Monografias - Igepri.org

Propaganda
IGEPRI
Monografias
Patentes: o regime internacional e a importância
para as empresas transnacionais
Cecília Megale Ogata
Volume 5 | Ano 2 | 2012
Nota: Todo conteúdo publicado pela Monografias
Igepri é de total responsabilidade de seu(s) autor (es).
As opiniões expressadas nesse caderno não representam as opiniões do periódico, nem do Conselho
Editorial e nem dos órgãos filiados a este caderno.
Ogata, Cecilia Megale.
O34p Patentes : o regime internacional e a importância para as empresas transnacionais / Cecilia Megale Ogata. – Marília, 2010.
126 f. ; 30 cm.
Monografia (Trabalho de Conclusão de Curso de Relações Internacionais) – Faculdade de
Filosofia e Ciências, Universidade Estadual Paulista, 2010.
Orientador: Dr. Luís Antônio Paulino.
1. Patentes. 2. Propriedade intelectual. 3. Empresas multinacionais. 4. TRIPs. 5. Concorrência. I. Autor. II. Título.
CDD 341.758
IGEPRI
Monografias
Monografias IGEPRI é uma publicação bimestral do Instituto
de Gestão Pública e Relações Internacionais (IGEPRI). Sua
missão é servir de espaço alternativo à publicação de pesquisas científicas elaboradas por jovens acadêmicos dedicados ao estudo e ao debate de temas relativos à Gestão
Pública e às Relações Internacionais no Brasil e no mundo.
Com potencial de influenciar e intervir no processo decisório
governamental nas suas diversas esferas, contribuindo com
novas propostas para a elaboração de políticas públicas,
efetivação de controle social, suporte à advocacia de idéias
e a busca de transparência no trato dos assuntos públicos.
Conselho Editorial
Cristina Soreanu Pecequilo (UNIFESP - Osasco)
Luis Antônio Francisco de Souza (UNESP – Marília)
Heloísa Pait (UNESP – Marília)
Luis Francisco Corsi (UNESP – Marília)
Janina Onuki (USP – Instituto de Relações Internacionais)
Marcelo Fernandes de Oliveira (UNESP – Marília) – Editor
José Blanes Sala (UFABC)
Marcelo Passini Mariano (UNESP – Franca)
Karina Lilia Pasquarielo Mariano (UNESP – Araraquara)
Miriam Cláudia Simoneti Lourenção (UNESP – Marília)
Lidia Maria Vianna Possas (UNESP – Marília)
Tullo Vigevani (UNESP – Marília)
Patentes: o regime internacional...
UNESP
CECILIA MEGALE OGATA
Patentes: o regime internacional e a importância
para as empresas transnacionais
2010
Marília - SP
Cecília Megali Ogata
2
CECILIA MEGALE OGATA
Patentes: o regime internacional e a importância para as
empresas transnacionais
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado
ao
Conselho
de
Curso
de
Relações
Internacionais da Faculdade de Ciência e
Filosofia, da Universidade Estadual Paulista
Júlio de Mesquita Filho – UNESP – campus
Marília, para obtenção do título de bacharel
em Relações Internacionais
Área de concentração: Economia Política
Orientador: Prfº. Dr. Luís Antônio Paulino
2010
Marília - SP
Patentes: o regime internacional...
3
CECILIA MEGALE OGATA
Patentes: o regime internacional e a importância para as empresas
transnacionais
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Conselho de
Curso de Relações Internacionais da Faculdade de Ciência e
Filosofia, da Universidade Estadual Paulista Júlio de
Mesquita Filho – UNESP – campus Marília, para obtenção
do título de bacharel em Relações Internacionais
Área de concentração: Economia Política
Orientador: Profº. Dr. Luís Antônio Paulino
BANCA EXAMINADORA
Orientador: _____________________________________________
Profº. Dr. Luís Antônio Paulino
2º examinador: __________________________________________
Profª Dr. Marisa Rossinholi
3º examinador:__________________________________________
Profº Dr. Marcelo Fernandes Oliveira
Marília, 17 de Agosto de 2010
Cecília Megali Ogata
4
Com, pela e para: minha mãe.
Patentes: o regime internacional...
5
Agradecimentos
Agradecer é, antes de tudo, reconhecer-me incapaz de viver sozinho, é uma oportunidade para
olhar para trás e ver quantas pessoas, direta ou indiretamente, contribuíram, ainda que apenas
com um tijolo para a construção da escada que aos poucos começo a subir.
Por isso, começo essa tarefa árdua e prazerosa, agradecendo a Deus, força suprema na minha
vida, que me concedeu e concede todos os dias, inúmeras bênçãos, mesmo quando não me
faltam razões para não creditar nas coisas e nas pessoas. Também me aparando e conduzindo
todos os momentos, agradeço à Nossa Senhora, que me permite sentir seu amparo a todo
momento; e ao meu anjo da guarda que tão bem cumpriu seu papel, zelando para que nada de
(muito) ruim me acontecesse durante esses quatro anos de graduação.
Sou imensamente grata aos meus familiares que sempre apoiaram meus sonhos e ambições,
em especial, aos meus avós, Takao e Akiko (in memorian) e Alcides (in memorian) e Cacilda,
que primeiro cultivaram o valor da educação em minha família. Às minhas tias Inez e Ana,
que são como mães para mim, exemplos de graça, força e alegria. Sem elas, as coisas, com
certeza, teriam sido muito mais difíceis e a vida menos completa. Ao meu pai por tudo que
representou no meu passado e por todas as lembranças inesquecíveis, guardadas no fundo do
meu coração.
Mas, se tudo isso, desde a primeira viagem à Marília até a impressão deste trabalho, se tornou
possível, é devido, sobretudo, à três pessoas: Maria Alice, minha mãe, Roberto e Helena,
meus irmãos. Aos dois últimos, atribuo minha inspiração para tudo na vida, o motivo de
superar os maiores adversários e as piores adversidades. E à minha mãe eu atribuo tudo o que
sou e por isso, agradeço tudo: minha vida, meus valores e princípios, minha educação, minha
garra, minha fé e meu coração. Desta forma, essa vitória é dela, por ela e para ela, com todo
merecimento do mundo!
Agradeço também aos melhores amigos que alguém pode ter. Àqueles de sempre e pra
sempre: Naza, Pet, Nathy, Dry, Tina, Didi, Carol, Carolzinha e Elisa. Àqueles todos da IV
Turma de Relações Internacionais da UNESP – Marília, que cresceram, amadureceram e
venceram comigo esses quatro anos, em especial: Alessandra, Anselmo, Ricardo e Gabriel. E
àquelas que em tão pouco tempo se tornaram mais que amigas: Carol e Sarah.
Cecília Megali Ogata
6
Meu muito obrigado a todos funcionários da FFC, principalmente aos meus professores do
curso de R.I., que só fizeram por contribuir com o meu crescimento acadêmico e pessoal, que
tão gentilmente, a cada aula, cediam, transmitiam e estimulavam conhecimento em nós,
alunos. Agradeço, de maneira especial, ao Prfº Dr. Luís Antônio Paulino, que me orientou na
concretização deste trabalho com muita paciência e atenção, não medindo esforços para sanar
minhas dúvidas. “Obrigada pelos conselhos, pelas conversas, pela sabedoria transmitida e
pela disponibilidade de compartilhar comigo seus conhecimentos.”
Por fim, agradeço ao Rafa (um grande presente de Deus), que há 7 anos é meu companheiro,
meu porto-seguro e meu amor; que, com tanto carinho respeitou minhas limitações de
presença, atenção e afeto; e que não mediu esforços para se fazer presente mesmo há 700km.
Patentes: o regime internacional...
7
"Aquele que recebe de mim uma idéia tem aumentada a sua instrução
sem que eu tenha diminuído a minha. Como aquele que acende sua
vela na minha recebe luz sem apagar a minha vela. Que as idéias
passem livremente de uns aos outros no planeta, para a instrução
moral e mútua dos homens e a melhoria de sua condição, parece ter
sido algo peculiar e benevolentemente desenhado pela natureza ao
criá-las, como o fogo, expansível no espaço, sem diminuir sua
densidade em nenhum ponto."
Thomas Jefferson (1743 - 1826), presidente dos Estados Unidos de 1801 a 1809
Cecília Megali Ogata
8
Resumo:
A temática central deste trabalho é o estudo das patentes como mecanismo de proteção à
propriedade intelectual. Procura-se destacar, particularmente, a sua importância como
mecanismo de proteção e valorização dos ativos intangíveis/intelectuais das empresas
transnacionais na nova ordem econômica internacional.
Para isso, realizou-se uma revisão
bibliográfica do processo histórico de criação do mecanismo de proteção patentária, das
teorias que influenciaram sua instituição e dos mecanismos que viabilizam sua aplicabilidade.
Estuda-se também o desenvolvimento e a consolidação do atual regime internacional de
patentes, desde o século XIV, bem como se faz uma avaliação crítica do processo por meio do
qual o instituto da patente se transformou de mecanismo de incentivo à inovação em
mecanismo de garantia e reforço do monopólio do conhecimento por parte das grandes
corporações. E, por fim, por meio do estudo da importância que este mecanismo tem
adquirido para as empresas transnacionais, analisa-se seu uso crescente, não apenas como
forma de proteção e estímulo ao inventor, mas também como forma de obtenção de garantias
de vantagens competitivas pelas empresas inovadoras.
Plavras-chave; patente, propriedade intelectual, TRIPS, empresas transnacionais, vantagem
competitiva, conhecimento, globalização, bens imateriais, inovação, competitividade
Patentes: o regime internacional...
9
Abstract:
The main objective of this work is the study of the patent as a mechanism of protection to the
intellectual property. It is, particularly, tried to detach its importance as a mechanism of
protection and evaluation of the intangibles/ intellectual assets of the transnational firms in the
new international economic order. Thus, it was made one bibliographical revision of the
historical process about the creation of the patent protection’s mechanism, the theories that
influenced its institution and the mechanisms that made available its application. It is also
studied the development and consolidation of the actual international regime of patents, since
14th century, as well as, it is made a critic analysis about the process through which the patent
changed from a mechanism to incentivize innovation to a way of maintain and reinforce
monopoly of knowledge by the huge corporations. Finally, through a study of the importance
that this mechanism is acquiring to transnational firms, it is analyzed its increasing use not
only as a way to promote protection and stimulus to the creator, but also as way to obtain
guarantees of competitive advantages by the innovators firms.
Key-words: patent, intellectual property, TRIPS, transnational firms, competitive advantage,
knowledge, globalization, immaterial goods, innovation, competitiveness.
Cecília Megali Ogata
10
Abreviaturas e siglas:
ALÇA – Área de Livre Comércio entre as Américas
ARIPO - Convenção Eurasiana de Patentes e a Organização Regional Africana de
Propriedade Industrial
AUTM - Associção da Universidade de Administração Tecnológica (Association of
University Technology Managers)
BIRD – Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento
BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento
CEDIN - Centro de Documentação e Informação Tecnológica
DIT – Divisão Internacional do Trabalho
DPI – Direito de Propriedade Intelectual
EMBRAPA – Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária
EPO – Escritório Europeu de Patentes (European Patent Office)
EUA – Estados Unidos
FAPESP - Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo
FIOCRUZ – Fundação Oswaldo Cruz
FMI – Fundo Monetário Internacional
GATT - Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio
IED – Investimento Externo Direto
INPI - Instituto Nacional de Propriedade Industrial
IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
MIT – Instituto de Tecnologia de Massashusetts (Massachusetts Institute of Tecnology )
NOEI - Nova Ordem Econômica Internacional
OCDE – Organização para Cooperação Econômica e Desenvolvimento
ODM – Design Original de Manufatura (Original Design Manufacturing)
OMC – Organização Mundial do Comércio
OMPI - Organização Mundial da Propriedade Intelectual
ONG – Organizações Não-Governamentais
PCT - Tratado de Cooperação de Patentes
P&D – Pesquisa e Desenvolvimento
PI – Propriedade Intelectual
PMDR – Países de Menor Desenvolvimento Relativo
PIB – Produto Interno Bruto
PNB – Produto Nacional Bruto
PRONEX - Programa de Apoio aos Núcleos de Excelência do CNPq
SNPC - Serviço Nacional de Proteção de Cultivares
TAFTA – Associação de Livre Comércio Transatrântico (TransAtlantic Free Trade
Association)
TNC – Empresas Transnacionais
TRIPS –Acordo sobre Propriedade Intelectual Relacionada ao Comércio (Trade Related
Intelectual Property Right)
UFRJ – Universidade Federal do Rio de Janeiro
UPOV – União para Proteção de Novas Variedades Vegetais
UNCTAD – Conferência das Nações Unidas para Comércio e Desenvolvimento
USP – Universidade de São Paulo
USTR – Representante do Comércio dos Estados Unidos (United States Trade
Representative)
Patentes: o regime internacional...
11
Sumário:
Introdução .................................................................................................................. 12
1. O Conhecimento e a Inovação: as grandes riquezas do novo século ................ 16
1.a – Conceitos ................................................................................................ 18
1.a.a – Conhecimento
1.a.b – Informação
1.a.c – Inovação e Invenção
1.b – A globalização ........................................................................................ 24
1.b.a – Evolução, conceitos e características
1.b.b – A economia pós-1970
1.c – A Era da Informação/ Conhecimento e a economia gerada por bens não materiais
.......................................................................................................................... 35
2. Patentes: proteção ao conhecimento e à inovação ........................................ 42
2.a – Introdução: Propriedade Intelectual (definição e teorias) ............................... 43
2.b–Patentes .................................................................................................... 50
2.b.a –Histórico do regime Internacional – da Conveção de Paris ao TRIPS
2.b.b – Comentários e críticas da evolução do sistema
2.c –Direito das patentes ................................................................................. 62
2.c.a – Legislação e Órgãos Nacionais
2.c.b – Legislação e Órgãos Internacionais
2.d – Paradoxo das patentes: desenvolvimento? ............................................. ......72
2.e – O valor econômico das patentes ................................................................. 80
3. As transnacionais e as patentes: o grande valor da inovação ....................... 82
3.a – As empresas Transnacionais ................................................................... 84
3.a.a – Origem e evolução: outro ator internacional
3.a.b - Funcionamento e poderio econômico
3.b – Pesquisa & Desenvolvimento ................................................................. 95
3.b.a – O que é e pra que serve P&D
3.b.b – Concentração ou não?
3.c - A importância das patentes para as transnacionais ...................................... 104
Considerações finais ................................................................................................ 116
Referências ............................................................................................................... 120
Bibliografia Consultada .......................................................................................... 124
Cecília Megali Ogata
12
Introdução:
A busca incessante de formas mais eficientes e eficazes para atender às crescentes e
potencialmente infinitas necessidades sociais da humanidade frente à escassez dos recursos
econômicos disponíveis tem sido um poderoso estímulo ao desenvolvimento da técnica, à
quebra de paradigmas tecnológicos e à descoberta e introdução de novas tecnologias e
sistemas de produção. Assim tem sido, desde a descoberta do fogo, da invenção da roda, do
desenvolvimento da agricultura, da máquina a vapor, até os modernos e avançados
computadores. Essas rupturas, independente da área em que acontecem e dos objetos que
envolvem, sempre se processam por meio de inovações, tanto materiais, quanto no campo de
serviços e processos.
Para o economista austríaco Joseph Alois Shumpeter (1883-1950), essas mudanças se
dão em ciclos, que envolvem a criação, a aplicação, a maturação, a difusão e um posterior
declínio das inovações, que possibilitam a evolução das relações econômicas e sociais. Como
se a cada nova inovação a sociedade “pulasse” para um novo patamar, o qual terá seu pico e
seu declínio, mas nunca uma decaída ao que era antes dessa dada inovação.
Embora alguns pontos e argumentos da “Teoria dos ciclos econômicos” de Shumpeter
possam ser questionados, até os dias atuais (agora parece estar mais do que nunca!) são as
inovações poderosas ferramentas de desenvolvimento para o mundo, mas também para
engessar o subdesenvolvimento por dar ensejo a formas mais violentas de competição. Isso
porque, desde a Primeira Revolução Industrial, quando foram inventadas a máquina a vapor e
a locomotiva, as inovações têm sido utilizadas como importantes fontes de vantagem
competitiva e criação de monopólios. Por exemplo, o caso da Inglaterra, que ao lançar todas
essas inovações, conseguiu alcançar o posto de potência hegemônica da época, sendo a
principal fornecedora mundial de manufaturas, enquanto os demais países apenas forneciam
matéria-prima.
Atualmente, o fenômeno da globalização, que propicia uma maior interdependência de
todas as áreas da atividade humana e de qualquer lugar do mundo, com a crescente
intensificação das trocas comerciais, com a flexibilização da produção, com a rapidez das
comunicações, com o “encurtamento” das distâncias e a facilidade dos transportes, fez com
que o conhecimento, as informações e a inovação adquirissem um crescente papel de destaque
nas estratégias competitivas das empresas e das nações. Isso fez com que muitos estudiosos
atribuíssem ao período recente que começa na última década do século XX de o nome de “Era
da Informação e do Conhecimento”.
Patentes: o regime internacional...
13
Devido a isso, a questão da Propriedade Intelectual tem ganhado cada vez mais espaço
nas discussões acadêmicas, econômicas, jurídicas, políticas e internacionais. Na medida em
que as inovações e o conhecimento, bens imateriais, se tornam elementos chave no ambiente
global muito competitivo, proteger e, mais do que isso, possuí-las torna-se fundamental para
pessoas, empresas e países.
Dentro desse panorama merece destaque a Patente, uma das formas de propriedade
intelectual caracterizada por ser um título de propriedade temporária, outorgado pelo Estado a
criadores e inventores de novos produtos, processos e aperfeiçoamentos que tenham aplicação
industrial. A busca pela carta-patente (nome dado ao documento que comprova a patente de
dado invento) tem se tornado cada vez mais importante para garantir vantagens competitivas e
o número de patentes registradas tem sido um indicador cada vez mais importante para medir
o sucesso de empresas e países na competição global por novos mercados
Contudo, associada à importância cada vez maior das inovações nas estratégias de
competição, verificam-se mudanças importantes de conotação para as patentes, que de
instrumento inicialmente pensado para incentivar a inovação e tornar públicas as invenções,
transformou-se paulatinamente em mecanismo para garantir monopólio do conhecimento para
as grandes corporações. A análise da evolução e construção do Regime Internacional de
Propriedade Intelectual e das Patentes revela que essa instituição não é tão recente, pois a
primeira lei de patentes data do século XIV. Como já mencionado, tanto a patente, quanto as
demais formas de proteção intelectual, como os direitos autorais, foram instituídos para
servirem de incentivo aos inventores, protegendo-os da cópia e garantindo retorno financeiro
ao seu esforço inventivo e como um meio de propiciar a difusão dessas inovações, e de tornálas públicas. Ou seja, em contrapartida ao direito de uso e posse exclusiva durante certo
período concedido ao inventor, esse deveria “contar”, explicar para sociedade como fez e
como chegou a tal invento. No entanto, à medida que o conhecimento tornou-se o principal
ativo das empresas e as inovações, a forma mais importante de competição, o instituto da
patente tornou-se mais uma forma de proteção da propriedade do que instrumento para
incentivar a difusão e incentivo a inovações.
A partir da década de 1980, consoante a este novo papel das patentes, o fórum mais
relevante para a discussão das regras internacionais sobre o tema deixa de ser a OMPI
(Organização Mundial de Propriedade Intelectual), criada em 1967 com a função exclusiva
de gerir o assunto e seus temas correlatos e, principalmente por pressão dos Estados Unidos,
passa a ser a Organização Mundial do Comércio (OMC) onde é estabelecido no campo
Cecília Megali Ogata
14
multilateral o Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados
com o Comércio (Trips), em 1994, para ser tratado também na esfera comercial.
Assim, como nesse caso, em que fica claro uma “imposição” e manipulação do
assunto pela potência hegemônica americana, o estudo da construção desse regime deixa claro
uma forte contradição entre o que pregam os países desenvolvidos – o liberalismo – para o
que de fato fizeram e fazem. Praticamente todos os países hoje na vanguarda do
desenvolvimento tecnológico e industrial, no início de tal processo agiram de maneira
protecionista e não adotaram ou assinaram tratados internacionais na área de direito de
patentes, foi assim com Inglaterra, Estados Unidos, Japão e Suíça, entre outros. Hoje, porém,
esses mesmos países insistem para que os países em desenvolvimento e de menor
desenvolvimento relativo adotem regras cada vez mais rígidas sobre o assunto.
