Vitória da Conquista, Bahia, 13 a 17 de fevereiro de 2017 XV

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POLÍTICA INDUSTRIAL E INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRA:
UMA ANÁLISE DO PERÍODO 2003-2010
Modalidade: Artigo Completo
GT 2: Economia Internacional, Economia Brasileira, Economia Regional e Baiana
Gesner Brehmer de Araújo Silva1
RESUMO: Nos últimos anos, tem se novamente discutido a importância do setor industrial
como motor do desenvolvimento econômico do país e de como o governo pode através da
política industrial, promover um maior dinamismo deste setor. Este artigo analisa a política
industrial no período 2003-2010, nos dois mandatos do governo Luiz Inácio Lula da Silva
como uma nova tentativa de retomar a pujança industrial. Mais precisamente, foca-se em duas
políticas consideradas chave no período, a PITCE (Política Industrial, Tecnológica e de
Comércio Exterior) e a PDP (Política de Desenvolvimento Produtivo), formuladas e lançadas
mais precisamente em 2004 e 2008 respectivamente, e suas consequências para a economia
brasileira.
Palavras-chave: Política Industrial, Setor Industrial, Industrialização.
ABSTRACT: In recent years, it has again discussed the importance of the industrial sector as
an engine of economic development of the country and how the government can through
industrial policy, promoting greater dynamism of this sector. This article analyzes the
industrial policy in the period 2003-2010, the two terms of government Luiz Inácio Lula da
Silva as a new attempt to resume industrial strength. More precisely, it focuses on two
considered key policies in the period, PITCE (Industrial, Technological and Foreign Trade)
and PDP (Productive Development Policy), formulated and launched more precisely in 2004
and 2008 respectively, and its consequences for the Brazilian economy.
Keywords: Industrial, Industrial Sector, Industrialization.
1
Gesner Brehmer é graduando em Economia pela UEFS (Universidade Estadual de Feira de Santana). Foi
bolsista do Programa de Iniciação Científica (FABESP) entre os anos de 2013 e 2014. Foi bolsista do PROBICUEFS(Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica) entre os anos de 2014 e 2015. É atualmente
monitor da disciplina Economia do Setor Público na Universidade Estadual de Feira de Santana.E-mail:
[email protected].
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1. INTRODUÇÃO
O setor industrial é um dos setores cruciais para o desenvolvimento da economia como
um todo, visto seu poder de encadeamento intersetorial que permite a criação de uma cadeia
produtiva que dinamiza a economia.
No Brasil, o setor industrial toma à dianteira como maior gerador de riqueza do setor
agrário a partir da Primeira Guerra Mundial, sobretudo na década de 20, onde o Brasil sofreu
um grande incentivo no setor manufatureiro interno para suprir o mercado externo, como as
indústrias de cimento, aço, papel e ferro. Porém, o panorama para o processo de
industrialização do Brasil começa a mudar no final do século XIX e início do século XX, em
grande parte como observa Peinado et al. (2007), pelas bases que a cafeicultura lançou para a
industrialização: ingresso de capital, incremento de transporte e mão de obra.
A atividade cafeeira permitiu a acumulação do capital para investimentos em diversas
atividades, dentre as quais indústrias e bancos, capazes de financiar a sua operação e a
instalação de ferrovias, sobretudo na região de São Paulo centro da produção cafeeira, para
escoar a produção, frutos da iniciativa privada dos cafeicultores, para a integração com as
várias regiões brasileiras.
No período seguinte, até a crise de 1929, a cafeicultura continuou forte como a
principal atividade econômica brasileira, até que a crise econômica fez com que o preço do
café ‘despencasse’ e a demanda pelo café brasileiro quase que desaparecesse. Neste contexto,
Getúlio Vargas assume a presidência da República e implanta uma estratégia para o
desenvolvimento da economia com foco no mercado interno para combater a dependência da
economia brasileira ao mercado internacional.
