Implementação de Filtros Ativos Usando Amplificadores Operacionais de Transcondutância e Capacitores (OTA-C) Autoria: Mário Sarcinelli Filho Edição: Felipe Dalvi Garcia 2008 1 Amplificador de Transcondutância Os Amplificadores Operacionais de Transcondutância (Operational Transconductance Amplifiers - OTAs) são circuitos amplificadores diferenciais com carga ativa, os quais podem ser modelados como uma fonte de corrente controlada por uma tensão diferencial aplicada nas suas duas entradas. Como exemplo, tem-se os circuitos mostrados na Figura 1. (a) Amplificador diferencial com uma carga ativa bipolar. (b) Implementação de (a) em tecnologia CMOS. Figura 1: Amplificadores Operacionais de Transcondutância (OTAs) [3]. Por sua vez, a Figura 2 mostra o modelo correspondente aos circuitos da Figura 1, para o qual vO = gm vd RO e AV = vO = gm RO . vd 1 Figura 2: Modelo equivalente da Figura 1. Outros arranjos diferentes daquele da Figura 1 são possı́veis, como configurações cascode, que têm maior resistência de saı́da e, assim, maior ganho de tensão. Conseqüentemente, vê-se que um OTA nada mais é que o estágio de entrada de um Amplificador Operacional (AmpOp) convencional. Talvez até por essa razão, seu sı́mbolo é o apresentado na Figura 3, junto com o modelo básico (ideal). (a) Sı́mbolo utilizado para o OTA. (b) Modelo ideal do OTA. Figura 3: Amplificador Operacional de Transcondutância (OTA). Observe-se, na Figura 3, que IABC é a corrente de polarização do OTA. Se ela for ajustável, o que é possı́vel, tem-se um OTA com gm ajustável proporcionalmente a tal corrente, o que quer dizer que gm = hIABC , enquanto a corrente de saı́da é dada por IO = gm (V + − V − ). Duas vantagens advindas do uso de OTAs são: • não há a limitação correspondente ao pólo dominante do amplificador operacional convencional, permitindo-se assim o uso dos OTAs em freqüências nas quais não é possı́vel usar o AmpOp convencional; • como o circuito do OTA não tem resistores, é possı́vel integrar OTAs, em grande quantidade, no mesmo chip, principalmente considerando sua versão em CMOS. A desvantagem, porém, é que dada sua grande não linearidade (principalmente usando MOS), só pequenas diferenças de potencial podem ser aplicadas na entrada diferencial do OTA (ver dados dos circuitos integrados LM 13600 e CA 3080, por exemplo). Mais recentemente, entretanto, esse problema foi sanado, usando-se topologias mais elaboradas que aquelas da Figura 1, e é possı́vel realizar OTAs em que vd varre até 95% da tensão de alimentação (VDD + |VSS |), com baixa distorção. 2 2 2.1 Blocos Básicos Implementados com OTAs [1] Amplificador Inversor Para tal circuito, tem-se que vO = IO RL = −gm vI RL . Daı́ vO = −gm RL , vI e também ZO = RL . Note-se que não há realimentação, o que é uma caracterı́stica interessante dos OTAs. Ou seja, amplificadores usando OTAs são circuitos em malha aberta. 2.2 Figura 4: Amplificador inversor. Amplificador Não-Inversor Invertendo-se a entrada onde o sinal é aplicado, obtém-se que vO = gm vI RL . Portanto, vO = gm RL vI e ZO = RL . Figura 5: Amplificador não-inversor. 2.3 Amplificador Inversor Totalmente sem Resistência Aqui, tem-se que IO1 = −gm1 vI , IO2 = −gm2 vO e IO1 = −IO2 . Daı́ vem que −gm1 vI = gm2 vO , resultando em Figura 6: Amplificador inversor sem resistência. 3 gm1 vO =− vI gm2 e ZO = 2.4 1 gm2 . Amplificador Não-Inversor Totalmente sem Resistência Há novamente a inversão da entrada de sinal. Daı́, tem-se que IO1 = gm1 vI , IO2 = −gm2 vO e IO1 = −IO2 . Daı́ vem que gm1 vI = gm2 vO , Figura 7: Amplificador não-inversor sem resistência. e, portanto, gm1 vO = vI gm2 e ZO = 3 3.1 1 gm2 . Outros Blocos Construı́dos com OTAs [1] Resistor Implementado de Forma Ativa (Aterrado) (a) Esquema utilizando OTAs. (b) Resultado equivalente obtido. Figura 8: Resistor aterrado implementado de forma ativa. 