mycobaterium haemophylum
é uma micobactéria não tuberculosa (MNT)
com ocorrência infrequente causadora de
doença principalmente em imunodeprimidos.
Com advento da Síndrome de Imunodeficiência
Humana (SIDA), do uso de medicamentos
imunossupressores
para
tratamento
de
neoplasias,
doenças
reumatológicas,
tranplantes, tornou-se importante a rápida
identificação desses micro-organismos para
o pronto diagnóstico e tratamento.3,4 O
Strongyloides stercoralis é um nematóide
intestinal com elevada prevalência em regiões
tropicais e subtropicais, que acomete seres
humanos e, na maioria dos casos, sob a forma de
infecção inaparente de evolução prolongada.5, 6
Nas formas graves, que, em geral, acometem
pacientes imunodeprimidos, a carga parasitária
eleva-se, podendo a helmintíase evoluir para
a forma disseminada. Geralmente o paciente
apresenta manifestações pulmonares que
configuram a síndrome de Loeffer e até mesmo
evoluir para Síndrome da Angústia Respiratória
Aguda (SARA).1, 4, 6
Relato de Caso
Paciente feminina, 27 anos, diagnóstico de LES
há 5 anos, de acordo com American College
of Rheumatology.7 Evoluiu com taquidispinéia
aguda e hemoptise profusa. Foi realizado
pesquisa de BAAR no escarro, no qual foram
evidenciados larvas de S. stercoralis. Evoluiu
com Insuficiência Respiratória Aguda e sepse
por provável translocação bacteriana, onde foi
intubada e submetida à ventilação mecânica,
fazendo
tratamento
com
ivermectina,
albendazol,
piperacilina-tazobactam
e
vancomicina endovenosa. Obteve boa resposta
e foi extubada em 3 dias. Durante a estada na
UTI, foram observados duas lesões na perna
direita (D) e uma na esquerda (E). Ao exame se
encontrava em REG, hidratada, dispnéia leve,
hipocorada, consciente, boa perfusão capilar,
sem linfadenomegalias palpáveis, cavidade
oral sem úlceras. Sem artrites. Aparelho
cardiovascular ritmo cardíaco regular, em 2
tempos, BNF, s/ sopros. PA: 110 x 80, FC: 80bpm.
Aparelho respiratório sem ruídos adventícios. Em
ar ambiente. Abdome inocente. Sem alterações
neurológicas. Em perna direita, duas lesões
nodulares de superfície violácea, bordos bem
definidos, profundas e dolorosas a palpação, de
consistência amolecida, de aproximadamente
6,0 x 4,5 cm em porção anterior e medial. Na
perna esquerda, apresentava lesão semelhante
de 3,0 x 3,0 cm em porção anterior (Figura
1). Realizou-se biópsia cutânea. Tais lesões
ulceraram e drenavam material purulento.
Figura 1: Lesões pernas direita
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Pimentel et al
Exame
estão relacionadas a um estágio clínico mais
tardio do LES. A Mycobacterium haemophylum
Hb 10,4, Hct 32%, reticulócitos: 0.4%, Leuco é uma MNT descrita primeiramente em 1978,
9.080 (Eos: 900 cels, Linfo: 1.300 cels), VHS 56, causando infecção cutânea, articular, pulmonar
EAS 16 piócitos, 15 hemácias, Hg ++. Proteinúria em adultos e linfadenite em crianças. Esta MNT
de 24h 83mg. Prova tuberculínica não reativa, é hemofílica e aeróbica, de crescimento lento,
células BAAR ausentes no escarro, pesquisa fastidioso, que cresce em ambiente quente (30o
de larvas nematóides presentes. Hemocultura a 32oC), e necessita de componente férrico
e urinocultura negativas. COOMBS negativo, para seu crescimento.2 Tem como habitat a
anticardiolipinas IgG e IgM negativos, sorologias água e o solo.12 Visto tais características, a
para HIV 1 e 2 , citomegalovírus e toxoplasmose cultura desse micro-organismo é diferente da
negativos. FAN 1:640 padrão pontilhado fino e padronizada para outras micobactérias. Talvez
homogêneo. Radiografia de tórax com infiltrado tal fato tenha sido responsável por culturas
intersticial difuso. Tomografia de tórax com falso-negativas para micobactérias no passado,
consolidações inflamatórias com discretos levando apenas o isolamento da bactéria a
broncogramas aéreos de permeio em lobos fresco. Com o aumento da prevalência da
superior e inferior esquerdos, densificações retrovirose juntamente com os portadores
reticulares em lobo inferior direito. Na biópsia de neoplasia e transplantados, aumentam
cutânea das lesões da perna foi evidenciado as chances de haver infecção em pacientes
infiltrado inflamatório de padrão granulomatoso imunocomprometidos.13 Menos de 100 pacientes
frouxo, em meio ao tecido adiposo, com pesquisa infectados foram relatados no mundo. MNT não
de células BAAR positiva. Na cultura desse é incomum em pacientes com LES, e geralmente
material cresceu Mycobacterium haemophylum. desenvolve na fase tardia da doença9 e a falta
Iniciamos eritromicina via oral com melhora de consciência dessa complicação pode retardar
inicial, porém com reincidência posterior. Foi o diagnóstico e administração de tratamento
então prescrito ciprofloxacina via oral, onde adequado. A clínica das infecções cutâneas
é ampla, de doença localizada à sistêmica, e
teve melhora das lesões.
deve ser suspeitada em pacientes com nódulos
indolentes, eritema nodoso-like, especialmente
Discussão
com culturas bacterianas negativas.
A infecção, contribuída pela imunodepressão,
ainda é principal causa de morte em pacientes
com LES.8, 9, 10 É sabido que os glicocorticóides
(GC) aumentam a suscetibilidade a infecções,
além de diminuir o número de macrófagos e
monócitos do sangue.9 Tem sido descrito que
a quimiotaxia, reconhecimento na membrana,
fagocitose, metabolismo oxidativo, produção de
interleucina (IL),8 células polimorfonucleares e
sistema complemento são deficientes no LES.9,
10, 11
O número de linfócitos T decai e a eficácia
da célula T-helper é diminuída, particularmente
durante a doença e a longa exposição ao GC.8
O aparelho respiratório, trato urinário e a pele
são locais comuns de infecção. A prevalência
de tuberculose (TB) está em torno de 5% da
população lúpica em área endêmica, sendo
o pulmão o local mais comum. Entretanto a
frequência extrapulmonar e a severidade são
maiores do que na população em geral.9 A infecção
por micobactérias não tuberculosas (MNT)
A estrongiloidíase é uma parasitose geralmente
crônica e assintomática. Contudo, sua forma
mais grave é invasiva e frequentemente fatal.
A mortalidade pode chegar a 87% e é associada
à infecção bacteriana secundária. No caso de
nossa paciente, havia suspeita de infecção
de vias aéreas inferiores, visto o desconforto
respiratório agudo, hemoptise franca e o estado de
imunossupressão. Mesmo não havendo sintomas
gastrointestinais ou pulmonares prévios, fezse necessário o aspirado traqueal, o qual é
um dos materiais orgânicos com maior taxa de
positividade (2/3 dos casos), acompanhado pelo
aspirado gástrico, biópsias de pele e pulmão.14
Dados sobre o diagnóstico dessa condição são
escassos e advêm de pequenas séries de casos
devido à raridade com que se diagnostica a
estrongiloidíase disseminada. O tratamento
da estrongiloidíase mudou significativamente
desde que a administração por via oral de
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STRONGILOIDÍASE DISSEMINADA E INFECÇÃO CUTÂNEA POR MICOBACTERIOSE EM PACIENTE COM LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO
ivermectina estabeleceu-se como o tratamento
de escolha. Atualmente, a tendência é que a
ivermectina venha a substituir o albendazol.