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No período de 1930 a 1952, a taxa média de crescimento da indústria brasileira se
manteve entre 8 e 10%, enquanto a taxa média de crescimento do setor agrícola se restringiu a
meros 2% ao ano. A escassez de produtos, por conta da primeira e segunda guerra mundial,
favoreceu a indústria e o comércio interno. A estrutura industrial se diversificou, englobando
novos setores como o metalúrgico, químico, farmacêutico e a indústria de base. A produção
manufatureira que era de 21% do PIB em 1920, saltou para 43%, em 1939. No início da
década de 1940, foram criadas indústrias de base como a CSN (Companhia Siderúrgica
Nacional), a CVRD (Companhia Vale do Rio Doce) e a FNM (Fábrica Nacional de Motores)
(Catelli, 2004; Luca, 2001; Silva, 1981). Com isso, conclui-se que o foco da Era Vargas era a
industrialização de base, com ênfase na siderurgia, na energia, transportes, extração de
minérios, motores entre outros.
Na década de 50, segundo Suzigan (1989), há um maior enfoque para a
industrialização por parte dos governos brasileiros, fruto de um maior planejamento
macroeconômico estabelecendo metas para outros segmentos não contemplados na década
passada, como a indústria pesada, indústria de bens de capital e substituição de importações
de insumos básicos.
Os anos 60 são marcados por profundas transformações no processo de
industrialização brasileiro e, por consequência, na utilização da política industrial por parte
dos governos do período, sobretudo os militares, como por exemplo, o PAEG Programa de
Ação Econômica do Governo) de 1964, que dentre outros objetivos, a maior utilização da
capacidade industrial ociosa através de um aumento dos investimentos e da concessão de
crédito para o fomento industrial.
Na década de 70, a indústria continuou a ser estimulada pelos governos brasileiros
como setor crucial para o desenvolvimento nacional através de políticas industriais como o I e
o II PND (Plano Nacional de Desenvolvimento) que tinham dentre seus objetivos, ampliar a
base do sistema industrial e aumentar o grau de inserção da economia, através da elevação de
investimentos, sobretudo no setor produtor de meios de produção, principalmente a indústria
siderúrgica.
Nos anos 80 e 90, a política industrial foi esquecida pelos governos brasileiros, fruto
do foco nas políticas de estabilização da alta inflação da década que provocou mudanças no
processo produtivo. O debate só seria retomado nos primeiros anos do século XXI, onde
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segundo Cano e Silva (2004), a escolha por um novo modelo de desenvolvimento para a
economia brasileira reforçava a necessidade de coordenação e articulação de uma política
industrial efetiva.
Neste sentido, os dois mandatos do governo Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010)
ficaram marcados além da retomada do crescimento econômico, pela promoção de políticas
industriais, segundo Almeida (2011) de médio/longo prazo, que possam dar suporte a
modificações estruturais na economia e na sociedade, criando assim um elo entre política
industrial, crescimento econômico e aumento da produtividade industrial.
O objetivo chave deste artigo é estudar a política industrial utilizada nos dois
mandatos do governo Lula, tendo como base os dois maiores programas do período em
questão, o PITCE (Política Industrial de Tecnologia e Comércio Exterior) e o PDP (Plano de
Desenvolvimento Produtivo) de 2008 e captar o efeito dessas ações na retomada do
desenvolvimento industrial da economia brasileira.
O artigo se divide em duas seções além dos antecedentes e das conclusões. Na seção 2
apresentaremos uma breve revisão teórica acerca do que é política industrial e suas
classificações. A seção 3 apresenta as políticas industriais do período em questão fazendo
análise destas através de dados oficiais e dos métodos quantitativos.
2. POLÍTICA INDUSTRIAL: CONCEITOS E CLASSIFICAÇÕES
Antes de partirmos para entender os padrões aplicados no Brasil em termos de política
industrial no período do governo Lula, é necessário conceituar de forma teórica o termo
“política industrial” e entender as implicações do mesmo e suas funções dentro do processo
de desenvolvimento econômico.
