O mundo demonstra que ajuste fiscal só profunda a crise

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Brasil247, 9 de março de 2017
Esther Dweck: O mundo demonstra que ajuste
fiscal só profunda a crise
Economista e professora do Instituto de Economia da UFRJ Esther Dweck
mostra que a política econômica chefiada por Henrique Meirelles não tem
outro resultado senão aprofundar ainda mais a recessão no Brasil, que já é
a pior da história; "[Meirelles] chegou a afirmar que o crescimento está
sendo retomado. Eu não sei em qual País, porque os últimos números
divulgados pelo IBGE mostram que, na margem, nos últimos dois
trimestres de 2016, a economia voltou a piorar. O carryover para o
crescimento de 2017, que é o crescimento da economia se esta ficar onde
está, é de -1,1%. Ou seja, se nada acontecer, teríamos uma terceira queda
do PIB. Algo visto apenas em países com grandes catástrofes"
Por: Esther Dweck, na Carta Maior
O governo Temer tem se aproveitado de diversas medidas dos
governos Lula e Dilma. A transposição do Rio São Francisco é talvez o
exemplo mais emblemático. Outro exemplo é o "Conselhão", criado por Lula
em 2003, para dialogar com a Sociedade Brasileira, com academia,
trabalhadores e empresários, foi reconfigurado pelo governo Temer.
Ontem, houve uma apresentação do Ministro Meirelles para o "Conselhão".
A apresentação poderia se chamar como destruir um projeto de
desenvolvimento inclusivo, mas segundo ele é a pauta para retomada do
crescimento. Os pontos apresentados por ele deixariam os ideólogos do
Consenso de Washington com inveja: como não pensaram em tanta maldade
junta.
O neoliberalismo começou em 1973, com um golpe de Estado no
Chile. No Brasil, ele entrou por via eleitoral e, justamente por isso, foi mais
tímido do que em outros países. A memória do regime militar e toda a agenda
defendida na Constituição Cidadã ainda estavam muito frescos durante os
Governos Collor e FHC para que fossem destruídos os pilares básicos da
Constituição. Não faltaram tentativas, mas os instrumentos não foram
destruídos.
Com a vitória de um projeto inclusivo nas urnas, em 2002, os
instrumentos foram utilizados para promover, pela primeira vez na história
do Brasil, um projeto de crescimento inclusivo. Podem existir várias críticas
e muitos podem achar que faltou aprofundar em algumas áreas chave. Mas é
difícil não reconhecer todos os avanços dos 13 anos que terminaram com
mais um golpe.
Ontem, foi apresentada a destruição desses mecanismos pelo Sr. Meirelles.
Em primeiro lugar, ele propõe o ajuste fiscal permanente como
condição necessária para retomada do crescimento, tendo como os elementos
centrais dois pontos. A EC95/2016 (teto declinante dos gastos), que
promoveu uma redução dos mínimos constitucionais de saúde e educação e
irá impor diversos cortes nas despesas sociais. E o segundo ponto é a
Reforma da previdência, uma reforma que irá excluir diversos brasileiros do
sistema e que destrói o sistema como o pilar de distribuição de renda e da
proteção social no Brasil.
Eu não sei em que mundo eles vivem, mas há um movimento mundial para
demonstrar que ajuste fiscal só aprofunda a crise econômica.
Na apresentação, ele chegou a afirmar que o crescimento está sendo
retomado. Eu não sei em qual País, porque os últimos números divulgados
pelo IBGE mostram que, na margem, nos últimos dois trimestres de 2016, a
economia voltou a piorar. O carryover para o crescimento de 2017, que é o
crescimento da economia se esta ficar onde está, é de -1,1%. Ou seja, se nada
acontecer, teríamos uma terceira queda do PIB. Algo visto apenas em países
com grandes catástrofes.
Depois, ele apresentou a tal Agenda de Produtividade e Crescimento
no Longo Prazo. O início é uma agenda de desburocratização, sem impactos
concretos e com alguma penalidade aos consumidores. O mais interessante
é que apresentou reformas relacionadas ao crédito, sem fazer o básico, que
era aumentar o crédito dos bancos públicos. O BNDES tem acumulado caixa
ao invés de contribuir para retomada do crescimento. Os números são de
mais de R$100 bilhões em caixa, fora a devolução antecipada de R$ 100
bilhões ao Tesouro.
Em seguida, vem o receituário de abertura comercial, com destaque
para a liberação da venda terra para estrangeiros. Consolidam assim a agenda
entreguista imposta desde maio de 2016.
Mas a cereja do bolo é o slide onde apresenta as "Várias Reformas
Liberalizantes", como se as anteriores não fossem ingredientes típicos das
agendas mais fundamentalistas do liberalismo econômico.
Os pontos principais dessas reformas liberalizantes são três. O
primeiro é a destruição da legislação trabalhista, com terceirização geral e
irrestrita, a prevalência do negociado versus o legislado e a flexibilização da
jornada. O mais interessante é que o Brasil tinha, em 2014, a menor taxa de
desemprego da história, sem que tivessem sido necessárias quaisquer dessas
mudanças.
As outras duas medidas demonstram a falta total de compromisso com
o desenvolvimento do País. A proposta é a reversão de medidas essenciais
para garantir que recursos públicos ou recursos naturais do País sejam
utilizados para gerar desenvolvimento tecnológico e emprego industrial no
Brasil. Fim da margem de preferência nas compras governamentais e a
"reforma" do conteúdo nacional do setor de Óleo e Gás, com a proposta de
"horizontalização" e globalização dos requisitos de conteúdo nacional, que
na prática elimina a exigência.
Mesmo que por uma questão estatística e pelos atuais estabilizadores
automáticos a economia pare de cair e até encontre um crescimento positivo,
se todas as propostas forem efetivamente implementadas, será o fim de um
modelo de crescimento inclusivo e para todos.
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