0I Encontro da MPB: o despertar de Curitiba como palco dos

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0I Encontro da MPB: o despertar de Curitiba como palco dos melhores da MPB.
Lissandro Leite
Prof. Dr. José Roberto Braga Portella
Palavras-chave: Espaço Cultural, Curitiba, MPB.
Reconhecido como uma manifestação cultural que apresenta ao mundo os nossos
dilemas e veículo de nossas utopias sociais, a musica popular brasileira ocupa um lugar
privilegiado na história sociocultural. Protagonista de um processo de identificação
construído por diferentes agentes sociais em interação, a Música Popular Brasileira é um
espaço de mediações, fusões, encontros de diversas etnias, classes e regiões que formam o
grande mosaico da sociedade brasileira.
Ao tornar a música popular brasileira um tema de pesquisa histórica nos juntamos a
milhares de aficionados pela música, que da platéia certamente tinham a noção de que no
Brasil, a música é importante. Ao partilharmos este universo da musica popular, entramos
em contato com uma dimensão da cultura brasileira. O interesse pelas artes e a música em
especial, iniciado neste ambiente de público ouvinte e os conhecimentos adquiridos nos
bancos da Universidade, nos levaram a estudar o I Encontro da MPB, espetáculo
idealizado pelo célebre jornalista Aramis Millarch o qual conseguiu realizar a façanha de
reunir em uma semana com uma apresentação diária, um time de grandes artistas da MPB.
Millarch participou dos principais festivais, concursos ou prêmios de âmbito nacional onde
a arte ou a cultura era objeto de discussão, foi também um dos fundadores e o primeiro
presidente da Associação dos Pesquisadores da Música Popular Brasileira.
A partir das informações obtidas através de jornais locais, da década de 1970, o
trabalho monográfico desenvolvido apresentou uma discussão acerca do contexto em que
foi realizada a inauguração do principal auditório do Teatro Guaíra.
Concebido como um complexo com três auditórios, o Teatro Guaíra começou a ser
construído em 1952. O "Auditório Salvador de Ferrante", de médio tamanho, conhecido
como “Guairinha”, foi inaugurado em dezembro de 1954, com a presença do então
Presidente da República Café Filho. A primeira peça apresentada no auditório foi
"Vivendo em Pecado", de Terence Rattigan, da companhia Dulcina, em fevereiro de 1955.
Entretanto, as obras do grande auditório seguiram lentamente durante dezesseis
anos. Em de abril de 1970, quando a inauguração estava próxima, um incêndio causou
graves danos ao prédio, que precisou de mais quatro anos para ficar pronto. A principal
sala do teatro, o “Auditório Bento Munhoz da Rocha Netto” apenas seria aberto ao público,
com a peça de estréia "Paraná, Terra de Todas as Gentes", de Adherbal Fortes e Paulo
Vítola, em dezembro de 1974.
No ano seguinte, alguns meses após a inauguração do teatro foi realizado o I
Encontro da MPB, momento este em que o espaço social, cultural e comercial da MPB
começava a se rearticular, marcado principalmente pelo retorno de compositores exilados.
Voltado para um publico consumidor de produtos culturais ligados à oposição do regime
militar, neste caso a MPB, este evento contou com grandes expoentes da musica brasileira
como Milton Nascimento, Jorge Ben, família Caymmi, Maria Bethânia, Elizeth Cardoso e
Chico Buarque.
Período em questão é importante para entendermos as mudanças locais, em que
reformas urbanas e culturais introduzidas em Curitiba, inseriram a cidade no modelo de
modernidade vigente durante o Regime Militar. Momento decisivo em relação ao processo
de planejamento da cidade data dos anos 70 os principais projetos na área de transportes
coletivos, embelezamento, restauração e preservação dos sítios históricos, padronização da
paisagem urbana, implantação de áreas de lazer (como parques e bosques), recebendo à
cidade a denominação de modelo de urbanismo.
Mediante isso, lançou-se um olhar peculiar sobre o I Encontro da MPB ocorrido em
fevereiro de 1975. A discussão que pretendemos conduzir neste trabalho tem como
propósito analisar o destaque dado pela imprensa paranaense sobre tal encontro entre
artistas de destaque da época, em um contexto de institucionalização da MPB situado,
sobretudo durante a fase mais autoritária do Regime Militar.