Essa pressão pela adoção de tais regras parte também de outro ator que tem se tornado
cada vez mais importante nas relações internacionais: as empresas transnacionais. Essas
empresas se tornaram enormes conglomerados que se espalham rapidamente pelo mundo,
reestruturando e adotando formas cada vez mais flexíveis de produção, de modo a haver
fábricas especializadas apenas na confecção de determinado componente, outras penas na
montagem do produto final e ainda outras que lidam apenas com a distribuição. Para alguns
autores esses atores transnacionais estão inclusive suplantando o poder dos Estados. Como
veremos adiante, essa idéia não parece ser totalmente verdade: o papel estatal ainda é muito
relevante para as relações internacionais, embora se deva concordar que algumas de suas
esferas tradicionais de atuação estão realmente sendo invadidas por essas grandes empresas.
Essas empresas transnacionais detêm hoje uma enorme gama de recursos em suas
mãos, controlam a produção global tanto de manufaturas, quanto de matérias-primas, mas seu
poderio se estende também para o setor de serviços, não apenas de bens. Sua atuação tem
influenciado cada vez mais as políticas nacionais e internacionais – como é o caso das
patentes. De acordo com dados do Banco Mundial (2008), são essas empresas as grandes
responsáveis pela geração de inovações e pelo desenvolvimento de Pesquisa e
Desenvolvimento (P&D) ao redor do globo, embora nos países em desenvolvimento e de
menor desenvolvimento relativo o incentivo à pesquisa e os investimentos em educação sejam
majoritariamente estatais e mesmo nos países ricos ainda grande parte das atividades de P&D
no setor privado é sustentado com verbas e contratos do governo, essa posição de
precursores de inovações faz com que um regime internacional de patentes e propriedade
intelectual mais rígido seja, de maneira geral, de grande interesse das transnacionais, a fim de
Patentes: o regime internacional...
15
manterem seu principal ativo e responsável pela maior parcela de vantagem competitiva
permaneça sob seu controle.
Desta maneira, as transnacionais, atores fundamentais na Era da Informação e do
Conhecimento, também se posicionam claramente a favor de acordos como TRIPS, que, ao
garantirem um direito de propriedade da patente por 20 anos, propicia um verdadeiro
monopólio sobre a inovação, visto que, no mundo globalizado atual, as tecnologias são
modificadas e aprimoradas a cada dia.
Esse trabalho se dedica ao estudo do regime internacional de propriedade intelectual
de forma geral, mas foca-se no seu tipo específico, a patente, por entender que é através dessa
que os novos atores internacionais, as transnacionais, conseguem extrair boa parte de sua
vantagem competitiva. Tem-se como objetivo principal uma análise crítica da construção do
regime, suas contradições e implicações, mas também se pretende, diante dessa análise prévia,
entender melhor como as empresas transnacionais se utilizam desse recurso para manter suas
vantagens competitivas, fato este que evidencia a mudança de caráter por que passou o regime
e o próprio instituto da patente.
Esse texto além de tentar inovar na forma como procura demonstrar que as patentes
são utilizadas como instrumentos de competitividade (faz-se isso por meio do estudo da
importância das patentes para transnacionais), traz também uma contextualização muito clara
acerca das modificações do próprio ambiente internacional e econômico que estimularam e
propiciaram essas mudanças. Por fim, acredita-se ser inovador no sentido de permitir a junção
de várias disciplinas para sua consecução: direito, economia, história, filosofia; o que é uma
característica muito destacada do curso ao qual esse trabalho se dedica: Relações
Internacionais.
Finalmente, para se alcançar tais objetivos acima mencionados, o trabalho está
dividido em três capítulos: no primeiro, procurou-se contextualizar o texto, apresentando ao
leitor qual o “pano de fundo” em que essa temática se desenvolveu e se insere, de onde
vieram os estímulos para se pensar nessa temática. No segundo, aborda-se a questão
propriamente dita da patente, passando por sua definição, as legislações nacionais e
internacionais que a regulam, as teorias que influenciaram a construção do regime, a história
da formação de tal regime e elaboram-se algumas críticas a cerca desta construção. Termina
com uma análise sobre as empresas transnacionais e a importância que as patentes adquiriram
para estas na etapa atual da globalização.
Cecília Megali Ogata
16
1. O Conhecimento e a Inovação: as grandes riquezas do novo século
É muito comum se ouvir que no século XXI ocorreu uma grande mudança de
paradigmas. Mas o que isso realmente significa? Ao final do século XX e início do XXI
alguns modelos e padrões econômicos, políticos, sociais e tecnológicos foram se alternando e
alguns de maneira drástica como é o caso das telecomunicações. A essas alterações na
atividade humana deu-se o nome de “globalização”, principalmente pela marcante redução
das fronteiras físicas entre a circulação de pessoas, mercadorias e informações, proporcionada
principalmente, pelos avanços nas áreas de comunicação e transportes. Mudou-se de um
capitalismo marcado pela máquina a vapor, pelo motor de combustão interna, pelo telégrafo,
eletricidade, eletromagnetismo, entre outros (século XX), para um capitalismo mais dinâmico,
no qual as modificações e as evoluções provêm de recursos intangíveis, ou seja, das
inovações. É o conhecimento a chave para maior lucratividade, produtividade e agilidade.
Nesse cenário evoluem também as grandes empresas transnacionais, que ocupam importante
papel no desenvolvimento, mas, sobretudo, na aplicação, dos conhecimentos; de maneira a
tornar possível o consumo de algo imaterial, o que as torna atores bastantes relevantes no
sistema internacional.
A crescente internacionalização dos mais diversos fatores, serviços e produtos fez
com que a importância das distâncias geográficas se reduzisse e com que o acesso a diferentes
formas de relacionamento social, produção e organização se tornasse possível a um número
cada vez maior de pessoas, nos mais diversos lugares do globo. A esse adensamento de
interdependências, com inúmeras conseqüências na organização dos espaços nacionais e
internacionais dá-se o nome de Globalização.
Contudo, é fundamental que se tenha em mente que tal fenômeno é, na realidade, um
processo, ou seja, não surgiu de repente nem tem um fim estabelecido, mas decorre de outros
fatos e transformações geradas do passado. Para alguns autores seus primeiros esboços
remontam a Rota da Seda, no período anterior a era cristã. Seria um erro, contudo, deduzir
desse fato que o presente e o futuro são meras projeções das tendências passadas, pois, se
assim fosse, nunca haveria inovações radicais ou revoluções tecnológicas, pois estas últimas
caracterizam-se exatamente pela quebra de paradigmas, pela descontinuidade em relação às
tendências do passado.
Patentes: o regime internacional...
17
E, como processo, ela está em constante mutação e reavaliação. Tendo isso em mente,
Joseph S. Nye Júnior (2002), co-fundador da Teoria Neoliberal de Relações Internacionais,
argumenta que a Globalização do século XXI é mais densa, veloz e incerta, isso,
principalmente, pelo avanço da Revolução da Informação.
Também chamada de 3ª Revolução Industrial, a Revolução da Informação é marcada
pelo grande desenvolvimento de tecnologias, sobretudo nas áreas de novos materiais,
biotecnologia e microeletrônica; por novas formas de gestão organizacional, que destacam o
“fator humano” enquanto gerador de vantagens competitivas; por uma automação flexível,
que permite a transnacionalização de diversos setores produtivos de uma mesma empresa para
diversos países; pela volatilidade dos fluxos financeiros; pelo uso intenso da internet e demais
canais de comunicação; e pela crescente importância do conhecimento e da informação em
todas esferas da sociedade, especialmente a econômica. Para Nye (2002, p.43) a grande
característica dessa Revolução não é a rapidez da difusão das informações e comunicações,
“The crucial change is the enormous reduction in the cost of transmitting information. [...]
The result is an explosion of information, of which documents are a tiny fraction.”.
Tais alterações geradas por essa Revolução culminaram no que hoje se chama de “Era
da Informação e do Conhecimento”: ou seja, um período em que as maiores riquezas e
vantagens se concentram em bens não táteis. Embora, a “[...] inteligência e a competência
humana sempre estiveram no cerne do desenvolvimento econômico de qualquer sociedade.”
(LASTRES; FERRAZ, 1999, p.28), agora, mais do que nunca, são suas capacidades de
inovar, inventar, aplicar e desenvolver novas técnicas, que as organizações, os Estados e os
indivíduos extrairão suas vantagens competitivas.
A “Economia do Conhecimento” deve-se então ao fato de que os bens de maiores
valores agregados hoje não são, em sua maioria, físicos, mas, sim, intangíveis. No capitalismo
do período “fordista” 80% do valor das empresas correspondiam às suas edificações,
instalações e equipamentos e 20% pelos seus bens intangíveis. No capitalismo do século XXI
essa proporção é inversa. As inovações tecnológicas, de produtos e processos, bem como
outros bens intangíveis, principalmente as marcas, representam a parcela mais expressiva do
patrimônio das empresas. Seguramente a marca “Coca-Cola” ou “Google” tem um valor de
mercado muito superior às instalações físicas dessas empresas.
Desta maneira, “No novo padrão de acumulação nota-se a crescente intensidade e
complexidade dos conhecimentos desenvolvidos e sua acelerada incorporação nos bens e
serviços produzidos e comercializados.” (LASTRES; CASSIOLATO, 2003, p.2).
Cecília Megali Ogata
18
Portanto, nessa nova configuração da economia mundial, fica evidente a importância
das inovações enquanto fatores-chaves para o processo de desenvolvimento (algo já presente
na tória de Schumpeter (1984) sobre a “Destruição Criativa”, que será trabalhada mais a
frente) e de obtenção de vantagens em um ambiente cada vez mais competitivo. Quanto ao
conhecimento, além de ser fonte para geração de inovações, é uma ferramenta cada vez mais
essencial: num mundo tão incerto, são os conhecimentos humanos que garantirão melhores
estratégias de ação e adaptação. Ademais, uma vez codificado ele pode se tornar um “produto
tangível” e assim ser comercializado mais facilmente.
Diante disso, o capítulo que segue se dedica a uma melhor explanação sobre a Era da
Informação e do Conhecimento, iniciando com uma breve definição dos termos mais
utilizados nessa parte que podem gerar confusão ao leitor: Conhecimento, Informação,
Inovação e Invenção. A segunda seção do capítulo se dedica a uma abordagem mais detalhada
sobre a Globalização e seus reflexos atuais, enfatizando o período econômico de 1970,
quando se “inicia” a Revolução da Informação, aos dias atuais. E, finalmente, para encerrar
essa primeira parte do trabalho, uma reflexão sobre o cenário dessa nova era no que tange o
novo paradigma “tecno-científico-econômico” e suas conseqüências.
1.a - Conceitos
Procurou-se dedicar a primeira parte desse trabalho a uma breve explanação sobre os
conceitos das palavras-chaves que, por serem amplamente utilizadas em textos como
sinônimas, poderiam causar dificuldade e imprecisão na compreensão do restante do trabalho,
são elas: Conhecimento, Informação, Inovação e Invenção.
1.a.a – Conhecimento
Já por volta do século XIV a.C., na civilização Celta1, o conhecimento era tema de
debates, como afirmam Carbone, Brandão, Leite e Vilhena no livro “Gestão Por
Competências - E Gestão do Conhecimento”. Para os celtas, não havia distinção entre o
“saber” e o “agir”, isto é, conhecimento e ação estavam interligados, integrados.
1
Os Celtas foram o primeiro povo civilizado da Europa. Chegaram neste continente junto com a primeira onda
de colonização ainda em 4.000 AC. Destacaram-se dos outros povos que chegaram na mesma época porque
acreditavam em uma terra prometida e iam em busca dela. Em 1800 AC já tinham a sua cultura e o território
totalmente estabelecidos, isso enquanto os gregos e os romanos nem sonhavam em nascer. Ocupavam a região
da Alemanha, Bélgica, Holanda, Dinamarca, França e Inglaterra e eram um povo com muita ciência unida a
muita mística. Disponível em: http://www.historiadomundo.com.br/celta/civilizacao-celta/
Patentes: o regime internacional...
19
Contudo, na Grécia antiga, desde o século VII a.C., filósofos pré-socráticos separavam
a “vida da cidade” da “vida da casa”. Nesse modelo de organização, que distingue a vida
particular da pública, é na polis, que os conhecimentos são levados ao alcance dos que a
frequentam, sujeitos à crítica e controvérsias.
Platão, ainda dentro desse contexto, vai abordar em sua obra o conhecimento como
“crença verdadeira justificada”. Mas, a morte de Sócrates, por volta do século IV a.C.,
colocou em crise essa concepção uma vez que o próprio Sócrates não conseguiu persuadir os
juízes a respeito de sua inocência. Então Platão e demais filósofos socráticos abandonaram a
pólis e a vida política. A partir daí adotaram a separação do pensamento da ação humana,
sendo que a primeira é superior à segunda. Ao afastarem-se da vida política surge a idéia da
República de Platão, pois somente eles – filósofos que abandonaram a pólis – estariam aptos
para governar. Nesse sentido, somente era relevante o conhecimento que propiciasse uma vida
boa e justa para todos.
Na era moderna, Santo Agostinho, um dos principais filósofos da era cristã,
desenvolveu o embrião da idéia das “paixões compensatórias”, segundo a qual, em linhas
gerais, um pecado compensaria o efeito negativo de outro pecado. No século XVIII essa idéia
foi retomada por Montesquieu para quem “todos contribuem para o bem-estar geral enquanto
pensam estar trabalhando pelos próprios interesses” (CARBONE, et al., 2006, p. 23) e
também por Adam Smith na elaboração da sua metáfora da mão invisível que regularia o
mercado sem a necessidade de intervenções governamentais.
Com Karl Marx, já no século XIX, a teoria de valor do trabalho, iniciada com Smith,
foi consolidada, atribuindo ao trabalho o verdadeiro valor da mercadoria. Contudo, ao
contrário do que se possa pensar, o trabalho e esforço físico não superaram a importância do
conhecimento. Com o decorrer dos séculos este foi sendo emancipado das crenças religiosas e
exaltado pelo domínio do homem sobre a natureza. O progresso no desenvolvimento de novas
tecnologias aproximou o conhecimento à prática e à “vida real”, possibilitando que ele hoje se
tornasse não apenas um insumo de produção, mas o insumo. Isso porque é dele que virá a
possibilidade de gerenciar informações tão diversas espalhadas no globo e gerar novos
serviços e bens, o que garantirá ganhos em vantagens competitivas e, por conseguinte, ganhos
econômicos e até mesmo sociais, políticos e culturais.
“Finalmente, a competição que se estabelece não é simplesmente por
participação no mercado, nem depende de um determinado conjunto fixo de
produtos e serviços, mas, sim, por padrões competitivos baseados no
conhecimento. Ou seja, competição por base tecnológica em termos de
Cecília Megali Ogata
20
competências essenciais, que transcende a competição por produtos, e é
alimentada pela geração permanente de inovações, através de processos
dinâmicos, sistêmicos e cognitivos.” (CARBONE, et al., 2006, p.39).
Portanto, para este trabalho o agir e o pensar são diferentes, porém não distantes, são
fatos interligados e intimamente relacionados: ao passo que o segundo estimula o primeiro e
este também propicia novos estímulos ao segundo. Diante disso, adota-se o significado de
Conhecimento como “crença verdadeira justificada”, fruto da mente humana, que, em certos
casos, pode ser codificado em ativos tangíveis; que capacita o homem a interpretar e
correlacionar fatos e assim gerar respostas; e que tem seu desenvolvimento atrelado ao meio
social e às necessidades e experiências humanas: “[...] conjunto de informações reconhecidas
e integradas pela pessoa dentro de um esquema preexistente.” (CARBONE, et al., 2006,
p.80); um processo, que não nasce com o indivíduo nem a ele é dado pelo meio social, mas
depende das associações e interpretações feitas pelo homem dos objetos e da realidade
analisados
Legenda:
Verdade
Crenças
Crenças
Verdadeiras
Crenças
verdadeiras e
justificadas CONHECIMENTO
Figura 1: Conhecimento
Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Conhecimento-Diagrama.png - adaptado pela autora
Patentes: o regime internacional...
21
1.a.b – Informação
Diferentemente do que sugerem alguns autores, este texto não toma como sinônimos
informação e conhecimento. Este já foi definido, cabendo agora a definição daquele a fim de
explicitar a diferença.
Informação é um termo extremamente complexo de ser conceituado, não apenas por
agregar idéias diferentes e até mesmo opostas, mas por se referir a colocações concretas e
abstratas. A primeira significação dada pelo Dicionário da Língua Portuguesa do Prof.
Francisco da Silveira Bueno é a de “a ação de informar; formação ou moldagem da mente ou
do caráter, treinamento, instrução, ensinamento, comunicação de conhecimento instrutivo”.
No entanto, com o fim da Segunda Guerra Mundial, o termo se alastrou para todas as ciências
da comunicação e passou a ser reconhecido como qualquer comunicado, mensagem ou dado
que não têm necessariamente valor intrínseco.
De acordo com o professor e mestre em comunicação, Alexandre Goulart (2004), são
três as teorias que definem tal termo: a Matemática, que a toma como redução de incertezas
dentro de um sistema estatístico; a da Forma, que toma a informação como um ato de dar
forma, possibilitar a percepção; e da Cognição que liga informação à consciência humana,
como são projetadas e organizadas pelo homem a fim de que gerem conhecimentos. Para este
trabalho todas as três definições não são excludentes entre si, mas complementares e passíveis
de uso conjunto.
De acordo com Joseph S.Nye Jr. (2002) há três dimensões da informação: como
dados, notícias e estatísticas; como vantagem em situações de competição; e como item
estratégico. O autor consegue estabelecer esses significados ao fazer uma leitura clara do
cenário mundial, como veremos mais a diante.
Michael Dertouzos é mais pontual em sua definição de informação como: “A hora
do dia é informação. [...] O conteúdo de um memorando datilografado é informação. [...]
Cantos dos pássaros e discursos presidenciais são informação. [...] Todos os 20 mil vídeos e
filmes comerciais são informação, também.” (1997, p.81). Esse autor ainda destaca três
“pontos-chave da natureza da informação” (1997. p.82): que os homens lidam com a
informação através de três níveis, sendo o primeiro a captação pelos sentidos, o segundo, o
processamento pelo sistema nervoso e a expressão, e o terceiro, externalizando-a; que ela
pode desempenhar papel substantivo ou verbal; e que a informação não é igual ao canal que a
transporta, hábito que se tornou muito comum na Era da Informação e do Conhecimento.
Cecília Megali Ogata
22
Portanto, Dertouzo usa, majoritariamente, a primeira dimensão da informação de
Nye. Este trabalho também adota a noção de Informação enquanto dados, códigos e símbolos
disponíveis nos mais diversos ambientes e provenientes das mais diversas formas, mas é
através da conotação de Informação como meio estratégico e de ganhos de vantagens que
complementará sua análise quanto a importância dessa nos dias atuais.
1.a.c – Inovação e Invenção
Sempre que se fala de Inovação fala-se também de Joseph Alois Shumpeter,
economista austríaco, que nas suas obras sobre o desenvolvimento e os ciclos econômicos
sempre destacou a importância da inovação e do empresário empreendedor. Defende que “É,
contudo, o produtor que, via de regra, inicia a mudança econômica, e os consumidores, se
necessário, são por ele ‘educados’; eles são, por assim dizer, ensinados a desejar novas coisas,
ou coisas que diferem de alguma forma daquelas que têm o hábito de consumir.” (1982, p.48).
O processo de “Destruição Criativa” seria a substituição de antigos produtos e hábitos
de consumo por novos: “[...] a estrutura econômica, a partir de dentro, incessantemente
destruindo a velha, incessantemente criando uma nova. Esse processo de Destruição Criativa
é o fato essencial a cerca do capitalismo. É nisso que consiste o capitalismo e é aí que têm de
viver todas as empresas capitalistas.” (1984, p.113). Mas, uma vez que um produto novo seja
aceito e consumido pelos consumidores, ele passa a ser copiado por outros produtores, não
inovadores, o que gera uma onda de investimentos na economia. Esse seria o período de
prosperidade dos ciclos econômicos. Porém, à medida que tais inovações ou modificações são
absorvidas e generalizadas pela sociedade, a taxa de crescimento diminui e, também, os
investimentos e o nível de emprego. Tem-se então o período de recessão dos ciclos.
Para Schumpeter o caráter empreendedorista do empresário está ligado a sua intuição,
“da capacidade de ver as coisas de um modo que depois prove ser correto, mesmo que não
possa ser estabelecido no momento [...]” (1982, p. 60) e somente podem ser considerados
empresários aqueles que efetivamente levam a cabo novas combinações. O desenvolvimento
desses novos bens e métodos também explica o lucro empresarial, pois ele é fruto do
excedente que essa inovação gera, ao ser comercializado.
Para ele, inovação não implica invenção:
“Enquanto não forem levadas à prática, as invenções são economicamente
irrelevantes. E levar a efeito qualquer melhoramento é uma tarefa
inteiramente diferente da sua invenção, e uma tarefa que requer tipos de
aptidão inteiramente diferentes. [...]Além disso, as inovações, cuja
Patentes: o regime internacional...