O IEDI (2002)2define política industrial como sendo
Um conjunto coordenado de ações, envolvendo setor público e setor privado,
visando ampliar a competitividade da indústria. O objetivo final é
impulsionar o crescimento econômico e o emprego do setor industrial.
Assim, a política industrial é um componente de uma estratégia de
fortalecimento da indústria e parte indispensável de uma política de
desenvolvimento. A promoção da competitividade constitui o foco da
2
Instituto de Estudos do Desenvolvimento Industrial.
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política industrial praticada atualmente no mundo desenvolvido e em países
que buscam promover seu desenvolvimento.3
Entretanto, é relevante destacar alguns pontos a respeito do termo “política industrial”
em sua concepção. O primeiro ponto a ser levantado é que a política industrial não pode ser
considerada como um “fim em si mesmo”, mas sim como um componente essencial a uma
política de promoção do desenvolvimento da economia, visto que a aplicação desta no sentido
de promover a competitividade, a concorrência, e a atualização tecnológica que resultará em
aumento da produtividade, não sendo seus objetivos, criar e disseminar empresas e setores
privilegiados que possam por ventura, sobreviver à sombra de subsídios onerosos aos cofres
públicos, por serem altamente ineficientes.
Um segundo ponto importante nos diz que a política e por ventura, o desenvolvimento
industrial não são incompatíveis com a estabilidade inflacionária e o controle das contas
públicas dos países que desfrutaram de grande crescimento industrial e são praticantes de
ativas políticas industriais são provas dessa afirmação.
Kupfer (2003) define a política industrial como todo instrumento capaz de acelerar os
processos de transformação produtiva que as forças do mercado são incapazes ou lentas em
disparar os processos que essas mesmas são incapazes de articular. Para o autor, a política
industrial não dever servir meramente para que se alcance crescimento do nível do produto,
mas que provoque mudanças estruturais em sua matriz industrial e econômica, para que se
possa promover em larga escala, o desenvolvimento socioeconômico.
Uma definição mais restritiva é dada por Ito (1993) ao afirmar que política industrial
compreende todas as medidas que dão uma orientação econômica através da intervenção na
alocação de recursos ou na estrutura industrial de determinada indústria. Com isso, não cabe
ao governo destinar recursos que possam administrar outras demandas ou setores específicos,
cabendo apenas o incentivo a determinados setores e empresas industriais, aqueles
considerados “especiais” através de subvenções diretas, isenção de impostos, limitação de
importação ou apoio às exportações até o financiamento de atividades de pesquisa e
desenvolvimento.
Através dessas definições, percebemos que na literatura disponível não há qualquer
consenso em torno do conceito de “política industrial”. Um motivo para isso é que grande
3
Ver. A Política de Desenvolvimento Industrial O Que É e o Que Representa Para o Brasil. IEDI(2002).
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parte dos autores envolvidos com esta temática simplesmente descrevem e discutem possíveis
medidas de política industrial, sem oferecer uma definição estruturada do termo e sem contar
com critérios claros para estabelecer tal definição (SANTOS 2002).
Porém, mesmos através dessas controvérsias em torno do conceito, Almeida (2013)
estabeleceu uma classificação acerca da aplicação da política industrial ao redor do mundo, o
que se convencionou chamar de “velha” e “nova” política industrial.
2.1. A velha política industrial
As políticas industriais podem ser interpretadas como segundo Krugman (1989) como
um esforço por parte do setor público em promover o incentivo a setores específicos da
indústria, direcionando assim sua estratégia na promoção do crescimento e desenvolvimento
econômico.
Em consenso com essa abordagem, Suzigan e Furtado (2008) definem política
industrial como sendo aquela capaz de aumentar a competitividade e a renda de setores
industriais específicos alterando a sua estrutura industrial. A isso também podemos associar o
papel da política industrial como aquela que será capaz de provocar um aumento da geração
de divisas, do emprego e da difusão tecnológica.