No capítulo 1, apresentamos o contexto político-cultural brasileiro dos anos 19601970 e as mudanças ocorridas na capital paranaense, inserindo Curitiba no modelo de
modernidade vigente durante o Regime Militar, possibilitada pelo “milagre econômico”.
Na seqüência, um breve relato sobre a construção do teatro Guaíra.
A vitória do movimento político-militar de 1964 abriu uma nova etapa da História
Republicana do Brasil. Nos início dos anos 70, a censura no governo brasileiro estava no
auge de ditadura militar, respaldado pelo Ato Institucional N.º5 como ato legal promulgado
em fins de 1968. Aprofundando assim o caráter repressivo do regime em vigor na época e
havendo uma profunda e abrupta cisão na produção e nas experiências musicais tidas ao
longo da década de 60, interferindo de maneira drástica e concludente no consumo e na
produção artística nacional, especialmente a musical. Em primeiro faremos uma breve
retrospectiva sobre essa evolução cultural musical nos anos 60 e o engajamento dessa arte
entre outras, nesse período.
O grande crescimento econômico do período se deve principalmente a intima
associação do Brasil ao capital internacional. No final dos anos 1960 e inicio dos 1970, a
economia mundial se expandiu rapidamente, gerando um significativo aumento do
comercio internacional e dos lucros das grandes companhias. Além disso, as autoridades
nacionais concederam toda a sorte de privilégios às multinacionais, que começaram a
investir maciçamente no Brasil, ao mesmo tempo em que os bancos internacionais nos
concediam empréstimos gigantescos.
No Paraná, este período foi marcado por intensas mudanças, principalmente em
Curitiba. Entretanto, essas mudanças ocorrem desde meados dos anos 50, buscando firmar
Curitiba como centro administrativo do Estado. Neste sentido, a principal obra é a
construção do centro Cívico, que se coloca como um marco das potencialidades locais, da
ação modernizadora do governo, que investe sobre construção de um lugar de poder.1
Entre essas obras, além do Centro Cívico podemos citar também a construção da
Biblioteca Pública, Praça do Centenário e Monumento do Centenário, Colégio Tiradentes,
avenidas de acesso ao Centro Cívico, o monumental Colégio Estadual do Paraná e o teatro
Guaíra, nosso objeto de pesquisa.
No capítulo 2, examinamos a MPB dos anos 1970, seus principais nomes e sua
relação com o Regime Militar. Buscamos observar também como se deu a
institucionalização da MPB. Expressão/sigla que sintetiza a busca de uma nova canção que
expressasse o Brasil como projeto de nação idealizada por uma cultura política
influenciada pela ideologia nacional-popular e pelo ciclo de desenvolvimento industrial
impulsionado a partir dos anos 1950.
1
MAGALHÃES, Marion Brephol de. Paraná: política e governo. Curitiba : SEED, 2001.p.64
Neste sentido o principal papel da institucionalização da MPB foi o de consolidar o
deslocamento do lugar social da canção, esboçado desde a Bossa Nova. Este estatuto de
canção que dele emergiu não significou uma busca de identidade e coerência estética. As
composições de MPB seguiram sendo objetos híbridos, portadores de elementos estéticos
de natureza diversa, tanto em sua estrutura poética, como na estrutura musical.
Em sua fase de consolidação ao longo da década de 70, a instituição MPB, pode
nos apresentar marcas ambíguas, durante a qual segmentos sociais, sobretudo da classemédia. Ou seja, herdeiros de uma ideologia nacionalista integradora no campo político,
porém abertos a uma nova cultura de consumo no campo sócio econômico, nos fornecendo
uma tendência de gosto musical que ajudaram a definir o sentido da MPB2.
A consolidação da MPB como instituição se deu a partir da estreita ligação com a
reorganização da indústria cultural, a qual agiu como fator estruturante de grande
importância no processo, não apenas como um elemento externo ao campo musical que
cooptou e deturpou a cultura musical brasileira.