Essa doença envolve quaisquer outros órgãos,
além dos pulmões e do trato gastrointestinal,
inclusive o sistema ocular. A mortalidade pode
chegar a 87%.
Concluímos que Infecção por Mycobacterium
haemophylum e Strongiloidiase sistêmica
ocorrem
principalmente
em
pacientes
imunocomprometidos. Devido a frequência
e relevância clínica do LES, deve-se sempre
desconfiar de lesões, sinais e sintomas sugestivos
a fim de iniciar o tratamento precocemente e
evitar a contribuição para os altos índices de
mortalidade e morbidade que tais patologias
apresentam.
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EXISTE RELAÇÃO ENTRE OSTEOGÊNESE
IMPERFEITA E HIPERTERMIA MALIGNA?
RELATO DE CASO
IS THERE A RELATIONSHIP BETWEEN OSTEOGENESIS IMPERFECTA AND MALIGNANT
HYPERTHERMIA? CASE REPORT
Marco Antônio Fernandes Rabelo,* Wendell Jackson de Macêdo Caldas,* Christiane Rodrigues da Silva,** Rodrigo dos Reis Ferreira***
Resumo
Osteogênese Imperfeita (OI) é uma doença genética rara associada a inúmeras intervenções e
complicações anestésico-cirúrgicas que exigem manejo acurado. Contudo, informações providas
de evidências científicas relacionadas ao ato anestésico são escassas, sendo o objetivo deste
estudo contribuir para o aprimoramento do cuidado a esses pacientes, abordando, sobretudo, a
complicação anestésica mais controversa da doença: a hipertermia maligna. No caso, temos um
paciente do sexo masculino, 15 anos, portador de Osteogênese Imperfeita tipo III, com histórico
de duas operações anteriores sob anestesia balanceada, sem complicações, foi submetido a
tratamento cirúrgico de pseudoartrose subtrocantérica utilizando haste telescópica ante mesma
técnica anestésica, sem qualquer intercorrência. Não há evidência científica com relevância
metodológica na literatura da relação entre OI e hipertermia maligna. Assim, a anestesia geral
balanceada pode ser uma opção segura para pacientes portadores da doença, sobretudo quando a
anestesia venosa total ou regional não são alternativas viáveis e medidas de prevenção e controle
da hipertermia intraoperatória estão asseguradas.
Palavras-chave: Anestesia; Osteogênese Imperfeita; Hipertermia Maligna.
Abstract
Osteogenesis Imperfecta (OI) is a rare genetic disease associated with numerous interventions
and anesthesia-surgical complications that require accurate handling. However, information
provided scientific evidence related to anesthesia are rare, being objective of this study
contribute to the improvement of care for these patients, addressing especially the most
controversial anesthetic complication of the disease: malignant hyperthermia. In case, we have
a male patient, 15 years old, holder of Osteogenesis Imperfecta type III, with a history of
two previous operations under balanced anesthesia, without complications, underwent surgical
treatment of subtrochanteric nonunion using telescopic rod at the same anesthetic technique
without any complications. There is no scientific evidence to methodological relevance in the
literature of the relationship between OI and malignant hyperthermia. Thus, the balanced
general anesthesia can be a safe option for patients with the disease, especially when the total
or regional intravenous anesthesia are not viable alternatives and measures for prevention and
control of intraoperative hyperthermia are assured.
*Médico em especialização em anestesiologia pelo CET integrado do Instituto de Anestesiologia do Amazonas/PRM em Anestesiologia do Hospital
Universitário Getúlio Vargas.
**Médica anestesiologista portadora do Título de Especialista em Anestesiologia pela SBA e colaboradora do CET integrado do Instituto de
Anestesiologia do Amazonas/Hospital Universitário Getúlio Vargas;
*** Médico anestesiologista portador do Título Superior em Anestesiologia pela SBA e instrutor do CET integrado do Instituto de Anestesiologia do
Amazonas/Hospital Universitário Getúlio Vargas.
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EXISTE RELAÇÃO ENTRE OSTEOGÊNESE IMPERFEITA E HIPERTERMIA MALIGNA?
RELATO DE CASO E REVISÃO NARRATIVA DA LITERATURA
Keywords: Anesthesia; Osteogenesis Imperfecta; Malignant Hyperthermia.
Introdução
índice de Goldman e classe III de estado físico
da ASA. Na sala de cirurgia, o monitoramento
Osteogênese Imperfeita (OI) ou Doença foi realizado com eletrocardiograma, oximetria
de Lobstein é uma patologia de origem de pulso, pressão arterial não invasiva,
genética, relacionada à produção anômala do temperatura esofágica e capnografia. A
colágeno tipo I, caracterizada por fraturas e presença de cifoescoliose, baixa estatura
alterações
hematológicas
afastaram
deformidades ósseas e associada a complicações e
multisistêmicas que exigem manejo anestésico- inicialmente a anestesia regional. O histórico
cirúrgico acurado.1 A hipertermia de origem anestésico-cirúrgico do paciente e a ausência
desconhecida,2 algumas vezes atribuída à de sustentação científica quanto ao risco
fisiopatogenia maligna,3-5 é frequentemente de desenvolvimento de hipertermia maligna
observada nesses pacientes, contudo, ainda não associado à OI encorajaram a administração de
há evidências científicas que sustentem essa anestesia geral balanceada.
relação.6-8 Isto posto, a anestesia balanceada
pode ser uma opção segura quando a anestesia Como medicação pré-anestésica, fentanil
venosa total ou regional não são alternativas 25mcg e clonidina 100mcg. A indução anestésica
deu-se com fentanil 5mcg.Kg-1, lidocaína
viáveis.
1mg.Kg-1, atracúrio 0,5mg.Kg-1 e propofol
3mg.Kg-1. Realizada intubação orotraqueal
Relato de Caso
com tubo de 6 mm por laringoscopia direta
Paciente do sexo masculino, 15 anos, 32 kg e cuidadosa evitando hiperextensão cervical e
1,10 cm, portador de osteogênese imperfeita traumatismos. Máscaras laríngeas de vários
tipo III, em uso de pamidronato dissódico tamanhos estavam acessíveis, mas não foi
mensal, foi admitido na sala de operações necessário utilizá-las. O plano anestésico foi
para tratamento cirúrgico de pseudoartrose mantido com sevoflurano entre 2,0 e 2,5% e
analgesia pós-operatória obtida com dipirona
subtrocantérica utilizando haste telescópica.
1,5g e morfina 4mg intravenosas. Dantroleno
Apresentava história de tratamento cirúrgico sódico, bicarbonato de sódio e plasma fresco
de fratura de ossos do carpo há 2 anos e foram alocados para o caso de desenvolvimento
colecistectomia videolaparoscópica há 2 de hipertermia maligna, conforme rotina do
meses, sendo ambas as cirurgias realizadas sob serviço, no entanto, nenhuma intercorrência
anestesia geral balanceada, sem intercorrências anestésica foi observada.
anestésicas.