23
realização é a função dos empresários, não precisam necessariamente ser
invenções. Não é aconselhável, portanto, e pode ser completamente
enganado, enfatizar o elemento invenção como fazem, tantos autores.”
(1982, p. 62)
A palavra Inovação é derivada do termo em latim innovatio (algo criado novo) e se
refere à novidade, ao desenvolvimento de novos processos, produtos ou serviços em resposta
antecipada a necessidades e expectativas de clientes, mas, ao contrário do que pode parecer, e
como afirma Schumpeter, ela não implica invenção, pois esta é anterior àquela. A passagem
da invenção para inovação se dá à medida que conhecimentos e habilidades formatam novos
projetos e novos produtos, envolvendo a seleção e a combinação de novas tecnologias
dominadas e de última geração para definirem plantas e viabilizarem a produção de protótipos
em escala econômica.
Portanto, entende-se, resumidamente, que o conhecimento é fruto do trabalho da
mente humana que correlaciona observações armazenadas com fatos recentes e que propicia
respostas às questões da realidade, enquanto a informação é a codificação de dado
conhecimento humano, que está disponível no exterior nos mais diversos meios e formas; e a
inovação é a capacidade humana de criar, a partir dos seus conhecimentos e das informações
coletadas, novas maneiras e objetos que sejam dotados de certa vantagem perante aos já
existentes ou que introduzam algo totalmente inédito.
Por fim, é importante destacar que não é de intenção deste trabalho aprofundar, tão
pouco esgotar, as questões acerca das definições desses termos. Eles foram aqui brevemente
expostos a fim de facilitar o trato com os mesmos tanto para a autora, como para os leitores,
durante o desenvolvimento da questão central deste texto.
1.b – A globalização
Nesta segunda parte do primeiro capítulo, abordar-se-á o pano de fundo sobre o qual
se desenvolve este trabalho. Essa prévia se faz necessária porque localizará o leitor quanto ao
contexto mais geral em que se insere a questão das patentes e também das empresas
transnacionais.
Cecília Megali Ogata
24
1.b.a – Evolução, conceito e características
Ao se falar em “globalização” fica claro que se trata de “algo” em escala global, que
se manifesta no globo e, assim, que envolve relações entre diferentes lugares, povos e nações.
Portanto, antes de se definir o termo, será feita uma breve recapitulação histórica, enfocando
acontecimentos influenciadores e geradores da globalização atual.
Segundo alguns historiadores pode-se falar em relações exteriores2 já na antiguidade
grega, pois este povo estava dividido em cidades-estados independentes que se relacionavam
entre si e com outras civilizações. Também os romanos estabeleceram relação com outros
povos, contudo, neste caso, a imensa maioria dessas relações era de dominação, portanto,
embora houvesse intercâmbios materiais e culturais, acabavam por se constituírem no âmbito
interno do império.
Historiadores como, Fernand Braudel, Immanuel Wallerstein e Janet L. Abu-Lughod,
apontam, que ainda no período antes de Cristo, a Rota da Seda (antigo emaranhado de
caminhos entre a Ásia e a Europa, que passava pelo Império Mongol, parte da Índia e da
China e do que hoje se conhece como Oriente Médio.)3 como o grande exemplo de que as
relações exteriores e a circulação de mercadorias e informações não se iniciam apenas na
Idade Moderna.
Porém, como se deve ter notado, esses povos citados, ainda que expandindo suas
atividades e interesses além fronteiras, não alcançavam uma escala propriamente dita global,
pelo contrário estavam limitadas ao espaço regional, à extensão terrestre do seu domínio.
Assim, o mais comum é que se refira à Idade Média como o ponto de partida da Globalização,
representada tanto pelas trocas comerciais das cidades de Gênova, Pisa e Veneza, do ocidente
com o oriente, como, principalmente, pela disseminação da fé cristã pela Igreja Católica – “a
Senhora Feudal”4.
A professora Aldaíza Sposati em seu artigo “Globalização: um novo e velho
processo” parte integrante do livro “Desafios da Globalização” (1997, p. 44 e 45), reitera essa
idéia: “A globalização não é necessariamente uma modernização ou uma idéia “pós-queda do
muro de Berlim”. A cristianização das sociedades foi um primeiro grande movimento na
2
No caso, não se utiliza o termo “relações internacionais”, visto que não havia ainda sido estabelecido e
formalizado o que seria um Estado, algo que só ocorre em 1648 com a Paz de Westfália.
3
Tal sistema surge das trocas comerciais entre o ocidente e o oriente via terrestre, como a Rota da Seda, e mais
tarde também por via marítima.
4
Este termo é usado pelos historiadores para se referirem a Igreja Católica Medieval, pois: “Calcula-se que a
Igreja Católica tenha chegado a controlar um terço das terras cultiváveis da Europa Ocidental. Era, portanto, uma
grande "senhora feudal" numa época em que a terra constituía a base de riqueza da sociedade.” Disponível em:
http://www.historiadomundo.com.br/idade-media/a-igreja-medieval/
Patentes: o regime internacional...
25
direção da globalização. No caso, sem dúvida, pela expansão da fé cristã. Este Movimento,
legitimando a conquista de territórios e riquezas para a Igreja e a Monarquia, expandiu a
figura de Cristo para muito além do seu berço natal, ou do circuito da cultura judaica”.
Com o advento das Grandes Navegações, as trocas comerciais e o contato entre
diferentes povos aumentaram, possibilitando ao homem o deslocamento por outros meios, não
apenas por terra. Neste contexto, as Colonizações são uma grande ilustração de como o
mundo se tornava cada vez mais interligado, pois atingiram povos que nunca antes haviam
entrado em contato com outros.
Contudo, é na Revolução Industrial do século XVIII que há uma acelerada evolução
do processo de produção e do intercâmbio de produtos e um estreitamento de relações, tanto
pelo desenvolvimento da máquina a vapor, quanto pelo crescente poderio da burguesia,
detentora do capital. A Inglaterra foi a grande pioneira dessa revolução, investindo no
desenvolvimento de novas tecnologias que viabilizassem a manutenção do seu modelo
capitalista de acumulação. Além das vantagens de um solo rico em carvão e ferro, dispunha
de mão-de-obra (fruto da política de Cercamento de Terras 1), de uma burguesia disposta a
financiar esse desenvolvimento e da aplicação de uma política econômica liberal, em que o
Estado interferia o mínimo possível na economia.Esta nova época regeu-se pelos interesses
das indústrias e das finanças e não mais pelas motivações dinástico-mercantis. O mundo, não
mais o território, ou o povo vizinho, ou a colônia, passou a ser visto como uma referência para
obtenção de mercados, locais de investimento e fontes de matérias-prima.
No século seguinte a ampliação dos espaços de lucro conduziu à globalização em
moldes mais próximos do que se vê hoje. A Segunda Revolução Industrial gerou tecnologias
que desenvolveram o uso da eletricidade, automóvel, telefone, televisor, rádio, avião, o que
aproximou ainda mais continentes e interesses. Mas, assim como a comunicação, a economia
e até mesmo a cultura atingiram escalas globais, também as guerras se tornaram confrontos
mundiais.
Nesse contexto de rivalidades cada vez mais crescentes advindas direta ou
indiretamente de desdobramentos dessa globalização, ocorrem a Primeira e Segunda Guerras
Mundiais. Na primeira, de 1914 a 1918, a Tríplice Entente (liderada pelo Império Britânico,
França, Império Russo - até 1917- e Estados Unidos - a partir de 1917) derrotou a Tríplice
Aliança (liderada pelo Império Alemão, Império Austro-Húngaro e Império Turco-Otomano),
e causou o colapso de quatro impérios, mudando de forma radical o mapa geo-político da
Europa e do Oriente Médio. A guerra química e o bombardeamento aéreo foram utilizados
Cecília Megali Ogata
26
pela primeira vez em massa nessa guerra. A segunda, iniciada em 1939, opôs os Aliados
(França, Reino Unido, União Soviética e Estados Unidos) às Potências do Eixo (Alemanha,
Itália e Japão), e culminou com a vitória dos primeiros em 1945. O fim da guerra é marcado
pelo lançamento de duas bombas atômicas sobre o Japão.
Cabe aqui destacar um fato importante que explicita o nível de interligação mundial
que já se tinha: uma das causas da Segunda Guerra foi o abalo que sofreu a economia
internacional com a Crise de 29, quando os países europeus se reestabeleceram após as
devastações da Primeira Guerra e assim reduziram suas importações americanas, gerando um
excedente de produção, que, por sua vez, ocasionou a queda dos preços, da produção, dos
empregos, dos lucros e do valor das ações, sucessivamente, em todo mundo. Ou seja, a
“interconecção” econômica do mundo era patente, a qual também estreitava os laços dos
demais setores da sociedade.
No pós – 45 observa-se um intenso movimento no sentido de independência de antigas
colônias, pincipalmente, na África e Ásia, o que elevou ainda mais o número de atores
internacionais. Neste período, os países europeus passam a atuar como coadjuvantes no
sistema internacional, cabendo aos Estados Unidos e à extinta União Soviética o papel
principal. Estas potências, por meio de suas ideologias excludentes: capitalismo e socialismo,
dividiram o mundo em dois pólos de influência. Esse período conhecido como Guerra Fria,
pelo fato de não ter havido um confrontamento direto5 entre os dois rivais, só termina
definitivamente com a Queda do Muro de Berlim em 1989. Com isso é consagrado o modelo
americano e o liberalismo econômico e a URSS é fragmentada em diversos países e inicia seu
processo de abertura econômica (perestroika) e, posteriormente, política (glasnost).
“The existence of communism limited the geographic range of capitalism;
the end of cold war therefore led to globalization and more rapid spread of
market principles around the whole world. [...]After the Cold War, there
was a detectable trend in the advanced capitalist countries towards a more
economically driven foreign policy.” (COX, 2001, p.141).
O mundo, após a segunda metade do século XX, ingressou em uma etapa de profundas
evoluções no campo tecnológico desencadeada, inclusive pelo revanchismo dos dois blocos,
durante a Guerra Fria. Essas evoluções não se esgotaram com o fim da guerra, pelo contrário,
5
Os confrontos se davam de forma indireta, com apoio militar ou financeiro dos EUA e da ex- URSS aos grupos
internos que se opunham quanto a qual ideologia adotar, como foi a Guerra do Vietnã e da Coréia do Norte.
Patentes: o regime internacional...
27
prosseguiram e prosseguem a passos cada vez maiores. Muitos falam inclusive do surgimento
da Terceira Revolução Industrial ou Tecno-científica, em que se desenvolveram
principalmente os setores de tecnologia da informação e da comunicação, mas que,
diferentemente das Revoluções anteriores, não se limitou a inovar e aprimorar apenas as
atividades industriais que produzissem bens com altíssimo valor agregado, mas também, as
formas de gestão desses organismos. Entretanto, o grande diferencial dessa nova Revolução é
a comercialização cada vez maior de ativos intangíveis, como softwares, por exemplo.
Procurou-se demonstrar que a globalização é “A historical process involving a
fundamental shift or transformation in the spatial scale of human social organization that
links distant communities and expands the reach of power relations across regions and
continents.” (MCGREW, 2001, p.24), ou seja, “A globalização – o crescimento das redes
mundiais de interdependência – é virtualmente tão antiga quanto a história humana. A
novidade é que agora as redes são mais densas, complexas e incluem pessoas de mais regiões
e classes sociais.” (NYE, 2002, p.78).
“By globalization we simply mean the process of increasing
interconnectedness between societies such that events in one part of the
world more and more have effects on peoples and societies far away. A
globalized world is one in which political, economic, cultural and social
events become more and more interconnected, and also one in which they
have more impact. In other words, societies are affected more and more
extensively and more and more deeply by events of other societies.”
(BAYLIS; SMITH, 2001, p.8)
Desta forma, a globalização deve ser entendida como um processo e, como tal, não é
assimilada por todos com a mesma rapidez e características, o que garante, portanto, dizer que
ela não implica universalidade, pelo contrário, em muitos casos, acaba por aprofundar o
abismo entre ricos e pobres, nas palavras de Anthony McGrew (2001), ela é “assimétrica”.
Ainda abordando o termo, Lastre, Cassiolato, Lemos, Maldonado e Vargas, destacam
o caráter ideológico do mesmo. Para estes autores “[...] a noção de globalização não apresenta
consistência conceitual; tanto no que se refere ao verdadeiro significado do termo, quanto à
extensão do processo em suas várias instâncias, uma vez que seus efeitos e impactos se fazem
sentir de forma diferenciada em diversos segmentos dentro da própria esfera econômica,
sejam estes financeiros, comerciais, produtivo, institucional, tecnológico, etc.” (1998, p. 3).
Porém, argumentam que no fim do século XX, as características apontadas pelos estudiosos
Cecília Megali Ogata
28
do assunto encontram certo consenso, o que, possibilita reduzir a imprecisão do seu
significado.
As principais características destacadas do processo são: a expansão das atividades
sociais, políticas e econômicas para além das fronteiras territoriais e o contato com distantes
comunidades e regiões do globo; o crescimento da magnitude da interdependência e das
relações entre os países, as empresas e os indivíduos; a aceleração e o desenvolvimento dos
processos e meios de comunicação, que aumentam a velocidade com que idéias, notícias,
bens, informação, capital e tecnologia se movimentam; e o aumento da rapidez, intensidade e
abrangência que se dá o relacionamento entre o local e o global.
Dessas características da Globalização se desdobram outros apontamentos mais
específicos, como por exemplo, a questão da importância da territorialidade. Ao se falar de
redução de barreiras, “mundo sem fronteiras” ou “o mundo está ficando pequeno”, tem-se a
errônea impressão de que o território, o espaço físico já não é relevante, que se estaria
vivendo uma “desterritorialização” do mundo, mas, como Nye (2002, p. 82) argumenta,
“Globalization has made national boundaries more porous but not irrelevant.”. Além disso,
o território é um dos elementos fundamentais para constituição de um Estado – juntamente
com o povo e o governo – e este é um dos atores fundamentais do Sistema internacional e da
Globalização.
“Hence the importance of globalization is that it has ended the monopoly of
territoriality in defining the spatial character of the world economy. This is
not to say that the trend has eliminated territoriality altogether. The global
dimension of contemporary world commerce has grown alongside, and in
complex relations with, its territorial aspects. Globalization has been
configuring geography rather than obliterating territory.” (SCHOLTE,
2001, p. 615)
A questão das fronteiras e do território serve de guia para uma outra suposição fruto da
Globalização, a de que se estaria formando uma cultura global, ou seja, que a intensa
transação de informações, bens de consumo e etc., estaria ocasionando uma homogeinização
cultural. É verdade que indivíduos de todos os lugares do mundo podem comprar um mesmo
produto, ouvir a mesma música e assistir o mesmo programa de TV. Porém, as peculiaridades
culturais já enraizadas em cada sociedade não são facilmente substituídas, são, sim,
influenciadas. Assim como ocorre na economia, que não atinge a todos da mesma maneira e
com os mesmos benefícios, a língua inglesa, a calça jeans americana também não são
automaticamente incorporadas por todos.
Patentes: o regime internacional...
29
Além destas também merecem destaque as características da Globalização de
regionalização, visto que há cada vez mais um nítido encaminhamento no sentido de se
formar blocos econômicos e políticos com a finalidade de se fortalecerem perante a sociedade
mundial e de alcançarem seus objetivos comuns mais facilmente, como é o caso da União
Européia – mais desenvolvido, do Mercosul e tantos outros; de desenvolvimento do Direito
Internacional e de novas temáticas concernentes a toda humanidade, como os Direitos
Humanos, meio-ambiente e imigração. Aliás, a imigração é também uma das facetas da
globalização, pois a modernização dos meios de transporte possibilita o deslocamento mais
veloz e simplificado das pessoas ao longo do globo.
A nova organização de produção que estabelece linhas de produção em diversos locais
do mundo é também uma característica marcante do processo de globalização, porque desta
forma, ocorre uma nova DIT – Divisão Internacional do Trabalho – e uma reorganização nos
modos de gestão e de fabricação, pois o produto final é fruto agora de partes, peças
desenvolvidas nos mais diversos países. Isso ocorre em busca de maior lucratividade e
competitividade.
O campo econômico é o que mais explicita os efeitos da Globalização, pois esta é
fruto do desenvolvimento do capitalismo. A escala mundial que se tem hoje foi atingida
buscando concretizar os desejos capitalistas, de maior consumo, venda e lucratividade e por
isso pode-se dizer que o processo de globalização ocorreu e ocorre primeiramente na
economia: “Mesmo havendo outros desdobramentos importantes decorrentes do processo de
globalização – no campo da política, da cultura, da sociedade, da tecnologia, entre outros –
estes seriam, em alguma medida, ainda que indiretamente e simplificando raciocínio,
conseqüências do citado processo econômico.” (VIGEVANI, 1997, p.281).
Por fim, destaca-se neste trabalho a característica mais estudada e questionada sobre a
Globalização: a perda de poder de atuação dos Estados. Há, de fato, alguns assuntos e
temáticas no âmbito internacional que não passam pela opinião dos Estados, que não depende
deles e sobre as quais não têm controle. Contudo, falar-se na formação de uma Comunidade
Mundial, sob um mesmo governo e a desmantelação e irrelevância das Nações no mundo
globalizado é uma análise superficial:
“In short, there is little sign that global commerce and the state are
inherently antithetical. On the contrary, the two have shown considerable
mutual dependence. States have provided much of the regulatory framework
for global trade and finance, albeit that they have shared these competences
with other regulatory agencies.” (SCHOLTE, 2001, p. 616)
Cecília Megali Ogata
30
Ian Clark argumenta, nesse sentido, que o que se tem atualmente é um “globalized
state” (2001, p. 739), ou seja, a globalização ocasiona uma transformação na natureza do
Estado; eles não estão obsoletos, mas diferentes. A crise econômica que atingiu praticamente
todos os países do globo em agosto de 20086 mostrou que os Estados realmente não
desapareceram e nem desaparecerão – pelo menos tão cedo – do Sistema Internacional, pelo
contrário, estão sendo eles os responsáveis pelo “controle” da crise, pelas tentativas a fim de
voltar a economia ao seu ritmo anterior. Não é o mercado financeiro, nem as grandes
corporações transnacionais que estão investindo milhões e bilhões em empresas “falidas”, a
fim de revigorar o crescimento da economia mundial, mas, sim, os Estados, o que demonstra
que, embora o mundo esteja cada vez mais globalizado, as políticas se mantém
nacionalizadas.
Por fim, cabe ainda colocar o que se fala em posições contra e a favor da
Globalização. As primeiras destacam a abertura econômica, o desenvolvimento da área de
comunicação, maior proximidade cultural das pessoas, o “encurtamento” do tempo e do
espaço, os movimentos no sentido de um estado global e o desenvolvimento de uma cultura
cosmopolita, ao passo que os contrários acusam que não se trata de um fenômeno recente, que
empresas genuinamente transnacionais são pouquíssimas, que a economia não é global, mas
concentrada nos países ricos, que as tecnologias não estão ao alcance de todos, que a
globalização é na verdade, um imperialismo ocidental, e que há globalização de coisas ruins
também, como o tráfico de drogas e o terrorismo.
Este trabalho não defende nem é contrário à Globalização, entende que ela foi e é um
processo originário das ações, desejos e escolhas dos homens, que possui pontos positivos e
negativos, como os destacados acima, portanto, o mais adequado não é uma simples
valoração de suas características, mas um estudo de suas causas e conseqüências para que
assim se possa lidar de maneira mais coerente e eficaz com os desafios impostos por sua
dinâmica.
Finalizando, a questão acerca da Globalização é delicada desde sua possível origem
até suas conseqüências mais modernas. Não se buscou debater amplamente as questões acerca
de suas características e desdobramentos, preocupou-se antes, em consolidar para o leitor a
imagem do que é a Globalização e suas manifestações. Sem seu estudo não é possível
compreender o mundo atual.
6
O desenvolvimento dessa crise e sua evolução serão abordados na próxima seção. Ver nota:9
Patentes: o regime internacional...
31
1.b.b – A economia do pós-70
Este recorte temporal foi necessário para que se pudesse dedicar uma maior atenção ao
desenvolvimento da economia mundial, que também é um “pano de fundo” das questões
centrais deste texto. A escolha de se iniciar com o final dos anos 70 deve-se ao fato de que a
partir daí “[...] foram intensas as modificações socioeconômicas relacionadas ao processo de
internacionalização da economia mundial. É preciso enfatizar que esse processo não é novo.
Mas ganhou características inusitadas e um assombroso impulso com o enorme salto
qualitativo ocorrido nas tecnologias da informação. Essas mudanças permitiram a
reformulação das estratégias de produção e distribuição das empresas e a formação de grandes
networks. A forma de organização da atividade produtiva foi radicalmente alterada para além
da busca apenas de mercados globais; ela própria passou a ser global.” (DUPAS, 1999).