4 Para esse circuito, pode-se verificar que IO = −gm vI e IO = −II . Portanto, pode-se verificar que gm vI = II . Assim, como ZIN = vI , II ZIN = 1 . gm obtém-se que 3.2 Resistor Implementado de Forma Ativa (Flutuante) O circuito correspondente é mostrado na Figura 9(a). (a) Esquema utilizando OTAs. (b) Resultado equivalente obtido. Figura 9: Resistor flutuante implementado de forma ativa. Para tal circuito, pode-se verificar que IO1 = gm1 (v2 − v1 ) e IO2 = gm2 (v1 − v2 ). Como II = −IO1 , obtém-se ZIN = v1 − v2 v1 − v2 = , II −gm1 (v2 − v1 ) ou seja, ZIN = 5 1 gm1 . Como as correntes saindo de v1 e voltando a v2 devem ter o mesmo módulo, então, tem-se obrigatoriamente que gm1 = gm2 = gm , e daı́ se obtém que ZIN = 3.3 1 . gm Conversor de Impedância - GIC (Impedância Aterrada) O circuito correspondente é dado na Figura 10. Figura 10: Conversor de impedância aterrado. A partir de tal circuito, obtém-se que IO1 = gm1 vI , IO2 = −gm2 vO = −gm2 ZL IL = −gm2 ZL IO1 , II = −IO2 e II = gm2 ZL gm1 vI . Como ZIN = vI , II então, obtém-se que a impedância ZIN vista a partir da entrada do circuito é ZIN = 1 . gm1 gm2 ZL Assim, se ZL for um capacitor de valor C, tem-se a impedância equivalente ZIN dada na Figura 11. 6 Figura 11: Resultado equivalente obtido. 3.4 Conversor de Impedância - GIC (Impedância Flutuante) Agora o circuito correspondente é apresentado na Figura 12. Figura 12: Conversor de impedância flutuante. De saı́da, tem-se a obrigatoriedade de que |IO2 | = |IO3 |. Logo, é necessário que gm2 = gm3 = gm . Assim sendo, obtém-se que vO = ZL IO1 = ZL gm1 (v1 − v2 ), IO3 = −gm vO , II = −IO3 e II = gm ZL gm1 (v1 − v2 ). Como ZIN = v1 − v2 , II então, obtém-se que ZIN = 1 . gm1 gm2 ZL Daı́, se ZL for um capacitor de valor C, tem-se a impedância equivalente ZIN caracterizada na Figura 13. 7 Figura 13: Resultado equivalente obtido. 3.5 Superindutor Aterrado (ZIN = s2 L) O circuito correspondente ao superindutor aterrado é mostrado na Figura 14. Figura 14: Superindutor aterrado. Para tal circuito, pode-se verificar que IO3 = −gm3 v3 , IO2 , sC2 IO2 = gm2 v2 , IO1 v2 = , sC1 IO1 = gm1 vI , v3 = II = −IO3 e II = gm3 IO2 gm3 gm2 IO1 gm3 gm2 gm1 vI = 2 = . sC2 s C1 C2 s2 C 1 C 2 Como é sabido que ZIN = vI , II então, obtém-se que ZIN 3.6 s2 C 1 C 2 . = gm1 gm2 gm3 FDNR (Aterrado) Basta usar o GIC da Seção 3.3, para o qual ZIN do superindutor da Seção 3.5 substitui ZL . 8 3.7 FDNR (Flutuante) Basta usar o GIC da Seção 3.4, para o qual ZIN do superindutor da Seção 3.5 substitui ZL . 4 Blocos Integradores Realizados com OTAs [1] 4.1 Integrador Ideal Como os OTAs são fontes de corrente, basta conectar um capacitor na sua saı́da para constituir um integrador. O circuito correspondente é apresentado na Figura 15. Para ele, IO = gm (v1 − v2 ) e vO = 1 gm (v1 − v2 ). sC Daı́ se obtém que gm vO = , v1 − v2 sC Figura 15: Integrador ideal. que corresponde ao integrador ideal. 4.2 Integrador com Pólo Fora da Origem (Versão 1) O circuito é o mesmo da Figura 15, acrescentando-se um resistor ativo aterrado em paralelo com o capacitor, como na Figura 16. Para tal circuito, IC = IO1 + IO2 , sendo IO1 = gm1 vI , IO2 = −gm2 vO e Figura 16: Integrador com pólo fora da origem. IC = sCvO . Daı́ vem que sCvO = gm1 vI − gm2 vO e (sC + gm2 )vO = gm1 vI , o que resulta em vO gm1 = , vI gm2 + sC caracterizando um integrador com pólo fora da origem. 9 4.3 Integrador com Pólo Fora da Origem (Versão 2) O circuito correspondente está na Figura 17. Para tal circuito, tem-se que vO = IO gm (vI − vO ) = , sC sC donde sCvO + gm vO = gm vI e, por fim, vO gm = , vI gm + sC caracterizando um integrador com pólo fora da origem. Figura 17: Integrador com pólo fora da origema . a Versão restrita à configuração não-inversora, com uma só entrada. 