Discussão
Exame físico evidenciava baixa estatura,
hipoplasia
principalmente
de
membros
inferiores, tórax cifoescoliótico, com aumento
do diâmetro anteroposterior e redução global
da expansibilidade torácica e lordose, além de
escleras azuladas e dentinogênese imperfeita.
Exames laboratoriais normais, exceto pela
atividade da protrombina alterada, com INR
= 1,54. Eletrocardiograma e Ecocardiograma
sem alterações. Radiografias de tórax e de
membros inferiores evidenciavam as principais
deformidades ósseas presentes.
Osteogênese Imperfeita (OI) ou Doença de
Lobstein decorre de mutações em genes
implicados na formação do colágeno tipo I,
proteína mais abundante da matriz extracelular
do tecido conjuntivo. Diversas anormalidades
anatômicas e fisiológicas originam-se da
formação anômala deste tipo de colágeno,
desenvolvendo tecidos conjuntivos débeis. É
uma das displasias esqueléticas mais comuns,
afetando aproximadamente 6 a 7 por 100.000
pessoas no mundo.1
Atribuiu-se ao paciente grupo I segundo o
Há pelo menos 8 formas reconhecidas de OI,
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Rabelo et al
sendo os tipos I e IV os mais comuns.1 O tipo
I é a forma mais branda e o tipo II, a mais
grave, normalmente incompatível com a vida.
O tipo III é a apresentação clássica da doença, a
segunda mais severa e a com maior risco para o
paciente submetido a procedimentos cirúrgicos
sob anestesia geral ou regional.1
Esses pacientes requerem manejo anestésicocirúrgico acurado, pois podem apresentar
fraturas ósseas espontâneas ou induzidas,
deformidades espinhais e torácicas com
comprometimento restritivo da mecânica
pulmonar, via aérea difícil, anormalidades
cardíacas potencialmente graves e diátese
hemorrágica, entre outras complicações.1
O
desenvolvimento
de
hipertermia
intraoperatória de origem desconhecida é
um fenômeno frequentemente observado em
pacientes com OI, sendo mais comum quando
enflurano foi administrado em comparação à
anestesia venosa total (AVT).2 Por conseguinte,
alguns autores têm sugerido associação entre
Osteogênese Imperfeita e hipertermia maligna3
e demonstrado inclinação para a administração
da AVT4 ou regional5 em detrimento da anestesia
balanceada.
Contudo, essa associação ainda não encontrou
sustentação científica. Estudo retrospectivo
envolvendo 49 pacientes com OI em 180 cirurgias
não cardíacas demonstrou que pacientes
com a doença experimentaram hipertermia
intraoperatória que não foi diferente daqueles
sem Osteogênese Imperfeita.6
Em outra pesquisa, a análise de 105
intervenções cirúrgicas em 29 pacientes com
OI, sendo 72% dos procedimentos realizados
sob anestesia balanceada com sevoflurano e
fentanil, encontrou registro de apenas um caso
de hipertermia não maligna que cedeu com
medidas físicas e antitérmicos.7
E ainda, a ocorrência de taquicardia, acidose
metabólica e hipertermia superior a 40°C
em paciente com OI, em outro estudo, foi
conduzida como hipertermia maligna, no
entanto, teste da contratura muscular in vitro
resultou completamente normal. Os autores
concluíram que o hipermetabolismo observado
em pacientes portadores da doença decorre de
mecanismos desconhecidos distintos daqueles
encontrados na hipertermia maligna.8
Várias teorias são postuladas para explicar o
aumento da temperatura corporal observado
nesses
pacientes.
Hipermetabolismo
representado clinicamente por diaforese,
hipertermia leve, taquicardia e taquipneia
e laboratorialmente por níveis séricos
basais
elevados
de
tiroxina,
creatina
quinase e pirofosfato sugerem que o estado
hipermetabólico basal e a regulação central
anormal da temperatura corporal podem estar
implicados na patogênese da hipertermia
associada à OI.1,7
Concluímos que não há evidência científica
com relevância metodológica, até o momento,
que confirme a relação entre Osteogênese
Imperfeita e hipertermia maligna. Assim, a
anestesia geral balanceada pode ser uma opção
segura para pacientes portadores da doença
quando a anestesia venosa total ou regional não
são alternativas viáveis. Nesses casos, medidas
de prevenção e controle da hipertermia
intraoperatória, maligna ou não, devem estar
asseguradas.
Referências
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for the Patient With Osteogenesis Imperfecta.
AANA Journal. 2010; 78:47-53.
2. Fürderer S, Stanek A, Karbowski A, Eckardt
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Anaesth. 1984 Dec; 56(12):1443-6.
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Anestésica em Criança com Osteogênese
Imperfeita e Hemorragia Epidural. Rev Bras
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EXISTE RELAÇÃO ENTRE OSTEOGÊNESE IMPERFEITA E HIPERTERMIA MALIGNA?
RELATO DE CASO E REVISÃO NARRATIVA DA LITERATURA
5. Lyra TG, Pinto VAF, Ivo FAB, Nascimento JS.
Osteogenesis Imperfecta em Obstetrícia. Relato
de Caso. Rev Bras Anestesiol. 2010; 60: 3: 321324.
6. Bojanić K , Kivela JE, Gurrieri C, Deutsch E,
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osteogenesis imperfecta. Eur J Anaesthesiol.
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7. Espinosa WE, Cabrera BA, Rodríguez PP,
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Experiencia en el tratamiento anestésico de los
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PERFURAÇÃO COMO COMPLICAÇÃO DE
LINFOMA INTESTINAL: RELATO DE CASO
PERFORATION AS COMPLICATION OF INTESTINAL LYMPHOMA
Caroline Lima de Oliveira* Patricia Carvalho Machado Aguiar**, Hugo Sanmarony Cardoso,* João José Correa Bergamasco***,
Rubem Alves da Silva Neto****, Felicidad Santos Gimenez*****
Resumo
Paciente, 40 anos, masculino, apresentou dor abdominal difusa tipo cólica que, em um mês,
evoluiu para localização em fossa ilíaca esquerda, migrando para fossa ilíaca direita, tendo
melhora espontânea. Em 2 meses, abriu quadro com tumoração em fossa ilíaca direita evoluindo
com aumento progressivo, febre, hematúria, êmese, hiporexia, fezes líquido-pastosas e
perda ponderal importante. Ao exame físico, abdome maciço à percussão em fossas ilíacas e
hipogástrio, além de massa palpável em todo o abdome inferior, endurecida, pouco móvel,
dolorosa à mobilização e medindo aproximadamente 25 cm. A tomografia computadorizada (TC)
de abdome total evidenciou volumosa lesão expansiva sólida e heterogênea sugestiva de processo
neoplásico primário possivelmente de alça intestinal delgada com linfonodomegalias de permeio
à raiz do mesentério. Evoluiu com perfuração de alça intestinal, levando a pneumoperitônio e
necessidade de laparotomia exploradora de urgência com resseção do tumor localizado no íleo
terminal, ileostomia e cistorrafia. A lesão foi identificada como linfoma não Hodgkin de células
T. O paciente apresentou boa recuperação pós-operatória, sendo encaminhado para seguimento
ambulatorial em regular estado geral, diurese preservada em sonda vesical de demora e com
ileostomia funcionante.
