Produto Potencial e Crescimento

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Instituto de Estudos para o
Desenvolvimento Industrial
PRODUTO POTENCIAL
E CRESCIMENTO
Março 2006
Conselho do IEDI
Abraham Kasinski
Josué Christiano Gomes da Silva
Sócio Emérito
Presidente do Conselho
Amarílio Proença de Macêdo
Lirio Albino Parisotto
Andrea Matarazzo
Luiz Alberto Garcia
Antonio Marcos Moraes Barros
Marcelo Bahia Odebrecht
Benjamin Steinbruch
Miguel Abuhab
Carlos Antônio Tilkian
Nildemar Secches
Carlos Francisco Ribeiro Jereissati
Olavo Monteiro de Carvalho
Carlos Mariani Bittencourt
Paulo Guilherme Aguiar Cunha
Carlos Pires Oliveira Dias
Paulo Setúbal Neto
Claudio Bardella
Pedro Eberhardt
Daniel Feffer
Pedro Franco Piva
Décio da Silva
Pedro Grendene Bartelle
Eugênio Emílio Staub
Pedro Luiz Barreiros Passos
Flávio Gurgel Rocha
Rinaldo Campos Soares
Francisco Amaury Olsen
Robert Max Mangels
Ivo Rosset
Roberto de Rezende Barbosa
Ivoncy Brochmann Ioschpe
Roger Agnelli
Jacks Rabinovich
Salo Davi Seibel
Jorge Gerdau Johannpeter
Thomas Bier Herrmann
José Antonio Fernandes Martins
Victório Carlos De Marchi
José Roberto Ermírio de Moraes
Walter Fontana Filho
Diretor Geral
Hugo Miguel Etchenique
Membro Colaborador
Paulo Diederichsen Villares
Membro Colaborador
Paulo Francini
Membro Colaborador
Roberto Caiuby Vidigal
Membro Colaborador
Julio Sergio Gomes de Almeida
Diretor-Executivo
PRODUTO POTENCIAL E CRESCIMENTO
Principais Conclusões e Sugestões.......................................................................................1
O PIB em 2005 e a Perspectiva para 2006..........................................................................3
Funções de Produção e Produto Potencial .........................................................................7
Problemas de Funções de Produção Agregadas ................................................................9
Identidades Contábeis ........................................................................................................9
Endogeneidade da produtividade.....................................................................................10
Crescimento e investimento ..............................................................................................13
Hiato do produto e inflação..............................................................................................14
O Filtro HP e a Tendência de Crescimento......................................................................15
O Filtro HP Com Função de Produção ............................................................................20
Conclusão ............................................................................................................................22
Principais Conclusões e Sugestões
O crescimento de 2,3% do PIB brasileiro em 2005 foi modesto, levando-se em conta
tanto o dinamismo da economia mundial, principalmente dos países emergentes, quanto o
objetivo de desenvolvimento nacional. Por trás do fraco desempenho está a política monetária
adotada pelo governo. O principal instrumento para contenção da inflação utilizado no Brasil,
assim como em vários outros países, é a taxa de juros que é usada para conter a demanda
doméstica quando esta está aquecida. Segundo a perspectiva do Banco Central brasileiro, a
elevação da taxa real de juro entre os meses finais de 2004 e o primeiro trimestre de 2005 foi
um mal necessário para reduzir o ritmo de crescimento do PIB a um nível compatível com o
crescimento da capacidade produtiva da economia. O argumento é que, diante da forte
aceleração do crescimento do PIB em 2004 (4,9% de expansão), o Banco Central foi forçado
a elevar a taxa básica de juro para evitar que o superaquecimento da economia gerasse
pressões inflacionárias de demanda e, portanto, inviabilizasse a convergência da inflação para
as metas estipuladas pelo Conselho Monetário Nacional.
Há três pontos críticos em relação ao argumento:
•
Primeiramente coloca-se a indagação: Como sabemos se a economia está aquecida? A
resposta reside na diferença entre o seu produto potencial – aquele que uma economia
atinge quando seus fatores de produção (trabalho, capital etc.) estão plenamente
empregados – e o produto registrado de fato. Todavia, a partir dessa resposta, emerge
outra questão: a de como estimar o produto potencial, pois só assim será possível ver o
quão forte está a pressão sobre os preços exercida pela demanda interna. O fato é que,
por maior que seja a sofisticação matemática do método adotado para estimação do
produto potencial, todas as metodologias, inclusive a que é adotada pelo Banco
Central, tendem a extrapolar o passado recente para o futuro. Como decorrência,
estimativas de produto potencial ou de hiato do produto devem ser utilizadas com
cuidado e pragmatismo na condução da política monetária. No caso específico do
Brasil, isto significa projeções muito conservadoras e possivelmente auto-realizáveis
sobre a capacidade de crescimento da economia. Se o passado recente foi de lento
crescimento, projeta-se um crescimento lento para o produto potencial e, na medida
em que a política monetária se guia por tal estimativa, ela pode acabar produzindo o
baixo crescimento projetado inicialmente. Em outras palavras, o Banco Central pode
acabar “produzindo” o hiato do produto que justifica sua política monetária.
•
Outra questão relevante diz respeito à constatação de que a taxa de inflação não
depende exclusivamente de fatores de demanda, dependendo também de fatores de
oferta. Como choques de oferta podem alterar a inflação independentemente do nível
de atividade da economia, estimativas de produto potencial não são um bom indicador
para o comportamento da inflação.
•
Por fim, é importante sublinhar que o crescimento de hoje determina o investimento e
a produtividade de amanhã, fazendo com que as taxas de crescimento efetivo e
potencial sejam interdependentes.
Saindo do mundo dos modelos, cabe advertir que existem condições concretas e
objetivas para o Brasil sustentar um rápido crescimento econômico nos próximos anos:
Produto Potencial e Crescimento
1
•
Em primeiro lugar, a taxa de desemprego ainda é elevada no país, situação que
permite um rápido crescimento do emprego sem gerar pressões inflacionárias
excessivas via aumento do salário real médio da economia.
•
Segundo, como grande parte da força de trabalho brasileira está empregada em setores
de baixa produtividade do trabalho, a aceleração do crescimento levará a um aumento
da taxa de crescimento da produtividade pela simples transferência de trabalhadores
dos setores “atrasados” para os setores “modernos”. Este efeito composição é limitado
no tempo, pois em algum momento a transferência de trabalhadores se esgota. No
entanto, como atestam os exemplos de China e Índia, bem como do próprio Brasil
entre as décadas de 1950 e 1980, o efeito composição pode ser longo o suficiente para
permitir, pelo menos, uma década de rápido crescimento econômico.
•
Terceiro, pelo lado do capital, a taxa de investimento do Brasil normalmente responde
rapidamente a uma aceleração do crescimento. Logo, dada uma expansão maior do
PIB por mais de dois anos consecutivos, é plausível esperar um grande aumento da
taxa de investimento, o que por sua vez ampliará o estoque de capital e a capacidade
produtiva da economia. Ademais, como o aumento do investimento em novas
máquinas, equipamentos e estruturas também vem associado a novas tecnologias, a
própria aceleração do crescimento e do investimento traz consigo um aumento
estrutural da produtividade e da eficiência da economia.
•
Assim, devido ao atual potencial de crescimento de sua produtividade e de seus
mercados externo e interno, o Brasil possui plenas condições de entrar em um círculo
virtuoso de crescimento não inflacionário nos próximos anos, no qual o incremento de
produtividade permite um aumento dos salários reais sem comprometer a estabilidade
da inflação. Como o maior crescimento da economia também expande a massa salarial
e o mercado interno, gera-se um novo estímulo para o aumento do investimento e da
produtividade, potencializando o círculo virtuoso de crescimento. No lado externo, o
incremento da produtividade e da escala de produção gerado pelo crescimento também
aumenta a competitividade das empresas brasileiras, incentivando as exportações.
Se, por um lado, as atuais condições internas e externas favorecem o crescimento de
longo prazo da economia, por outro, é preciso não temer o crescimento econômico. Durante o
início de uma expansão econômica é natural que se verifiquem algumas pressões localizadas
de inflação, devido ao aumento da utilização da capacidade produtiva da economia. Mas, são
justamente tais sinais de aquecimento econômico que levam ao aumento do investimento e,
conseqüentemente, à sustentação do crescimento com estabilidade de preços no médio prazo.
Para entrar em um círculo virtuoso de expansão é necessário, portanto, deixar que a economia
cresça por algum tempo.
