MESTRADO EM TEORIA LITERÁRIA PROGRAMA DE ATUALIZAÇÃO DOCENTE Título do Curso: Procedimentos de leitura da obra literária a partir de teorias que valorizam o efeito estético Professor: Edson Ribeiro da Silva Dia/Horário: Sexta-feiras, das 14 às 17h30 Carga horária: 12 horas Categoria: Atividade de extensão gratuita Local: Campus Cidade Universitária, Edifício José Barros, sala 223 DESCRIÇÃO: A proposta curricular para o ensino de literatura elaborada pela Secretaria de Educação do Estado do Paraná, conhecida como Diretrizes Curriculares Estaduais, inovou ao focalizar o aspecto estético da obra literária, fazendo, inclusive, uma crítica às influências que a crítica sociológica exerce na ação docente. Trata-se, sem dúvida, de um movimento de atualização dos modos de abordagem da literatura. Ao mesmo tempo em que renega o uso do texto literário como pretexto para construções e digressões que interessam sobretudo às demais disciplinas, seja de forma interdisciplinar, seja como modo ingênuo de incentivar a leitura, a proposta não reabilita as abordagens puramente estruturalistas, que descrevem o fenômeno literário, sem despertar no aluno o fascínio pelas possibilidades de leitura. A leitura visa ao prazer, à formação do leitor, mas pensando que a mesma é de natureza estética. Ler é interagir com o texto. Mas, como dizia Barthes, no conhecido artigo “A morte do autor”, o foco deixa de serem as significações ocultas, a serem desencavadas pelo leitor, as quais devem corresponder a uma intencionalidade autoral. A significância está na experiência estética. O leitor passa a ser a preocupação, aquele ser desconhecido, com o qual, segundo Barthes, a teoria nunca se importara. Dar atenção ao leitor, para a proposta paranaense, significa adotar os preceitos do movimento crítico que desenvolveu toda uma metodologia de aproximação entre obra e leitor. A Estética da Recepção passa a ser um referencial hermenêutico. Embora cite os trabalhos de Jauss com maior destaque, é fácil perceber que a proposta paranaense se aproxima de obras de Iser e de seu conceito da obra literária como “jogo”. O jogo é forma de prazer. Mas é mais que isso. É forma de interação com o real. Iser cria o que denomina “antropologia literária” para explicar que a ficção não é mero entretenimento, mas forma de compreensão do real. A mesma tese defendida por Ricoeur em Tempo e narrativa. Ideia que pode ser redescoberta em Homo ludens, de Huizinga. Ou seja, dar ao professor uma justificativa para que o ensino de literatura não precise se ancorar em um falso pragmatismo é atitude amparada dentro da teoria da literatura e fora dela. Da mesma forma, focalizar algumas das concepções da teoria da literatura que mostram o texto como realização estética, como a de estranhamento, do Formalismo Russo, ou a função poética, de Jakobson, são formas de mostrar ao docente que a ideia não é um modismo adotado por uma proposta curricular passageira. É preciso criar no professor pressupostos teóricos, mas também sugerir modos de abordagem do texto literário como jogo, ou seja, como obra que interage com o leitor, mas que exige dele a compreensão das regras do jogo em si, para que aquele perceba as especificidades de cada partida jogada. Portanto, é preciso trazer textos literários que causem estranhamento, como a obra de João Guimarães Rosa, e confrontá-la com a de um autor sobre o qual o senso comum criou a falsa noção de não provocar reações de desconforto, como Graciliano Ramos. A abordagem estética de obras dos dois autores, usando, inclusive, adaptações cinematográficas e pictóricas, servirá como sugestão de trabalho ao docente, a ser usada em sala de aula. Além de sugestão de trabalho, serve como definição de uma metodologia voltada para a abordagem estética e para a interação autor/leitor. CRONOGRAMA 15/08 Conceitos de literatura: clássico (Hegel), moderno (Formalismo Russo), e pós-moderno (Estética da Recepção). A função social da literatura (Antonio Candido); a função antropológica da literatura (Iser); a função estética da literatura (Lefebve). O estranhamento em oposição ao senso comum e às artes voltadas ao consumo. O valor estético. O cânone literário. Forma e opacidade do texto literário. A linguagem literária a partir da teoria da teoria dos atos de fala. Ficção e mentira. 