Otávio Bagatini XLIII Resumo Microbiologia Prova 3º Bimestre - Vírus Introdução a virologia Os vírus são visualizados a partir de microscopia eletrônica apenas. Não sendo possível sua visualização através de MO. Suas dimensões variam de 10-7 até 10-8 metros, e diversas formas são encontradas. Os componentes dos vírus são: - Ácido nucléico; - Capsídeo: um invólucro protetor constituído de proteínas, que protege e facilita sua proliferação, além de proteger o ácido nucléico; - Envelope: nem todos os vírus possuem envelope – Ex. Hepatite A. Envelope viral é o envelope ou cápsula, externa ao capsídeo, presente nos vírus. Sua composição baseia-se, principalmente, de glicoproteínas e fosfolípidos, sendo estes derivados de estruturas da célula hospedeira, como membrana plasmática e organelas. O envelope facilita a interação do vírus com a membrana citoplasmática e aumenta a proteção do vírus contra o sistema de defesa do organismo. Um vírus completo = um vírion = uma partícula infecciosa. De acordo com a simetria do capsídeo, os vírus podem ser helicoidais, icosaédricos ou complexos. Características distintivas dos vírus: Classificação dos vírus: - Diferenciados pelo ácido nucléico: Vírus DNA, podendo ser fita simples ou dupla fita. Ou vírus RNA, também podendo ser dupla fita ou fita simples. - Outra propriedade notável dos ácidos nucléicos virais é a polaridade (sentido, ou senso) das fitas de DNA e RNA. Fitas senso positivo (+) apresentam seqüência idêntica à do mRNA, enquanto as senso negativo (-) apresentam seqüência nucleotídica complementar. Principais grupos de vírus DNA: Adenoviridae, Herpesviridae, Poxviridae, Papovaviridae, Hepadnaviridae. Principais grupos de vírus RNA: Picornaviridae, Togaviridae, Flaviviridae, Retroviridae. Características gerais da replicação viral: - Adsorção: sempre mediada por receptores, é o momento em que o vírus se fixa na superfície do hospedeiro; - Penetração: é quando o material genético penetra dentro do hospedeiro, podendo ser por endocitose, penetração direta ou fusão de membranas do envoltório do vírion com a célula; - Desnudamento: separação física do ácido nucléico viral dos outros componentes estruturais do vírion; - Síntese precoce: RNAm e proteínas não estruturais; - Multiplicação do genoma viral; - Síntese tardia: RNAm e proteínas estruturais; - Montagem de vírions novos; - Liberação. DNA ---transcrição--->RNA ---tradução---> DNA RNA ---transcrição---> DNA ---transcrição ---> RNA ---tradução reversa---> Proteínas DNA ---transcrição---> RNA ---transcrição---> DNA ---transcrição---> RNA ---tradução reversa---> Proteínas. Curva de crescimento de um vírus: - Período de ECLIPSE: desde a entrada do vírus na célula até a produção viral dentro da mesma; - Período de LATÊNCIA: desde a entrada do vírus na célula até sua quantificação no meio extracelular. Tipos de infecção viral: - Produtiva: células susceptíveis e permissivas; - Restritiva: célula transientemente (determinado momento de sua vida) susceptível; - Abortiva: célula susceptível, mas não permissiva (não produtiva); - Latente: célula transientemente não permissiva, ou seja, persistência de genoma viral sem partículas infecciosas. - Infecção aguda: ocorrência repentina dos sintomas e resolução rápida; - Infecção crônica ativa: persistência dos sintomas; - Infecção crônica latente: sintomatologia episódica. Determinantes da patogenia viral: interação do vírus com tecido alvo, atividade citopatológica do vírus e resposta imune. Efeito citopático: alterações na forma da célula resultante da infecção viral. Podem ser a separação das células adjacentes, aumento de volume, bloqueio da atividade celular na entrada, lise na saída, fusão de células adjacentes (formando os sincícios), alteração na permeabilidade da membrana plasmática, ruptura do citoesqueleto (arredondamento da célula), formação de corpúsculos de inclusão citoplasmáticos (proteínas e/ou partículas virais). Em infecções persistentes, o efeito citopático pode ser mais grave, com transformação e imortalização celular (presença de produtos virais oncogênicos ou quando o genoma viral é incorporado ao genoma do hospedeiro). Esse processo pode ocorrer pela promoção ou fornecimento de genes que estimulam o crescimento ou a remoção dos mecanismos de restrição que limitam a síntese de DNA e o crescimento celular. Ocorre alteração da