Palavras-chave: Tumor de intestino delgado, Linfoma, Perfuração intestinal.
Abstract
Patient, 40 years old, male, showed diffuse abdominal pain cramping that in a month, evolved
into location in the left iliac fossa, moving to the right iliac fossa, with spontaneous improvement.
In two months, he opened frame with tumor developed progressive enlargement in the right iliac
fossa, fever, hematuria, vomiting, appetite loss, liquid-pasty stools and significant weight loss.
Physical examination revealed massive abdomen percussion in iliac and hypogastric tanks, with
a palpable mass around the lower abdomen, hardened, little mobile, painful to mobilization and
measuring approximately 25cm. Computed tomography (CT) of the abdomen showed voluminous
full suggestive solid and heterogeneous mass lesion of primary neoplastic process possibly thin
intestinal loop. Lymphadenopathy in between the root of the mesentery. The patient developed
intestinal loop perforation, leading to pneumoperitoneum, requiring laparotomy of urgency with
resection of the tumor located in the terminal ileum, ileostomy and cystorrhaphy. The lesion
was identified as non-Hodgkin T-cell. The patient had an uneventful postoperative recovery
was referred to outpatient follow-up in good general condition, diuresis preserved in indwelling
urinary catheter and ileostomy functioning.
Keywords: Small bowel tumor, Lymphoma, Intestinal perforation.
*Residente de Cirurgia Geral – HUGV
**Acadêmica de Medicina – UFAM
***Residente de Cirurgia do Aparelho Digestivo do HUGV
**** Cirurgião do Aparelho Digestivo
*****Coloproctologista
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PERFURAÇÃO COMO COMPLICAÇÃO DE LINFOMA INTESTINAL: RELATO DE CASO
Introdução
Os tumores do intestino delgado representam
de 1% a 6% de todas as neoplasias do trato
gastrointestinal.
Sintomas
inespecíficos
colaboram para um diagnóstico difícil e, quando
malignos, seu prognóstico é ruim.1
Dentre os tumores benignos, os de origem
epitelial são a maioria, apresentando-se
principalmente em íleo. Quando malignos, o
prognóstico é ruim. Das neoplasias malignas
em geral, 40 a 50% são adenocarcinomas e o
linfoma representa 14%, com taxa de sobrevida
para 5 anos de 30 a 50%.2
Os linfomas não Hodgkin são mais frequentes
em idosos e acometem mais os homens, sendo
a imunodeficiência primária ou secundária uma
predisposição bem estudada. A incidência
dos linfomas não Hodgkin e seus padrões de
expressão apresentam variações no mundo.
Os linfomas de células T são mais comuns na
Ásia do que no Ocidente, enquanto o linfoma
folicular, um subtipo de linfomas de células B, é
mais comum nos países ocidentais.3
A maioria dos linfomas intestinais é de células
B (mais que 95%) e estão uniformemente
divididos em tumores de baixo grau e de
alto grau. A pequena fração de linfomas de
células T que ocorre no intestino geralmente é
formada por lesões de alto grau e geralmente
associada à doença celíaca. Distinguir um
linfoma primário do intestino delgado de um
linfoma que se apresenta como parte de uma
doença generalizada é delicado. Ausência de
linfadenopatia mediastinal, o envolvimento
hepato-esplênico, o mielograma sem alterações,
e o aspirado de medula óssea normal auxiliam
no diagnóstico de doença primária. Podem
apresentar-se como infiltração difusa, massa
exofítica, massa polipóide ou múltiplos nódulos.4
Relato de Caso
Apresenta-se o caso de um homem, de 40
anos, técnico de informática, previamente
hígido. Em maio de 2014 apresentou dores do
tipo cólica em abdome, de caráter difuso e
intermitente, que surgia na maioria das vezes
à noite, sem fator precipitante. Após um mês,
a dor localizava-se em fossa ilíaca esquerda,
onde permaneceu por 15 dias, com as mesmas
características descritas anteriormente. A dor
migrou para fossa ilíaca direita, permanecendo
por alguns dias e cessou espontaneamente. Em
agosto de 2014, o paciente notou abaulamento
em fossa ilíaca direita além de hematúria.
Apresentou aumento progressivo da massa,
febre aferida intermitente com variação de 38º
C - 38,5º C, perda ponderal de 20 kg em 60 dias,
episódios esporádicos de vômitos, inapetência
por 2 semanas e alteração da consistência
das fezes, alternando líquida e pastosa não
aumentando a frequência de evacuações
diárias. Ao exame físico apresentava-se
levemente hipocorado, abdome maciço à
percussão em fossas ilíacas e hipogástrio,
com
massa palpável em todo o abdome
inferior, endurecida, pouco móvel, dolorosa à
mobilização e medindo aproximadamente 25 cm
em seu maior diâmetro. Os exames laboratoriais
evidenciaram anemia, plaquetose, eosinofilia
e hipoalbuminemia. A TC de abdome total
evidenciou volumosa lesão expansiva sólida e
heterogênea, com componente gasoso em seu
interior e com material liquefeito necrótico
ou resíduos fecais na sua porção central,
ocupando a cavidade peritoneal a nível de
mesohipogastrio, estendendo-se inferiormente
à pelve, medindo 13,4x16,2x12,8 cm, sugestivo
de processo neoplásico primário possivelmente
de alça intestinal delgada. Também foram
visualizadas linfonodomegalias de permeio à
raiz do mesentério, a maior medindo 5,84 x
4,5 cm. O paciente foi internado para iniciar
nutrição parenteral (NPT) com programação
de laparotomia exploradora e enterectomia,
porém evoluiu no 1º dia de internação com
perfuração da alça intestinal pelo tumor e
pneumoperitônio, necessitando de laparotomia
exploradora de urgência. Foi realizada
resseção do tumor localizado em íleo terminal,
acarretando em enterectomia. Devido ao quadro
de desnutrição do paciente, não foi realizada
anastomose e prosseguiu-se com ileostomia.
Durante a ressecção do tumor, foi observado
que havia invasão em parede posterior da
bexiga, tornando delicada a dissecção. Ocorreu
uma incisão vesical, necessitando de cistorrafia.
O exame histopatológico evidenciou Linfoma
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Oliveira et al
não Hodgkin de células T. A recuperação pósoperatória transcorreu sem intercorrências. O
paciente recebeu alta em regular estado geral,
diurese preservada em sonda vesical de demora
e com ileostomia funcionante. Seguindo para
acompanhamento ambulatorial e encaminhado
para o hospital de referencia para tratamento
de câncer (FCECON).
Discussão do Caso
O trato gastrintestinal é a localização
extranodal mais acometida por linfoma por
5% -20% de todos os casos. No entanto, o
linfoma gastrointestinal primário é muito raro,
constituindo apenas cerca de 1% a 4% de todas
as neoplasias gastrointestinais. Apesar de o
linfoma poder envolver qualquer parte do trato
gastrointestinal, os sítios mais frequentes entre
adultos são o estômago seguido pelo intestino
delgado e região ileocecal.5
Está
frequentemente
associado
à
imunossupressão por HIV e enteropatias.