Isto não significa relaxar o controle da inflação, mas trabalhar com um horizonte
temporal mais amplo do que o ano calendário. Além disso, as autoridades monetárias devem
olhar para inflação não somente como um fenômeno derivado do comportamento da
demanda. Interromper prematuramente uma expansão por medo da inflação pode acabar
prejudicando a própria política de controle inflacionário, pois se a política monetária não
permite um aumento do investimento e da produtividade, o produto potencial não cresce e
qualquer pequena expansão da economia sempre parecerá representar uma ameaça
inflacionária. Em decorrência, se reproduz o “stop and go”, tão característico da trajetória da
economia nos últimos anos e que vem impedindo o crescimento sustentado brasileiro.
Produto Potencial e Crescimento
2
O PIB em 2005 e a Perspectiva para 2006
De acordo com os dados do IBGE, o produto interno bruto (PIB) da economia
brasileira cresceu apenas 2,3% no ano passado, uma variação praticamente idêntica à média
de crescimento dos últimos 10 anos (2,2%). Devido a essa desaceleração, a taxa de
crescimento do PIB no corrente ano terá um pequeno efeito de carregamento (“carry-over”)
herdado do ano anterior, o que reduz a expectativa de crescimento no ano. Assim, mesmo
com uma recuperação que esperamos para a economia em 2006, a evolução do PIB no ano
como um todo deverá ficar em 3,5%.
A tabela 1 abaixo relaciona a taxa de crescimento do PIB em 2006 com diferentes
trajetórias de recuperação da economia ao longo do ano. A principal conclusão do exercício é
que, mesmo que a economia se recupere significativamente e cresça em média, por exemplo,
1% por trimestre com ajuste sazonal, a taxa de crescimento final do PIB será de apenas 3,1%
ao final do ano. Em outras palavras, mesmo que a economia cresça a um ritmo trimestral de
4% em termos anualizados ao longo de 2006, o crescimento anual do PIB será de apenas
3,1% neste ano devido ao fraco desempenho de 2005.
Tabela 1: Crescimento do PIB em 2006 com Base em Diferentes Hipóteses
para o Crescimento Trimestral do PIB com Ajuste Sazonal
Crescimento trimestral do
PIB com ajuste sazonal
0,0%
0,5%
1,0%
1,5%
2,0%
Crescimento do PIB em 2006
0,5%
1,8%
3,1%
4,4%
5,7%
Voltando ao resultado econômico de 2005, a conclusão inevitável é que nesse ano
o Brasil fechou mais um curtíssimo ciclo de aceleração e desaceleração de crescimento
econômico, algo que vem se repetindo nos últimos anos e que tem efeitos muito negativos
sobre o investimento. Para ilustrar este ponto, as figuras 1 e 2 apresentam a evolução da
taxa de crescimento do PIB, do consumo e do investimento desde 1992. É possível
identificar quatro episódios de redução do nível de atividade econômica ou de
significativa desaceleração do crescimento do PIB: (i) em 1995, após a crise do México;
(ii) em 1998-99, devido às crises da Ásia, da Rússia e do próprio Brasil; (iii) em 2001,
devido ao “apagão” e à crise argentina; e (iv) em 2002, devido à crise de confiança no ano
de eleições presidenciais. A desaceleração de 2005 é, portanto, a quinta em apenas uma
década.
Produto Potencial e Crescimento
3
Figura 1: Taxa de Crescimento Anual do PIB do Brasil
(% Acumulado nos Últimos 4 Trimestres)
10%
Crise do México
(1994-95)
8%
6%
Desaceleração
em 2005
Crises da Ásia
(1997), Rússia
(1998) e Brasil
(1999)
4%
Apagão e crise
da Argentina
Eleição de
2002
2%
0%
2005-4
2004-4
2003-4
2002-4
2001-4
2000-4
1999-4
1998-4
1997-4
1996-4
1995-4
1994-4
1993-4
1992-4
-2%
Fonte: IBGE, Sistema de Contas Nacionais Trimestrais (www.ibge.gov.br).
Figura 2: Taxas de Crescimento Anual da Formação Bruta
de Capital Fixo (FBCF) e do Consumo Privado no Brasil
(% Ao Ano Acumulado nos Últimos 4 Trimestres)
25%
20%
15%
10%
5%
0%
-5%
Fonte: IBGE, Sistema de Contas Nacionais Trimestrais (www.ibge.gov.br)
Produto Potencial e Crescimento
Consumo das famílias
2005-4
2004-4
2003-4
2002-4
2001-4
2000-4
1999-4
1998-4
1997-4
1996-4
1995-4
1994-4
1993-4
1992-4
-10%
Formação Bruta de Capital Fixo
4
A principal diferença entre a desaceleração atual e as anteriores é que, desta vez, a
queda do ritmo de crescimento não foi resultado de um fator exógeno, como um racionamento
de energia, uma crise externa ou um ataque especulativo à moeda brasileira. Desta vez o recuo
foi produzido pelo Governo, notadamente pelo Banco Central, através do aumento da taxa de
juros, sob o argumento da necessidade de fazer a inflação convergir para um valor próximo da
meta ajustada de 5,1% estabelecida para 2005.
A redução da inflação é obviamente uma meta válida e necessária para a estabilidade
macroeconômica. Contudo, deve ser perseguida de modo responsável para não acabar
inviabilizando o crescimento sustentável da economia e prejudicar o próprio controle da
inflação. De fato, a incapacidade de sustentar uma taxa de crescimento elevada por mais de
dois anos consecutivos tem sido uma das principais causas da estagnação do investimento no
Brasil nos últimos dez anos, o que inibe o crescimento e dificulta a obtenção da estabilidade
inflacionária. A figura 3 ilustra este ponto: desde 1996 a formação bruta do capital fixo tem
flutuado em torno do mesmo patamar.
Figura 3: Formação Bruta de Capital Fixo no Brasil (1990=100)
140
130
120
110
100
90
Fonte: IBGE, Sistema de Contas Nacionais Trimestrais (www.ibge.gov.br).
Formação Bruta de Capital Fixo
2005-1
2004-1
2003-1
2002-1
2001-1
2000-1
1999-1
1998-1
1997-1
1996-1
1995-1
1994-1
1993-1
1992-1
1991-1
80
Média 1996-2005
A queda do PIB no terceiro trimestre de 2005 foi um resultado direto da política
macroeconômica do Governo Federal. De um lado, a alta taxa de juro real praticada pelo
Banco Central e a valorização cambial por ela induzida desestimularam o investimento
privado e reduziram a rentabilidade das exportações brasileiras. De outro lado, o alto
superávit primário praticado pelo Tesouro Nacional para compensar o alto custo da dívida
Produto Potencial e Crescimento
5
interna teve, como contrapartida, uma elevada carga tributária e um baixo investimento
público, prejudicando ainda mais o crescimento econômico e a competitividade das empresas
brasileiras.
Por que sacrificar o crescimento econômico em um ambiente internacional tão
propício para o Brasil? Segundo a perspectiva do Banco Central, a elevação da já alta taxa
real de juro entre os meses finais de 2004 e o primeiro trimestre de 2005 foi um mal
necessário para reduzir o ritmo de crescimento do PIB a um nível compatível com o aumento
da capacidade produtiva da economia. Ou seja, o argumento é que, diante da aceleração do
crescimento do PIB em 2004, o Banco Central teria sido forçado a elevar a taxa básica de juro
para evitar que um superaquecimento da economia gerasse pressões inflacionárias de
demanda e, assim, inviabilizasse a convergência da inflação para as metas estipuladas pelo
Conselho Monetário Nacional.
A questão crucial é, obviamente, como saber se a economia está ou não superaquecida.
Teoricamente, para responder a esta pergunta bastaria comparar a produção efetiva e a
produção potencial do país, sendo esta última definida tautologicamente como o nível do PIB
para o qual a taxa de inflação tende a permanecer estável. Em outras palavras, quando a
economia ultrapassa seu produto potencial, o excesso de demanda causa uma aceleração da
inflação. Quando o oposto acontece, a insuficiência de demanda causa uma desaceleração da
inflação. Ao Banco Central caberia, portanto, administrar a política monetária de modo a
manter a economia próxima ao seu produto potencial. O problema com este raciocínio é que,
como diz o ditado popular, na prática a teoria é outra.