morfologia, perda do controle do crescimento e alteração em propriedades biológicas e químicas. Cultura de vírus: para que ocorra cultura e multiplicação viral, células eucarióticas são cultivadas in vitro e os vírus propagados nessas células. Os vírus se replicam em tecidos vivos, portanto, diferentemente das bactérias, não se desenvolvem em culturas de meio nutriente. Aspectos Gerais da Patogenia Viral Os efeitos primários de uma infecção viral são desde a ausência de alteração patológico-morfológica aparente na célula até transformação maligna, passando por citopatologia e lise celular. Quando há a ausência de efeitos morfológicos ou funcionais, denomina-se infecção endosimbiótica (depende das necessidades replicativas de cada vírus). Efeitos citopáticos e transformação maligna: explicados acima. Lise celular: Ocorre inibição da síntese basal de macromoléculas, com acúmulo excessivo de partículas virais. Ocorre o egresso (saída) dos vírus de dentro da célula, estimulando a apoptose e danificando as membranas lisossomais, que liberam enzimas hidrolíticas, culminando em necrose. Exposição e transmissão: a exposição pode ocorrer por contato direto com indivíduo infectado ou indireto com secreções/excreções, contato acidental com materiais contaminados ou vetores biológicos. A transmissão pode ser vertical (também conhecida como materno-infantil, é a transmissão de uma geração para seus descendentes, podendo ser passadas quando ainda no período de gestação, no nascimento e/ou mesmo nos primeiros anos de vida através do leite materno) ou horizontal (é a transferência de um patógeno de um indivíduo infectado para outro indivíduo sadio, independente do relacionamento de parentesco desses indivíduos. Pode ocorrer por contato direto ou indireto). Portas de entrada: as portas de entrada para os vírus são o trato respiratório e conjuntiva (gotículas em aerossóis), trato digestivo (contaminação oral-fecal), trato geniturinário (materiais contaminados) e lesões de pele. A pele intacta é um importante agente protetor contra as infecções virais, impedindo seu acometimento. A infecção se estabelece pela capacidade do vírus em encontrar células susceptíveis e permissivas. Essas infecções podem ser localizadas – replicação primária (ex.: resfriados comuns), ou sistêmicas (disseminadas pelas vias sanguínea e linfática). Mecanismos de infecções virais: - Lesões ocasionadas pela replicação dos vírus nos órgãos-alvo; - O número de células infectadas/afetadas e a extensão das lesões podem resultar em disfunção orgânica e manifestações clínicas das doenças; - A doença pode surgir em função de diversos fatores: efeito direto dos vírus nas células e/ou resposta imunológica do hospedeiro. Resposta imune nas infecções virais: Com a entrada do vírus na célula, ocorre ativação do sistema imunológico para destruição do agente agressor. Os INF-α e INF-β apresentam interferência direta no ciclo viral, impedindo a replicação. Podem apresentar atuação parócrina (na própria célula) ou parácrina (em células vizinhas). O INF-γ age atraindo os macrófagos, que por sua vez, sintetizam IL-1 e IL-6, além de TNF-α, que estimulam as células NK (matam a célula infectada). Escape da atividade imunológica – Infecções virais persistentes: - INFECÇÕES CRÔNICAS: os hospedeiros produzem e excretam continuamente uma grande quantidade de vírus – alguns portadores ASSINTOMÁTICOS ou OLIGOSSINTOMÁTICOS ; - INFECÇÕES LATENTES: vírus mantido no hospedeiro em uma forma não produtiva; - INFECÇÕES POR VÍRUS LENTO: período longo entre infecção e início da doença em função do longo período de incubação dos vírus e da evolução patológica. Hepatites Virais Vírus A Exclusivamente causada por vírus hepatotrópico (utiliza o fígado como sítio primário de replicação), é de transmissibilidade inter-humana, podendo causar infecção aguda ou crônica com alta morbidade universal. Caracteriza-se por inflamação do parênquima hepático com necrose hepatocelular. Curto período de incubação – 30 dias na maioria das vezes, podendo variar de 15 até 50 dias (diferente do vírus B, com longo período de incubação). Os vírus da hepatite A não são envelopados, apresentam simetria icosaédrica, família Picornaviridae, gênero Hepatovírus, RNA + com sentido simples. 