A apresentação clínica usual dos linfomas
gastrointestinais incluem dor abdominal, fadiga,
diarreia, perda ponderal e ocasionalmente,
febre. A ocorrência de linfomas primários em
intestino delgado é rara e representam menos
de 2% de todas as neoplasias intestinais e 1020% das neoplasias do intestino delgado. O íleo
é o local mais comum, representando 50% dos
linfomas do intestino delgado.6
Somente 10% dos pacientes com tumores do
intestino delgado apresentam sintomatologia.
Tais
sintomas
estão relacionados com a
localização
do
tumor e seu padrão de
crescimento, não havendo uma clínica
específica. A média de idade dos pacientes
com tumores do intestino delgado encontrase na sétima década de vida, sendo que os
portadores de doença maligna são mais jovens.
A manifestação clínica pode ser de massa
abdominal, obstrução intestinal, sangramento e
perfuração. A perfuração, em geral, localizada,
é vista em cerca de 10% dos pacientes, sendo
mais comum em linfomas ou sarcomas.7
Os linfomas não Hodgkin representam a maior
classe de neoplasias do sistema imunológico,
com mais de 10 tipos distintos. Apesar de
apresentar-se mais frequentemente acima dos
40 anos de idade, podem ocorrer em qualquer
idade. Quando afeta pacientes mais jovens, é
mais comum no sexo masculino e com subtipos
histológicos mais agressivos.3
O mais comum tipo histológico incluem
linfoma relacionado com IPSID (Doença
imunoproliferativa do intestino delgado), EATL
(Enteropatia associada a Linfoma de células T),
linfoma difuso de grandes células B, linfoma de
células do manto, linfoma de Burkitt e linfoma
folicular.4
Dentre as dificuldades de diagnóstico para
os linfomas gastrintestinais primários, há o
fato de que, muitas vezes, apenas pequenas
biópsias estão disponíveis para análise, além
das dificuldades de diferenciação dos tipos de
linfoma.5
Os linfomas não Hodgkin apresentam
comprometimento
ganglionar,
mais
frequentemente no anel de Waldeyer, nos
linfonodos epitrocleares e nos mesentéricos.
Sintomas sistêmicos também podem estar
presentes: sudorese noturna, perda ponderal
superior a 10%, já a febre ocorre em apenas
20% dos casos. Os sintomas referentes à doença
extraganglionar são mais evidentes nos subtipos
mais agressivos como os linfomas intestinais e
podem apresentar também massas testiculares,
compressão da medula, lesões ósseas solitárias,
alteração do hábito intestinal por compressão
extrínseca e muito raramente fistulização
intestinal.3
Doenças
inflamatórias
intestinais,
principalmente a doença de Crohn podem
culminar com perfuração de segmentos do
intestino delgado. Esta complicação é mais
comum em pacientes com ileíte ou ileocolite,
podendo ocorrer em torno de 23% dos casos. As
causas infecciosas como a tuberculose intestinal
e neoplasias também devem ser levadas em
consideração. A perfuração ou obstrução
intestinal tem sido descritas em pacientes com
linfoma não Hodgkin, especialmente no íleo
terminal. No entanto, esta situação é incomum.5
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PERFURAÇÃO COMO COMPLICAÇÃO DE LINFOMA INTESTINAL: RELATO DE CASO
A perfuração como apresentação inicial é rara.
Exames de imagem e endoscópicos podem ser
úteis para o diagnóstico, mas frequentemente
não são conclusivos. Para os tumores primários,
a ressecção cirúrgica é a opção de escolha,
porém, para os metastáticos, a terapêutica
operatória deve ser reservada para os casos
complicados por obstrução, hemorragia ou
perfuração.8
lymphoma. Leukemia & lymphoma (2009).
50(10), 1618-1624.
5. Longo DL. Neoplasia das Células Linfóides.
In:
.Hematologia e Oncologia de Harrison 2ª
Ed. Porto Alegre: McGraw Hill Brasil, 2015, cap
15, p.146. ISBN 9788580554564.
6. Torricelli FCM, Lopes RI, Dias AR, Marchini
GS, Bonafé WW, Lopes JM et al. Linfoma ileal
O paciente referido neste relato apresentou primário como uma causa de intussuscepção
uma forma clínica típica de neoplasia do ileocecal recorrente. Rev Bras. Colo-Proctol.
trato gastrointestinal. Perante a uma massa 2008; 28(2 246-250.
abdominal que à medida que crescia, evoluía
com dor abdominal crônica, sintomas sistêmicos 7. Veenstra M, van Unen JM, Strobbe LJ. Acute
como febre, hiporexia, perda ponderal, além abdomen as the first presentation of a malignant
de quadro característico de compressão, com lymphoma of the small intestine. Acta. Chir.
massa abdominal palpável que complicou com Belg. 2014 Maio-Junho;114(3):209-11.
perfuração.
8. Rangel MF, Silva MVM da, Fernandes MJC,
Atentando à evolução do quadro clínico, foi Ferreira MAS, Nóbrega LPS, Souza MG. Tumores
considerado neoplasia de intestino como Malignos do Intestino Delgado. Rev. Col. Bras.
hipótese diagnóstica. Entretanto, o linfoma Cir. — Vol. 27 – nº 6, 2000, p.385-388.
intestinal é uma patologia que demanda um
grau maior de suspeição durante a propedêutica
diagnóstica, pois detectá-lo em estágios iniciais
é de suma importância para evolução clínica e
tratamento do paciente.
Referências
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Silva LUMA, Silva OAC. Linfoma Difuso de
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patients with small intestinal non-Hodgkin
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PROTEINOSE ALVEOLAR PULMONAR:
RELATO DE CASO
PULMONARY ALVEOLAR PROTEINOSIS: A CASE REPORT
Flavia Matos Salame*, Marta Helena Morais**, Yuri Gonçalves Maduro***, José Correa Lima Netto***
Resumo
A proteinose alveolar pulmonar (PAP) é uma síndrome rara que pode resultar em graus variados
de insuficiência respiratória. Pode ter etiologia congênita, adquirida ou autoimune, sendo esta a
forma mais comum em adultos. O tratamento atualmente estabelecido é feito através de lavagem
pulmonar total e em pacientes com pouca resposta clínica, no uso de Fator Estimulador de
Colônias de Granulócitos e Macrófagos (GM-CSF). No entanto, plasmaferese e imunossupressores
tem sido estudados como alternativas promissoras, principalmente para os casos refratários as
terapêuticas previamente citadas. A evolução da doença após o tratamento varia desde remissão
completa até a falta de resposta clínica e radiológica. Descrevemos o caso de um paciente com
diagnóstico de PAP autoimune, confirmado por meio de biópsia pulmonar, com achados clínicos e
radiológicos compatíveis. Tratado com lavagem pulmonar total e GM-CSF. Evoluiu com regressão
importante dos sintomas a despeito da melhora discreta do padrão radiológico.
Palavras-chave: Proteinose alveolar pulmonar, GM-CSF, lavagem pulmonar total broncoalveolar.
Abstract
Pulmonary alveolar proteinosis (PAP) is a rare syndrome that can result in varying degrees of
respiratory distress. It may have congenital, acquired or autoimmune etiology, this is the most
common form in adults. The onset of clinical disease is insidious, marked mainly by dyspnea
with or without cough. Its diagnosis is made by lung biopsy and correlation with clinical and
tomographic findings. Treatment currently set is done by total lung lavage in patients with
little clinical response, the use of Granulocyte-macrophage colony-stimulating factor (GM-CSF).