A economia não é uma ciência exata e a política monetária não é uma questão
simplesmente técnica. A utilização de estimativas de produto potencial como guia para a
política monetária é um tema naturalmente controverso por três motivos. Primeiro, existem
várias formas de medir o produto potencial e, dependendo da metodologia e hipóteses
utilizadas, os resultados variam substancialmente.1 Segundo, a taxa de inflação depende não
só de fatores de demanda, mas também de fatores de oferta. Como choques de oferta podem
alterar a inflação independentemente do nível de atividade da economia, estimativas de
produto potencial não são um bom indicador para o comportamento da inflação. Terceiro, o
crescimento de hoje determina o investimento e a produtividade de amanhã, fazendo com que
as taxas de crescimento efetivo e potencial sejam interdependentes. Políticas de administração
de demanda para fins de estabilização macroeconômica de curto prazo têm efeitos
permanentes sobre a estrutura produtiva e o crescimento da economia no longo prazo.
O objetivo deste texto é apresentar e discutir a pertinência e as implicações da
utilização de estimativas de produto potencial como guia para a política monetária no Brasil.
Para tanto a análise começa com o conceito de função de produção agregada.
1
Uma análise das diferentes metodologias para o caso brasileiro foi apresentada recentemente em três textos: (i) Araújo,
C.H.V., Areosa, M.B.M., e O.T.C. Guillén (2004), “Estimating potential ouput and the output gap for Brazil” texto
apresentado no XXXII Encontro Nacional de Economia da ANPEC, disponível em www.anpec.org.br; (ii) Barbosa-Filho,
N.H. (2005), “Estimating potential output: a survey of the alternative methods and their aplications to Brazil”, Texto para
Discussão 1092, IPEA; e (iii) Souza Júnior, J.R.de C., (2005), “Produto Potencial: Conceitos, Métodos de Estimação e
Aplicação à Economia Brasileira”, Texto para Discussão 1130, IPEA. Os dois últimos textos estão disponíveis em
www.ipea.gov.br.
Produto Potencial e Crescimento
6
Funções de Produção e Produto Potencial
Modelos de função de produção normalmente reduzem a análise do crescimento
econômico a três variáveis: o crescimento do emprego, o crescimento do estoque de capital, e
o crescimento da chamada produtividade total dos fatores de produção (a PTF), que
representa o aumento da produtividade conjunta do capital e do trabalho.2
A idéia básica de uma função de produção é que, pela ótica da oferta, um aumento da
produção pode ser obtido por três formas distintas: (i) pelo acréscimo no número de horas
trabalhadas na produção; (ii) pelo aumento do estoque de bens de capital utilizados na
produção; ou (iii) pelo incremento da produtividade dos trabalhadores e dos bens de capital.
Como na prática estas três formas de crescimento ocorrem simultaneamente, o grande atrativo
para se utilizar uma função de produção agregada em estudos aplicados é que tal conceito
permite separar as três fontes de aumento da produção.
Para ilustrar o ponto acima, a figura 4 decompõe o crescimento da economia brasileira
no período 1991-2005 com base nos dados do IPEA e do IBGE. As contribuições do capital e
do trabalho para o crescimento foram calculadas a partir das taxas de crescimento e da
participação de cada um desses dois fatores no valor adicionado total da economia.3 Tomando
essas contribuições e considerando ainda o crescimento observado do PIB, a taxa de
crescimento da PTF foi calculada residualmente.
Como a figura 4 sugere, a taxa de crescimento da PTF tende a seguir o comportamento
do PIB. Em anos de alto crescimento econômico a PTF tende a subir e em anos de baixo
desempenho da economia a PTF tende a cair. A razão é que, por definição, a PTF é uma
média ponderada da produtividade média do capital e do trabalho, sendo que cada um destes
dois fatores entra no cálculo com um peso equivalente a sua participação no valor adicionado
total da economia.
Em outras palavras, períodos de rápido crescimento são caracterizados por economias
de escala e ganhos de eficiência na utilização de máquinas e equipamentos e,
conseqüentemente, verifica-se um aumento da produtividade média do capital. No mesmo
sentido, períodos de rápido crescimento também são caracterizados por um aumento na
produtividade média por empregado devido ao aumento no número de horas trabalhadas por
trabalhador. O resultado final é um comportamento pró-cíclico da taxa de crescimento da
PTF.
Para efeito de estimação da taxa de crescimento potencial da economia é necessário
eliminar flutuações cíclicas da análise. Assumindo que as taxas de desemprego e de
participação sejam estáveis no longo prazo,4 o crescimento potencial do emprego é dado pelo
crescimento da população em idade ativa. No mesmo sentido, o crescimento do estoque de
capital depende fundamentalmente da taxa de investimento, da taxa de depreciação do capital
2
Uma função de produção pode ser especificada para qualquer número de insumos, mas a maioria dos modelos
macroeconômicos trabalha com apenas com duas categorias, capital e trabalho, para simplificar e facilitar a análise.
3
A contabilidade do crescimento seguiu a metodologia adotada pelo Congressional Budget Office do Governo dos Estados
Unidos (www.cbo.gov). A taxa de crescimento do capital levou em consideração a variação do estoque de capital medida
pelo IPEA, até 2003, e projeções, para 2004 e 2005, com base na taxas de crescimento do investimento. A taxa de
crescimento do trabalho foi obtida pela taxa de variação do número de pessoas empregadas na economia, segundo os dados
do Sistema de Contas Nacionais Anuais até 2003 e no crescimento do emprego segundo a Pesquisa mensal do Emprego, para
2004 e 2005. Por fim, a particpação do trabalho na renda também foi obtida do Sistema de Contas Nacionais, até 2003,
repetindo-se os valores de 2003 para 204 e 2005, pois o IBGE ainda não divulgou estes dados para os dois últimos anos.
4
A taxa de participação é a razão entre a força de trabalho e a população em idade ativa.
Produto Potencial e Crescimento
7
e da relação capital-produto da economia. O ponto mais controverso na estimação do produto
potencial é, portanto, a projeção da taxa de crescimento de longo prazo da PTF.
Como exemplo do raciocínio acima, considere um simples exercício baseado nos
últimos números do Brasil. De acordo com as projeções populacionais do IBGE, o
crescimento anual da população em idade ativa será de aproximadamente 1,5% nos próximos
anos. Segundo os dados do IPEADATA, a relação capital/produto do Brasil está atualmente
em cerca de 3,1, a preços de 1999, e a taxa de depreciação do estoque de capital agregado é de
aproximadamente 4% ao ano. Por fim, segundo os dados do IBGE, a taxa de investimento da
economia brasileira está em torno de 20% do PIB. Com base nestes números, e assumindo
que capital e trabalho respondam, cada um, por 50% do valor adicionado, a contribuição do
trabalho para a taxa de crescimento potencial seria atualmente de aproximadamente 0,7% ao
ano. Já a contribuição do capital para o crescimento seria de aproximadamente 1,3% ao ano.
Tomadas conjuntamente, o trabalho e o capital permitiriam, portanto, uma taxa de
crescimento de cerca 2% ao ano. A esse número deve ser adicionado o crescimento projetado
da PTF para se obter a taxa de crescimento potencial da economia no longo prazo.
Com base nos dados da figura 4 crescimento médio anual da PTF foi de
aproximadamente 2,8% de 1993 a 1997. Já no período 1998-2002 o aumento anual médio foi
negativo em 0,5%. A conclusão óbvia é que o crescimento da PTF depende fortemente do
crescimento efetivo da economia, o que introduz uma circularidade no cálculo da taxa de
crescimento potencial: quanto mais a economia cresce... Mais ela pode crescer! Esta
circularidade lógica é um resultado natural do caráter descritivo da contabilidade do
crescimento e evidencia porque projeções de limites ao crescimento derivadas de funções de
produção agregadas são problemáticas.
Figura 4: Contabilidade do Crescimento do PIB no Brasil
(Variáveis em Pontos Percentuais) em 1991-2004
5,9
7
3,8
4,0
5
2,5
0,8
1,6
0,9
0,5
0,7
0,8
0,6
1,3
1,4
1,1
1,2
1,9
2,0
1,2
1,2
0,8
1,5
1,4
1,1
2004
2005
0,1
0,3
0,5
1,6
1,4
1,3
0,7
1,2
0,7
0,8
1,0
0,7
0,4
1
0,2
1
0,4
2
0,9
2
1,4
2,2
3
2,5
2,7
3
2,3
4
2,3
3,3
4
4,2
5
4,4
4,9
6
4,9
6
1991
1992
1993
Contribuição do capital
Produto Potencial e Crescimento
1994
1995
1996
1997
Contribuição do emprego
1998
-0,8
-1,0
-0,6
-0,5
-3
-1,8
-2
-1,9
-1,4
-2
-1,2
-1
-0,5
-1
-0,3
0
1999
2000
2001
Taxa de crescimento da PTF
2002
2003
Taxa de crescimento do PIB
8
Problemas de Funções de Produção Agregadas
Existe um longo debate sobre a validade e aplicação de funções de produção
agregadas na literatura econômica. No entanto, para entender por que tal abordagem é
problemática para guiar a política monetária no Brasil, basta considerar quatro pontos:
•
Funções de produção agregadas são sempre válidas ex-post.