7 genótipos já foram identificados (I e III mais freqüentes em infecções no homem). Epidemiologia: - Distribuição mundial diretamente relacionada às condições de higiene e saneamento básico, sendo um vírus de transmissão oral-fecal, cuja contaminação ocorre por ingestão de alimentos/água contaminados; - O Brasil é um país de alta incidência do vírus de hepatite A, sendo que cerca de 90% da população brasileira apresenta anticorpos para o vírus, ou seja, essas pessoas já entraram em contato com o mesmo, na maioria das vezes na infância. Ciclo viral: - Transmissão oral-fecal; - O vírus se mantém viável na água por cerca de 3 a 10 meses, 15x mais que isso em crustáceos e moluscos (importante cozinhar bem antes de ingerir). - Chegando ao intestino, não se sabe se o VHA penetra no enterócito e se replica, ou se ele penetra via células M, alcançando a mucosa e penetrando no sistema porta, atingindo assim o fígado pelos capilares sinusóides. - Atingindo o tecido hepático, eles adentram no hepatócito, mediado por receptores (molécula da família das mucinas), ocorrendo desnudamento. O ciclo ocorre inteiramente no citoplasma celular. - Após ocorrer a replicação do vírus no interior da célula, ele é liberado, sem causar necrose celular, pela região apical do hepatócito, alcançando o canalículo biliar, sendo lançado no intestino e eliminado nas fezes. Ou pela região basolateral da célula, alcançando a circulação sanguínea e levando a uma viremia (presença de vírus vivos no sangue circulante). Obs.: A ocorrência de viremia é tremendamente rara. Seu período é curto e a transmissão por via parenteral (sanguínea) quase nula. - No meio extracelular o vírus está susceptível a ser eliminado por anticorpos ou outros componentes do sistema imunológico. Os linfócitos T, por exemplo, são ativados por receptores que surgem na própria membrana celular do hepatócito quando o vírus penetra. Formas clínicas: - A grande maioria dos pacientes são assintomáticos; os sintomáticos apresentam na maioria das vezes icterícia ou manifestações intestinais (tais como cólica e diarréia). - 99% dos pacientes evoluem para a cura; 1% pode apresentar hepatite colestática (icterícia por mais de 12 semanas e prurido), hepatite recidivante (aspecto bifásico, ou seja, IgG cai, ocorrendo reincidência da doença, sem nova contaminação), hepatite prolongada ou hepatite fulminante (óbito). Marcadores sorológicos: - Anti VHA (IgM): anticorpos de fase aguda contra o VHA, subclasse IgM. - Anti VHA (IgG): anticorpos de fase crônica contra o VHA, subclasse IgG. Estes anticorpos conferem recuperação e imunidade ao infectado. Tratamento: não existe um tratamento específico para o vírus da hepatite A, apenas sintomático (se necessário). A doença evolui espontaneamente para a cura, sendo acompanhada pela dosagem das enzimas hepáticas transaminases e bilirrubina. O paciente fica em repouso até a melhora da icterícia (se houver), sendo necessário sempre interromper o uso de medicamentos hepatotóxicos e álcool. Profilaxia: cuidados com a água, alimentos (verdura, legumes, frutas). O vírus é inativado pela fervura (20 min), cloração e luz ultravioleta. Imunoprofilaxia: existe vacina indicada em áreas de baixa endemicidade, para hepatopatas crônicos e receptores de transplante de medula óssea. A Ig humana anti VHA é o anticorpo contra a doença. Outra forma de imunoprofilaxia é o recebimento do próprio anticorpo, agindo de forma diferente da vacina, já que a mesma induz sua produção. É indicado para acidentes com material biológico contaminado, viajantes em áreas endêmicas e contato com pessoas sintomáticas com infecção aguda. Hepatites Virais Vírus C Descoberto em 1989 como principal agente da hepatite pós-transfusional não-A e não-B; sendo a principal causa de doença crônica no fígado. Agente etiológico: vírus HCV, da família Flaviviridae, Gênero Hepacivírus, RNA de fita simples, responsável por 90% dos casos de infecção pelos vírus da hepatite e principal causa de hepatite pós-transfusional. É um vírus envelopado, de simetria icosaédrica, já tendo identificados 6 genótipos diferentes, com mais de 50 subtipos. Os genótipos I e IV são os mais agressivos e difíceis de tratar. Epidemiologia: - Atualmente 200.000.000 de infectados pelo vírus HCV no mundo, representando um dos mais graves problemas de saúde pública no Brasil e no mundo. Os países são divididos em prevalências alta, intermediária, baixa e muito baixa. O Brasil ocupa a segunda