However, plasmapheresis and immunosuppressants has been studied as a promising alternative,
especially for refractory cases the therapeutic previously cited. The evolution of the disease
after treatment ranges from complete remission to the lack of clinical and radiological response.
Describe in this report, the case of a male patient, 39 years old, diagnosed with autoimmune PAP,
confirmed by pulmonary biopsy with compatible clinical and radiological findings. Treated with
whole lung lavage and GM-CSF. Progressed with significant regression of symptoms despite the
slight improvement of the radiological pattern.
Keywords: Pulmonary alveolar proteinosis, GM-CSF, whole lung lavage.
*Professora auxiliar da Disciplina Clínica Médica I (Pneumologia) da Universidade do Estado do Amazonas. Médica pneumologista do Hospital Universitário Getúlio Vargas **Residente do Programa de Clínica Médica do Hospital Universitário Getúlio Vargas.
***Médico assistente do Serviço de Cirurgia Torácica do Hospital Universitário Getúlio Vargas
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PROTEINOSE ALVEOLAR PULMONAR: RELATO DE CASO
Introdução
Relato de Caso
A proteinose alveolar pulmonar (PAP) é uma
síndrome rara caracterizada pelo acúmulo
de lipídios e proteínas tensoativas no espaço
alveolar.1–5 A incidência na população geral não
é conhecida, mas estima-se que ocorra cerca de
um caso para cada dois milhões de pessoas.2,6
Paciente de 39 anos, do sexo masculino,
pardo, natural e procedente de Manaus-AM
e autônomo. Relata que há 5 anos iniciou
quadro de astenia, tosse seca recorrente e
dispneia aos moderados esforços. Evoluiu com
piora progressiva dos sintomas associada ao
surgimento de hemoptoicos. Durante a evolução
Pode ter etiologia congênita, autoimune, do quadro, foi tratado com hipótese diagnóstica
relacionada a doenças hematológicas ou de Pneumonia Adquirida na Comunidade em
adquirida por exposição ocupacional. A forma duas ocasiões (2011 e 2013) e submetido a
mais comum de apresentação no adulto é tratamento empírico para tuberculose pulmonar
a autoimune, associada a altos níveis de por 6 meses em 2014, evoluindo sem melhora.
autoanticorpos neutralizadores dos fatores Em 2015, teve acesso pela primeira vez a um
estimuladores de colônias de granulócitos e serviço de pneumologia, iniciando investigação
macrófagos (GM-CSF).7
diagnóstica. Na ocasião, em regular estado geral,
com dispneia aos mínimos esforços, saturação
O tratamento mais aceito é a lavagem pulmonar periférica de oxigênio (SpO2) em torno de
total, entretanto há sérias desvantagens e 86% em ar ambiente e em repouso. Ao exame
complicações. Há relatos promissores, mas físico os achados normais foram um murmúrio
ainda escassos sobre o uso do rituximabe, vesicular diminuído globalmente e estertores
um anticorpo monoclonal dirigido contra o crepitantes finos em ambas as bases pulmonares
antígeno de linfócito B CD20.8,9 Outra proposta à ausculta. Nega outros antecedentes mórbidos
terapêutica é o uso de GM-CSF, que demonstrou pessoais e exposições ocupacionais relevantes.
eficácia em 50 a 70% dos pacientes com relato A tomografia computadorizada de tórax (TC de
de uso na literatura,7,10 tendo sido a droga de tórax) (Figuras 1 e 2) evidenciou acometimento
escolha no caso relatado adiante.
extenso pulmonar, bilateralmente, com achados
do tipo Pavimentação em Mosaico e áreas de
vidro fosco.
Figura 1: Tomografia computadorizada do tórax em avaliação inicial na Pneumologia. Figura 2: Achados
de áreas de opacidades extensas em padrão de pavimentação em mosaico (vidro fosco associado a
espessamento de septos interlobulares), bilaterais e poupando a periferia dos pulmões.
Optou-se por realizar biópsia pulmonar por meio
de toracotomia cujo estudo anatomopatológico
confirmou o diagnóstico de Proteinose Alveolar.
Foi realizada uma lavagem pulmonar total, sem
possibilidade de repetição do procedimento
por dificuldades logísticas do nosso serviço. Foi
iniciado tratamento com GM-CFS (filgastrim) na
dose de 300 mcg ao dia por via subcutânea. Cerca
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v.14. n.1 jan./jun. - 2015
Salame et al
de dois meses após início, evoluiu com melhora
importante do estado geral e da dispneia que
se tornou aos médios esforços, associada à
melhora da hipoxemia, com saturação periférica
de oxigênio com SpO2 mantendo-se em torno
de 92%. Também ocorreu normalização da
ausculta pulmonar. No entanto, comparandose as imagens da TC de tórax antes e após o
tratamento com GM-CSF, não se observou
melhora radiológica significativa (Figura 3). O
paciente recebeu alta hospitalar mantendo o
uso de GM-CSF diariamente, com programação
de nova lavagem pulmonar total e terapia
com rituximabe em caso de refratariedade ao
tratamento convencional.
Figura 3: Tomografia computadorizada do tórax realizada depois de lavado pulmonar total.
Imagem evidenciando melhora discreta das áreas de opacidade.
Discussão
Nosso paciente representa um caso de
PAP autoimune, a etiologia mais comum
desta doença em indivíduos adultos.2,6
Apresentava quadro insidioso de dispneia,
inicialmente aos médios esforços com piora
progressiva, associado a tosse seca, por vezes
com expectoração
hialina e hemoptóicos.
Apresentou dois episódios de piora do quadro,
associado a febre e expectoração purulenta
após infecção de vias aéreas documentadas. A
literatura descreve como principal sintoma a
dispneia, que geralmente é aos médios esforços,
mas pode apresentar-se também às atividades
cotidianas.2,7 Relatos de febre baixa são comuns
e geralmente se associam a quadros infecciosos
concomitantes.2 Ao exame físico, nosso paciente
apresentava murmúrio vesicular diminuído
globalmente e crepitações finas em ambas
bases pulmonares, compatível com os achados
habituais de PAP.2 A hipoxemia é comum nesses
pacientes, principalmente naqueles com quadro
avançado.2 O paciente relatado não apresentava
cianose central nem de extremidades, mas
necessitava suplementação de oxigênio por
meio de cateter nasal para manter a sua
saturação arterial de oxigênio acima de 90%.
Foi submetido a tomografia computadorizada
de tórax que evidenciou acometimento
extenso de ambos os pulmões, com presença
de vidro fosco distribuído assimetricamente
com espessamento de septos interlobulares
configurando padrão de “pavimentação em
mosaico.” Classicamente, o acúmulo de
produtos fosfolipoprotéicos dentro dos alvéolos
e infiltrado linfocitário com edema dos septos
interlobulares justifica esses achados.2 Diante
de achados clínicos e radiológicos sugestivos
de PAP, optou-se pela biópsia pulmonar
cirúrgica para confirmação diagnóstica, como
postula a literatura.7 O estudo histopatológico
da amostra coletada evidenciou arquitetura
acino-lobular preservada, espaços alveolares
preenchidos por material proteico, amorfo,
eosinofílico, granuloso fino, eventualmente
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PROTEINOSE ALVEOLAR PULMONAR: RELATO DE CASO
permeado por cristais romboidais ou por
macrófagos
alveolares
volumosos,
com
citoplasma amplo e de aspecto xantomatoso. Os
septos alveolares eram delgados e tênues com
discreto infiltrado inflamatório linfocitário, às
vezes se associando a dilatações e coalescência
de espaços alveolares. Todos esses achados
são compatíveis com o que habitualmente se
observa na PAP.3 Feito o diagnóstico, iniciouse o tratamento com GM-CFS 300 mcg ao dia,
que têm se mostrado eficaz em 50 a 70% dos
pacientes, segundo alguns estudos.3 A principal
modalidade terapêutica consagrada para PAP é
o lavado broncoalveolar total.3 No entanto, esse
procedimento apresenta algumas desvantagens.