Para Amsden (1989), a política industrial deve ser voltada para a formação de grandes
conglomerados empresariais destinados a diversificação de investimentos para a criação de
vantagens comparativas em setores intensivos de capital (siderurgia, metalurgia, petroquímica
etc.), criando grandes economias de escala. Para promover este processo, seria papel do
Estado conceder crédito subsidiado a esses setores, além de uma proteção temporária do
mercado e incentivos a P&D (Pesquisa e Desenvolvimento) e controle sobre o IDE
(Investimento Direto Estrangeiro).
Campanário e Silva (2004) resumem de forma expressiva essa definição de política
industrial como:
A criação, implementação, coordenação e controle estratégico de instrumentos
destinados a ampliar a capacidade produtiva e comercial da indústria, a fim de
garantir condições concorrenciais sustentáveis nos mercados interno e externo. A
política industrial tem como objeto de intervenção atividades econômicas
específicas ou setoriais e em temas que diretamente afetam a sua competitividade e
função social – geração de emprego, qualidade de produtos e processos, incentivos
fiscais e financeiros, suprimento energético e de transporte, infra-estrutura
tecnológica e meio ambiente (CAMPANARIO e SILVA, 2004, p. 14).
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Percebemos que esta corrente de autores toca em pontos em comum a cerca de suas
abordagens de política industrial: presença do setor público (Estado) na promoção dos
investimentos industriais para o crescimento econômico, e a eleição de setores, tecnologias e
até mesmo empresas específicas a serem estimulados. São as políticas industriais
denominadas verticais (aquelas que privilegiam deliberadamente indústrias ou setores
específicos) sob quatro principais argumentos: 1. Indústria com maior valor agregado; 2.
Indústrias com grande poder de encadeamento; 3. Indústrias com grande dinamismo
potencial; 4. “Indústrias nascentes ou com retornos crescentes de escala”.
Porém este modelo de política industrial apresenta falhas, como a alta concentração
setorial e de investimentos em setores que podem não ser produtivos, não promovendo
aumento da produção industrial e tendo um custo oneroso ao Estado.
Outra crítica a ser feita demanda que, nos países que promoveram este tipo de política
industrial são que os grupos empresariais dos setores intensivos de capital não eram
proprietários de grandes tecnologias modernas, e, portanto, as vantagens comparativas criadas
por essa política viriam através do planejamento logístico das empresas.
Almeida (2013) redefine o conceito de política industrial vertical para o de “velha”
política industrial e ainda destaca que esse modelo faz com que os países fiquem presos a um
modelo de compra de tecnologias desde o início do processo de industrialização, tendo
perdido a vantagem de first moverem setores industriais importantes.
2.2. A “nova” política industrial
Outra ênfase de política industrial além daquelas consideradas como a “velha” política
industrial, em que era baseada no apoio à diversificação dos grandes grupos empresariais,
vem se destacando no início do século XXI, a política industrial relacionada ao processo de
externalidades, coordenação e descoberta.
Rodrik (2003) talvez seja o principal expoente dessa corrente em seu artigo “Industrial
policy for twenty-first century”, onde irá defender essa “nova política industrial, partindo do
pressuposto que, mesmo em um país com bons fundamentos macroeconômicos, os
empresários industriais não sabem ou não saberiam em que poderiam investir para a produção
de forma economicamente viável do mercado doméstico.
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Essa incerteza acerca do que produzir para o mercado interno, e do tempo que levaria
todo esse processo de descoberta para saber se tal atividade ou produto industrial pode ser
produzido de forma viável e eficiente gera para Hausmann e Rodrik (2007), um custo
elevadíssimo para quem ousar investir nas atividades industriais (os empresários), e para a
sociedade (a possibilidade ou não de retorno dessa descoberta), gerando um caso clássico de
externalidade de informação, uma vez que , não há como saber anteriormente qual atividade
será lucrativa, mas, uma vez que os empresários descubram, os outros empresários industriais
seguiriam o mesmo investimento.