•
O crescimento da produtividade dos fatores depende do crescimento efetivo da
economia.
•
O crescimento do estoque de capital também depende do crescimento efetivo da
economia.
•
Medidas do hiato do produto nem sempre são um bom guia para inflação.
Para facilitar a exposição, vejamos cada um desses pontos separadamente.
Identidades Contábeis
Em primeiro lugar, funções de produção agregadas são uma construção teórica sem
ligação direta com a realidade. Somente em condições muito especiais e altamente irrealistas
seria possível construir uma função de produção global para a economia a partir da agregação
das funções de produção de cada unidade produtiva no país.5 O aparente sucesso de funções
de produção em explicar o crescimento não se deve à adequação de suas hipóteses ao mundo
real. O sucesso prende-se ao fato de que é possível chegar à contabilidade do crescimento a
partir das contas nacionais, sem nenhuma hipótese sobre a suposta “tecnologia agregada de
produção”.
Por definição o valor adicionado a custo de fatores é igual à soma da renda do trabalho
e da renda do capital. Como conseqüência, o crescimento do valor adicionado pode ser
decomposto em termos de apenas quatro variáveis: o crescimento do número de horas
trabalhadas, o crescimento do capital utilizado na produção, o crescimento da remuneração
real por hora trabalhada e o crescimento da remuneração real por unidade de capital utilizada
na produção. Esta decomposição vem das contas nacionais e independe da existência de uma
função de produção agregada. Mais importante, por se tratar de uma identidade contábil, essa
decomposição do crescimento econômico não estabelece uma relação de causalidade entre as
variáveis envolvidas.
A contabilidade do crescimento baseada em funções de produção é uma forma de
interpretação da realidade pelo lado da oferta, na qual as remunerações reais do capital e do
trabalho são consolidadas em um índice de produtividade total dos fatores de produção. Desta
forma, a análise do crescimento é reduzida de quatro para três variáveis. Apesar desta
5
Este ponto é analisado com detalhes por Felipe, J. e F. Fisher (2003), “Aggregation in Production Functions: What Applied
Economists should Know”, Metroeconomica 54.
Produto Potencial e Crescimento
9
“sofisticação”, funções de produção agregadas nada mais são do que uma maneira que os
economistas encontraram para ler as contas nacionais. O objetivo primordial de tal construção
teórica é apenas organizar a análise do crescimento em apenas três variáveis (capital, trabalho
e produtividade), de modo a obter uma descrição didática e parcimoniosa do processo de
crescimento ex-post.
Utilizar estimativas de funções de produção agregadas para fazer previsões sobre os
limites ao crescimento é problemático, pois, qualquer que seja a evolução da economia, ela
será por definição compatível com uma função de produção ex-post. Por serem baseadas em
uma identidade contábil, funções de produção agregadas sempre se ajustam à realidade, não o
contrário.
Endogeneidade da produtividade
Em segundo lugar, como a taxa de crescimento da PTF é uma média ponderada das
taxas de crescimento da produtividade do capital e da produtividade do trabalho, uma
aceleração do crescimento efetivo da economia tende a gerar um aumento estrutural da PTF
devido às economias de escala e aos ganhos permanentes de produtividade decorrentes do
aumento do tamanho do mercado. Em outras palavras, o crescimento efetivo da economia
aumenta a produtividade e eleva a taxa de crescimento potencial.
No caso específico do Brasil, existe ainda um outro fator muito importante que afeta a
PTF: quando o crescimento se acelera, trabalhadores tendem a se deslocar de atividades de
baixa produtividade (normalmente no setor informal em segmentos de serviços) para
atividades de maior produtividade (na indústria e no setor formal de serviços). Esta mudança
na composição do emprego acaba por elevar a produtividade média na economia, ou seja, o
crescimento acaba por gerar um aumento da PTF, que por sua vez eleva o crescimento
potencial da economia. Naturalmente, o oposto acontece quando o crescimento se desacelera.
Para ilustrar o ponto acima, as tabelas 2 e 3 apresentam as taxas de crescimento da
produtividade do trabalho entre 1990 e 20036 nos 42 setores da economia brasileira. Os dados
indicam um rápido crescimento da produtividade na agricultura, um aumento mediano da
produtividade na indústria, e estagnação da produtividade no setor de serviços, especialmente
nos setores de alta informalidade do trabalho.
Devido à diferença entre as taxas de crescimento da produtividade do trabalho entre a
indústria e os serviços, a queda relativa do emprego industrial nos últimos anos tem atuado
como um redutor da taxa de crescimento da produtividade do trabalho de toda a economia.
Mais importante, caso o crescimento do PIB e da indústria se acelerem nos próximos anos o
inverso deve ocorrer. Dito de outra forma, caso a indústria cresça mais e venha a absorver
mais trabalhadores, os índices de produtividade do trabalho da economia aumentarão devido à
mudança na composição do emprego em direção a setores de maior produtividade.
6
Até o momento o IBGE não divulgou o sistema de contas nacionais anuais de 2004 e 2005;
Produto Potencial e Crescimento
10
Tabela 2: Taxa de Crescimento Acumulada e Média da Produtividade do Trabalho no Brasil em 1991-2003
AGROPECUÁRIA
INDUSTRlA
Extrativa mineral (exceto combustíveis)
Extração de petróleo e gás natural, carvão e outros combustíveis
Fabricação de minerais não-metálicos
Siderurgia
Metalurgia dos não-ferrosos
Fabricação de outros produtos metalÚfgicos
Fabricação e manutenção de máquinas e tratores
Fabricação de aparelhos e equipamentos de material elétrico
Fabricação de aparelhos e equipamentos de material eletrônico
Fabricação de automóveis, caminhões e ônibus
Fabncação de outros veículos, peças e acessórios
Serrarias e fabricação de artigos de madeira e mobiliário
Indústria de papel e gráfica
Indústria da borracha
Fabricação de elementos químicos não-petroquímicos
Refino de petróleo e indústria petroquímica
Fabricação de produtos químicos diversos
Fabricação de produtos farmacêuticos e de perfumaria
Indústria de transformação de material plástico
Indústria têxtil
Fabricação de artigos do vestuário e acessórios
Fabricação de calçados e de artigos de couro e peles
Indústria do café
Beneficiamento de produtos de origem vegetal, inclusive fumo
Abate e preparação de carnes
Resfriamento e preparação do leite e laticínios
Indústria do açúcar
Fabricação e refinq de óleos vegetais e de gorduras para alimentação
Outras indústrias alimentares e de bebidas
Indústrias diversas
Serviços industriais de utilidade pública
Construção civil
SERVIÇOS
Comércio
Transporte
Comunicações
Instituições financeiras
Serviços prestados às famílias
Serviços prestados às empresas
Aluguel de imóveis
Administração pública
Serviços privados não-mercantis
Crescimento
acumulado
82,8%
33,5%
49,1%
9,2%
58,1%
135,5%
56,7%
24,0%
23,0%
161,2%
52,6%
113,5%
72,2%
12,7%
52,6%
88,5%
53,8%
114,7%
60,0%
27,9%
-26,8%
27,7%
-25,9%
-8,0%
51,9%
27,7%
17,5%
24,4%
48,7%
106,8%
46,8%
5,4%
109,6%
10,7%
-2,2%
-15,5%
-0,7%
152,5%
10,8%
-13,5%
-6,8%
63,4%
8,5%
-13,8%
Taxa média de
crescimento anual
4,8%
2,2%
3,1%
0,7%
3,6%
6,8%
3,5%
1,7%
1,6%
7,7%
3,3%
6,0%
4,3%
0,9%
3,3%
5,0%
3,4%
6,1%
3,7%
1,9%
-2,4%
1,9%
-2,3%
-0,6%
3,3%
1,9%
13,0%
1,7%
3,1%
5,7%
3,0%
0,4%
5,9%
0,8%
-0,2%
-1,3%
-0,1%
7,4%
0,8%
-1,1%
-0,5%
3,8%
0,6%
-1,1%
Fonte: IBGE.