Portanto, o desenvolvimento econômico de tal período é fundamental para compreensão da
formação das transnacionais que será abordado mais detidamente no terceiro capítulo deste
trabalho e da consolidação da Era da Informação e do Conhecimento, discutidos na próxima
seção deste capítulo.
Em 1944, foi assinado o acordo de Bretton Woods, que tinha como objetivos principais
reorganizar a economia e as finanças internacionais sob a nova hegemonia dos Estados Unidos
e assegurar a não ocorrência de um segundo “Crash”, como o de 1929, além de reconstruir a
Europa, arrasada pela guerra. Também foi criado o Fundo Monetário Internacional (FMI) a
fim de promover a cooperação monetária internacional; favorecer a expansão equilibrada do
comércio; oferecer ajuda financeira aos países membros em dificuldades econômicas; e
contribuir para a instituição de um sistema multilateral de pagamentos e promover a
estabilidade dos câmbios.
Cria-se, nesta época também, o Banco Internacional para Reconstrução e
Desenvolvimento (BIRD) com o intuito de facilitar investimentos privados e reconstruir a
Europa7. E, por fim, foi assinado o GATT (Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio) que se
tronou um fórum de negociação para liberalização do comércio. Todas essas medidas
contribuíram para o incremento das trocas comerciais entre vários paísese para cooperação
destes em assuntos que lhes concernia.
7
Hoje o BIRD faz parte do Banco Mundial junto com Associação Internacional do Desenvolvimento (AID),
Corporação Financeira Internacional (IFC), Agencia Multilateral de Garantias de Investimentos (AMGI) e Centro
Internacional para Arbitragem de Disputas sobre Investimentos (CIADI), todas reunida sob uma única
presidência.
Cecília Megali Ogata
32
No final da década de 60 e início da de 70, ocorre o que, Paulo Roberto de Almeida
chama de “terceira onda da globalização”8, em que ocorre uma reorganização geral da
economia mundial, permitida pela expansão do comércio internacional e pela abundância de
capitais. Essas mudanças deram origem a uma Nova Ordem Econômica Internacional. As
causas que impulsionaram essas modificações são as inovações tecnológicas, a reestruturação
produtiva, a crescente mobilidade do capital, o aumento da concorrência empresarial, a
globalização produtiva e financeira, intensificação de integrações tanto “rasas”, quanto
profundas, e a redução do custo dos transportes.
Todas essas causas geraram consequências que permanecem até hoje e que
configuraram o cenário internacional desde então: a concorrência intercapitalista; a
concentração do capital; investimentos em desenvolvimento de tecnologias; novos temas
internacionais, como a questão dos serviços, de regras uniformes de comércio; e a abertura e
busca de novos mercados.
A globalização produtiva envolve “[...] a interação de três processos distintos, a saber,
o avanço do processo de internacionalização da produção, o acirramento da concorrência
internacional e a maior integração entre as estruturas produtivas das economias nacionais.”
(BAUMANN; CANUTO; GONÇALVES, 2001, p.226). Cada vez mais e mais indústrias
distribuem ao longo do globo suas diferentes unidade de produção e negócios,
descentralizando-as, visando ganhos competitivos sobre uma mão-de obra mais barata, maior
abundância de matéria-prima ou mesmo insenções fiscais, entre outros.
Também a globalização finaceira pode ser entendida como a interação de três fatores
diferentes “[...] a expansão extraordinária dos fluxos financeiros internacionais, o acirramento
da concorrência nos mercados internacionais de capitais e a maior integração entre os sistemas
finaceiros nacionais.” (BAUMANN; CANUTO; GONÇALVES, 2001, p.221). O dinheiro tem
se tornado cada vez mais volátil e não conta mais com a necessidade do lastro, seja em dólar
ou em ouro, compram-se títulos, ações, há muito mais dinheiro em operações finaceiras, do
que em operações de comércio propriamente ditas. E há também uma necessidade vital dos
países em estimularem investimentos em seus territórios, em valorizar suas ações, tal processo
atinge não apenas aqueles países desenvolvidos, mas também os em desenvolvimento e os
subdesenvolvidos.
8
Para Paulo Roberto de Almeida haveria, além dessa onda citada, duas ondas anteriores: a primeira no período
dos descobrimentos e do capitalismo mercantil; e a segunda compreende o último quarto d o século XVIII até o
início do século XX. Esses períodos, segundo o autor, apresentam mudanças significativa separa o processo de
globalização ao mesmo tempo em que o intensificam ainda mais.
Patentes: o regime internacional...
33
Outro fator muito importante de se destacar é que a partir deste período também ocorre
uma crescente busca por se incrementar as integrações ja existentes (tanto entre nações, como
entre organizações) e por criar novas a fim de se fortalecerem perante outro grande desafio da
globalização que é a concorrência, a qual a partir da década de 70 também é reorganizada. O
mundo ia deixando de estar dividido em dois grandes blocos e se fragmentava em inúmeros
novos blocos supranacionais organizados para facilitar o comércio e a circulação de
mercadorias e pessoas.
Finalmente, o grande diferencial deste período que se inicia nos anos 70 é o
surgimento de um novo paradigma: “técnico- científico –econômico” pautado na produção
flexível de bens e serviços intensivos em informação, impulsionados e impulsionando uma
vasta rede de infra-estrutura de telecomunicação. Este paradigma norteou uma nova
competitividade marcada pelas inovações tecnológicas e pela crescente importância da
propriedade intelectual. Este assunto será abordado separadamente na próxima seção devido a
sua importância para este trabalho.
Caminhando para o final dessa década, os custos militares americanos da Guerra do
Vietnã e de programas de educação pública e desenvolvimento urbano, sem crescimento de
impostos (NYE, 2002); a crescente concorrência da Europa, já reconstruída; a ascensão de
novos pólos competitivos na Ásia; as crises do petróleo em 73 e 79, fizeram com que os
Estados Unidos, por meio de seu poderio e pressões, iniciassem um processo de
protecionismo. Mas, cabe lembrar que os “choques” do petróleo abalaram todo o mundo, tanto
que é nesta época que se cunha o termo “estagflação” para se referir a uma situação em que se
verifica a coexistência de elevado desemprego de fatores (estagnação) e de elevadas taxas de
inflação. A explicação para uma situação deste tipo encontra-se no fato da inflação manter-se
numa “inércia”, ou seja, uma vez instaurada não se encontram meios de exterminá-la.
Assim, nos anos 80 surgiu o intenso debate entre as idéias neoliberais de ajustes
estruturais de liberalização, privatização e desregulamentação e as idéias keynesianas de
regulamentação por parte do Estado. Nas negociações nos anos 80 e 90, prevaleceram as
posições liberais, expressas principalmente através do “Consenso de Washington”. Este
conjunto de medidas consolidou o receituário de caráter neoliberal, passou a ser "receitado"
pelo
FMI,
aos
países
em
desenvolvimento
que
promovessem
o
"ajustamento
macroeconômico", norteado por dez regras básicas: disciplina fiscal, redução dos gastos
públicos, reforma tributária, juros de mercado, câmbio de mercado, abertura comercial,
investimento estrangeiro direto (IED) com eliminação de restrições, privatizações de estatais,
Cecília Megali Ogata
34
afrouxamento de leis econômicas e trabalhistas e concessão de direito à propriedade
intelectual.
Todos esses processos de recomendações e negociações culminaram com a formação
da Organização Mundial do Comércio (OMC) em 1995, que tem como principais funções
gerenciar os acordos que compõem o sistema multilateral de comércio, servir de fórum para
comércio internacional, supervisionar a adoção dos acordos e implementação destes acordos
pelos membros da organização e a resolução de controvérsias.
O século XXI se inicia com crescente liberalização econômica e desenvolvimento
tecnológico, o qual não parou de produzir novos produtos, processos e conhecimentos desde a
década de 70, porém, caminha, não para a centralização estatal, mas para um maior controle,
uma maior participação dos Estados na economia mundial, principalmente em virtude da crise
atual9 que começa junto como novo século.
Finalizando, o que se percebe é que a partir da década de 70 a economia dominou todas
as demais esferas da vida social e do sistema internacional. E ela introduziu novas
configurações no cenário global, caminhando crescentemente para um maior aproveitamento
de todos espaços do mundo, contudo não se deve criar a ilusão de que a globalização e as
mudanças geradas pela economia atingem a todos, pelo contrário elas agravam mais ainda a
distância entre pobres e ricos e colocam cada vez mais barreiras à inserção verdadeira deles
nos negócios internacionais.
1.c – A Era da Informação e do Conhecimento e a economia gerada por bens não materiais
Fruto da evolução da globalização e impulsionado pelas novas exigências da
economia, a partir do século XX, principalmente da década de 80, ocorre um veloz
desenvolvimento de inovações nas áreas de informática e telecomunicações, robótica, química
9
Em 2001, devido a baixa dos juros, muito americanos refinanciam seus imóveis pegando dinheiro em troca e
elevando os valores dos imóveis até 2005, quando eles atingem níveis históricos. Em junho de 2006, com
aumento da taxa de juros, os preços dos imóveis caem e novas hipotecas alcançam valores menores e empresas
de concessão de crédito passam a enfrentar a inadiplência de muitos credores. Em março de 2007 a crise
imobliária chega à bolsa de valores, pois as prestações imobiliárias reduzem o consumo da população e, assim,
desacelera o mercado. Já neste ano muitas empresas do ramo imobiliário e de crédito e bancos começam a fechar
e decretar falência e anunciar perdas gigantescas, inclusive europeus. Nem o congelamento dos juros das
hipotecas de alto risco pelo presidente Bush desacelerou a crise, em 2008 muitos conglomerados financeiros
encerram suas atividades e empresas de todos os ramos anunciam prejuízos que ultrapassam a esfera dos milhões.
É então, em setembro de 2008, que o governo dos Estado Unidos assume o controle das maiores hipotecárias do
país e marca um novo momento da economia mundial, no qual os Estados se tornam essenciais para a superação
desta crise ajudando finaceiramente o setor privado.
Patentes: o regime internacional...
35
fina e tecnologia10 em geral. Segundo José Eduardo Cassiolato, o que se tem é “[...] uma
mudança de paradigma das tecnologias intensivas em capital e energia e de produção
inflexível e de massa (baseadas em energia e materiais baratos) para as tecnologias intensivas
em informação, flexíveis e computadorizadas” (1999, p.164).
Para Lastres e Ferraz (1999, p. 35 e 36), tal paradigma, chamado de “paradigma tecnoeconômico das tecnologias de informação” tem como elementos constituintes básicos a
informação, o conhecimento e o aprendizado; e como características mais importantes a
crescente complexidade dos novos conhecimentos e tecnologias utilizados pela sociedade; a
aceleração do processo de geração de novos conhecimentos e de fusão de conhecimentos e de
adoção e difusão de inovações; a crescente capacidade de codificação de conhecimentos e
maior velocidade, confiabilidade e baixo custo de transmissão; o aprofundamento do nível de
conhecimentos tácitos; a maior flexibilidade e capacidade de controle nos processos de
produção; as mudanças fundamentais nas formas de gestão e de organização empresarial; as
mudanças no perfil dos diferentes agentes econômicos, passando a se exigir maior
qualificação; e a exigência de novas estratégias e políticas, novas formas de regulamentação e
novos formatos de intervenção governamental.
“O novo paradigma é visto, portanto, como resposta encontrada pelo sistema
capitalista para o esgotamento de um padrão de acumulação baseado na
produção em larga escala de cunho fordista11, utilização intensiva de matéria
e energia e capacidade finita de gerar variedade.” (LASTRES; FERRAZ,
1999, p. 36)
É o surgimento desse novo paradigma que dará origem ao que se tem denominado
Revolução da Informação ou 3ª Revolução Industrial. De acordo com Nye, ela é baseada em
“[...] rapid technological advances in computers, communications, and software that in turn
have led to dramatic decrease in the cost of processing and transmitting information.” (2002,
p.42). Ele ainda relembra a frase de Robert Darnton: “Every age was an information age, each
10
Tecnologia é tomada neste texto como sendo a ciência aplicada no desenvolvimento e aprimoramento da
técnica a fim de possibilitar resoluções e respostas aos problemas enfrentados.
11
Foi um modelo de produção criado por Henry Ford que “Consistia em organizar a linha de montagem de cada
fábrica para produzir mais, controlando melhor as fontes de matérias-primas e de energia, os transportes, a
formação da mão-de-obra. Ele adotou três princípios básicos; 1) Princípio de Intensificação: Diminuir o tempo
de duração com o emprego imediato dos equipamentos e da matéria-prima e a rápida colocação do produto no
mercado. 2) Princípio de Economia: Consiste em reduzir ao mínimo o volume do estoque da matéria-prima em
transformação. 3) Princípio de Produtividade: Aumentar a capacidade de produção do homem no mesmo período
(produtividade) por meio da especialização e da linha de montagem. O operário ganha mais e o empresário tem
maior produção.” Disponível em: http://pt.shvoong.com/social-sciences/1674951-taylorismo-fordismo/ acessado
em 30/05/2009
Cecília Megali Ogata
36
in its own way.”, mas adverte que a mudança crucial desta nova revolução é a grande redução
do preço para transmissão dessa informação.
As principais características dessa Revolução são: “O desenvolvimento de um conjunto
de inovações tecnológicas de largo espectro de utilização e mutuamente estimuladoras entre si,
nas áreas de novos materiais, biotecnologia e, sobretudo e principalmente, na
microeletrônica.” (PASSOS, 1999, p.61); o aprimoramento e criação de formas de gestão que
extraiam o máximo de conhecimento de humano e priorizem o incentivo à criação e ao
aprendizado; aumento do uso de automação flexível, com instrumentos que permitem o
controle e a automação dos processos em tempo real e auto-ajustáveis; modificação nos
processos organizacionais, nas estratégias e culturas das organizações empresariais, com o
“desmantelamento”
de
estruturas
rígidas
e
maior
investimentos
em
Pesquisa e
Desenvolvimento (P&D). Além disso, surge também o “Mercado de Informação”, que,
Michael Dertouzos define como “[...] reunião de pessoas, computadores, meios de
comunicação software e serviços que serão engajados nas transações de informações
interpessoais e interinstitucionais do futuro. Estas transações incluirão o processamento e a
transmissão de informações em conformidade com os mesmos estímulos econômicos que hoje
impulsionam o mercado tradicional de bens e serviços” (1997, p.31). A propósito, o futuro de
que Dertouzos fala é o século XXI de hoje.
Essas mudanças atingiram também as políticas, a gestão estatal, a cultura, as
organizações sociais e o indivíduo em si, mas há ainda locais no globo que não convivem com
tais tecnologias, nem mesmo com tecnologias anteriores a essas.
Sem dúvidas, a cultura das sociedades mundiais está sendo alterada, pois a internet está
difundindo novos hábitos e padrões que de certa forma, não abruptamente, são incorporados
em diversas partes do mundo, além disso, a privacidade dos indivíduos está sendo reduzida.
Obviamente, como já dito anteriormente, isso não significa que haverá uma comunidade
global como os mesmos valores, mas negar que a disseminação de determinados modos de
vida está influenciando aos que têm acesso aos recursos dessa revolução é uma falácia.
Quanto aos Estados, à semelhança da globalização, este tem que enfrentar sérias
dificuldades no que diz respeito do seu poder de controle da informação, em outras palavras,
com essa revolução de grande quantidade de informação circulando a todo vapor nos diversos
meios e em diversas direções, o controle disso está cada vez mais rarefeito: “The spread of
informaion will mean that power will be more widely distributed and informal networks [...]
will undercut the monopoly of traditional bureaucracy.”(NYE, 2002, p.53). Contudo é
inegável que está sendo criado um ciber espaço de relacionamentos e trocas de informações
Patentes: o regime internacional...
37
paralelo às comunidades geograficamente localizadas e aos Estados–nações (grandes atores do
sistema internacional). E isso faz com que o soft power12 seja crescentemente importante para
os governos.
Quanto à segurança, esta revolução trouxe também novas armas cada vez mais
potentes e de maior alcance, a possibilidade de monitoramento dos espaços aéreo, terrestre e
aquático, entre outros. Mas, o que também tem gerado cada vez mais preocupação é que tais
informações e tecnologias ao mesmo tempo em que podem ser usadas para o bem, podem
contribuir para o planejamento de ataques terroristas, da disseminação de crimes “digitais” e
invasão de privacidade.
Por fim, na área econômica tem-se o surgimento da “economia do conhecimento e da
informação”, termo que se origina “[...] da observação de que a partir do final da Segunda
Guerra Mundial, os processos produtivos têm crescentemente se apoiado e dependido de
atividades baseadas em conhecimento.” (LUNDVALL, 199713 apud CASSIOLATO, 1999,
p.172). Essa nova economia tende cada vez mais a aumentar o valor agregado dos bens
intangíveis, de modo que o valor material de um CD é algo em torno de um real, mas se este
estiver com o conteúdo de um programa de computador gravado nele pode atingir valores
milhares de vezes maiores.
Os ativos intangíveis podem ser definidos como: “[...] uma fonte não física de geração
de valor, sendo resultante de inovação, estrutura organizacional específica ou práticas de
recursos humanos.” (LEV, 200114 apud FINGERL; GARCEZ, 2002). Eles se distribuem nas
categorias: marketing (marcas, logos); tecnologia (patentes, know-how), artes (copyrights),
processamento de dados (software, banco de dados), consumidores, contratos (licenças,
franquias), mas ainda fala-se da capacidade de exportação, liderança, flexibilidade e estratégia.
Contudo, esses ativos têm uma grande peculiaridade: não são passíveis de mensuração,
ou seja, como se mede o valor da marca Coca-Cola? Essa dificuldade é agravada pelo fato de
que esses ativos não são posse de uma empresa, ou de um órgão governamental, elas são, por
essência, frutos do trabalho intelectual humano e estão, assim, associadas a processos de
aprendizagem, dependentes de contextos e formas de interação sociais específicas. Para
Dertouzos, “O valor da informação não precisa se confinar a termos econômicos: [...] o valor
da informação é determinado pelo valor intangível das coisas que gera [...]” (1997, p.299),
12
Termo cunhado por Joseph Nye Jr. que se refere ao poder de atrair os adversários e demais atores
internacionais ou cooperar com eles para que queiram o mesmo que você.
13
LUNDVALL, B. A.; Development strategies in learning economy. Texto apresentado na conferência do 10º
aniversário do STEPI. Seul, 1997.
14
LEV, B.; Intangibles: management, measurement and reporting. Washington: The bookings Institute.
Cecília Megali Ogata
38
portanto relativa. Em certa medida Dertouzos está certo porque não há ainda nenhum
instrumento capaz de mensurar com precisão esses ativos, mas a importância de avaliá-los em
termos econômicos é cada vez maior visto que eles têm se transformado em fatores centrais da
economia mundial. Por isso, é uma questão bastante discutida entre os empresários,
governantes e estudiosos da área.
Diante de tal configuração mundial, que se instalou no período pós-anos 80 e se
consolidou no fim da década de 90 e início do século XXI, adotou-se a denominação de Era da
Informação e do Conhecimento, que de acordo com a profª.Drª. Sarita Albagli (1999, p.292 e
293), tem como características principais: a vinculação de desenvolvimento científico ao
tecnológico, na qual a ciência passa a desempenhar um papel estratégico como força produtiva
e como mercadoria; a incorporação do progresso científico-tecnológico às esferas de poder
público e simultânea privatização de tal processo por grandes agentes econômicos; e a
inserção dessa tecnologia e ciência no cotidiano e na cultura contemporâneos.
Nessa nova “era” a competição está cada vez mais acirrada e incrementada:
“[...] a competição entre empresas se volta não apenas para o produto, mas
principalmente para a tecnologia dos processos produtivos. A
competitividade tecnológica implica também em custos elevados em
pesquisa para desenvolvimento de produtos existentes e criação de novos
produtos e serviços, na sofisticação, no atendimento da demanda e na
provisão de assistência técnica. As empresas se reestruturam
geograficamente, visando à competição a nível mundial, procurando as
vantagens comparativas de cada país”. (KON, 1997, p. 64)
A inovação figura, nesse cenário, “[...] como fator estratégico de sobrevivência e
competitividade para as empresas e demais organizações” (LASTRES; CASSIOLATO, 2003,
p. 4), é ela que vai garantir ganhos de vantagem competitiva, que dizer, é partir de uma
inovação que a empresa “passa a frente” de suas concorrentes. E, como a inovação só surge
por meio da utilização de tecnologias e informações direcionadas pelo conhecimento, estes
também se tornam essenciais à atividade empresarial atual.