Há outro problema ainda decorrente dessa incerteza acerca do que produzir, que é
justamente a falta de coordenação dos investimentos industriais, onde o empresário não sabe
de forma antecipada se a sua decisão de investimento será acompanhada por seus pares, o que
pode levar a que o seu projeto tenha um retorno individual, mas que seria lucrativo se os
investimentos complementares (nesse caso, dos outros empresários que acompanhariam o
primeiro investimento) fossem feitos, ocorrendo neste caso, o que Almeida (2013) chama de
problema de ação coletiva para agentes individuais.
Por fim, para resolver esse problema da falta de coordenação e das externalidades nela
existentes, torna-se primordial a atuação do Estado na provisão de bens públicos para grupos
empresariais, não em medidas empresariais para grandes empresas individuais, caracterizando
assim, o que Rodrik (2003) e Sabel (2010) irão chamar de “política industrial para o século
XXI”.
2.3. Diferenças e semelhanças entre a velha e a nova política industrial
Tanto o modelo de velha política industrial, proposto por Amsden (1989), quanto o
modelo da nova política industrial, proposto por Rodrik (2003), apresentam, em algumas de
suas premissas, semelhanças e, em outras, bastantes diferenças.
Uma primeira semelhança a ser notada é que em ambas para serem bem-sucedidas,
irão exigir que os industriais tenham metas individuais monitoráveis, para que segundo
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Almeida (2013), o mecanismo da reciprocidade funcione. Porém, na primeira semelhança,
também já se encontra a primeira diferença.
Enquanto na velha política industrial, a definição dessas metas e o seu monitoramento
estavam voltados para a promoção de determinados setores, visando gerar um concentrado
setor industrial, a nova política não visa de forma direta ao desenvolvimento de um setor
especifico, e sim, estimular o processo de descoberta pelos próprios empresários. Talvez a
frase sintetizante da proposta dessa nova política, se resuma na frase de Rodrik (2003): “O
desafio do governo em termos de política industrial não é o de escolher os vencedores, mas
saber identificar quando há perdedores”.
Em relação aos incentivos por parte do setor público, as duas abordagens também
muito se aproximam, ao tratarem destes se destinando de forma significativa as novas
atividades, fazendo com que a sociedade possa ter um retorno social maior do que o retorno
individual do projeto para o empresário, sendo esta diferença, a condição essencial para o
apoio do setor público.
Porém, já na abordagem da origem do capital para incentivo das políticas industriais, a
abordagem difere-se entre si. Enquanto a nova política não discrimina as origens do capital e
os trata apenas como “gargalos específicos” que impedem o crescimento da produtividade, os
teóricos da velha, tem sobretudo, uma importante preocupação com a origem do capital e seus
desafios de não apenas incentivar o desenvolvimento de setores industriais intensivos em
capital, mas também, assegurar por meio de mecanismos de proteção, que os empresários
domésticos controlem esses novos setores.
3. A POLÍTICA INDUSTRIAL NO PERÍODO 2003-2010
O objetivo primordial desta seção é analisar as ações em termos de política industrial
no período 2003-2010 e seus desdobramentos no desenvolvimento industrial brasileiro,
através de duas ações importantes no período, o PITCE (Política Industrial, Tecnológica e de
Comércio Exterior) em 2004 e o PDP (Plano de Desenvolvimento Produtivo) em 2008, ambas
operacionalizadas pelo BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social).
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Nos próximos parágrafos, vamos entender e esmiuçar esses dois momentos e entender sua
importância na política industrial recente.
O PITCE (consubstanciada em um conjunto de 57 medidas distribuídas em 11
programas de política) estabelecia três linhas de ação para a promoção do desenvolvimento
industrial brasileiro:
i.
ii.
iii.
Linhas de ações horizontais (inovação e desenvolvimento tecnológico;
inserção
externa;
modernização
industrial;
ambiente
institucional/aumento da capacidade produtiva)
Escolha de setores estratégicos (software, semicondutores, bens de
capital, fármacos e medicamentos)
Escolha de atividades com potencial futuro (biotecnologia,
nanotecnologia e energias renováveis).