5 Implementação de Filtros Ativos Usando OTA-C Utilizando os blocos conversores de impedância das Seções 3.3 e 3.4, é viável implementar filtros ativos a partir da substituição dos indutores do filtro passivo. Inclusive, para o caso de indutores flutuantes se usam menos OTAs para realizar o filtro ativo do que AmpOps convencionais. Também é mais viável substituir os indutores flutuantes do que usar o FDNR, que consumiria mais OTAs (ver Seções 3.6 e 3.7). Isso é muito interessante, por exemplo, para realizar filtros passa-baixas elı́pticos, até então não adequados para implementação ativa (usando AmpOps convencionais). Como exemplo, seja o filtro elı́ptico passivo mostrado na Figura 18, cuja implementação ativa baseada na substiuição dos indutores por GICs implementados com OTAs é mostrada nas Figuras 19 e 20. Figura 18: Filtro passa-baixas elı́ptico passivo. 10 Figura 19: Filtro passa-baixas elı́ptico com implementação ativa. (a) Bloco 1. (b) Bloco 2. Figura 20: Esquema interno dos blocos 1 e 2 da Figura 19. Adicionalmente, uma vez que um integrador pode ser realizado de forma muito simples usando OTA e capacitor, inclusive no caso particular de integrador não ideal (com pólo fora da origem), é também muito fácil implementar filtros ativos baseados na estrutura leap-frog usando OTA-C. Em qualquer caso, a implementação de filtros ativos à base de OTA-C tem duas vantagens em relação às estruturas baseadas em AmpOps-RC, que são: • pode-se atingir freqüências bem maiores; • pode-se integrar totalmente o filtro, pois não há resistores, e com isso ocupa-se pequena área no chip. A seguir, é mostrado um exemplo de realização leap-frog usando OTA-C [2]. 11 Figura 21: Exemplo de filtro Chebyshev ou Butterworth de ordem 3. As equações para a realização leap-frog do circuito da Figura 21 são: I1 = 1 (E1 − E2 ) =⇒ V1 = f1 (s)(E1 − E2 ), Z1 E2 = Z2 (I1 − I3 ) =⇒ E2 = f2 (s)(V1 − V3 ) e I3 = 1 E2 =⇒ V3 = f3 (s)(E2 − 0). Z3 Em tais equações tem-se os integradores 1 , R1 + sL1 1 f2 (s) = sC2 f1 (s) = e f3 (s) = 1 . R2 + sL3 Observe-se aqui que o OTA é adequado para fazer integradores com duas entradas v1 e v2 , sendo (v1 − v2 ) a tensão integrada (ver Seção 4.1). Dessa forma, pode-se implementar a rede leap-frog exatamente como indicado no diagrama de blocos da Figura 22, ou seja, a subtração já está implı́cita no integrador, com exceção daquele da Seção 4.3, onde só é possı́vel usar uma entrada. Figura 22: Diagrama de blocos da rede leap-frog do circuito da Figura 18. A realização da rede leap-frog correspondente a tal diagrama de blocos é, portanto, a que está apresentada na Figura 23. 12 Figura 23: Realização ativa do filtro da Figura 21. Para o filtro da Figura 23, tem-se que: • Integrador 1: gm1 gm2 + sL1 gm1 = 1S f1 (s) = gm2 = R1 S(R1 = 1Ω =⇒ gm2 = 1S). • Integrador 2: gm3 sC2 = 1S. f2 (s) = gm3 • Integrador 3: f3 (s) = gm4 . gm4 + sL3 Se R2 = 1Ω, então gm4 = 1S. Se R2 6= 1Ω, pode ser mais interessante usar o integrador 3 com a mesma configuração do integrador 1, e então ter-se-ia que gm4 , gm5 + sL3 gm4 = 1S f3 (s) = e gm5 = R2 S. Um detalhe significativo é que não é possı́vel usar o integrador 1 na mesma configuração do integrador 3 (o da entrada da rede e o da carga), pois o integrador da entrada da rede recebe uma realimentação de outro integrador, que deve entrar no seu terminal negativo, o que não pode ser feito no caso da configuração usada no último integrador. Este tem tal configuração porque não recebe qualquer realimentação que não seja da sua própria saı́da. Com isso, o número mı́nimo de OTAs que pode ser utilizado é o número de integradores mais um (que é o resistor ativo aterrado usado no integrador da entrada da rede). 13 Referências [1] R. L. Geiger and E. Sánchez-Sinencio, “Active Filter Design Using Operational Transconductance Amplifiers: A Tutorial,” IEEE Circuits and Devices Magazine, vol. 1, pp. 20–32, Março 1985. [2] A. P. Nedungadi and R. L. Geiger, “High-Frequency Voltage-Controlled Continuous-Time Lowpass Filter Using Linearised CMOS Integrators,” Eletronic Letters, vol. 22, no. 14, pp. 729–731, Julho 1986. [3] A. S. Sedra and K. C. Smith, Microelectronic Circuits, 4th ed. 14 Makron Books, 2000.