22/08 A multissignificação e o senso comum. A obra aberta. Os leitores e autores (empíricos e modelos), de Eco, e o modelo deste para a interação obra/leitor. Os precursores da Estética da Recepção. Os pressupostos: Jauss. Iser: a interação como jogo. Os modelos de jogo. O tempo e a voz como elementos primordiais para o estabelecimento do jogo. A observação da opacidade do texto literário em poemas de encarte do jornal Folha de São Paulo. O estilo. O estranhamento como desafio ao senso comum. A “escritura” como parte do jogo iseriano. 29/08 Análise de “Baleia”, capítulo de Vidas secas, de Graciliano Ramos, a partir dos elementos do jogo iseriano (a voz e o tempo). Confronto com a tela “Baleia”, de Portinari, e com gravura de Aldemir Martins, a partir de elementos estéticos e da intenção de representar o real. Confronto com cena do filme Vidas secas, de Nelson Pereira dos Santos: os recursos da arte cinematográfica como efeito estético. Abordagem de trecho da novela “Campo geral”, de João Guimarães Rosa. Confronto com trecho do filme Mutum, de Sandra Kogut. O efeito estético na obra roseana e na adaptação cinematográfica. Para além do enredo e do sentido: a literatura como produção estética. A crise da representação do real e a necessidade de abordagens menos “ingênuas” do texto literário. Comparação entre os modos como a crise da representação se apresenta nas artes visuais e na literatura. Literatura como jogo: regras e transgressões. Fazer do efeito estético uma forma de instigar a leitura, como jogo, mas também como reconhecimento da proposta estética e do nível de realização alcançado em cada obra lida. REFERÊNCIAS Livros: ALDRICH, V. Filosofia da arte. Tradução de Álvaro Cabral. 2ª ed., Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editora, 1997. AUERBACH, E. Mimesis: a representação da realidade na literatura ocidental. Tradução de vários tradutores. 5ª ed., São Paulo: Perspectiva, 2004. BARTHES, R. “A morte do autor.” In: ___. O rumor da língua. Tradução de Mário Laranjeira. São Paulo: Martins Fontes, 2004. CARVALHO, A. L. C. Foco narrativo e fluxo da consciência: questões de teoria literária. São Paulo: Pioneira, 1981. ECO, U. Lector in fabula: a colaboração interpretativa nos textos narrativos. Tradução de Attílio Cancian. 2ª ed., São Paulo: Editora Perspectiva, 2004. ______. Seis passeios pelos bosques da ficção. Tradução de Hildegard Feist. São Paulo: Companhia das Letras, 1994. GUERREIRO, M. A. L. O problema da ficção na filosofia analítica. Londrina, PR: Editora Eduel: 1999. HEGEL, G.W.F. Estética. Tradução de vários autores. São Paulo: Nova Cultural, 1999. HUIZINGA, J. Homo ludens: O jogo como elemento da cultura, São Paulo: Editora Perspectiva, 2000. ISER, W. O fictício e o imaginário: perspectivas de uma antropologia literária. Tradução de Johannes Kretschmer. Rio de Janeiro: EdUERJ, 1996. ______. “Teoria da recepção: reação a uma circunstância histórica.” In: ROCHA, J. C. C. (org.) Teoria da ficção: indagações à obra de Wolfgang Iser. Rio de Janeiro: EdUERJ, 1999. JAUSS, H. R. A história da literatura como provocação à teoria literária. Tradução de Ségio Tellaroli. São Paulo: Ática, 1994. LEITE, L. C. M. O foco narrativo (ou a polêmica em torno da ilusão). 10ª ed., São Paulo: Editora Ática, 2005. RAMOS, G. Vidas secas. Rio de Janeiro: Record, 2008. RICOEUR, P. Tempo e narrativa. Tradução de Cláudia Berliner. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2010. ROSA, J. G. “Campo geral”. In: Manuelzão e Miguilin. 32ª ed. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 2001. Filmes: MUTUM. Direção de Sandra Kogut. Brasil: Tambellini Filmes e Gloria Films, 2008. 90 min., son. VIDAS SECAS. Direção de Nelson Pereira dos Santos. Brasil: Nelson Pereira dos Santos, 1963. 103 min., p&b, son.