Isso fez com que aparecesse, na área de administração, a “gestão do conhecimento” e
a “gestão de competências”, que se ocupam, basicamente e respectivamente, “[...] de mapear
e transferir conhecimentos críticos dos processos organizacionais.” e “[...] em compreender as
competências15 dos funcionários em face das competências organizacionais (equipes) e
15
“[...] não apenas um conjunto de conhecimentos, habilidades e atitudes necessários para exercer determinada
atividade, mas também como desempenho expresso pela pessoa em determinado contexto, em termos de
comportamentos e realizações decorrentes da mobilização e aplicação de conhecimentos, habilidades e atitudes
no trabalho.” (CARBONE et al., 2006, p.43)
Patentes: o regime internacional...
39
profissionais (cargos ou funções) desejadas.” (CARBONE, et al. 2006, p. 98). Além disso,
outras organizações também criaram e vem criando departamentos/áreas/secretarias de gestão
do conhecimento, como é o caso do BNDES, onde foi criada a Área de Gestão do
Conhecimento em 2002.
Esses esforços buscam desenvolver uma forma de estimular a criação de inovações e
retenção dos conhecimentos gerados e utilizados dentro das organizações, porém, isso reflete
uma contradição: ao mesmo tempo em que o conhecimento, enquanto matéria-prima para
inovações pode ajudar a “alavancar” a empresa, a grande maioria deles é intransferível, ou
seja, permanecem enraizados nas pessoas que os desenvolvem. Portanto, a produtividade e a
competitividade dos agentes econômicos dependem cada vez mais da capacidade de lidar com
seu “capital humano”16 e eficazmente com a informação para transformá-la em conhecimento
(e vice-versa) e deste processo gerar inovações.
“A complexidade crescente das relações concorrenciais sobre esses
diferentes mercados e situações conduz as empresas, os Estados e as
coletividades locais a elaborar novas formas de enfrentar a realidade. A
eficácia de tais comportamentos repousa sobre o desenvolvimento de
verdadeiros dispositivos de gestão estratégica de informação no interior de
sistemas de inteligência econômica. Sua existência permite aos diferentes
atores e interesses antecipar a situação dos mercados e a evolução da
concorrência, detectar e avaliar as ameaças bem como as oportunidades
disponíveis, para então definir as ações ofensivas e defensivas mais bem
adaptadas a suas estratégias de desenvolvimento” (tradução livre do idioma
francês: Relatório do Grupo “Inteligência Econômica e Estratégia das
Empresas”, 1994, p. 16 apud PASSOS, 1999, p.74)
Com os bens intangíveis possuindo, atualmente, maior valor agregado que muitos bens
tangíveis, a propriedade intelectual figura como uma solução para atribuir valor a esses bens e
com isso facilitar seu comércio e transnacionalização. Por isso, a importância do estudo deste
assunto, no caso, da patente. Para a globalização atual e seus desdobramentos futuros, cada
vez mais a patente e as demais formas de propriedade intelectual serão imprescindíveis às
empresas e, direta ou indiretamente, aos Estados e indivíduos. Nas palavras de Lastres e
Ferraz: “[...] tratar o agente inovador como um indivíduo (ou conjunto de indivíduos), e a ele
conferir a propriedade do conhecimento, quando sabidamente o conhecimento que baseia tal
inovação provém de um acervo social e coletivo. Daí o papel também crucial da propriedade
16
Para este termo podem ser encontradas diversas definições que, em geral, fundamental a mesma idéia da
aplicação das capacidades humanas na realização de um trabalho, cumprimento de uma estratégia,
desenvolvimento de ativo.
Cecília Megali Ogata
40
intelectual na nova economia e dos debates que tema acompanhado sua nova abrangência e
formulação” (1999, p. 40).
Por fim, é desejo da autora deste trabalho encerrar este capítulo com uma crítica
quanto ao caráter localizado da inovação. A Globalização, devido a seu caráter generalizado,
faz com que se conclua que a tecnologia, as inovações, as pesquisas e outros recursos
estratégicos estão circulando livremente e globalmente em todas as direções, nas palavras de
Maldonado, imagina-se a existência de um “tecno-globalismo”
17
. O autor ainda fala da
existência de duas vertentes de autores que debatem sobre essa questão: os que defendem a
existência do tecno-globalismo e os que a negam enquanto fenômeno mundial. Os primeiros
argumentam que a aceleração, a partir da década de 80, do processo de internacionalização
das atividades de P&D se generalizou pelo globo, que os principais mercados do mundo já
têm acesso, consomem e até produzem bens e serviços com conhecimento tecnológico. Os
segundos, por sua vez, dizem que as atividades tecnológicas são exatamente um caso de nãoglobalização: “O essencial da P&D continua sendo desenvolvido no país de origem das
empresas e quando se internacionaliza objetiva principalmente, adaptações ao mercado local
do que realização de P&D propriamente dita.” (MALDONADO, 1999, p.108). Esse
argumento pode ser reforçado pelo que diz Fingerl e Garcez (2002, p.1): “Ao contrário do que
se poderia imaginar, cada vez mais a inovação se dá através de processos historicamente e
culturalmente determinados, sendo fortemente vinculada a instituições e organizações locais”.
Os recursos estratégicos de tecnologia e conhecimento se encontram localizados
majoritariamente na “Tríade” – Estados Unidos, Japão e Europa Ocidental – e provoca um
crescente processo de polarização entre blocos, países, regiões e grupos sociais, gerando
novas e mais complexas disparidades entre eles.
Como, cada vez mais, conforme já explicitado, a concorrência aumenta e se pauta em
bens intangíveis de alto valor agregado de informação, conhecimento e inovação, esses ativos
se tornaram estratégicos para todas as empresas. Assim, não tem sido incorporado à lógica da
globalização de crescente difusão, pelo contrário, se mostram concentrados nos locais onde
são desenvolvidos (majoritariamente, nos países ricos).
“Em que pese a atual hiperdisponibilidade de informações, tornada viável
pela revolução das tecnologias da informação e comunicação, o
conhecimento tecnológico, ao se constituir num dos principais ativos
estratégicos das empresas num quadro de acirramento da competição não se
17
“Tal termo diz respeito ao suposto caráter crescentemente internacional do processo de geração, transmissão e
difusão das tecnologias” (MALDONADO, 1997, p.106)
Patentes: o regime internacional...
41
globaliza, permanecendo, na sua essência, restrito ao âmbito daquelas que
detêm esse conhecimento”. (MALDONADO, 1999, p.118).
Este assunto será retomado mais a frente numa reflexão mais focada na patente.
Cecília Megali Ogata
42
2. Patentes: proteção ao conhecimento e à inovação
Neste capítulo busca-se realizar um aprofundamento da questão, que passa pela
origem da propriedade intelectual, foca as patentes e vai até a adequação do sistema às novas
necessidades dessa “Era da Informação”.
É importante perceber que o sistema de propriedade intelectual é fruto de uma
mudança na própria forma de ler a realidade. Durante muitos séculos as idéias, o
conhecimento e a própria racionalidade foram tidos como presentes dos deuses e/ou de Deus.
Além disso, a própria noção de propriedade mudou ao longo do tempo dando origem a teorias
com distintas idéias, ora de que a propriedade é um direito natural (Locke), ora que é uma
criação humana (Rousseau), entre outras.
O aparecimento de novas tecnologias, das marcas, de novas formas de gestão, de
modernos produtos, fez com que o conceito de propriedade fosse sendo “estendido” a fim de
abarcar novas matérias e formas de posse da riqueza pelos agentes econômicos. Em outras
palavras, “propriedade”, que antes se aplicava apenas aos bens tangíveis, hoje ultrapassou
esse limiar e se refere também aos intangíveis.
Como procuraremos demonstrar neste capítulo, não há uma agenda única associada
aos diferentes regimes de propriedade intelectual no contexto internacional. Ao se estudar sua
evolução, desde o século XIV – quando se fala da “primeira lei de Patente” – até a
consolidação do TRIPS – Trade Related Intelectual Property Right – assinado no âmbito da
OMC – Organização Mundial do Comércio – nota-se que as regras e regulamentações foram
variando para acompanhar as inovações e, principalmente, os diferentes graus de apropriação
e difusão das mesmas. Mas, mais do que isso, o regime foi consolidado com vistas a atender
os interesses das potências dominantes, o que gerou grande contradição da propriedade
intelectual, principalmente da patente: a questão da transferência de tecnologia e do
desenvolvimento, que será comentada no final deste capítulo.
Por fim, cabe acrescentar que o foco na patente deve-se ao fato de essa ser o principal,
mais usado, difundido e procurado tipo de propriedade intelectual e por ser o mais utilizado
nas empresas, assunto do capítulo final deste trabalho.
2.a – Introdução: Propriedade Intelectual (definição e teorias)
Nesta seção tem-se como objetivo a definição do que vem a ser Propriedade
Intelectual – chamada apenas de PI a partir de agora – e também de seus tipos.
Patentes: o regime internacional...
43
A PI pode ser definida como “[...] um direito privado conferido a um cidadão, empresa
ou entidade sobre as idéias, as informações, ou, de forma mais geral, as criações intangíveis e
que dá ao seu detentor o poder de excluir os outros do livre uso do bem por ele criado ou
adquirido” (CRUZ, 2008, p.22).
Ela é composta de dois “subgrupos”: a Propriedade Industrial e os Direitos Autorais. O
primeiro engloba a Proteção de Cultivares, Indicações Geográficas, Desenho Industrial,
Marcas e Patentes. O segundo refere-se às obras literárias e artísticas, programas de
computador e domínios de internet, protege trabalhos publicados ou não nas áreas da
literatura, música, software, entre outros. Relaciona-se a ele o direito patrimonial, que se
refere ao valor econômico de uma obra, mas, mesmo que o autor disponha de sua obra, o seu
direito moral sobre ela é intransferível, sua autoria não pode ser omitida.
Segue agora uma sucinta explicação sobre o que vêm a ser cada uma dessas
modalidades (Museu Paraense Emílio Goeldi, 2004):

Proteção de Cultivares: é o direito exclusivo, por um determinado período (no Brasil
15 ou 18 anos, de acordo com a espécie), de comercialização de novas variedades de
plantas pelos cultivadores. Isso não significa, no Brasil, “patente de novas variedades
vegetais”, é preciso que haja novidade (não exista ainda), distinguibilidade (ser clara
diferença entre outras já existentes), homogeneidade (baixa variabilidade quando
usadas em plantio), estabilidade (quando utilizadas comercialmente não devem
apresentar alterações) e ter denominação conforme (genética). Esses requisitos foram
estabelecidos pela UPOV – União para Proteção de Novas Variedades Vegetais - em
suas convenções de 1978 e 1991, mas o TRIPS – Trade Related Aspects of
Intellectual Property Rights, acordo que regula as questões de PI relacionadas ao
comércio e que está atualmente em maior evidência, permite que tal assunto seja
protegido de três maneiras: por uma patente, por um sistema especial – como é o caso
do Brasil, onde há a lei nº 9.456 de 25 de abril de 1997 regulamentada pelo decreto
nº2.366 de 5 de novembro de 1997 e o Serviço Nacional de Proteção de Cultivares
(SNPC)– ou pela combinação dos dois.

Indicações Geográficas: é uma indicação de procedência (centro de produção,
fabricação ou extração) ou de denominação de origem (país, cidades, região) que
designem o produto, cuja qualidade se deva exclusivamente ao meio geográfico. É
uma forma de agregar valor e credibilidade, um diferencial. Uma vez reconhecida, só
pode ser utilizada pelos membros daquela determinada região. O acordo que rege tal
assunto é o de Lisboa, mas como tem poucos signatários, os que não o integram tem
Cecília Megali Ogata
44
feito uso de acordos bilaterais, baseados na reciprocidade, mas ela também é
garantida pelo TRIPS.

Desenho Industrial: é a forma plástica ornamental de um objeto, ou conjunto de linhas
e cores que possam ser aplicados a um produto, proporcionando visual externo novo e
original. A proteção atua sobre a originalidade da aparência. Precisa ter novidade,
aplicação industrial, unidade (se referir a um só objeto) e cada pedido poderá conter
até 20 variações. Este mecanismo goza do que é chamado “período de graça”, a
permissão de divulgação da invenção até um ano antes do depósito, pelo inventor ou
pessoa autorizada em feiras, palestras e exposições, sem que isso seja considerado
quebra de novidade. Tem duração de 10 anos, prorrogável por mais três períodos de
cinco anos. Ele só é válido dentro do país em que foi requerido, mas o Acordo de
Haia possibilita um único depósito internacional.

Marcas: são figuras, nomes ou símbolos que possam ser identificados visualmente,
servindo para distinguir um determinado produto ou serviço, dentre aqueles dispostos
no mercado.

Patente: é um título de propriedade temporária, outorgado pelo Estado a criadores e
inventores de novos produtos, processos e aperfeiçoamentos que tenham aplicação
industrial. Como este é o foco deste trabalho, mais detalhes, como tipos de patentes, o
processo de registro, bem como os órgãos responsáveis e requisitos serão tratados
mais adiante. Além da patente, há também o Segredo Industrial, que protege um
invento por meio do sigilo industrial, ou seja, mantendo-o em segredo. A vantagem
desta proteção sobre a patente é de que dura o tempo que o inventor conseguir manter
em segredo sua descoberta, muitas vezes muito mais que 20 anos – duração de uma
patente. Contudo, uma vez violado, não há como impedir sua utilização por terceiros.
Esse tema também é regulado pelo TRIPS.

Obras Literárias e Artísticas: o registro das obras é facultativo ao autor. No Brasil
pode ser feito na Escola de Belas Artes da UFRJ (artes plásticas), na Escola de
Música da UFRJ (composições musicais), no Conselho Nacional de Cinema
(produção cinematográfica), no Conselho Federal de Engenharia, Arquitetura e
Agronomia (projetos de arquitetura, paisagismo, geografia e outros) e na Biblioteca
Nacional (obras literárias). A proteção se inicia a partir da criação e se estende por
mais 70 anos contados a partir de 1º de janeiro do ano seguinte à morte do autor ou do
último autor. Além disso, são de domínio público as obras de autores que tenham
Patentes: o regime internacional...
45
falecido sem deixar sucessores e as de autores desconhecidos. Não são passíveis de
proteção, dentre outras coisas, esquemas, planos ou regras de atos mentais,
formulários em branco, textos de convenções, leis e decretos, informações de uso
comum, como calendário, nomes ou títulos isolados. A primeira Convenção a versar
sobre o assunto foi a de Berna de 1886, mas atualmente a temática também está
inserida no TRIPS.

Programas de computador: é a expressão de um conjunto organizado de instruções
contidas em suporte físico de qualquer natureza, necessário a máquinas automáticas
de tratamentos de informação, dispositivos, instrumentos, entre outros aparelhos. Tem
validade de 50 anos a partir do 1º de janeiro do ano seguinte a sua publicação. No
Brasil deve ser registrado junto ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial - INPI
– e não há exame técnico. Protege-se tanto o produto quanto seu nome comercial.

Domínios na Internet: são nomes que servem para localizar e identificar conjuntos de
computadores na Internet, tem como objetivo facilitar a memorização dos endereços
de computadores na Internet. Não podem ser domínios de internet: palavras de baixo
calão ou nome que represente um conceito pré-definido na rede. No Brasil é realizado
o registro junto a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo –
FAPESP.
Para Marisa Gandelman18(2004), a PI tem como premissa ontológica a idéia de que o
homem usa sua capacidade de criação a fim de se desenvolver e indiretamente, desenvolver a
sociedade como um todo. Desta maneira, a ele caberia um “prêmio” pelo esforço e para que
se sinta estimulado a continuar criando. Seria uma recompensa em defesa do interesse da
própria sociedade. Assim, a autora conclui que o sistema de PI só é possível dentro de
sociedades que reconheçam o direito de propriedade. Afinal, o termo advém da apropriação
do conhecimento humano, ou seja, da apropriação de um bem intangível pelo conceito de
propriedade, antes destinado apenas aos bens materiais.
Por isso, antes de tratar das teorias de PI, cabe tecer um breve comentário sobre a
questão da propriedade. Gandelman, em seu livro “Poder e conhecimento na economia
global” (2004) e Liliam Ane Cavalhieri da Cruz em sua tese de mestrado “O regime global da
propriedade intelectual e a questão do desenvolvimento: o poder dos países em
desenvolvimento no campo multilateral” (2008) apontam algumas vertentes teóricas e seus
18
Doutora em Relações Internacionais pela PUC-RJ
Cecília Megali Ogata
46
respectivos entendimentos sobre o que vem a ser propriedade, que serão expostas de maneira
bem sucinta, uma vez que esse não é o propósito deste trabalho.
O primeiro autor que discute a questão é John Locke. De acordo com ele, o homem
tem direito de propriedade sobre si mesmo e sobre o resultado do seu trabalho. Portanto, a
propriedade é vista como um direito natural do homem, a partir do trabalho humano sobre a
natureza a fim de garantir sua subsistência, o homem converte o comum em próprio.
A segunda teoria baseia-se na idéia de Rousseau de que a propriedade gera escravidão,
os homens não possuem a mesma evolução, sendo a propriedade uma instituição social que se
materializa necessariamente pela lei. É um direito elaborado por ficção jurídica, cuja
justificativa é resolver o problema da desigualdade, pela organização da sociedade.
Há ainda outra corrente com base em Hegel, segundo a qual a propriedade é o meio
que permite ao indivíduo sua autodefinição, pois é a expressão de sua personalidade
individual, meio pelo qual se reconhece. De certa forma a idéia de Macpherson de que a
propriedade reflete uma escolha, valores priorizados por cada sociedade, de acordo com seu
contexto e propósitos, também se vale de algumas idéias de Hegel. O filósofo Kant, segundo
Riccardo Pozzo (2006), também toma a PI como parte da construção metafísica da atividade
intelectual e fala inclusive de recebimento de “vantagens patrimoniais” daqueles que utilizam
o trabalho adquirindo novos conhecimentos e experiências, mas para ele trata-se de um direito
inalienável, porém transferível.
Em contrapartida, Karl Marx vai dizer que a divisão do trabalho e a alienação do
trabalhador19 já não permitem a identificação do trabalhador com o fruto do seu trabalho. Para
ele, a propriedade privada impede o desenvolvimento do homem, embora sua abolição não
signifique garantia de liberdade. O conhecimento é visto como propriedade de todos, fruto de
um esforço coletivo antecedente.
Nota-se que foi com base nessas mesmas teorias de propriedade que se desenvolveram
também as teorias do Direito de Propriedade Intelectual – chamada a partir de agora de DPI.
19
“No primeiro manuscrito de 1844, Marx trata da questão da alienação. Tal termo fazia parte do vocabulário de
Feuerbach, para quem a religião era uma alienação, pois, colocando sua essência e sua humanidade num Ser fora
de si próprio, no mundo invertido da divindade, o homem vira um ser que não se pertence. Esse é o aspecto
religioso da alienação que Feuerbach usa. O homem adora os ídolos que projeta. [...] Para Marx, a alienação
religiosa seria gerada pela alienação econômica. Tal estado é, para Marx, resultado da realização de o trabalho
aparecer como a desrealização do trabalhador. O objeto produzido pelo trabalhador aparece como estranho e
independente a ele. As mercadorias existem para suprir necessidades. O sistema capitalista transforma o
trabalhador e o trabalho em mercadorias, ao privar o trabalhador dos objetos que produz. Quanto mais ele
produz, menos pode possuir. Essa apropriação do objeto pelos possuidores da propriedade se realiza como
alienação do trabalhador. Este, ao pôr sua vida na produção de objetos que não lhe pertencem, perde a posse
desta.” Disponível em: http://www.consciencia.org/marx.shtml acessado em 22 abril 2010.
Patentes: o regime internacional...
47
Willian Fisher, em “Theories of Intellectual Property” (2001), relata um grande
crescimento do número de teorias sobre a PI, mas aponta as quatro principais, que concentram
as demais: teoria do Utilitarismo, teoria do Trabalho, teoria da Personalidade e teoria do Plano
Social. A primeira é a mais popular e foi criada a partir do entendimento de que a PI deve
contribuir para a maximização do bem-estar social. Para isso deve haver um equilíbrio entre a
recompensa (poder exclusivo) e o incentivo; e as medidas que garantam o bem-público.
A segunda, Teoria do Trabalho, que baseia-se nas idéias de Locke, defende que há
uma apropriação natural do homem sobre tudo aquilo que advém do seu trabalho, sobre sua
capacidade de utilizar algo do bem-comum para converter em algo novo, não, simplesmente,
encontrado na natureza.
Contudo, Fisher menciona que Robert Nozick20 faz uma importante ressalva sobre o
pensamento de Locke: a aquisição de propriedade, por meio do trabalho aplicado sobre algo
da natureza só será legítimo se isso não causar prejuízo à pessoa e se após a aquisição ainda
houver recursos para todos. Diante disso, Nozick argumenta que pela visão de Locke uma
pessoa que aparecesse com a mesma invenção independente, depois de um primeiro inventor,
teria os mesmos direitos de utilizá-la e comercializá-la
Nozick, diferentemente de Locke, defende que o tempo de duração da patente, não
deveria ultrapassar o tempo necessário para que outros chegassem a tal invenção. Ainda
dentro da visão deste mesmo autor, a patente não representa um mal a sociedade, pelo
contrário, ajuda os consumidores, porque mesmo que a patente traga algumas limitações de
acesso, se ela não existisse, esse esforço inovativo do criador poderia nem ter sido revelado.