Mais do que mero reflexo das estruturas sociais, a MPB foi um pólo fundamental
da configuração do imaginário sócio-político da classe média progressista submetida ao
controle do Regime Militar. Também porque, considerável parcela dos compositores e
cantores mais destacados da MPB era procedente dos segmentos médios da sociedade.
Por fim, no capítulo 3, tentamos apresentar as principais características dos festivais
que marcaram o período. O objetivo geral do capítulo é distinguir o I Encontro da MPB
dos demais festivais e analisar sua repercussão na imprensa paranaense.
A opção por este evento não é arbitrária. Dá-se porque o Encontro em questão foi
um dos primeiros espetáculos do gênero no recém inaugurado teatro. Um outro aspecto que
não pode deixar de ser enfatizado é que paralelamente ao I Encontro da MP, foi realizado
o I Encontro dos Pesquisadores da MPB, debates que contou com Sérgio Cabral, Paulo
Tapajós, Lúcio Rangel, Paixão Cortes, Ricardo Cravo Albin, Hermínio Bello de Carvalho,
J. L. Frezzeti, Hermínio Borba Filho, Tárik de Souza. Conforme publicado no Diário do
Paraná: “terá início amanha, às 17 hrs no auditório Salvador de Ferrante, o I Encontro de
Pesquisadores da MPB, que reunirá todos aqueles que se preocupam com o estudo, a coleta
de dados e documentos visando a preservação da memória musical brasileira.”3
O que nos chamou a atenção foi o tratamento da imprensa paranaense dado ao I
Encontro da MPB a respeito dos músicos e compositores brasileiros e suas relações com o
publico. Em função disso, foram analisadas reportagens de periódicos como Gazeta do
Povo, Diário do Paraná, Estado do Paraná, sendo que nos focamos principalmente nas
informações publicadas no Diário do Paraná, do qual era componente do órgão de
comunicação Diário e Associados, fundado e dirigido por Assis Chateaubriand.
A escolha por essas fontes, deve-se ao fato dos jornais ser umas das principais
fontes de informação histórica. Preocupando-nos com a identificação das matrizes das
idéias, buscando compreender os pressupostos projetos políticos veiculados nos jornais.4
Ao refletir, de certa forma, o clima de época, isto é, inclusos no contexto da década de
1970, essas reportagens nos permite assim ter acesso às formas pelas quais as pessoas
representavam as relações e as tensões que experimentavam dentro do universo cultural
musical.
Assim faremos um recorte ao localizar o período em que o I Encontro da MPB foi
realizado. A partir desta localização buscaremos entender como a imprensa paranaense
2
NAPOLITANO, Marcos. A musica popular brasileira(MPB) dos anos 70. In: Actas del IV Congresso
Latinoamericano de la Associación para el Estúdio de la Música Popular. 2000. p. 3.
3
Diário do Paraná. 27/02/1975 Caderno 2º MPB tem “encontro no Paraná” p. 3.
4
CAPELATO, Maria Helena Rolim. A imprensa na história do Brasil. São Paulo : Contexto/EDUSP, 2ª
edição, 1994. p. 24
constrói suas posições a respeito dos compositores que foram atração do festival. Buscando
analisar a imagem desses compositores e do próprio Encontro, pois além de ser chamado
do I Encontro de MPB, chamado também “dos melhores da MPB” e ocorrendo
paralelamente o também I Encontro dos pesquisadores da MPB no então recém inaugurado
e o maior auditório da América Latina, o teatro Guaíra da cidade de Curitiba que então
ostentava por tornar-se parte do roteiro nacional dos grandes shows musicais da MPB.
Em suma, seria difícil, hoje, imaginarmos o Brasil sem a MPB, da mesma forma
que é difícil estabelecer uma única razão para a enorme projeção conquistada pelo gênero
musical. A discussão levantada em torno das reportagens sobre a inauguração do Teatro
Guaíra e o I Encontro da MPB mostrou-se instigante na medida em que tematizou um
fenômeno com grande visibilidade na sociedade paranaense e de âmbito nacional,
repercutindo nos veículos locais comunicação e que ainda se encontra pouco analisado.
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