As metas do PITCE foram sintetizadas em dois macro-programas que seriam o “carro
chefe” para as realizações das metas estabelecidas pelo plano: O Indústria Forte e o Inova
Brasil, que tinham como objetivo fortalecer a indústria brasileira de base e aumentar a
capacidade inovadora das empresas.
O PITCE teria como objetivo, promover uma maior inserção e integração da economia
brasileira ao comercio internacional, através de estímulos a setores onde o Brasil teria maior
capacidade e/ou necessidade de desenvolver vantagens competitivas.
Essa visão é corroborada por Cano e Silva (2010, p.07) ao afirmar que o PITCE tratase de “uma política governamental construída a partir de uma visão da complexidade da
estrutura produtiva do país e apoiada na percepção de que os diversos setores e cadeias
produtivas desempenham papéis diferenciados na dinâmica do desenvolvimento, em termos
de geração e difusão de inovações, competitividade e dinamismo internacional e atendimento
das necessidades básicas da população, e que se refletem na sua posição no desenho de uma
política industrial e tecnológica contemporânea, em uma perspectiva de longo prazo, com
ênfase na dimensão da inovação e da agregação de tecnologia aos produtos brasileiros”.
Dentre as medidas do período, podemos destacar a isenção do IPI (Imposto sobre
Produtos Industrializados) para os bens de capital; a isenção da contribuição para PIS/Pasep e
Cofins para a compra de máquinas e equipamentos por empresas exportadoras que
exportassem pelo menos 80% de sua produção, a isonomia tributária entre produtos
importados e produzidos no país aplicando aos primeiros a contribuição para o Cofins.
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Em relação aos setores escolhidos pelo PITCE para receberem estímulos ao
desenvolvimento, os setores de semicondutores, fármacos, software não foram contemplados
com ações de fomento em grande escala, embora segundo Cano e Silva (2010) tenham sido
objeto de Programas específicos do BNDES (Modermaq, Prosoft e Profarma, por exemplo),
cabendo as maiores ações do PITCE na área de promoção de exportações.
Contudo, as ações do PITCE levantaram muitas críticas acerca dos seus objetivos.
Para Brandão e Drummond (2012), o programa se baseava nas mesmas estratégias
generalistas com pouca ou nenhuma clareza de objetivos relativos principalmente aos setores
industriais mais intensivos de mão de obra como de calçados, têxtil e de confecções,que são
os setores que mais empregam no Brasil.
Para Cano e Silva (2010), o problema do PITCE foi a falta de coordenação entre este e
a política macroeconômica do período, e a atenção excessiva do governo somente para esta
política. Para os autores, a estratégia de desenvolvimento industrial apenas com políticas
industriais explicitas, causam distorções ou anulações neste desenvolvimento industrial.
Provavelmente em reação as críticas do PITCE, o governo brasileiro lança em 2008 o
PDP (Plano de Desenvolvimento Produtivo), que tinha como principal objetivo promover um
ciclo de desenvolvimento produtivo sustentado, com base no investimento, na inovação, na
competitividade e no aumento das exportações, como mostra o Quadro 1.
Os instrumentos utilizados pelo governo para a promoção do PDP estão sintetizados
na Tabela 1.
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Tabela 1 - PDP: Resumo das principais medidas
As políticas do PDP foram divididas em três níveis: Ações sistêmicas para “consolidar
e expandir a liderança”, onde o foco seria os setores nos quais o Brasil já se encontrava forte,
com destaque para os setores: aeronáutico, petrolífero, celulose, siderurgia entre outros.
O segundo nível seriam ações para promover o aumento da competitividade em
setores industriais considerados cruciais para o fortalecimento da economia: complexo
automotivo; bens de capital; indústria naval e cabotagem; têxtil e confecções; couro, calçados,
agroindústrias e construção civil.