A Teoria da Personalidade deriva dos escritos da Kant e Hegel e toma o DPI como
crucial para a satisfação de necessidades humanas, justificável na medida em que defende
autores e artistas da apropriação ou modificação de suas obras, que na verdade expressam
seus próprios desejos e sentimentos. Os DPI criam condições sociais e econômicas que
incentivam e apóiam a criação intelectual, que é importante para a que a humanidade
prospere.
Para Hegel, uma forma de sistema de PI ideal deveria abarcar as seguintes
considerações: preocupar-se mais com os frutos das atividades altamente intelectuais; a
20
Robert Nozick (Nova Iorque, 16 de Novembro de 1938 — 23 de Janeiro de 2002). Foi um proeminente
filósofo político americano nas décadas de 70 e 80. Desenvolveu outros trabalhos adicionais, mas menos
influentes nas áreas de epistemologia e teoria da decisão. Seu "Anarquia, Estado e Utopia" de 1974 foi uma
resposta libertária para o "Uma Teoria da Justiça" de John Rawls, publicado em 1971.
http://br.geocities.com/discursus/filotext/nozicfil.html acessado em 30 de setembro de 2009 às 16horas.
Cecília Megali Ogata
48
própria imagem pública da pessoa e a pessoa em si, enquanto detentora de uma personalidade
deveria contar com proteção legal, mesmo não sendo fruto de trabalho; e os autores e
inventores deveriam receber admiração, honra e dinheiro pela permissão de uso e cópia de
seus trabalhos.
Por fim, a Teoria do Plano Social defende que os DPI deveriam ser usados para ajudar
a alcançar uma cultura justa e atrativa. Trabalha com diferentes teóricos, como Marx,
Jefferson, Realistas legais e Republicanos clássicos. Entre os pontos de defesa dessa teoria
destacam-se a maior abertura dos direitos autorais para o domínio público e maior uso de
licenças compulsórias21 para equilibrar o interesse dos criadores com o dos consumidores.
Willian Fisher argumenta que o ideal é que se faça um balanço entre as quatro teorias
utilizando-se o que há de melhor em cada; que há ainda assuntos relativos à PI que nenhuma
das teorias aborda; e que, atualmente, muitas das idéias teóricas se confundem com as leis,
além de muita ambigüidade nos textos legislativos e na própria interpretação destes.
Ele levanta também as principais vulnerabilidades de cada teoria. Para a Utilitarista,
aponta que não se pode falar de bem-estar social de forma geral, visto que este não é igual
para todos; que essas análises partem do ponto de vista de países ricos; e que a definição de
bem-estar para a sociedade é muito restrita já que existem outras necessidades que não são
abarcadas por essa denominação.
Para a segunda teoria, a do Trabalho, as principais críticas são elaboradas em virtude
do fato de: (1) essa teoria não agregar todos os tipos de produção intelectual; (2) da teoria de
Locke apresentar diferentes possibilidades de interpretação e raciocínios, o que gera várias
formas de se priorizar determinado aspecto de cada uma dessas interpretações; (3) de sua
aplicação ser dificultada por não haver apenas um tipo de trabalho intelectual, apenas uma
habilidade envolvida no desenvolvimento de uma invenção, mas sim, várias; (4) de que a
propriedade vai residir sobre a criação, a qual fez uso de uma informação ou conhecimento
prévio, na maioria das vezes não desenvolvidos pela mesma pessoa; (5) e de que o direito por
ser inalienável seria também vitalício.
Ao tratar da terceira teoria, a da Personalidade, Fisher defende que o direito de
propriedade privada somente deveria ser concedido quando ele promove a evolução humana,
protegendo interesses e necessidades comuns. Contudo, seria muito difícil ao judiciário
21
A licença compulsória é um mecanismo de defesa contra possíveis abusos cometidos pelo detentor de uma
patente e que é acionado pelo governo do país concedente do privilégio. Através da licença compulsória o
governo autoriza um terceiro a explorar o objeto da patente sem o consentimento prévio do detentor da
mesma. Disponível em: http://www.cipi-qf.org.br/legislacao.asp?tipo=L&legislacao=7 acessado em 30 de
setembro de 2009 às 14horas.
Patentes: o regime internacional...
49
elaborar o que é de fato interesse da humanidade, tendo em vista sua heterogeneidade, e quais
recursos seriam então passiveis de serem privados e quais seriam públicos.
Finalmente, sobre a teoria do Plano Social, pode-se apontar que seria muito
complicado estabelecer o que é justo e quais culturas são atrativas. Temas esses que são
verdadeiramente impossíveis de serem padronizados e unificados em forma de um sistema.
Cruz (2008) também faz algumas críticas de grande valor às construções teóricas da
PI. Para ela é preciso ter em mente que o direito de propriedade privada foi criado, dentre
outras razões, porque os bens tangíveis são passíveis de depredação, usurpação, fim, já os
intangíveis não tem essa característica, não se pode falar que uma “idéia foi desgastada ou
acabou”. Argumenta também, que o conhecimento é uma construção social, fruto da interação
do homem com seu meio, sendo assim, não seria possível a admissão de um monopólio. Os
DPI geraram uma mudança no significado da ciência, que agora deixa o ideal de busca de
conhecimentos que ajudem no avanço do mundo e da sociedade, e passa a ter necessidade de
aplicação, ser comercializável e lucrativo.
Concluindo, nota-se que não há uma teoria geral que consiga abrigar todas as
exigências sociais e ao mesmo tempo contemple os interesses dos inventores/inovadores.
Porém, as teorias têm um grande valor, na medida em que ajudam a identificar resoluções não
óbvias para determinados problemas e criar discussões entre vários participantes legislativos a
fim de aprimorarem seus sistemas.
Parece que ao mesmo tempo em que o Regime de PI se faz necessário para incentivar a
atividade inovativa, que, em menor ou maior escala, direta ou indiretamente, atua sobre o
bem-estar social , não pode deixar de estabelecer mecanismos que viabilizem a prioridade à
dignidade humana.
2.b–Patentes
Essa seção se dedicará ao exame mais detalhado do instituto da patente, embora seja
mencionado o regime como um todo, referente a todas as formas de PI. Pretende-se, num
primeiro momento, traçar a trajetória do Regime de PI desde seu surgimento até os dias
atuais. Posteriormente, tecer um comentário analisando as peculiaridades implícitas em cada
nova mudança ou adaptação desse mesmo regime, as forças que o conduziram até o ponto em
que atualmente se encontra. Trata-se, portanto, de uma análise histórica. As questões relativas
a regulamentações e procedimentos do “patenteamento”, serão analisadas dentro das
Cecília Megali Ogata
50
legislações e órgãos nacionais e internacionais. Ao passo que o debate sobre sua utilização
enquanto ferramenta de desenvolvimento e ganhos econômicos, nas seções finais do capítulo.
2.b.a –Histórico do Regime Internacional – da Convenção de Paris ao TRIPS
Antes de se iniciar a cronologia do desenvolvimento deste Regime Internacional, é
importante justificar porque se fala em “Regime”. O fato advém dos estudos do teórico de
Relações Internacionais, Stephen Krasner (1995), considerado um dos fundadores da teoria
neorealista. De acordo com ele,
“Os regimes são definidos como um conjunto de princípios, normas, regras e
procedimentos de tomada de decisão, implícitos ou explícitos, em torno dos
quais as expectativas dos atores convergem em um domínio específico das
relações internacionais. Princípios são crenças sobre fatos, causalidades e
retitude. Normas são padrões de comportamento estabelecidos em termos de
direitos e obrigações. Regras são prescrições ou proposições específicas para
ação. Procedimentos de tomada de decisão são práticas prevalescentes ao
fazer ou implementar escolhas coletivas.” (p.2).
Ainda neste estudo, Krasner diz que há três escolas que estudam os regimes: estrutural
convencional ou realismo estrutural; realismo estrutural modificado e grocianos. Para a
primeira, os regimes são irrelevantes, “[...] é uma conceito que obscurece as relações
econômicas e de poder [...]” (CEPAULINI, 2005, p.60). A segunda considera que os regimes
só vão adquirir importância e utilidade em situações bem definidas e restritas, nas quais os
Estados não conseguem atingir o Ótimo de Pareto22. Por fim, para a terceira escola os regimes
são mais que necessários, são inerentes a qualquer padrão complexo de relações.
Como se pode perceber, os regimes servem para superar problemas de ação coletiva,
ampliar o horizonte de cálculos dos atores, permitir a coordenação das ações dos Estados com
vistas a um determinado resultado, facilitar a reciprocidade e reduzir os custos de transações.
Tendo em vista que não faz parte do objetivo deste trabalho analisar a questão isolada
das teorias de regime, cabe somente justificar a escolha por essa definição porque a mesma
permite a incorporação de outros atores transnacionais – no caso, empresas transnacionais,
que são tema deste trabalho juntamente com as patentes – enquanto influenciadores da
formulação de tais regimes, fato este que será comprovado mais adiante.
22
Diz-se que uma determinada situação representa um “ótimo de Pareto” quando não é possível melhorá-la a
situação de um indivíduo sem piorar a situação de outrem. É também conhecida como “segundo ótimo” uma vez
não se pode atingir a situação considerada ideal sem prejudicar a situação dos demais indivíduos. .
Patentes: o regime internacional...
51
Isto posto, parte-se agora para a o nascimento e evolução deste Regime.
Cruz relata que a globalização regulatória em matéria de PI é um processo com
aproximadamente 200 anos, mas que os autores da área dividem a história do
desenvolvimento da PI em 3 períodos: “[...] o período territorial, caracterizado pela ausência
de uma proteção internacional; o período internacional, que começou na Europa no fim do
século XIX, com as Convenções de Paris para proteção da Propriedade Industrial (1883) e
com a Convenção de Berna para Proteção da Produção Literária e Artística (1886); e, o
período global, cujo início tem seu marco na década de 1980, com a ligação construída pelos
EUA entre PI e comércio, sendo estabelecido no campo multilateral com o Acordo TRIPS em
1994, sob auspícios da OMC.” (CRUZ, 2008, p. 46).
Carla Hesse23(2002) mostra que, na Antiguidade, as criações, as artes e os saberes
eram tidos como dádivas concedidas pelos deuses ou por Deus, contudo, no oriente, antes
mesmo de se falar em leis de PI propriamente ditas, já havia na China antiga, por volta de
618- 907 a.C., na dinastia Tang, “leis de privilégios” que proibiam a transcrição e distribuição
em larga escala da literatura, isso com vistas a proteger os interesses do imperador. Mas, esses
privilégios não figuram como uma forma de PI, pois era um “presente” dado pelo imperador.
Com a invenção da imprensa no século XV e sua rápida difusão, começam a surgir na
Europa estruturas institucionais e legais com a finalidade de garantirem o monopólio
comercial ou “privilégio” sobre as obras em troca da submissão a vigilância e controle do
Estado. Assim,
“The earliest European initiative occurred in Republic of Venice in 1469,
where Johann Speyer was granted an exclusive monopoly or printing in
Venetian territories for a period of five years. The practice of granting
exclusive privileges to print in a particular city, to print a particular text, or
to print a particular category of texts (schoolbooks, laws, Latin texts, etc.)
spread rapidly from Venice throughtout the Italian states, and from there to
France and England”. (HESSE, 2002, p.30)
Essa “lei” de Veneza também é considerada a “primeira lei de patente”, pois
assegurava o privilégio de 10 anos aos inventores de novas artes e máquinas. De 1445 a 1550
foram concedidos em torno de 100 privilégios, os quais pareciam exigir utilidade e colocação
em prática.
Para a autora o caso da Grã- Bretanha foi peculiar: em 1504, é criado o título de
“King’s Printer”, concedido a um cidadão inglês, que obteve o direito exclusivo de imprimir
23
Professora de História na University of Califórnia Berkeley, com interesse nas áreas de Europa Moderna,
França do séculos 16 a 20, História Intelectual da Europa no século 17 a 20. Disponpivel em:
http://history.berkeley.edu/faculty/Hesse/ acessado em 7/4/2010 às 13:55h
Cecília Megali Ogata
52
os documentos oficiais; em 1557 são criadas as “Stationer’s Company”, que detinham um
monopólio virtual sobre a impressão e publicação dentro do território inglês; em 1559,
Elizabeth I decreta que as publicações deveriam ter o aval de “críticos” indicados pela coroa
para serem impressos e colocados em circulação; na década de 70 do século XVI, quatro
dessas companhias passam a possuir o monopólio da publicação, por meio de cartas patentes,
dos livros mais lucrativos da época, observa-se que até este fato, as concessões da coroa ainda
figuravam mais como privilégios do que PI; e, em 1623, é criado o “Estatuto do Monopólio”,
conhecido também como Carta Magna dos direitos do inventor, que “[...] ganhou
reconhecimento por ter sido a primeira lei geral de um Estado moderno em que o monopólio
de patente deveria ser outorgado apenas ao “verdadeiro e primeiro” inventor de um novo bem
industrial” (CRUZ, 2008, p.48)
Durante o século XVIII ocorrem mudanças significativas na Europa, a vida cultural se
modifica, a classe média aumenta e isso gera uma maior procura por livros e invenções que
facilitem a vida cotidiana. Com isso a aumenta também a pressão exercida por mudanças nos
direitos dos autores e patentes, pois agora, além do reconhecimento da autoria, há também a
importância comercial destas criações. Além disso, se consolida a noção de que as invenções
são fruto essencialmente do trabalho humano, não dádivas divinas.
Na segunda metade desse século, o sistema até então vigente nos países europeus entra
em colapso sob forte pressão dos autores e inventores, o que levanta o debate sobre as bases e
propósitos do conhecimento. Ganham força as idéias de Locke de que a propriedade é legítima
e inerente ao homem pois é fruto de sua ação sobre a natureza: “Intellectual property, is a
invention of the eighteenth century, thus brust into the world claiming to be real property in its
purest form.” (HESSE, 2002, p.33). Não se deve mais falar em privilégio, pois o que deve
haver é apenas a confirmação legal de um direito de propriedade anterior, assegurado pelo
trabalho do autor.
É importante ressaltar que outros teóricos também se manifestaram e nem sempre de
acordo com Locke. Para Condorcet, por exemplo, a propriedade sobre obras literárias não é
um direito natural, mas sim, criado pela sociedade; aliás, as própria idéias da mente do homem
não seriam fruto apenas de si mesmo, mas de sua relação em sociedade (Condorcet é um dos
fundadores da teoria do utilitarismo).
Outro marco importante na consolidação do regime de propriedade intelectual foi a
Revolução Francesa, quando se iniciou um movimento pela total liberalização do comércio e
da indústria e, junto a isso, a liberalização também dos direitos autorais e das patentes, as
quais, até 1762, eram concedidas apenas na forma de privilégios, abusivos e arbitrários. A
Patentes: o regime internacional...
53
partir de então, o DPI passaram a receber regulamentações, como a duração de 15 anos, a não
permissão de se herdar um privilégio e a necessidade de utilidade e prática do invento. Por
isso somente em 1793, devido à pressão de um grupo de lobbistas, foi criada a “Declaração
dos Direitos dos Gênios”, que se tornou a base dos direitos autorais na França e incorporados
os princípios da “Carta Magna” inglesa de 1693 sobre os direitos de propriedade das
invenções industriais. Já a Alemanha, embora no século XVI alguns príncipes tenham feito
uso de patentes, só vai possuir uma lei de direitos autorais uniforme em 1870.
Com a Revolução Industrial, o aumento do número de invenções e produtos e com a
maior velocidade na comunicação, inicia-se a preocupação com leis que garantissem esses
direitos também em outros países, pois a difusão de conhecimentos e técnicas estava
ocorrendo de maneira muito acelerada. Além disso, na primeira metade do século XIX, o
clima europeu era de prosperidade, haviam acabado as guerras napoleônicas e o continente se
encontrava em pleno progresso industrial e comercial. Desta maneira, a cooperação entre as
nações européias aumentou, inclusive no que diz respeito às patentes. Cruz observa que “[...]
os princípios das leis de patente encontrados no Estatuto de Monopólio Inglês de 1623 foram
paulatinamente sendo reconhecidos pelos outros Estados.” (2008, p. 49). Então, é no século
XIX que se inicia o Regime de Propriedade Intelectual, enquanto conjunto de normas e regras
sobre os quais os atores internacionais convergem. Quando os Estados começam a se
organizar de modo a estender esses direitos além de seus territórios e consolidar uma maior
harmonização de suas leis é o que se chama de segundo período da construção do Regime.
Começam a surgir no século XIX relações bilaterais que versavam sobre a questão da
PI, principalmente da patente, no tocante a proteção contra a pirataria. A Grã- Bretanha vai
formalizar sua estratégia de reciprocidade, na qual somente reconheceria a patente de um
inventor de outro país se o mesmo país reconhecesse as patentes de cidadãos ingleses. A partir
de então ela passou a firmar contratos com diferentes países. Isso fez com que surgisse um
“emaranhado” de acordos bilaterais sobre DPI, o que passou a dificultar o entendimento dos
mesmos no continente como um todo.
Desta dificuldade e da crescente demanda pela proteção, devido ao rápido processo de
industrialização, desenvolvimento e relações exteriores a que as nações estavam passando,
originaram as duas primeiras Convenções internacionais sobre o assunto: a de Paris para
Proteção da Propriedade Industrial em 1883 e a de Berna para Proteção da Produção Literária
e Artística em 1886.
A segunda, que não aborda o tema central deste trabalho, entrou em vigor em 1887,
assinada por Suíça, Itália, Espanha, França, Grã-Bretanha, Bélgica, Tunísia e Alemanha. Teve
Cecília Megali Ogata
54
como princípios-chaves a reciprocidade, o mesmo tratamento que o dispensado ao autor
nacional, proteção automática e garantia de direitos mínimos ao proprietário da obra, visando
atingir a eficácia e uniformidade à proteção de produções literárias e artísticas. Essa
Convenção tem como diferencial o fato de que deste seu início, ela surge com a pretensão de
ser universal, por isso deixa os Estados livres para decidirem sobre suas próprias legislações.
Em 1873 ocorreu o Congresso de Viena, considerado o primeiro encontro
internacional para a regulamentação dos direitos de propriedade industrial, que terminou com
caráter favorável à proteção patentária, mas, devido ao debate, permitindo a existência de
licenças compulsórias. Em 1878 ocorreu a Conferência de Paris da qual surgiu a Convenção
de Paris.
A Convenção foi criada com o intuito de facilitar o fluxo de tecnologia e estabelecer
requisitos comuns para concessão de patentes (não discriminação e direito de monopólio). Ela
entrou em vigor em 1884, com a assinatura de: Itália, Holanda, Portugal, Espanha, França,
Bélgica, Grã-Bretanha, Suíça, Tunísia e Brasil. Posteriormente em 1885, aderiram a Noruega
e a Suécia e em 1887 os Estados Unidos. Seu embasamento teórico foi o de que a inovação
deve ser premiada, que é fruto do trabalho do homem, por isso ele tem direito de obtê-la como
sua propriedade, o que remete às idéias de Locke.
Desta Convenção surgiu a União de Paris, cujo principal objetivo era promover um
maior intercâmbio de tecnologia entre os países membros por meio da regulamentação da PI.
Sua principal contribuição foi a inserção dos princípios de não-discriminação e de tratamento
nacional às patentes concedidas em diferentes países, princípios estes que estão até hoje
presentes em todos os tratados e acordos do tema. No século XX, já no terceiro período do
regime de DPI, a Convenção passa por seis revisões: 1900 em Bruxelas, 1911 em
Washington, 1925 em Haia, 1934 em Londres, 1958 em Lisboa, 1967 em Estocolmo, e, em
1979, uma emenda foi integrada à Convenção.
A partir da segunda metade deste século, o assunto ficou ainda mais em voga, pois no
mundo, a cada dia, as pessoas faziam novas descobertas que geravam novas invenções. O
domínio de tecnologia passa a ser posto como uma questão de interesse nacional, seu acesso
se tornou fundamental para o crescimento econômico e a participação no mercado
internacional.
“Na organização do sistema internacional do pós-guerra, a ordem de
prioridade de valores começa a se modificar, e as interações entre as
unidades do sistema passam a girar cada vez mais em torno da produção de
riqueza e desenvolvimento. A capacidade tecnológica, isto é, a capacidade
Patentes: o regime internacional...