Produto Potencial e Crescimento
11
Tabela 3: Taxa de Crescimento Anual da Produtividade do Trabalho no Brasil
AGROPECUÁRIA
INDÚSTRIA
Extrativa mineral (exceto combustíveis)
Extração de petróleo e gás natural, carvão e outros combustíveis
Fabricação de minerais não-metálicos
Siderurgia
Metalurgia dos não- ferrosos
Fabricação de outros produtos metalÚfgicos
Fabricação e manutençáo de máquinas e tratores
Fabricacão de aparelhos e equipamentos de meteriai elétrico
Fabricação de aparelhos e equipamentos de material eletrônico
Fabricação de automóveis, caminhões e ônibus
Fabricação de outros veículos, pecas e acessórios
Serrarias e fabricacão de artigos de madeira e mobiliário
Indústria de papel e gráfica
Indústria da borracha
Fabricacão de elementos químicos não-petroquímicos
Refino de petróleo e indljstria petroquimica
Fabricacão de produtos químicos diversos
Fabricacão de produtos farmacêuticos e de perfumaria
Indústria de transformeção de material plástico
Indústria têxtil
Fabricação de artigos do vestuário e acessórios
Fabricacáo de cal ados e de artigos de couro e peles
Indústria do café
Beneflciamento de produtos de origem vegetal, inclusive fumo
Abole e preparação de carnes
Resfriamento e preparacão do lee e laticínios
Indústria do acúcar
Fabricacão e refino de óleos vegetais e de gorduras para alimentação
Outras indústrias alimentares e de bebidas
Indústrias diversas
Serviços industriais de utilidade pública
Construcão civil
SERVIÇOS
Comércio
Transporle
Comunicações
Instuições financeiras
Servicos prestados às fammas
Serviços prestados às empresas
Aluguel de imóveis
Administracão pública
Servicos privados não-mercantis
1991
1992
-1,0%
2,4%
6,1%
0,9%
10,8%
0,8%
-2,3%
1,7%
9,0% -1,8%
8,9%
9,0%
8,7% 10,2%
6,0%
3,7%
6,2%
0,7%
15,6% 19,3%
11,6% -5,5%
28,7%
7,7%
8,7%
9,9%
-0,6%
1,5%
8,3%
0,2%
6,2%
3,6%
8,2% -4,1%
12,6%
7,4%
7,8%
4,7%
3,2% -6,5%
4,3% -2,9%
1,4%
1,0%
-9,0% -2,4%
-1,8%
4,7%
-6,5% 16,8%
1,9% -0,9%
-0,8% -1,2%
-9,9% -1,0%
-2,6% -13,3%
14,0% -3,8%
1,3% -6,2%
-0,5% -6,3%
13,0%
5,4%
5,6%
0,0%
-0,8% -0,1%
-1,4% -4,5%
2,7%
3,7%
23,2%
2,5%
3,5%
1,3%
-0,4%
1,8%
-0,3% -0,3%
17,9% 14,8%
-3,0% -2,8%
-8,9% -0,1%
1993
0,4%
5,8%
-1,0%
12,1%
7,5%
16,3%
13,8%
12,3%
18,7%
12,5%
26,3%
21,0%
16,1%
4,0%
17,9%
13,3%
11,7%
5,5%
13,7%
3,2%
6,0%
4,7%
-1,1%
9,4%
2,7%
9,1%
5,5%
-3,0%
-4,8%
5,6%
8,5%
1,9%
-3,2%
1,6%
2,2%
1,4%
3,0%
7,1%
-3,3%
4,4%
4,8%
7,1%
7,6%
-0,4%
1994
6,9%
7,2%
13,8%
5,6%
6,0%
14,1%
17,2%
8,8%
9,1%
5,3%
22,0%
10,1%
10,2%
-0,7%
-0,8%
5,1%
6,8%
8,3%
8,7%
1,5%
6,2%
5,2%
0,7%
-2,5%
-5,0%
2,9%
-6,2%
-4,1%
7,6%
2,7%
8,0%
9,3%
15,8%
9,0%
1,4%
5,4%
-0,6%
9,9%
2,3%
-2,3%
-2,2%
-6,0%
6,4%
-1,1%
1995
5,5%
3,0%
12,6%
0,4%
7,6%
3,0%
1,0%
-2,3%
0,1%
5,1%
11,1%
6,6%
3,6%
-0,1%
-0,2%
3,6%
-2,0%
7,5%
3,4%
7,3%
8,1%
5,4%
-0,6%
4,9%
-9,5%
2,2%
9,5%
15,6%
5,2%
6,7%
8,9%
5,2%
19,6%
1,2%
0,9%
4,6%
1,8%
24,3%
-3,4%
-5,1%
-2,5%
-8,9%
6,8%
-1,3%
1996
12,4%
5,5%
12,6%
29,6%
7,4%
18,8%
8,8%
1,6%
1,5%
7,0%
16,5%
11,7%
11,8%
2,2%
4,4%
22,8%
8,6%
11,1%
8,0%
0,2%
0,6%
17,8%
1,8%
7,2%
1,3%
6,9%
4,8%
8,9%
1,8%
4,6%
5,2%
17,0%
16,5%
2,4%
2,1%
3,3%
2,8%
16,3%
9,2%
0,6%
-1,9%
5,5%
0,5%
-2,6%
1997
1998
1999
2000
2001
0,8%
4,2%
0,3%
8,7% 17,3%
4,8% -2,4% -1,9% -2,0%
0,1%
4,1% -2,0%
0,5%
0,5%
2,6%
12,6%
3,4% -17,8% -11,8% -17,4%
2,3%
7,9% -6,3% -4,7%
2,4%
8,8%
4,5%
7,0% -7,8%
2,5%
5,1% -11,4%
5,8% -10,4%
4,4%
5,5% -7,0% -4,1% -5,3%
5,3%
6,0%
1,9% -2,9% -5,1% -4,7%
7,3%
0,5%
0,1%
7,4%
6,2%
-2,4% -14,1% -10,0% -7,9% -7,8%
11,5% -3,1% -18,9% 11,3%
4,0%
8,4% -3,9% -7,8%
3,1% -5,3%
3,6%
3,7% -1,2% -3,5%
1,9%
4,5% -0,4% -0,7%
1,5%
4,7%
6,0%
2,7%
0,4% -3,1% -1,6%
4,7% 17,7%
5,3% -2,9%
0,3%
10,6% 25,4%
9,4%
0,2%
1,6%
-2,3% -1,2%
0,8%
8,9% -4,1%
6,1% -0,3%
9,5% -5,4%
1,4%
-0,5% -0,5% -19,6% -14,3% -1,5%
-2,7%
0,9% -7,6% -4,1%
0,7%
1,2%
0,8% -4,7% -1,4% -11,3%
-0,8% -9,9% -0,2% -11,4%
4,5%
1,2%
1,7% 17,1% -1,7% 20,4%
4,2%
0,4% -5,9%
6,4% -2,9%
3,8% -3,8%
1,6% -6,2% -3,6%
5,2%
6,5% -2,7% 11,9% -9,1%
13,9% 18,5% 10,5% -22,3% 21,3%
1,9% 35,2%
2,1% 11,4%
0,6%
-3,0%
0,7%
0,8%
3,7%
4,1%
-1,5% -9,2%
0,3% -8,1%
9,2%
5,1%
3,4%
2,7% 13,8% -7,9%
2,4% -6,9% -0,5%
0,0% -0,5%
0,8% -1,6% -0,2% -3,2%
0,0%
1,4% -6,7% -3,2% -3,9% -0,1%
-0,8% -5,5% -0,3% -2,7% -1,2%
10,1% -13,8% 11,8% -4,2%
8,0%
3,0%
7,1% -0,7%
0,5% -1,5%
-1,3% -2,3% -0,8% -4,5% -2,5%
0,9% -1,3%
0,8%
0,4%
0,8%
6,2%
7,4% 10,5%
1,6% -0,9%
2,4% -1,7% -0,4% -2,4%
1,0%
0,1% -2,7% -0,2%
0,6% -0,1%
2002
2,6%
0,7%
-3,3%
3,6%
2,6%
7,0%
-4,0%
3,2%
1,8%
14,0%
9,0%
-3,8%
5,1%
-3,8%
3,7%
7,2%
3,2%
1,2%
2,4%
5,4%
1,9%
4,3%
0,6%
-2,4%
-7,3%
6,1%
7,8%
2,8%
3,3%
-8,1%
3,3%
3,9%
1,2%
-5,2%
-1,8%
-5,7%
-3,4%
6,3%
-3,2%
-1,7%
0,0%
-2,8%
-3,3%
0,0%
2003
2,8%
2,2%
-8,7%
-1,1%
8,4%
-0,6%
0,8%
-4,0%
-9,4%
1,4%
4,0%
-0,5%
-1,2%
5,5%
1,4%
1,1%
-10,4%
-16,8%
-1,3%
0,5%
-13,8%
-0,1%
-3,1%
-7,3%
17,7%
-4,4%
6,9%
4,4%
10,5%
7,4%
4,6%
-11,8%
-4,9%
2,2%
-1,8%
-6,3%
0,1%
0,6%
-3,3%
0,0%
-5,7%
1,0%
-1,9%
2,3%
Fonte: IBGE.