classificação, sendo: genótipo I (70%), genótipo II (2,5%) e genótipo III (28%). Fatores de maior risco: - Usuários de drogas endovenosas - 80% - Receptores de fatores de coagulação antes de 1987 - 90% - Receptores de transfusão sangüínea ou transplante de órgãos antes de 1987- 6%; - Hemodiálise - 20%; - Filhos de mães positivas- 5%; - Parceiros de portadores do HIV; - Crianças com 12 meses de idade com mãe portadora do HCV; - Profissionais da área da saúde vítimas de acidente com sangue contaminado. Obs.: existem estudos que mostram que o vírus pode também estar presente em outros fluidos do corpo (ex.: leite materno, esperma,...) que não o sangue. Porém em grau de virulência muitíssimo baixo, não suficiente para causar a doença. Transmissão: a principal via de transmissão á a parenteral, tendo também a vertical e a sexual (muito rara). Patogenia: vírus hepatotrópico; efeito citopático; lesão hepática, principalmente resultante da imunidade celular; evoluindo para a cronicidade em 80 – 85% dos casos. O vírus não contamina as células sanguíneas, apenas circula pelo sangue. Ele atinge as células hepáticas por contato, infectando-as. Ciclo viral: - Após a entrada no organismo o vírus se liga nas células de Kupffer (presente no endotélio vascular), mediado por receptores, porém não penetra nela. Essa célula se retrai levando o vírus até o hepatócito, no qual enzimas do próprio organismo clivam o vírus, separando-o da célula de Kupffer. O hepatócito é altamente permissivo, o vírus se liga a receptores da célula (E2, CD81, SR-B1, ocludina), é internalizado, e no citoplasma ele é desnudado. Vai para o retículo endoplasmático, onde sofre replicação. Passa para o Complexo de Golgi e é liberado, adquirindo um novo envelope, nesse caso, a membrana do próprio complexo de Golgi. Replicação: 3´_______________5´ RNA + 5´_______________3´ RNA – Evolução clínica: de 100% de pessoas infectadas, apenas 20% curam. 80% cronificam. Destes pacientes crônicos, 40% sofrem de doença progressiva (cirrose) e 60% de doença não progressiva, sendo 25% ALT NL e 35% leve. Procedimento após picadas de agulhas, cortes ou exposição de sangue HCV positivo: - Exame: Anti-HCV e ALT, imediato e até 4-6 meses; - HCV-RNA em 4-6 semanas (+ rápido); - Confirmar todos os anti-HCV; - Encaminhar a pessoa infectada a serviço médico especializado para avaliação e acompanhamento. Obs.: O risco de contaminação do HCV é altísimo. Comparando-se o Risco de infecção após picada com agulha contaminada pelo HCV e pelo HIV, tem-se um risco 10x maior de contaminação pelo HCV! Marcadores sorológicos: O diagnóstico é sorológico, podendo ser realizado pelo método Elisa ou PCR. O primeiro detecta o anticorpo Anti-HCV, já o segundo, detecta o RNA do HCV. O exame Elisa pode dar positivo, mesmo que o paciente esteja em fase aguda da doença. Assim, utiliza-se também o PCR, para identificar a carga viral e controlar o tratamento e medidas. Infecção pelo HCV – Evolução para a cura Infecção pelo HCV – Evolução para a cronicidade Importância da Biópsia: como a severidade da doença não pode ser determinada com precisão por métodos menos agressivos, a biópsia continua sendo necessária para avaliar o grau de inflamação e fibrose (formação de cicatrizes). O consenso mundial é de que a biópsia é necessária em todos os pacientes antes do início do tratamento. Papel da biópsia hepática na hepatite C Confirma o diagnóstico clínico Avalia o grau de fibrose e inflamação Avalia a presença de outras doenças concomitantes Ajuda a definir a melhor opção terapêutica Tratamento, prevenção e controle: - O interferon-alfa constitui o principal tratamento eficaz conhecido para a infecção pelo HCV (associado ou não à Ribavirina). Ele atua na replicação viral. - Formas de controle: evitar comportamento de alto risco. Esquema terapêutico: - Interferon alfa 3.000.000 unidades por via subcutânea 3 vezes por semana; - Ribavirina 1.000 mg ao dia por via oral em < 75 kg e 1.200 mg em > 75 kg. Obs.: As pessoas em tratamento devem ser acompanhadas freqüentemente. Exames laboratoriais são necessários a cada 1-2 semanas durante os primeiros 2 meses e depois a cada 4-8 semanas. Pacientes mais jovens, com infecção há menos tempo, sem cirrose, com infecção pelos genótipos 2 e 3 e com menor carga viral (abaixo de 800.000 Unidades/mL) tem as melhores chances de sucesso terapêutico.