55
de inovar e criar novas tecnologias a partir da existente, e à qual se tem
acesso mediante a aceitação e o cumprimento de regras de transferência, é o
ponto crucial ou a chave para o caminho do crescimento.” (GANDELMAN,
2004, p. 174)
Na década de 60, com a Revisão de Estocolmo, citada a cima, é criada a Organização
Mundial da Propriedade Intelectual, a OMPI - 1967, para atuar como uma organização
especializada no assunto, com a função de estimular a proteção e a inovação, modernizar a
administração de PI, respeitando a soberania e com tratamento igualitário a todos os
membros.
Ao contrário do que pode parecer, a todo o momento desde o início da formação do
regime sempre houve movimentos que não concordavam com os DPI, ora defendendo que a
atividade intelectual advinha das relações coletivas, por isso deveriam ser um direito de todos;
ora porque esses mais inibiam a difusão de tecnologia do que estimulavam, visto que
impunham uma série de exigências a países ainda pouco desenvolvidos. Assim, dois anos
após a criação da OMPI surge mais um desses movimentos aqui na América Latina, quando
foi assinado o Tratado de Cartagenta entre os países andinos com o propósito de atuarem
conjuntamente para minimizar os efeitos dos investimentos estrangeiros e da transferência de
tecnologia. Na visão do grupo, as patentes tinham efeito negativo sobre o desenvolvimento
porque a maioria era de titularidade estrangeira, substituíam investimentos estrangeiros e
podiam ser fontes de práticas restritivas de negócios.
Na década de 70, o mundo passa por intensas mudanças na organização da produção
industrial e no desenvolvimento de ciências e tecnologias e da relação destas com as
empresas, que passou a funcionar como importante fonte de ganho de competitividade.
Importantes marcas americanas passaram a se consolidar mundo afora, como a Coca-cola, a
IBM e a Ford. Essas empresas passaram a conquistar o mundo não apenas pelos produtos,
mas também pelo conjunto de valores que transmitiam e que estavam agregados às suas
marcas, a seus modelos de distribuição, sua publicidade.
Na mesma época, surge o movimento para uma Nova Ordem Econômica
Internacional (NOEI) liderado pelo G-77, formado de países em desenvolvimento e
subdesenvolvidos que vão compor, na sua grande maioria, o grupo do Não-Alinhados durante
a Guerra Fria. Esse movimento mostrou que os países menos desenvolvidos estavam cientes
das mudanças da economia mundial, mas, mais do que isso, cientes das modificações em suas
próprias capacidades. (CRUZ, 2008).
Cecília Megali Ogata
56
Ainda nessa década, em 1974, a Índia liderou o movimento pela revisão da
Convenção de Paris. Foi publicado um relatório conjunto da United Nations Conference of
Trade and Development (UNCTAD), Economic and Social Concil (ESOCOC) e da OMPI,
que não obteve resultados satisfatórios as suas demandas.
A OMPI, enquanto agência especializada da ONU teve e tem como uma de suas
grandes realizações para melhoria do Regime Internacional de PI, a criação do Tratado de
Cooperação de Patentes (PCT), em 1970. Este tratado tem como objetivo simplificar,
tornando mais eficaz e econômico, tanto para o usuário como para os órgãos governamentais
encarregados na administração do sistema de patentes, o procedimento a seguir, no caso de
uma solicitação para proteção patentária em vários países, como será comentado mais a
frente.
Já na década de 80 ocorre a grande mudança que classifica esse período como um
novo momento no Regime Internacional da PI: relação de PI com o comércio internacional.
Isto acontece principalmente devido ao forte lobby24 exercido pelos grandes empresariados
americanos (principalmente pelos setores: farmacêutico, de entretenimentos, de computadores
e químico), que diante dos altos investimentos em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) de
suas empresas preocupavam-se em impedir que as imitações – relativamente fáceis de serem
feitas nesses setores – levassem à perda de competitividade e lucratividade.. De acordo com
Cruz, isso ocorreu pela primeira vez em 1984, quando os EUA fazem um adendo no “Trade
and Tariff Act”, incorporando oficialmente a PI aos assuntos comerciais. Tal adendo, dentre
outras coisas, permitia ao “United States Trade Representative” – USTR (organismo do
governo norte-americano com status de ministério encarrego de tratar dos assuntos
relacionados ao comércio exterior) – usar a proteção à PI como um critério para eleger os
países que “mereciam” ou não participar do Sistema de Preferências25. Durante muito tempo
o país resolveu suas questões relacionadas à PI por meio de acordos bilaterais, mas a longo
prazo esses acordos poderiam gerar dificuldades de interpretação, custos dispendiosos e
complexidades administrativas.
Daí em diante só aumenta o esforço americano no sentido de que incluir o assunto no
General Agreement on Tariffs and Trade, o GATT, que foi criado logo após o fim da
Segunda Guerra Mundial, em 1947, com a finalidade de harmonizar as políticas aduaneiras
24
É um grupo de pressão na esfera política, um grupo de pessoas ou organizações que tentam influenciar, aberta
ou
secretamente,
as
decisões
do
poder
público
em
favor
de
seus
interesses.
http://www.brasilescola.com/politica/lobby.htm acessado em 30 de setembro de 2009 às 13 horas e 5 minutos.
25
O GSP ou “Generalized System of Prefrences” é um sistema de vantagens preferenciais que garantem a alguns
países em desenvolvimento o acesso preferencial ao mercado americano.
Patentes: o regime internacional...
57
dos signatários e, assim, facilitar suas relações comerciais. Para Marisa Gandelman, esse
interesse de transferir a PI da esfera da OMPI para a do GATT, pauta-se em três razões: o
processo de votação da OMPI, além de contar com mais membros, não viabilizava uma fácil
solução de impasses; no GATT, o país contaria com questões como acesso a mercados e
benefícios comerciais que lhe garantiriam maior poder de barganha, ao contrário da OMPI
onde o assunto era um só; e porque na OMPI os assuntos discutidos versavam apenas sobre
transferência de tecnologia e padrões de proteção.
É necessária uma pequena pausa para enfatizar que desde a década de 70, quando as
empresas vão se tornando realmente transnacionais, passam a “espalhar” sua produção pelo
globo e buscar novos mercados para sua superprodução, surge também a percepção de que as
patentes viriam a funcionar como recursos estratégicos e de ganhos competitivos. Essas
demandas são então repassadas aos governos que vão buscando obter um regime mais
uniformizado, universalizado e rígido. Portanto, as grandes empresas são também formadoras
indiretas do regime.
Na Rodada do Uruguai do GATT se iniciou em 1986, tendo como pauta principal os
chamados “novos temas”: PI, investimentos e serviços, os quais eram interesses prioritários
dos países desenvolvidos. Tentou-se ainda usar das questões agrícolas e têxteis como “moeda
de troca” com os países em desenvolvimento e subdesenvolvidos. Contudo, os EUA
recomendaram a suas grandes empresas que incentivassem as grandes empresas do Japão e da
Europa a também cobrarem de seus governos uma postura mais assertiva a cerca da PI e logo,
se obteve um grande numero de países querendo a inclusão da PI nos temas da rodada.
Paralelamente, foi também formado o G-10, grupo dos 10 países menos
desenvolvidos (Índia, Brasil, Argentina, Cuba, Egito, Nicarágua, Nigéria, Peru, Tanzânia e
Iugoslávia) que eram contrários à inclusão da PI como tema do GATT. Esse movimento não
retrocedeu até o momento em que os EUA aplicaram sanções à Coréia do Sul e ao Brasil,
com base na seção 301, que autoriza o governo norte-americano a aplicar sanções comerciais
contra países que tomem medidas comerciais contrárias aos seus interesses. A partir de então
os países em desenvolvimento aceitaram negociar sobre o assunto e sua inclusão na Rodada e
no GATT.
Gandelman (2004) afirma que tal mudança de comportamento não se deveu apenas à
pressão americana, mas foi influenciada por diversos outros fatores, como: a queda do bloco
socialista e a transformação do sistema internacional da bipolaridade para a unipolaridade;
mudanças internas dentro dos países em desenvolvimento; e a adesão americana à Convenção
de Berna em 1986, que além de o inserir nas discussões sobre direitos autorais, também tinha
Cecília Megali Ogata
58
como intenção possibilitar o desempenho de sua hegemonia, assumindo uma posição de
liderança.
Por fim, em 1995, quando o GATT deixou de existir dando origem à Organização
Mundial do Comércio26, foram incorporados à Ata Final da Rodada quatro anexos, o 1C é o
“Trade Related Aspects of Intellectual Property Rights”, mais conhecido como TRIPS. Este
acordo será analisado detalhadamente mais adiante, por hora cabe dizer que tal acordo teve
como bases legais a Convenção de Paris, a Convenção de Roma sobre intérpretes, produtores
e empresas de radiodifusão, a Convenção de Berna e o Tratado de Washington de 1989 sobre
circuitos integrados. E que ele representa o início da globalização desta forma de propriedade.
No século XXI, com a “Economia do Conhecimento” cada vez mais evoluída, ágil e
dinâmica; com a crescente importância da tecnologia para as empresas e a sociedade de forma
geral; e como a rapidez com que as inovações vêm sendo processadas e comercializadas, a PI
continua sendo um assunto importante e controverso. O que se observa é a entrada de novas
matérias como sendo passíveis de DPI, juntamente com um alargamento do conceito de
propriedade, ou seja, nesse novo século mais e mais ações, produtos, métodos estão sendo
inseridos na proteção patentária ou de outras formas de PI. Alguns exemplos disso são as
formas de vida, as manipulações genéticas e os conhecimentos tradicionais.
Mas, no bojo desses assuntos também vem crescendo o número de ativistas, ONGs e a
própria opinião pública que se posicionam contrários a essas proteções, que julgam
transformar tudo em mercadoria. Questionam valores éticos e a supremacia do bem comum,
da saúde pública e do interesse nacional perante as regras do Regime e os interesses dos
países desenvolvidos e das grandes transnacionais.
2.b.b – Comentários e críticas da evolução do sistema
Uma vez contada a formação histórica do Regime Internacional da Propriedade
Intelectual, essa seção tem o intuito de elaborar comentários críticos a cerca desta formação.
O primeiro e talvez mais nítido é que tal Regime foi elaborado e modificado por
países desenvolvidos, em outras palavras, os “ditadores” das regras sempre foram aqueles
com maiores recursos. Suas intenções estavam pautadas nas suas próprias condições internas,
representavam os seus interesses, ora de proteger seus inventores, ora de proteger suas megaindústrias. Isso mostra que a harmonização não ocorreu por um padrão que alcançasse a
26
A Organização Mundial do Comércio - OMC é um organismo multilateral, internacional, para construção,
defesa e desenvolvimento do sistema mundial do comércio.
Patentes: o regime internacional...
59
todos. Embora os países em desenvolvimento tenham participado das Convenções, reuniões e
acordos, nunca tiveram poder de barganha suficiente para fazer com que tais meios jurídicos
incluíssem suas necessidades, que são diferentes das dos países desenvolvidos. É certo que o
TRIPS, como será comentado mais adiante, inclui algumas salvaguardas para aqueles países,
porém cabe dizer que não equivalem às que os desenvolvidos “se deram” ao longo de todas
essas décadas de consolidação do regime.
Uma das evidências dessa crítica é a coincidência entre a época dos primeiros tratados
internacionais sobre patentes – as Convenções de Berna e Paris, respectivamente, 1886 e 1883
– e o momento em que a Inglaterra se consolida como potência econômica mundial, o
chamado período do laissez-faire sob a égide do padrão Ouro-Libra, a partir de 1870. Graças
a sua Revolução Industrial, o país atingiu um patamar que dificilmente seria alcançado pelos
demais países. Portanto, após décadas sustentando um regime de comércio essencialmente
protecionista para desenvolver sua própria indústria à custa da ruína da indústrias holandesas
e indianas de tecidos, o país decide advogar um regime de livre-comércio, mas para evitar que
os demais países da Europa e os Estados Unidos a alcancem, patrocinam aqueles primeiros
acordos de patentes como forma de garantir seus privilégios de inovador. Assim também o
fizeram Estados Unidos e vários outros países europeus, como a Suíça, por exemplo, que
conhecida mundialmente pela excelência de seus laboratórios farmacêuticos só adotou uma
lei de patentes em 1906, depois que sua indústria farmacêutica, com base na cópia, havia
atingido um nível de excelência mundial; a mesma coisa foi feita pela Japão (CHANG, 2004).
Contraditoriamente, países como o Brasil, que aderiram ao acordo de Paris na primeira hora –
quem assinou o acordo pelo Brasil foi D. Pedro II, antes dos Estados Unidos – permanecem
até hoje como fornecedores de matérias-primas.
O segundo ponto a se destacar diz respeito à atuação americana. Nota-se que o país só
assinou a Convenção de Berna um século depois de sua criação, ao passo que foi o grande
responsável pela inclusão da PI nos assuntos comerciais. O que é aparentemente uma
incoerência, se traduz na atuação americana favorável à PI somente quando seu
desenvolvimento interno não seria prejudicado ou limitado pela mesma. Além disso, é
importante notar também que o país não hesitou em utilizar ações coercitivas contra vários
países de forma unilateral e autoritária.
Neste ponto cabe comentar que a expressão “relacionados ao Comércio” no nome do
acordo - TRIPS - trata-se de uma distorção à essência da proteção intelectual de incentivo aos
inventores e publicação (tornar público) de tais inventos e técnicas, que nada tema ver com
comércio propriamente dito. Essa modificação se deu a medida que a intenção americana era
Cecília Megali Ogata
60
de trazer os assuntos relacionados à PI para o âmbito da OMC, muito mais rigorosa que a
vigente na OMPI. Pode-se, inclusive, questionar porque um tema que já era objetivo de
regulamentação internacional por um órgão da ONU foi submetido a uma nova
regulamentação sob um novo organismo internacional. Ao se modificar o prazo de 10 para 20
anos de duração, a OMC instituiu um verdadeiro poder de monopólio, pois, como já
comentado, em um mundo onde as inovações se processam de forma tão dinâmica e veloz, no
prazo de 20 anos a tecnologia desenvolvida, com certeza já foi ultrapassada. Logo, esse
acordo se contradiz ao que pregoam os desígnios do liberalismo: cada vez maiores e poucas
corporações empresariais então obtendo o monopólio de determinadas inovações e com isso
minando a possibilidade de desenvolvimento de outros países, senão os seus.
Em terceiro lugar, trata-se de um comentário especulativo, pois se nota que os líderes
de cada momento da construção do regime foram aqueles países que mais ganhariam com a
implementação das regulamentações: a França, mediante a Revolução Francesa, a Inglaterra,
mediante a Revolução Industrial e os EUA, mediante ao seu grande avanço industrial no
século XIX e XX. Isso pode levar a pensar que talvez, com o surgimento de uma nova
potência tecnológica, possa também surgir uma nova fase neste regime, que provavelmente
admita mais e mais matérias, que tenha leis específicas para a nanotecnologia, a medicina
genética e partes humanas produzidas artificialmente.
O quarto ponto a ser levantado é a questão da transformação do sentido da patente e
da PI, que até o século XVIII era tida como um meio de proteger o inventor, um direito pelo
seu esforço, que pretendia evitar a cópia alheatória sem consentimento do criador original.
Contudo, no século XIX e, principalmente, no XX, as patentes e a PI passam a ter um valor
econômico e a funcionar elas mesmas como uma mercadoria, de modo que os DPI não mais
estão atrelados à função de proteção do inventor, mas também a de gerar e obter lucros.
Finalmente, é claro na evolução do regime que o conceito de propriedade foi sendo
amplamente modificado a fim de se adequar às demandas dos países ricos e das poderosas
indústrias. Contudo, é preciso que alguns critérios sejam sempre mantidos, ou a patente
perderá seu sentido, se for possível patentear uma simples descoberta ou qualquer processo de
correção de provas escolares, tudo terá se tornado propriedade e com isso o acesso será cada
vez mais restrito e a desigualdade maior.
Patentes: o regime internacional...
61
2.c –Direito das patentes
Depois de relatada a formação do Regime Internacional da PI, deseja-se agora analisar
quais são e o que dizem as legislações brasileiras sobre as patentes e também quais são as
“legislações” internacionais sobre o assunto, ou seja, o conteúdo específico das Convenções,
acordos e Tratados em matéria de patentes.
Começaremos traçando um breve histórico do surgimento das legislações de
Propriedade Industrial, interna e externamente, de forma geral e depois passaremos ao
detalhamento apenas daquelas vigentes e que dizem respeito às patentes.
2.c.a – Legislação e Órgãos Nacionais
De acordo com o Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) a primeira
iniciativa nacional no sentido dos DPI data de 1809. Foi um Alvará assinado pelo príncipe
regente D. João, que isentava qualquer matéria-prima utilizada pelas indústrias de pagar
direitos de entrada em todas as alfândegas dos estados, quando o fabricante as comprasse para
gasto de sua fábrica. Também concedia algumas regalias a fabricantes, manufaturas nacionais
e à navegação. Contudo, o mais importante desse alvará diz respeito ao seu sexto parágrafo,
no qual já é destacada a importância de incentivar e proteger o inventor com privilégios
exclusivos de 14 anos de duração, mediante uma avaliação do invento:
“VI. Sendo muito conveniente que os inventores e introdutores de alguma
nova máquina e invenção nas artes gozem do privilégio exclusivo, além do
direito que possam ter ao favor pecuniário, que sou servido estabelecer em
benefício da indústria e das artes, ordeno que todas as pessoas que estiverem
neste caso apresentem o plano de seu novo invento à Real Junta do
Comércio; e que esta, reconhecendo-lhe a verdade e fundamento dele, lhes
conceda o privilégio exclusivo por quatorze anos, ficando obrigadas a
fabricá-lo depois, para que, no fim desse prazo, toda a Nação goze do fruto
dessa invenção. Ordeno, outrossim, que se faça uma exata revisão dos que se
acham atualmente concedidos, fazendo-se público na forma acima
determinada e revogando-se todas as que por falsa alegação ou sem bem
fundadas razões obtiveram semelhantes concessões.” 27
A segunda regulamentação é a lei nº3.129 de 14 de outubro de 1882, assinada por D.
Pedro II. Essa lei regula a concessão de patentes aos autores de invenção ou descoberta
industrial. Ela protegeria a invenção de novos produtos industriais, a invenção de novos meios
27
http://www.inpi.gov.br/menu-esquerdo/patente/pasta_legislacao/alvara_28_04_1809_html acessado em 25 de
setembro de 2009 às 9 horas.
Cecília Megali Ogata
62
ou a aplicação nova de meios conhecidos para se obter um produto ou resultado industrial e o
melhoramento de invenção já privilegiada, que tenha tornado mais fácil a fabricação do
produto ou uso do invento privilegiado. Não poderiam ser patenteadas invenções contrárias à
moral e à lei, ofensivas à segurança pública, nocivas à saúde pública e que não oferecessem
resultado prático industrial. Só poderia ser concedida pelo Poder Executivo, duraria 15 anos e
poderia ser desapropriada pelo Estado caso houvesse necessidade pública. Ainda garantia
proteção a inventores de outras nacionalidades, se esses preenchessem as formalidade
nacionais. Já expunha as questões da nulidade e caducidade da patente.
A terceira medida foi uma lei sem número, de 1830, que concedia privilégio de
exclusividade a quem descobrisse, inventasse ou melhorasse uma indústria útil e concedia um
prêmio ao que introduzisse uma indústria estrangeira, sendo este firmado por meio de uma
patente, com duração de 5 a 20 anos. O curioso dessa lei era que caso mais de uma pessoa
aparecesse com o mesmo pedido, o pedido seria concedido a ambas.
A lei nº 16.254 de 1923 criou a Diretoria Geral de Propriedade Industrial. Essa lei
versava sobre a constituição dessa Diretoria, da concessão dos privilégios, do registro das
patentes, das taxas e anuidades, da cessão, transferência e restrição das patentes, da nulidade e
caducidade, das infrações e penalidades e do registro e arquivamento.
Em 1934, é promulgada outra lei – nº 24.507, que aprova o regulamento para a
concessão de patentes para desenho ou modelo industrial, para o registro de nome comercial e
do título de estabelecimentos e, para a repressão à concorrência desleal. Alguns anos mais
tarde, em 1945, é criado o Código da Propriedade Industrial, por meio da lei nº 7.903, que
regula os direitos e obrigações concernentes à propriedade industrial. Neste código constam
as disposições, exigências, duração e punições sobre cada tipo de propriedade industrial, ou
seja, a concessão de privilégio de patente de invenção, modelos de utilidade, desenhos ou
modelos industriais e variedades novas de plantas e de registros através de marcas de
indústria e de comércio, nomes comerciais, títulos de estabelecimento e insígnias, expressões
e sinais de propaganda e recompensas industriais.