Produto Potencial e Crescimento
12
Crescimento e investimento
Terceiro, o produto potencial depende da taxa de crescimento do capital, que por sua
vez depende da taxa de investimento da economia, que a seu turno depende do crescimento
efetivo e esperado do PIB. A conclusão óbvia é que crescimento hoje gera mais crescimento
amanhã devido ao impacto positivo do aumento da utilização da capacidade produtiva sobre
as decisões de investimento. Para ilustrar este efeito, a figura 5 mostra o comportamento da
taxa de investimento da economia brasileira desde 1991, a preços do terceiro trimestre de
2005. Não surpreendentemente, períodos de redução da taxa de investimento coincidem ou
ocorrem ligeiramente após uma desaceleração do crescimento. No mesmo sentido, os
períodos de elevação da taxa de investimento coincidem ou ocorrem ligeiramente após
períodos de aceleração do crescimento econômico.
Figura 5: Taxa de Investimento no Brasil (Formação Bruta de
Capital Fixo em % do PIB a Preços do Terceiro Trimestre de 2005)
26%
25%
Crise do México (1994-95)
Crises da Ásia (1997),
Rússia (1998)
e Brasil (1999)
24%
Apagão e crise
da Argentina
23%
Desaceleração
em 2005
22%
Eleição
de 2002
21%
20%
19%
2005-4
2004-4
2003-4
2002-4
2001-4
2000-4
1999-4
1998-4
1997-4
1996-4
1995-4
1994-4
1993-4
1992-4
18%
Com base nos dados da figura 5 pode-se esperar uma elevação da taxa de investimento
caso a economia entre em um processo de crescimento rápido por mais de dois anos
consecutivos. A seqüência é o fator crucial. Em um primeiro momento, a aceleração da
expansão se traduz em um aumento do grau de utilização de capacidade produtiva na
indústria. Em um segundo momento, a maior utilização da capacidade produtiva leva ao
aumento do investimento, gerando o aumento de oferta necessário para atender a expansão
continuada da demanda no futuro. Se o processo é abortado no seu início a economia não
decola e o país permanece preso à armadilha do baixo crescimento.
Produto Potencial e Crescimento
13
Hiato do produto e inflação
Finalmente, tão importante quanto saber a taxa de crescimento potencial da economia
é saber o quanto a economia se encontra abaixo ou acima de seu potencial. Em outras
palavras, é preciso saber a diferença entre o produto efetivo e o produto potencial, o hiato do
produto, para calcular o potencial de crescimento não inflacionário da economia.
Um exemplo ajuda a explicar este ponto. Suponha que o produto potencial cresça 4%
ao ano e que a economia se encontre 2% abaixo de seu potencial. O hiato entre o produto
potencial e efetivo permite, portanto, que a economia cresça até cerca de 6% no próximo ano
sem atingir seu produto potencial.
Se o conceito de função de produção já é complicado, a mensuração do hiato do
produto é um ponto ainda mais controverso na teoria econômica.7 Tradicionalmente, os
economistas definem o hiato do produto com base nos níveis “naturais” da taxa de
desemprego e da taxa de utilização da capacidade produtiva. Mas o que são estes níveis
naturais? São os níveis de taxa de desemprego e de utilização da capacidade para os quais a
inflação fica constante.
Em outros termos, o raciocínio é circular. Qual é a taxa natural? Aquela que estabiliza
a inflação. E quando a inflação se estabiliza? Quando a taxa está em seu nível natural! A saída
desta armadilha lógica é recorrer à econometria, isto é, estimar as taxas de desemprego e de
utilização para as quais a inflação fica estável.
O problema em recorrer à econometria para resolver o problema é que, como
mencionado anteriormente, no mundo real não existe somente inflação de demanda. Por
exemplo, suponha que a economia esteja operando em seu nível natural, isto é, com uma taxa
de inflação constante. Dado um choque de oferta, digamos, uma desvalorização cambial, a
inflação aumenta e, conseqüentemente, torna-se necessário aumentar o desemprego e reduzir
a utilização da capacidade produtiva para compensar as pressões de custos através de uma
redução da demanda agregada e, desta forma, manter a inflação constante. Logo, o que antes
era um nível de atividade natural passa a ser um nível de atividade aquecido devido às
pressões inflacionárias criadas pelo choque de oferta.
A conclusão final é que, ao utilizarmos uma definição empírica, as taxas naturais de
desemprego e de utilização da capacidade tendem a variar ao sabor dos choques de oferta de
curto prazo experimentados pela economia e, portanto, deixam de ser um guia estável e
confiável para a inflação.8 Diante desta dificuldade, a resposta padrão na literatura sobre o
tema é abandonar a estabilidade da inflação como critério de referência para as taxas naturais
de desemprego e de utilização da capacidade. No seu lugar coloca-se uma hipótese simples e
intuitiva: no longo prazo os níveis de produção efetiva e potencial tendem a convergir e,
portanto, é possível estimar os níveis naturais de qualquer indicador de demanda a partir das
tendências de longo prazo observadas na economia.
Em outras palavras, ainda que não se saiba exatamente qual é o produto potencial hoje,
se sabe que o produto efetivo não pode se desviar indefinidamente do potencial e vice versa.
Logo, a tendência do produto efetivo torna-se boa proxy para o produto potencial.
7
Ver, por exemplo, Stiglitz, J. (1997), “Reflections on the Natural Rate Hypothesis”, Journal of Economic Perspectives 10.
Para maiores detalhes sobre este ponto ver Galbraith, J.K. (1997), “Time to Ditch the NAIRU”, Journal of Economic
Perspectives 11.
8
Produto Potencial e Crescimento
14
O Filtro HP e a Tendência de Crescimento
Existem várias formas de estimar a tendência de uma série temporal, cada uma com
suas vantagens e desvantagens. O chamado filtro HP foi proposto por Hodrick e Prescott
(1997)9 e é um dos métodos mais utilizados em macroeconomia aplicada devido a sua fácil
aplicação e interpretação intuitiva. De um lado, o filtro HP consiste em uma simples operação
linear sobre a série em análise. De outro lado, o filtro HP define a tendência de longo prazo
como uma média ponderada da série em análise, cabendo ao analista definir quão “suave”
deve ser a taxa de variação desta tendência.10
Deixando as tecnicalidades de lado e passando diretamente para o caso brasileiro, a
figura 6 apresenta a evolução do PIB do País e sua tendência de longo prazo com base no
filtro HP.11 Com base nos dados da figura 6, a figura 7 apresenta a relação entre o PIB efetivo
e o PIB potencial do Brasil. Valores superiores a 100 indicam que o PIB efetivo está acima do
potencial e vice-versa.
Figura 6: Valor Efetivo e Tendência de Longo Prazo do PIB Brasileiro
(Série Com Ajuste Sazonal, 1990=100)
150
140
130
120
110
100
Tendência HP
2005-1
2004-1
2003-1
2002-1
2001-1
2000-1
1999-1
1998-1
1997-1
1996-1
1995-1
1994-1
1993-1
1992-1
1991-1
90
PIB
9
Hodrick, R.J. and E.C. Prescott (1997), “Postwar US business cycles: An empirical investigation,” Journal of Money, Credit
and Banking 29, pp-1-16.
10
Em um linguajar mais técnico, o filtro HP é obtido a partir da minimização da soma do quadrado das diferenças entre a
série efetiva e a tendência de longo prazo, sujeita à restrição que a soma do quadrado das segundas diferenças da tendência
deve ser zero. O peso desta última restrição varia de acordo com o analista e a intuição é que, quanto maior este peso, mais a
tendência derivada do filtro HP se aproxima de uma reta. Em constraste, quanto menor o peso atribuído à “suavização” da
tendência, mais esta se aproxima da série original.
11
O parâmetro de suavização foi fixado em 1.600, que é o valor padrão na literatura sobre o tema. Devido ao pequeno
número de observações disponíveis, o valor da tendência de longo prazo não varia muito quando outros valores são utilizados
para suavizar a série.