Normalmente é necessária anestesia geral
com uso de ventilação mecânica e todas as
consequências inerentes a esses procedimentos.
Além disso, há risco de pneumotórax,
pneumomediastino e infecções, embora sejam
incomuns.3 Nosso paciente foi submetido a
lavado broncoalveolar total com um volume de
4 litros de soro fisiológico. A literatura relata o
uso de 20 a 40 litros de solução salina durante o
procedimento2, no entanto, nosso paciente não
tolerou volumes acima do utilizado, evoluindo
com queda importante na saturação arterial de
oxigênio durante o procedimento. Apesar disso,
semanas após a lavagem pulmonar o paciente
evoluiu com melhora clínica importante.
Apresentava dispneia apenas aos grandes
esforços e mantinha saturação arterial de
oxigênio acima de 90% sem o uso de oxigênio
suplementar, entretanto, não houve melhora
significativa do padrão radiológico comparandose as tomografias de tórax anterior e posterior
ao procedimento. A despeito de ser considerado
o tratamento padrão-ouro para PAP, o lavado
broncoalveolar total não é efetivo para todos
os portadores dessa doença, mesmo quando
realizado da forma adequada.4,11–13 Alguns
pacientes evoluem com remissão definitiva
da doença após um ou poucos procedimentos,
outros necessitam de quantidades maiores
de lavagem e ainda há aqueles que não se
beneficiam dessa modalidade terapêutica.1 Há
programação de novas tentativas de lavagem
pulmonar para o paciente relatado. Caso não
se evidencie resposta satisfatória, planejamos
iniciar terapia com Rituximabe que tem se
mostrado uma alternativa promissora para os
pacientes que não apresentam resposta aos
tratamentos convencionais.7,8
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HÉRNIA DIAFRAGMÁTICA CONGÊNITA DE
BOCHDALEK EM PACIENTE PORTADOR DA
SÍNDROME DE EHLERS DANLOS –
RELATO DE CASO
BOCHDALEK-TYPE CONGENITAL DIAPHRAGMATIC HERNIA IN A PATIENT WITH
EHLERS DANLOS SYNDROME – A CASE REPORT
Fernando Luiz Westphal,* Luiz Carlos de Lima,* Miriam Blanco Sampietro Pinheiro,**Waleska Affonso Salignac Marcião,** Vania Mesquita Gadelha
Prazeres,***Thaís Caroline Sales Raposo,****Maria Alyete Bezerra Moreira****
Resumo
Hérnia diafragmática congênita (HDC) consiste em um defeito na formação embrionária do
diafragma, resultando em uma comunicação entre a cavidade torácica e a cavidade abdominal.
Em pacientes portadores da Síndrome de Ehlers Danlos, podem ser evidenciadas características
como pele frágil ou hiperelástica, hérnias recorrentes, hiperelasticidade das articulações,
dificuldade de cicatrização, pneumotórax espontâneo, e complicações vasculares. A presença de
um defeito no diafragma permite a passagem de vísceras abdominais para a cavidade torácica
levando a compressão do pulmão ipsilateral e, dependendo do volume das vísceras herniadas, há
desvio do mediastino com compressão do pulmão contralateral. Mesmo com avanços diagnósticos
e terapêuticos ainda é possível encontrar pacientes com diagnóstico tardio de HDC, como
evidenciado neste relato de caso, o que mostra que essa doença ainda é subdiagnosticada,
indicando falhas no diagnóstico durante o pré-natal e no período neonatal.
Palavras-chave: Hérnia diafragmática, Bochdalek, Ehlers Danlos.
Abstract
Congenital diaphragmatic hernia (CDH) consists of a defect in the embryonic formation of the
diaphragm, resulting in a communication between the thoracic cavity and abdominal cavity.
In patients with Ehlers Danlos syndrome, features like fragile skin or hyperelastic, recurrent
hernias, hypermobility of joints, healing difficulty, spontaneous pneumothorax, and vascular
complications can be noticed. The presence of a defect in the diaphragm allows the passage of
abdominal viscera into the thoracic cavity leading to compression of the ipsilateral lung and,
depending on the volume of herniated viscera, there mediastinal shift with compression of the
contralateral lung. Despite diagnostic and therapeutic advances it is still possible to find patients
with late diagnosis of CDH, as evidenced in this case report, which shows that this disease is still
underdiagnosed, indicating failure diagnosis during prenatal and neonatal period.
Keywords: Diaphragmatic Hernia, Bochdalek, Ehlers Danlos syndrome.
* Professor Adjunto da Universidade Federal do Amazonas
**Médica Pediatra
***Médica Geneticista
****Acadêmica de Medicina da Universidade Federal do Amazonas
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HÉRNIA DIAFRAGMÁTICA CONGÊNITA DE BOCHDALEK EM PACIENTE PORTADOR DA
SÍNDROME DE EHLERS DANLOS – RELATO DE CASO
Introdução
imagens com hipertransparência nos 2/3 do
hemitórax esquerdo, sugerindo pneumotórax.
Foi submetida a pleurostomia intercostal
fechada entretanto não se observou expansão
pulmonar (Figura 1). Entretanto, observou-se
que não houve expansão pulmonar e iniciou-se
investigação para provável etiologia. O paciente
ficou em observação por 2 dias, contudo com
dreno de tórax não funcionante.
Hérnia diafragmática congênita (HDC) do tipo de
Bochdalek consiste em um defeito na formação
embrionária do diafragma, resultando em uma
larga abertura (forame de Bochdalek) na região
postero-lateral do diafragma, o que cria uma
comunicação entre a cavidade torácica e a
cavidade abdominal.1 Pode ser uni ou bilateral
sendo mais frequente unilateral acometendo o
Havendo suspeita de hérnia diafragmática, foi
lado esquerdo.2
realizada uma radiografia contrastada, após
A incidência de HDC varia dependendo da a ingestão de bário, que demonstrou alças
utilização de casuísticas pré ou pós-natais. A intestinais na cavidade torácica (Figura 2). Foi
incidência neonatal é cerca de 1:3000 a 1:5000, realizada uma tomografia computadorizada de
com uma incidência pré-natal de 1:2000.2 Em tórax que diagnosticou a hérnia diafragmática
pacientes portadores da Síndrome de Ehlers congênita no lado esquerdo. No dia seguinte ao
Danlos que é uma condição genética autossômica diagnóstico realizou-se uma toracotomia lateral
na qual ocorre distúrbio na formação de tecido esquerda para correção da hérnia diafragmática
conjuntivo, com complicações sistêmicas, é congênita de Bochdalek. Durante o procedimento
conhecida a possibilidade de apresentarem foi realizada a ráfia do diafragma e, devido à
pneumotórax espontâneo e recorrência na característica friável do diafragma do paciente,
formação das hérnias.3 Mesmo com os avanços foi realizado o reforço do mesmo com enxerto
na terapêutica como ventilação com alta pericárdico.
frequência e tratamento cirúrgico a taxa
evoluiu sem complicações
de mortalidade permanece alta.4 Algumas O paciente
morbidades comumente são encontradas decorrentes da cirurgia, permanecendo
associadas à HDC como hipertensão pulmonar, intubado entre o primeiro e segundo dia de
disfunção
gastrointestinal,
sequelas
no pós-operatório, e com drenagem torácica
desenvolvimento neuropsicomotor, deficiência fechada no lado esquerdo por nove dias.
