IMPASSES NO REINGRESSO A ESCOLA DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES SOBREVIVENTES DO CÂNCER Ana Beatriz Bernat Nina Gomes Costa PANORAMA DA CLÍNICA EM ONCOLOGIA PEDIÁTRICA • O adoecimento por câncer faz surgir inúmeras questões no âmbito psíquico. O recorte a que se propõe este trabalho circunscreve a questão do câncer infanto-juvenil, o tratamento oncológico e seu impacto sobre a vontade de saber destes pacientes. • O Câncer na Infância e Juventude corresponde a tumores que apresentam menores períodos de latência e, em geral, crescem rapidamente e são mais invasivos. (INCA, 2012) PANORAMA DA CLÍNICA EM ONCOLOGIA PEDIÁTRICA • A etiologia é pouco conhecida. • O tratamento: de acordo com o tipo histológico, a localização e o estadiamento do tumor, mas pode incluir a abordagem cirúrgica, por vezes mutiladora, a quimioterapia e a radioterapia. • Transportando a magnitude destas questões para o âmbito da investigação psicanalítica, identificamos o câncer como uma experiência potencialmente devastadora, que remete ao estado de desamparo primordial do ser humano, caracterizado por um excesso pulsional¹ – estado de tensão, desconforto – que não é passível de inscrição simbólica, acometendo o sujeito como uma espécie de desamparo psíquico². • Dissimetria na relação equipe assistente – paciente e família ¹ (Freud, 1914) ² (Gondar, 1993) ESPECIFICIDADES DA CLIENTELA INFANTOJUVENIL • Atualmente temos uma parcela de 70% de crianças e adolescentes que sobrevivem ao tratamento oncológico; • Qualidade da sobrevida dessa população; • Retorno à escola; • Estratégia intersetorial Saúde – Educação para acolher essa clientela em sua especificidade; A VONTADE DE SABER • Trata-se de um saber que a criança tece em parceria com o Outro e que procura responder a como a pulsão sexual afeta, organiza e constitui seu corpo. • É preciso apostar no saber que a criança tece, para a partir de uma parceria atenta a essa construção favorecer o trabalho de simbolização do excesso pulsional em jogo. AS CONTRIBUIÇÕES DE FREUD • A vontade de saber que desde muito cedo habita a vida das crianças, tem relação intrínseca com uma “sede de saber” sobre o sexual. • Em Os Três Ensaios sobre a Teoria da Sexualidade (1905), Freud assinala que a sexualidade não coincide exclusivamente com os órgãos genitais e que por esta razão, está colocada para o sujeito desde seu nascimento, com a ressalva de que neste período da vida aparece sob a forma do autoerotismo. • Desde tenra idade a criança encontra-se às voltas com o enigma do sexual, o que coloca em movimento seu interesse intelectual, seu desejo de conhecimento. HIPÓTESE DE UM ESTUDO EM TRAMITAÇÃO • A construção das teorias sexuais infantis, que colocam em movimento a vontade de saber, encontra obstáculos e dificuldades diante da irrupção do câncer na vida destas crianças e adolescentes. • A morte, as perdas, a invasão do corpo por algo potencialmente destruidor – a doença e o próprio tratamento – são dados reais que se interpõem na vida destes sujeitos, de modo a ocasionar o que chamamos de um “curto-circuito” das construções simbólicas e imaginárias em que se ancoravam. Colocando em xeque a vontade de conhecer. HIPÓTESE DE UM ESTUDO EM TRAMITAÇÃO • O trabalho clínico orientado pela psicanálise levou-nos a circunscrever duas posições extremas de crianças e adolescentes em relação a seu tratamento. Tais posições admitem variações intermediárias entre si: a de curioso/pesquisador e a de débil • O sujeito pode mostrar-se mais ativo ou mais apassivado diante do real da doença oncológica, tais posições têm influência não só no enfrentamento da doença, como também na qualidade de vida que terão pós-tratamento. UMA PARCERIA ADVERTIDA • A criança ou o adolescente submetido a tratamento oncológico precisa ao longo do mesmo encontrar um interlocutor que a partir do manejo de sua angústia possa tornar esse tratamento médico menos devastador para o sujeito a ele submetido. • Faz-se necessário “singularizar o cuidado” de cada paciente, marcando os protocolos e procedimentos hospitalares com os nomes e pistas que nossos pacientes nos dão a cada dia, a partir do saber que têm e constroem sobre sua doença, para que esse tratamento possa fazer mais sentido para eles, tornando-se consequentemente menos invasivo. UM SABER SINGULAR CONSTRUÍDO NA TRANSFERÊNCIA • A função do brincar; • Uma aposta inédita; • Uma parceria que pode fazer a diferença; • Tornar o tratamento singular a cada paciente a partir deste saber em construção transferencial; ALGUMAS CONSIDERAÇÕES • A experiência clínica nos leva a destacar alguns impasses que se repetem para estas crianças: 1 – Sérias dificuldades de aprendizagem que parecem decorrentes, dentre outras causas, de uma posição débil de horror ao saber; 2 – Incômodo em ser tratado como especial e não poder responder ao esperado pelos colegas de escola e professores; 3 – Urgência dos pais em proteger essas crianças e trocá-las de escola, como se o problema fosse da instituição escolar; 4 – Precipitação das escolas em enquadrar essas crianças na estranheza que elas presentificam para o entorno social; 5 – Ser tratado como uma exceção: benefícios e malefícios INTERSETORIALIDADE • Precisamos fazer laços de trabalho com outros discursos como o da educação para tornar a instituição escolar mais permeável a singularidade de nossas crianças e adolescentes sem reduzi-los necessariamente à condição de “alunos de inclusão”; • Uma estratégia Intersetorial em construção: Fórum Mensal de Discussão de Casos Clínico acerca dos Impasses no retorno de nossos pacientes a escola, de modo a favorecer a transmissão de um saber que possa tornar a educação mais permeável a singularidade suscitada por cada criança e adolescente sobrevivente do câncer. UM TRABALHO QUE SE AMPLIA CASO A CASO • Iniciamos a escuta destas crianças e adolescentes ao longo de seu tratamento, em internações e no ambulatório, contamos com a parceria da classe hospitalar para construir pontes extra-muros; acolhemos a escola de referência em seus impasses. • Procuramos construir recursos lúdicos para ir à escola da criança e tratar a questão do câncer infanto-juvenil em um semelhante – Desenho. • As crianças seguem em acompanhamento singularizado e nós seguimos seu percurso tecendo laços intersetoriais a partir de sua singularidade. OBRIGADA!