Produto Potencial e Crescimento
15
Figura 7: Estimativa do Nível de Atividade Econômica no Brasil,
Calculada com Base no Filtro HP Univariado
(Índice=100*Produto Efetivo/Produto Potencial)
106
105
104
103
102
101
100
99
98
97
2004-1
2005-1
2004-1
2005-1
2003-1
2002-1
2001-1
2000-1
1999-1
1998-1
1997-1
1996-1
1995-1
1994-1
1993-1
1992-1
1991-1
96
Figura 8: Estimativa da Taxa de Crescimento Anual de Longo Prazo
do PIB Brasileiro, Calculada com Base em no Filtro HP Univariado
4,0
3,5
3,0
2,5
2,0
Produto Potencial e Crescimento
2003-1
2002-1
2001-1
2000-1
1999-1
1998-1
1997-1
1996-1
1995-1
1994-1
1993-1
1992-1
1991-1
1,5
16
Por definição os desvios entre o PIB efetivo e potencial obtidos pelo filtro HP se
cancelam no longo prazo, já que a tendência de longo prazo é simplesmente uma média móvel
ponderada do PIB efetivo da economia.
Apesar da tendência de longo prazo apresentada na figura 6 ter um comportamento
muito mais suave do que o PIB efetivo da economia, sua taxa de crescimento varia ao longo
do tempo. Para ilustrar este ponto, a figura 8 apresenta a taxa de crescimento do produto
potencial com base na tendência obtida pelo filtro HP. Como é de se esperar de uma média
móvel, o crescimento potencial da economia segue a evolução do crescimento efetivo do PIB.
Em outras palavras, a interpretação estatística é diferente da interpretação econômica: é o
produto potencial que se adequa ao produto efetivo e não o contrário.
No início dos anos 1990, a taxa de crescimento “de longo prazo” da economia
brasileira se acelerou devido à expansâo verificada em 1992-95. Após o pico atingido durante
o plano real, a taxa de crescimento potencial se desacelerou até atingir um vale em 1998.
Desde então há uma recuperação e, ao final da amostra, a taxa de crescimento potencial está
em 2,55% ao ano. Novamente é importante ressaltar que esta medida não deve ser
interpretada como um teto para o crescimento da economia, mas simplesmente como um
indicador do passado recente.
Por se tratarem de uma média móvel, estimativas de crescimento potencial derivadas
do filtro HP tem um problema grave que não pode ser ignorado na formulação da política
macroeconômica: os valores obtidos pelo filtro HP ao final da amostra variam conforme
novas observações são incorporadas.
Ou seja, como a tendência de longo prazo é uma média dos valores observados, o
crescimento potencial da economia ao final da amostra é revisado na medida em que novas
observações são incorporadas. Se o PIB cresce, a tendência é revisada para cima, se o PIB cai,
a tendência é revisada para baixo.
O ponto acima pode ser ilustrado por uma simples comparação entre as tendências de
crescimento da economia em uma mesma data, mas estimadas em diferentes pontos do tempo.
Por exemplo, suponha um observador no final de 2003 tenha que estimar a taxa de
crescimento do produto potencial do Brasil pelo filtro HP. Como os anos imediatamente
anteriores foram de crescimento lento, esse analista naturalmente obterá uma estimativa baixa
conforme apresentado na figura 9.
Produto Potencial e Crescimento
17
Figura 9: Estimativas da Taxa de Crescimento Anual de Longo Prazo
do PIB Brasileiro, Calculadas com Base no Filtro HP Univariado,
Ao Final de 2003 e Ao Final de 2005
4,0
3,5
3,0
2,5
2,0
Estimativa em 2005
2005-1
2004-1
2003-1
2002-1
2001-1
2000-1
1999-1
1998-1
1997-1
1996-1
1995-1
1994-1
1993-1
1992-1
1991-1
1,5
Estimativa em 2003
Agora passemos para um momento como o ano de 2005. Devido ao excepcional
desempenho da economia em 2004, quando o analista realizar o mesmo exercício sua
estimativa de crescimento do produto potencial obtida no final de 2003 se revelará muito
conservadora. O motivo é simples: na medida em que novas observações foram incorporadas,
a tendência de crescimento da economia foi revisada para cima, como também é apresentado
na figura 9.
Note que a revisão da taxa de crescimento potencial apresentada na figura 9 é
substancial. Com base nos dados disponíveis ao final de 2003 o crescimento potencial da
economia brasileira seria de 1,6% ao ano. Já com base nos dados mais recentes, a taxa de
crescimento “potencial” segundo o filtro HP ao final de 2005 era de 2,4% ao ano. Ou seja,
uma diferença de 0,8%!
O mesmo raciocínio vale para a estimativa do nível de atividade da economia, como
apresentado na figura 10. Ao final de 2003, quem se utilizasse do filtro HP estimaria que a
economia brasileira estava 0,3% ACIMA de seu produto potencial. No entanto, com base nos
dados mais atuais, a economia brasileira estaria 1,1% ABAIXO de seu produto potencial no
final de 2003! Neste caso, a estimativa de hiato do produto foi revisada em 1,4% do PIB, ou
seja, uma revisão substancial que evidencia o caráter endógeno de estimativas de hiato do
produto.
Produto Potencial e Crescimento
18
Figura 10: Estimativas do Nível de Atividade Econômica no Brasil,
Calculadas com Base no Filtro HP Univariado, ao Final de 2003 e
ao Final de 2005 (Índice=100*Produto Efetivo/Produto Potencial)
106
104
102
100
98
Estimativa em 2003
2005-2
2004-3
2003-4
2003-1
2002-2
2001-3
2000-4
2000-1
1999-2
1998-3
1997-4
1997-1
1996-2
1995-3
1994-4
1994-1
1993-2
1992-3
1991-4
1991-1
96
Estimativa em 2005
O ponto fundamental do exercício apresentado nas figuras 9 e 10 é que a taxa de
crescimento do produto potencial depende fortemente da evolução esperada da economia no
futuro próximo. Uma estimativa obtida hoje pode se revelar conservadora caso a economia
apresente um rápido crescimento no próximo ano. Por analogia, uma estimativa obtida hoje
pode se revelar otimista caso a economia apresente um lento crescimento no próximo ano.
E qual é implicação desta endogeneidade de estimativas do produto potencial para a
formulação da política monetária? Simplesmente CRUCIAL! Caso o Banco Central não leve
em consideração a sensibilidade de suas estimativas à evolução futura da economia, introduzse um profecia auto-realizável na política monetária.
Para entender esse ponto, imaginemos o caso de um banco central que pratica altas
taxas de juros sob a justificativa de que suas estimativas de produto potencial indicam que a
economia está superaquecida. Ao proceder dessa forma, a autoridade monetária acaba por
desacelerar o crescimento efetivo da economia, o que por sua vez resultará em uma revisão
para baixo das estimativas do produto potencial, confirmando as expectativas iniciais do
banco central! No final das contas o banco central parecerá estar certo não porque suas
previsões estavam corretas, mas por que suas ações fizeram a economia se adequar a suas
previsões.
Produto Potencial e Crescimento
19
O Filtro HP Com Função de Produção
Além de utilizar um método baseado em uma função de produção agregada e outro
método baseado no filtro HP para estimar o produto potencial, o Banco Central do Brasil
também utiliza um método misto que combina estas duas abordagens.12 Para ver como isto
pode ser feito, cabe relembrar que a forma mais usual de estimar as taxas naturais de
desemprego e de utilização da capacidade produtiva consiste simplesmente no cálculo da
tendência de longo prazo destas variáveis. O filtro HP pode, portanto, ser utilizado para
estimar não só o PIB potencial, mas também as taxas naturais de desemprego e de utilização
da capacidade produtiva.
Em princípio nada impede que o filtro HP seja aplicado a mais de uma série ao mesmo
tempo. O método adotado pelo Banco Central consiste justamente em “filtrar” o produto, a
taxa de desemprego e a taxa de utilização da capacidade simultaneamente. Além disso, para
garantir que o resultado da aplicação de tal filtro seja compatível com uma função de
produção, impõe-se, ainda, a condição de que as séries filtradas satisfaçam uma determinada
relação matemática em cada período sob análise.13
Com intuito de ilustrar o método acima, a figura 11 apresenta os resultados da
aplicação de um filtro HP multivariado com pesos idênticos para as três séries envolvidas.14
Não obstante a maior sofisticação matemática deste método, o sentido intuitivo dos resultados
é o mesmo que foi analisado anteriormente: as tendências de longo prazo são uma média
móvel ponderada dos valores efetivos das séries sob análise. Apenas os pesos das médias
móveis foram calculados de uma forma mais sofisticada.