Apresentou picos febris no décimo sétimo dia
auditiva, entre outros.5
de pós-operatório. Em avaliação posterior foi
O objetivo é relatar um caso de diagnóstico diagnosticada pneumonia de origem hospitalar
tardio de hérnia diafragmática congênita do no pulmão direito, no décimo nono dia de póstipo Bochdalek, em um paciente pediátrico, operatório. Durante o período que permaneceu
internado também realizou acompanhamento
portador da síndrome de Ehlers Danlos.
com geneticista e foi solicitada a investigação
de cariótipo uma vez que o mesmo evoluía
Relato de Caso
com baixo peso e atraso neuropsicomotor,
Paciente do sexo masculino, 29 meses, pesando sendo o mesmo diagnosticado com Síndrome de
8.700g, deu entrada no pronto atendimento com Ehlers-Danlos. Realizou nova broncoscopia no
queixa de dificuldade para evacuar há 3 dias. trigésimo terceiro dia de pós-operatório a qual
Ao exame físico apresentava-se normocorado, teve resultado normal e teve alta hospitalar
anictérico, acianótico, afebril e dispneico. Na após 34 dias de internação. O Raio-X de tórax
ausculta pulmonar notou-se murmúrio vesicular de controle demonstrou o diafragma bem
abolido em hemitórax esquerdo. Na ausculta posicionado (Figura 3).
cardíaca ritmo cardíaco regular em 2 tempos com
bulhas normofonéticas. O abdômen apresentavase flácido, plano, indolor a palpação superficial
e profunda. Foram realizadas radiografias de
abdômen e tórax nas quais foram visibilizadas
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HÉRNIA DIAFRAGMÁTICA CONGÊNITA DE BOCHDALEK EM PACIENTE PORTADOR DA
SÍNDROME DE EHLERS DANLOS – RELATO DE CASO
Figura 1: Radiografia de tórax em PA com imagem sugestiva de pneumotórax. É observada área
hipertransparente ocupando 2/3 inferiores do hemitórax esquerdo e ocasionando desvio de mediastino para
o lado contralateral. Dreno (seta) posicionado na porção inferior do hemitórax esquerdo.
Figura 2: Radiografias em AP e Perfil, utilizando contraste oral (bário). É evidenciada a hérnia diafragmática
com a presença de alças intestinais para a cavidade torácica e o deslocamento de
mediastino para o lado contralateral.
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Westphal et al
Figura 3: Radiografia de tórax no pós-operatório, demonstrando boa expansão pulmonar e hemidiafragma
esquerdo com bom posicionamento, convexidade e curvatura.
herniação durante a gestação.2
Discussão
As hérnias de Bochdaleck, descritas pelo
anatomista Vincent Bochdalek em 1848, resultam
de um defeito no segmento posterolateral do
diafragma. Constituem de 85 a 90% das HDC.
Os defeitos podem ser unilaterais ou bilaterais,
sendo as hérnias esquerdas as mais frequentes,
com uma incidência de cerca de 75 a 90%, como
o observado no caso apresentado. Os defeitos
posterolaterais direitos ocorrem em cerca de
10% dos casos e são bilaterais em menos de 5%
dos casos.2
Em pacientes portadores da Síndrome de
Ehlers Danlos, a qual é uma condição genética
que ocasiona distúrbio na formação de
tecidos conjuntivos, podem ser evidenciadas
características como pele frágil ou hiperelástica,
hiperelasticidade das articulações, dificuldade
de cicatrização, pneumotórax espontâneo,
hérnias recorrentes e complicações vasculares.3
Tais características desses pacientes favorecem
o aparecimento de hérnias diafragmáticas como
foi apresentado neste caso.
A HDC pode ser diagnosticada durante o préAs hérnias de Bochdalek resultam de uma fusão natal utilizando o exame de ultrassonografia,
incompleta das membranas pleuroperitoneais o qual é o método de investigação mais
entre a 6ª e 8ª semana, altura em que o utilizado por seu baixo custo e segurança do
intestino regressa à cavidade peritoneal, teste. Entretanto, a ultrassonografia continua
com consequente persistência do canal apresentando falhas diagnósticas em torno de
pleuroperitoneal. A gravidade da HDC está 41% dos casos de hérnia diafragmática, sendo a
relacionada com a dimensão das vísceras falha do examinador correspondente à 33% dos
6,2
herniadas e com a altura em que ocorreu a erros diagnósticos.
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HÉRNIA DIAFRAGMÁTICA CONGÊNITA DE BOCHDALEK EM PACIENTE PORTADOR DA
SÍNDROME DE EHLERS DANLOS – RELATO DE CASO
Quando o diagnóstico não é estabelecido no
pré-natal ou no período neonatal podemos
fazer uso da tomografia computadorizada
que é um excelente método para diagnóstico
de hérnias diafragmáticas. A apresentação
clínica pode variar entre eventos respiratórios
(tosse, dispneia, infecção do trato respiratório
alto, pneumonia) em 43% dos casos, sintomas
gastrointestinais (vômitos, dor abdominal,
constipação) em 33% dos casos, o paciente
pode apresentar sintomas respiratórios e
gastrointestinais simultaneamente (13%), como
no paciente apresentado, ou mesmo pode se
apresentar assintomático (11%). 6
O tratamento cirúrgico eletivo é o ideal uma vez
que o diagnóstico tenha sido feito, pois pode
ocorrer o encarceramento e estrangulamento
do conteúdo herniado a qualquer momento.
Tradicionalmente, as abordagens abertas como
a laparotomia ou a toracotomia têm sido mais
utilizadas, como no caso apresentado. Com o
advento da laparoscopia, a abordagem mudou
para um procedimento minimamente invasivo,
com menor morbimortalidade.7
Em conclusão, a presença de um defeito no
diafragma permite a passagem de vísceras
abdominais para a cavidade torácica levando
a compressão do pulmão ipsilateral e,
dependendo do volume das vísceras herniadas,
há desvio do mediastino com compressão do
pulmão contralateral. Mesmo com avanços
diagnósticos e terapêuticos ainda é possível
encontrar pacientes com diagnóstico tardio
de HDC, o que mostra que essa doença ainda
é subdiagnosticada. Um diagnóstico tardio
de HDC pode facilmente ser confundido
com outras doenças devido ao seu quadro
sintomático inespecífico, além de poder estar
associada a condições genéticas como, por
exemplo, a síndrome de Ehlers Danlos, como
foi relatado anteriormente. Essa condição
requer maior experiência e conhecimento por
parte do médico para que o diagnóstico seja
feito de forma precisa sem acarretar maiores
complicações para o paciente.
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