O terceiro nível consistiria em programas em 6 áreas consideradas estratégicas: Saúde,
Tecnologia da Informação e comunicação, energia nuclear, nanotecnologia, biotecnologia e
indústria bélica.
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Para pôr estas políticas em prática, o PDP também reservou ao BNDES a importante
tarefa de ser o financiador deste processo, concedendo ao banco medidas de agilização
desburocratização dos financiamentos e significativo aporte de recursos. A participação do
BNDES no programa previa financiamentos de R$ 210,4 bilhões para o setor de indústria e
serviços (excluindo os financiamentos à infraestrutura) entre2008 e 2010, com previsão de
que os desembolsos do banco para este segmento chegassem a R$ 77,7 bilhões em
2010(CANO E SILVA, 2010).
Outras medidas que merecem destaque no PDP são: redução de 20% no spread básico
do conjunto de linhas de financiamento do BNDES e de 40% para as linhas de
comercialização de bens de capital; a depreciação do prazo e crédito de 25% para o valor
anual da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido e a eliminação da incidência do IOF de
0,38% nas operações de crédito do BNDES e do FINEP (Financiadora de Estudos e Projetos).
Segundo o documento oficial do PDP (2008), todas essas ações acima citadas visavam
ao objetivo de aumentar a capacidade de produção dos serviços ofertados no país,
preservando a robustez do balanço de pagamentos e elevar a capacidade de inovação
tecnológica para fortalecer as grandes e médias empresas brasileiras. Essas ações foram
sintetizadas em quatro macrometas, como exposto na Tabela 2.
Tabela 2 - Macrometas do PDP
Como apresentado pela Tabela 2, das quatro macrometas estabelecidas pelo PDP,
apenas a meta referente à ampliação da participação das exportações brasileiras no comércio
mundial foi atingida (e até superada), alcançando 1,38% em 2010. Porém, como salientam
Brandão e Drummond (2012), é extremamente simplista e delicado atribuir somente ao PDP
este número, uma vez que, no período observado, não há uma significativa mudança na pauta
exportadora brasileira, e sim, um boom das exportações brasileiras, sobretudo de
commodities.
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Sobre as outras macrometas não alcançadas, as respostas para estas que podem ser
encontradas nos documentos oficiais, segundo Bonelli (2011), pela acentuada crise econômica
a partir de 2009, que teria criado barreiras para o crescimento dos investimentos no Brasil e
em segundo lugar, pela mudança do padrão das empresas que passaram de pequenas para
média, tornando assim, insustentável manter taxas de crescimento sustentado por muito tempo
no Brasil.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O PITCE e o PDP podem ser entendidos como tentativas por partes do governo
brasileiro de retomar as políticas industriais como instrumentos capazes de estimular o
desenvolvimento industrial do país, depois de um período de quase 20 anos de
“esquecimento” da política industrial em prol da política de combate inflacionário.
Talvez a maior conquista dessas políticas, principalmente do PITCE, foi o de
novamente trazer ao centro do debate o tema do desenvolvimento industrial como importante
mecanismo para o desenvolvimento econômico. Os avanços e as formulações do PDP
ampliaram os instrumentos e os setores contemplados do PITCE, apoiando as maiores
medidas nas melhorias em setores como planejamento, coordenação e gestão da política.
Tanto o PITCE quanto o PDP apoiaram-se nas premissas do que foi apresentado na
seção 2.1 de velha política industrial, ou seja, aquela caracterizada pela forte presença do
Estado na promoção dos investimentos industriais, e a eleição de setores, tecnologias e até
mesmo empresas específicas a serem estimulados.
Assim, percebemos que a política industrial brasileira durante o período 2003-2010
não se caracteriza naquilo que Rodrik (2003) conceituou de nova política industrial, pois não
se percebe uma tendência voltada para a geração de atividades novas (inovação), através do
governo agindo como provocador de novos aprendizados tecnológicos a partir do
financiamento a partir do fomento as atividades inovativas, independente da escolha setorial.
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