Em comparação com o PIB potencial estimado pelo filtro HP univariado, a
principal diferença do método multivariado é que as variações da tendência de longo
prazo do PIB obtidas pelo método multivariado são menos suaves do que quando apenas o
PIB é filtrado. Apesar disso, os resultados qualitativos são basicamente os mesmos, isto é,
o nível de atividade da economia varia na mesma direção de acordo com as duas
metodologias.
Por fim, cabe ressaltar que a maior sofisticação matemática da combinação do
filtro HP com uma função de produção não elimina o problema mencionado
anteriormente da endogeneidade da estimativa de produto potencial ao final da amostra.
A figura 12 ilustra este ponto apresentando a diferença entre as estimativas do nível de
atividade da economia ao final de 2003 com base nos dados disponíveis naquela época e
atualmente.
12
Ver Banco Central do Brasil, Relatório de Inflação de setembro de 2005, pp.106-107, disponível em:
http://www.bcb.gov.br/htms/relinf/port/2005/09/ri200509b6p.pdf.
13
Por incluir mais de uma variável, é preciso atribuir um peso para cada série na aplicação de tal filtro, ou seja, além do
parâmetro de suavização mencionado anteriormente, também é preciso definir quais serão os pesos do produto, da taxa de
desemprego e da taxa de utilização no resultado final.
14
O parâmetro de suavização foi mantido em 1600 e os resultado foram obtidos de modo a satisfazer uma função de
produção de Cobb-Douglas com retornos constantes de escala, onde a elasticidade de cada fator de produção corresponde a
sua participação na distribuição funcional do valor adicionado a custo de fatores no Brasil.
Produto Potencial e Crescimento
20
Utilização
Tendênca HP
Emprego
150
104
140
103
130
102
120
101
110
100
100
99
2005Q1
2004Q1
2003Q1
2002Q1
2001Q1
2000Q1
1999Q1
1998Q1
1997Q1
1996Q1
1995Q1
1994Q1
1992Q1
2005Q1
0,86
2004Q1
0,70
2003Q1
0,87
2002Q1
0,88
0,72
2001Q1
0,89
0,74
2000Q1
0,76
1999Q1
0,90
1998Q1
0,78
1997Q1
0,91
1996Q1
0,80
1995Q1
0,92
1994Q1
0,82
1993Q1
0,93
1992Q1
0,84
1993Q1
Figura 11: Estimativas do Nível de Atividade na Economia Brasileira e das Tendências de Longo Prazo do
Nível de Utilização da Capacidade Instalada na Indústria, da Taxa de Emprego, e do PIB, Calculadas com
Base no Filtro HP Multivariado, com Função de Produção, ao Final de 2005
(índice=100*Produto Efetivo/Produto Potencial)
Tendênca HP
98
2005Q1
2004Q1
2003Q1
2002Q1
2001Q1
2000Q1
1999Q1
1998Q1
1997Q1
1996Q1
1995Q1
1994Q1
1993Q1
2005Q1
2004Q1
2003Q1
2002Q1
2000Q1
2001Q1
Tendênca HP
97
1992Q1
PIB
1999Q1
1998Q1
1997Q1
1996Q1
1995Q1
1994Q1
1993Q1
1992Q1
90
Assim como na figura 11, a estimativa obtida ao final de 2003 se revela conservadora face ao
desempenho favorável da economia em 2004. Em números, ao final de 2003 a estimativa
indicava que a economia estava 0,3% abaixo de seu potencial. Já com base nos dados atuais, a
estimativa revisada indica que a economia estava 1,4% abaixo de seu potencial ao final de
2003. Em outras palavras, com base nos dados mais atualizados, verifica-se que, ao final de
2003, a economia estava muito mais desaquecida do que ela parecia estar. Caso o Banco
Central siga esta metodologia cegamente, o risco da política monetária impor uma profecia
auto-realizável à economia não é desprezível.
Produto Potencial e Crescimento
21
Figura 12: Estimativas do Nível de Atividade Econômica no Brasil Calculadas
com Base no Filtro HP Multivariado, com Função de Produção, ao Final de
2003 e ao Final de 2005 (Índice=100*Produto Efetivo/Produto Potencial)
104
103
102
101
100
99
98
Estimativa em 2003
2005Q1
2004Q1
2003Q1
2002Q1
2001Q1
2000Q1
1999Q1
1998Q1
1997Q1
1996Q1
1995Q1
1994Q1
1993Q1
1992Q1
97
Estimativa em 2005
Conclusão
Estimativas de produto potencial ou de hiato do produto devem ser utilizadas com
cuidado e pragmatismo na condução da política monetária. Não obstante a maior ou menor
sofisticação matemática de cada método de estimação do produto potencial, no final das
contas todas as metodologias tendem a extrapolar o passado recente para o futuro. No caso
específico do Brasil isto significa projeções muito conservadoras e possivelmente autorealizáveis sobre a capacidade de crescimento da economia. Se o passado foi de lento
crescimento, projeta-se um crescimento lento para o produto potencial e, na medida em que a
política monetária se guie por tal estimativa, ela pode acabar produzindo o baixo crescimento
projetado inicialmente. Em outras palavras, o Banco Central pode acabar “produzindo” o
hiato do produto que justifica sua política monetária.
Saindo do mundo das funções de produção agregadas e dos filtros estatísticos, existem
condições concretas e objetivas para o Brasil sustentar um rápido crescimento econômico nos
próximos anos. Em primeiro lugar, a taxa de desemprego ainda é elevada no país e,
conseqüentemente, isto permite um rápido crescimento do emprego sem gerar pressões
inflacionárias excessivas via aumento do salário real médio da economia.
Segundo, como grande parte da força de trabalho brasileira está empregada em setores
de baixa produtividade do trabalho, a aceleração do crescimento levará a um aumento da taxa
de crescimento da produtividade pela simples transferência de trabalhadores dos setores
“atrasados” para os setores “modernos”. Este efeito composição é obviamente limitado, uma
vez que em algum momento a transferência de trabalhadores se esgota. No entanto, como
atestam os exemplos da China e Índia atualmente, e do próprio Brasil de 1950 a 1980, este
Produto Potencial e Crescimento
22
efeito composição “transitório” pode ser longo o suficiente para permitir, pelo menos, uma
década de rápido crescimento econômico.
Terceiro, pelo lado do capital, a taxa de investimento do Brasil normalmente responde
a uma aceleração do crescimento. Logo, dada uma expansão rápida do PIB por mais de dois
anos consecutivos, é plausível esperar um grande aumento da taxa de investimento, o que por
sua vez aumentará o estoque de capital e a capacidade produtiva da economia. Além disso,
como o aumento do investimento em novas máquinas, equipamentos e estruturas também
vem associado a novas tecnologias, a própria aceleração do crescimento e do investimento
traz consigo um aumento estrutural da produtividade e da eficiência da economia.
Por fim, devido ao atual potencial de crescimento de sua produtividade e de seus
mercados externo e interno, o Brasil tem plenas condições de entrar em um círculo virtuoso
de crescimento não inflacionário nos próximos anos, no qual o aumento de produtividade
permite um aumento dos salários reais sem comprometer a estabilidade da inflação. Como o
maior crescimento da economia também expande a massa salarial e o mercado interno, gerase um novo aumento do investimento e da produtividade, ou seja, o círculo virtuoso de
crescimento é potencializado. No lado externo, o aumento da produtividade e da escala de
produção gerado pelo crescimento também aumenta a competitividade das empresas
brasileiras, incentivando o aumento das exportações.
As atuais condições internas e externas favorecem o rápido crescimento da economia
brasileira por um longo período. Para que esta oportunidade seja aproveitada é preciso, antes
de tudo, não temer o crescimento econômico. Durante o início de uma expansão econômica é
natural que se verifiquem algumas pressões localizadas de inflação devido ao aumento da
utilização da capacidade produtiva da economia. No entanto, são justamente estes sinais de
aquecimento econômico que levam ao aumento do investimento e, conseqüentemente, à
sustentação do crescimento no médio prazo.
Para entrar em um círculo virtuoso de crescimento é necessário, portanto, permitir que
a economia cresça por algum tempo. Isto não significa relaxar o controle da inflação, mas
trabalhar com um horizonte temporal mais amplo do que o ano calendário. Além disso, as
autoridades monetárias devem olhar para inflação não somente como um fenômeno derivado
do comportamento da demanda. Interromper prematuramente uma expansão por medo da
inflação pode acabar prejudicando a própria política de controle inflacionário, pois se a
política monetária não permite um aumento do investimento e da produtividade, o produto
potencial não cresce e qualquer pequena expansão da economia sempre parecerá representar
uma ameaça inflacionária.
Produto Potencial e Crescimento
23
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