Vinte e quatro anos mais tarde é feita uma mudança nesse código, com a lei nº1.005 e
não são mais consideradas propriedade industrial: modelos de utilidade, variedades novas de
plantas, nomes comerciais, insígnias comerciais e recompensas industriais. No ano seguinte,
em 1970, a lei nº 5.648 estabelece a criação do INPI e em 1971, com a lei nº5.772, é feita uma
reformulação no Código da Propriedade Industrial, que institui um novo código. Observa-se a
reincorporação dos modelos de utilidade:
Patentes: o regime internacional...
63
“Art. 2.° A proteção dos direitos relativos à propriedade industrial se efetua
mediante:
a) concessão de privilégios: de invenção; de modelo de utilidade; de modelo
industrial; e de desenho industrial;
b) concessão de registros: de marca de indústria e de comércio ou de
serviço; e de expressão ou sinal de propaganda;
c) repressão a falsas indicações de procedência;
d) repressão à concorrência desleal.” 28
Em 1988 foi promulgada a nova Constituição brasileira que faz referência, em seu Art.
5º (sobre os direitos do homem), à propriedade , inclusive a dos autores e inventores sobre
suas obras:
“Art. 5.º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se a todos os brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes:
.......
XXVII - aos autores pertence o direito exclusivo de utilização,
publicação ou reprodução de suas obras, transmissível aos herdeiros pelo
tempo que a lei fixar.
XXVIII - são assegurados, nos termos da lei:
a) a proteção às participações individuais em obras coletivas e à
reprodução da imagem e voz humanas, inclusive nas atividades desportivas;
b) o direito de fiscalização do aproveitamento econômico das obras que
criarem ou de que participarem aos criadores, aos intérpretes e às respectivas
representações sindicais e associativas.
XXIX - a lei assegurará aos autores de inventos industriais
privilégio temporário para sua utilização, bem como proteção às criações
industriais, à propriedade das marcas, aos nomes de empresas e a
outros signos distintivos, tendo em vista o interesse social e o
desenvolvimento tecnológico e econômico do País.
.......”29
Contudo, a principal e atual lei vigente sobre o assunto é a nº9.276 de 1996. Essa lei
foi estabelecida logo após a conclusão das negociações do antigo GATT, que deram origem à
OMC e ao TRIPS. Acordo este que foi internalizado imediatamente pelo Brasil, como uma lei
ordinária, não passando pelos tramites como um código.
Essa lei possui 244 artigos, divididos em disposições preliminares e oito títulos, a
saber: patentes, desenhos industriais, marcas, indicações geográficas, crimes contra a PI,
transferência de tecnologia e da franquia, disposições gerais e disposições transitórias e finais.
Tomando como base a delimitação deste trabalho e sua natureza não-jurídica, os comentários
serão acerca apenas dos pontos mais relevantes da lei que tratam da patente.
28
http://www.inpi.gov.br/menu-esquerdo/patente/pasta_legislacao/lei_5772_1971_html acessado em 26 de
agosto de 2009 às 9 horas e 32 minutos.
29
http://www.ufmg.br/prpq/LegPICT&IT.html acessado em 26 de agosto de 2009 às 11 horas.
Cecília Megali Ogata
64
Consta como uma das obrigações dos titulares de patentes o pagamento de anuidades
junto ao INPI durante todo período de vigência da patente, relativa à manutenção do processo
do pedido. O não pagamento ocasionará a extinção deste privilégio, se já foi concedido, ou
seu arquivamento no caso de estar com o processo em andamento. Outra obrigação é a
exploração efetiva da patente, ou seja, colocá-la em uso, caso isso não ocorra em até três anos
após a concessão, estará sujeito a um processo de licença compulsória, podendo ser concedido
a outra pessoa ou empresa.
Os requisitos de patenteabilidade são: (1) constituir uma novidade, isto é não tenha
sido divulgado de nenhuma forma em meio de comunicação; (2) ser passível de aplicação
industrial, quer dizer, possível de ser produzida em série e para consumo; e (3) ser resultado
de uma atividade inventiva, totalmente nova, sem precedentes no mercado ou que apresente
uma melhora funcional significativa em comparação ao que já existe. Não podem ser
patenteados: o que for contrário à moral, segurança pública e interesse nacional; substâncias,
matérias, misturas e elementos de qualquer espécie; parte ou todo de seres vivos, exceto os
que tenham alguma característica fruto da ação humana sobre ele ou que tenham sido
modificados geneticamente; descobertas; teorias científicas, concepções abstratas, regras de
jogos e métodos matemáticos; criações estéticas, obras literárias e artísticas30; programas de
computador31; e técnicas e métodos cirúrgicos, terapêuticos ou de diagnóstico.
A patente pode ser classificada em “de invenção”, quando é algo ou algum processo
inédito – duração de 20 anos, de acordo com o Art.40 – e “de utilidade”, quando apresenta
uma melhoria a algo já existente – duração de 15 anos, de acordo com o Art.40.
Estão também especificados na lei os procedimentos necessários para o requerimento
de uma patente. O primeiro passo é protocolar no INPI, em uma de suas delegacias regionais
ou via postal, um pedido de patentes, definindo bem o produto ou processo, da forma mais
abrangente possível, apresentando todos os detalhes da técnica. O pedido fica em sigilo até
sua publicação, embora no Brasil, haja o “período de graça”, que é a permissão de divulgação,
por parte do inventor ou de pessoa autorizada, no período de até um ano antes da divulgação,
em palestras, exposições e publicações, sem que isso seja considerado quebra de novidade.
É recomendado que se faça um exame prévio junto ao Banco de Patentes do Centro de
Documentação e Informação Tecnológica – CEDIN, a fim de se evitar o pedido sobre algo já
patenteado. Feito o pedido, esse será encaminhado para exame, o qual resultará num parecer
30
31
Esse tipo de produção é protegido pela lei de direitos autorais: nº9.610 de 1998
Esse tipo de produção é protegido por uma lei específica nº9.609 de 1998
Patentes: o regime internacional...
65
favorável, que concederá a Carta Patente, ou num parecer contrário, ou mesmo em um
requerimento de reformulações.
Os custo básicos são: a taxa de depósito de R$ 140,00, que pode diminuir para R$
55,00 para pessoas físicas, instituições de ensino e pesquisa e microempresas; a taxa de
pedido de exame de invenção com até 10 reivindicações de R$ 400,00; a taxa do pedido de
exame do modelo de utilidade de R$ 280,00; e pela expedição da Carta Patente, taxa de R$
95,00 para invenção e de R$ 40,00 para modelo de utilidade32.
As licenças para exploração podem ser obtidas de duas formas: voluntária e
compulsória. A primeira ocorre quando o proprietário da patente celebra um contrato de
licença para exploração, ficando o licenciado investido pelo titular de todos os poderes para
agir em defesa da patente. O contrato de licença deverá ser averbado no INPI para que
produza efeitos em relação a terceiros e qualquer aperfeiçoamento introduzido na patente será
de posse do que o fizer.
A segunda é concedida em caso de uso dos direitos de patente de maneira abusiva; de
não exploração do objeto patenteado em território nacional, com exceção de casos devidos a
inviabilidade econômica ou comercialização insuficiente; e se não ocorrer a fabricação após
três anos da sua concessão. Também pode ser proclamada licença compulsória temporária e
não exclusiva em casos de emergência nacional e interesse público, como: saúde pública,
nutrição, defesa do meio ambiente, desenvolvimento tecnológico, sócio-econômico e casos de
perigo público.
A extinção da patente ocorrerá quando expirar seu prazo, quando o titular renunciar,
pela caducidade (não ter sido explorada) ou pela falta de pagamento de anuidade. Contudo, há
o recurso da restauração, que permite o restabelecimento de seu andamento processual e
deverá ser requerida no prazo de três meses a contar da data da notificação (publicação na
Revista de Propriedade Indústrial) do seu arquivamento, por falta de pagamento da anuidade.
Uma vez extinta a patente cai em domínio público.
A nulidade administrativa acontece quando não tiverem sido atendidos os requisitos
legais, inclusive para preenchimento dos relatórios e das reivindicações; quando o objeto se
estender a algo não requisitado no depósito e quando alguma formalidade essencial tiver sido
omitida.
A lei prevê ainda medidas punitivas para crimes contra as patentes: para violação das
patentes de invenção a pena é de detenção de três meses a um ano ou multa e para quem
32
De acordo com o site do INPI – www.inpi.gov.br - acessado em 2010.
Cecília Megali Ogata
66
comercializar produto produzido sem a devida licença a pena é de multa e de um a três meses
de detenção.
A lei ainda aborda o caso em que a invenção é fruto do empregado ou de prestador de
serviço. Ela será do empregador se resultar de atividade inventiva advinda da própria natureza
do trabalho empregado. Será do empregado se a invenção for fruto do trabalho não
relacionado ao que exerce dentro do estabelecimento e não tenha feito uso das ferramentas a
este pertencentes. E será comum dos dois se for fruto de atividade do empregado, mas com
contribuição dos recursos do empregador.
Resta ainda comentar a questão do pipeline, regido pelos Art. 230 e 231, o qual
significa, basicamente, “[...] o mecanismo em que a patente expedida no exterior é
reconhecida no Brasil apenas até o tempo em que ela leva para expirar no país de origem.”33
“De acordo com a Lei de Propriedade Industrial, os pedidos ou depósitos no
sistema pipeline deveriam ser feitos no prazo de um ano contado da
publicação da Lei – ocorrida em 15/05/96 – e as patentes seriam concedidas
sem avaliação prévia do INPI. Bastava à requerente comprovar a existência
do depósito original em outro país para ser-lhe concedido o direito de
prioridade no Brasil, por meio de depósito aqui. E assim que concedida a
patente no país onde foi depositado o primeiro pedido, haveria concessão no
Brasil. Por isso, as patentes pipeline são conhecidas como patentes de
importação ou revalidação.”34
A lei nº10.196 de 2001 “[...] acrescentou
que os pedidos relativos a produtos
farmacêuticos e produtos químicos para a agricultura, não protegidos pela legislação de 1971,
depositados entre primeiro de janeiro de 1995 e 14 de maio de 1997, seguirão os critérios de
patenteabilidade da Lei 9.279, assegurando a proteção a partir da data da concessão das
patentes, pelo prazo restante a contar do dia do depósito no Brasil.” (CRUZ, 2008, p.94)
As principais críticas que podem ser feitas a esse mecanismo são a de que não é algo
estipulado pelo TRIPS, ou seja, é uma “regalia” oferecia pela legislação nacional, que
privilegia depositários estrangeiros e que é um monopólio concedido, sem o requerimento de
novidade, um dos requisitos fundamentais, segundo a mesma legislação, para se obter o
privilégio.
De acordo com as estatísticas do INPI, até 2004 o número de depósitos de pedidos de
patente de não residentes era, em média, o dobro do relativo a residentes, contudo em 2005
essa posição se inverteu, prevalecendo os depósitos de residentes. Ainda de acordo com os
33
http://www.inpi.gov.br/noticias/anvisa-patente-pipeline-e-criacao-nacional-1/ acessado em 23 de agosto de
2009 às 14 horas e 15 minutos.
34
http://www.deolhonaspatentes.org.br/?cid=718 acessado em 25 de setembro de 2009 às 14 horas.
Patentes: o regime internacional...
67
dados do Instituto, até 1996 a maioria dos depósitos se referia a Privilégio de Invenção, a
partir desta data a maior parte foi proveniente do PCT, o que demonstra maior interesse, por
parte de inventores estrangeiros em garantirem seus direitos em diversos lugares.
Como já mencionado, o órgão responsável pela administração, concessão, registro e
avaliação das patentes, no Brasil é o INPI, que foi criado em 1970 e está vinculado ao
Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. O instituto sofreu uma
reestruturação em 2004 a fim de modernizar tanto os processos administrativos quanto as
áreas fins, em especial as relacionadas às marcas e patentes. Concluiu a primeira fase em
2006 com a contratação de 330 novos funcionários e com a criação da Ouvidoria e da
Diretoria de Articulação e Informação Tecnológica. Procurou-se também implementar um
projeto que viabiliza o requerimento de proteção de marcas via internet. Na segunda fase
pretende-se conferir ao INPI importância estratégica nacional, rever o estatuto jurídico,
modernizar e fortalecer sua política de recursos humanos, melhorar as instalações físicas e as
informatizações.
O Instituto possui parcerias com a Confereção Nacional da Indústria (CNI) e o
SEBRAE e realiza Ciclos de Discussões Técnicas sobre temas variados a fim de promover a
interação com a sociedade. A sede fica no Rio de Janeiro – RJ, mas possui representações em
todos os estados da federação.
2.c.b – Legislação e Órgãos Internacionais
Como já foi feito anteriormente, neste capítulo, um histórico do desenvolvimento e da
evolução de todo Regime Internacional da Propriedade Intelectual, particularmente das
patentes, apenas serão citados os principais acordos internacionais anteriores ao TRIPS, o
qual será detalhado melhor por ser o principal instrumento de regulamentação do assunto nos
dias atuais.
Recapitulando, temos a primeira fonte de normatização do regime, com a formação da
União de Paris, fruto da Convenção de Paris de 1883. Essa convenção, como já foi dito, passa
por revisões ao longo do século XX, mas os princípios originários nela, como a questão do
tratamento nacional às patentes estrangeiras registradas no país e a concessão estar restrita a
uma determinada territorialidade fazem parte das normas atuais.
Em 1967, com a criação da OMPI, por meio da convenção de Estocolmo, a PI ganha
um arcabouço muito forte no que tange sua maior harmonização e regulamentação, pois, além
de ser uma organização de caráter mundial, é também uma agência especializada e da ONU, a
maior e mais forte Organização Internacional da qual fazem parte 192 países.
Cecília Megali Ogata
68
No que tange as regras, foram mantidas as mesmas presentes nas Convenções de Paris
e Berna, mas houve a novidade da inclusão de “performance dos artistas, fonogramas e
radiodifusão35” como itens que se enquadram no conceito de PI. Além disso, foi estabelecida
uma Assembléia Geral formada pelos signatários, para realização de revisões, alterações e
tomadas de decisões. Também possui uma Conferência para discutirem temas relativos à PI
que interessem a todos e um Comitê para assessorar os órgãos e preparar as agendas tanto da
Assembléia como da Conferência. Essa organização ainda possui a capacidade de concluir
acordos com outras organizações e buscar cooperação com outros órgãos de diferente
natureza.
No entanto, a maior contribuição, sem dúvidas, da OMPI foi a criação do Tratado de
Cooperação de Patentes – PCT, estabelecido em 19 de junho de 1970, em Washington.
“O PCT tem como objetivo simplificar, tornando mais eficaz e econômico,
tanto para o usuário como para os órgãos governamentais encarregados na
administração do sistema de patentes, o procedimento a seguir, no caso de
uma solicitação para proteção patentária em vários países. No que se refere
ao pedido internacional, o tratado prevê basicamente o depósito
internacional e uma busca internacional. O depósito do pedido internacional
deve ser efetuado em um dos países membros do PCT e tal depósito terá
efeito simultâneo nos demais países membros. O Pedido Internacional, junto
com o relatório internacional da busca, é publicado após o prazo de dezoito
meses contados a partir da data de depósito internacional ou da prioridade,
se houver.”36
O Tratado não substitui a legislação nacional e nem a necessidade de se fazer um
depósito de pedido nacional nos escritórios recomendados, contudo, tem como vantagem que
antes do início da Fase Nacional, o usuário, já com conhecimento do Relatório de Busca
Internacional e da opinião escrita, poderá avaliar as possibilidades reais de patenteabilidade
do seu pedido, prosseguindo ou não com o mesmo. Esta avaliação é importante em vista dos
gastos de tramitação necessários nas respectivas Fases Nacionais.
O seguinte organograma elaborado pelo INPI explicita esses tramites:
35
Em 1961 foi assinada a Convenção de Roma que trata dos direitos conexos aos direitos de autor, reconhecendo
o direito da empresa de radiodifusão sobre o sinal transmitido, bem como o das produtoras sobre as gravações
artísticas sonoras.
36
http://www.inpi.gov.br/menu-esquerdo/patente/pasta_pct acessado dia 21 de setembro às 18 horas.
Patentes: o regime internacional...
69
Fonte: INPI
Na última década do século XX é assinado, no âmbito do novo sistema GATT/OMC,
o Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual relacionados ao Comércio –
TRIPS (sigla inglesa), que marca a transição da PI para o campo também do comércio.
Segundo Vera Thorstensen (2001, p.219),
“A questão da propriedade intelectual afeta a área do comércio internacional de
várias maneiras. Uma delas é que os produtores exportadores de bens de maior
conteúdo tecnológico desejam garantir que os altos custos que incorreram com
pesquisa e desenvolvimento fiquem protegidos nos países produtores. Outra maneira
é porque os investidores desejam produzir localmente, ou conceder licenças de
produção a países que tenham como garantir a proteção da tecnologia transferida.
Finalmente, produtores e exportadores estão cada vez mais preocupados com a
questão da pirataria e contrafação em países que dão proteção a propriedade
intelectual.”
Este acordo foi estabelecido ao término da Rodada do Uruguai e teve o prazo para sua
implementação um ano para países desenvolvidos e cinco para em desenvolvimento. Seu
objetivo central era estabelecer um quadro de referências, para negociações multilaterais, de
princípios, regras e disciplinas sobre PI, para que esta não se transformasse em mais uma
barreira ao comércio internacional.
O acordo está dividido em sete partes: I. Disposições Gerais e Princípios Básicos; II.
Normas Relativas à Existência, Alcance e Exercício de Direitos de PI; III. Observância dos
Direitos de PI; IV. Aquisição e Manutenção dos Direitos de PI e Procedimentos
Cecília Megali Ogata
70
Contraditórios Relacionados; V. Prevenção e Solução de Diferenças; VI. Disposições
Transitórias; e VII. Disposições Institucionais.
A parte I diz que os signatários podem implementar, em suas próprias legislações,
regulamentações para uma proteção mais rígidas, desde que essa não conflite com os
dispositivos do acordo. Além disso, o TRIPS substitui e incorpora as convenções, tratados e
acordos anteriores a ele sobre PI, como a de Berna e de Paris, por exemplo. Prevalecem como
princípios fundamentais a cláusula de nação mais favorecida, segundo a qual o mesmo
privilégio concedido a um determinado membro, deve ser estendido a todos os demais; e a do
tratamento nacional, ou seja, dar-se-á o mesmo tratamento tanto para residentes, como para
não-residentes.
São apontados como elementos de PI: direito de autor, marcas, indicações geográficas,
desenho industrial, patentes, topografia de circuitos integrados, proteção de informação
confidencial, controle de práticas de concorrência desleal em contratos de licenças.
Na parte II há oito seções cada uma abordando especificamente cada uma dessas
formas de PI acima citadas. A seção V aborda as questões relativas às patentes, vai do Art.27
ao Art.34. O primeiro, então, corresponde aos requisitos de patenteabilidade: “qualquer
invenção, de produto ou de processo, em todos os setores tecnológicos, será patenteável,
desde que seja nova, envolva um passo inventivo e seja passível de aplicação industrial”37.
Faz a ressalva de que o país pode considerar não passíveis de patente aquelas invenções cuja
exploração em seu território seja necessário para proteger a ordem pública, a moralidade, a
vida ou a saúde humana, animal ou vegetal ou para evitar sérios prejuízos ao meio ambiente.
O próximo artigo, 28, versa sobre os direitos dos titulares das patentes e o 29 sobre a
necessidade do requerente de divulgar a invenção de modo suficientemente claro e completo
para permitir que um técnico habilitado possa realizá-la, além da indicação do melhor método
de se realizar a invenção. O Art. 33 define como prazo de vigência o período de 20 anos a
partir do depósito e o Art. 34 refere-se ao patenteamento de processos.
O acordo ainda diz que suas exigências devem ser aplicadas de maneira justa e
eqüitativa, sem procedimentos caros e complicados desnecessários; prevê remédios para casos
de violação dos dispositivos, como, por exemplo, indenizações; permite às autoridades a
aplicação de medidas cautelares em caso de violação dos DPI, sobretudo se essa afeta o
comércio e para preservar provas; e versa sobre os procedimentos em caso de pirataria e dos
remédios aplicáveis nesse caso, podendo os membros aplicar medidas penais.
37
http://www.inpi.gov.br/menu-esquerdo/patente/pasta_legislacao/27-trips-portugues.doc/download acessado
em 21 de setembro de 2009 às 23horas e 25 minutos.
Patentes: o regime internacional...
71
Na parte V o TRIPS aborda questão da solução de controvérsias, que cobra a
transparência das legislações nacionais sobre PI, devendo estas serem publicadas logo que
postas em vigor. Por fim, nas duas últimas partes, fala-se sobre a extensão de 10 anos para
implementação do acordo para países de menor desenvolvimento relativo e da ajuda a esses
quanto à transferência de tecnologia; sobre a não existência de reservas no acordo; sobre as
obrigações e funções do Conselho; sobre a concordância entre os membros de cooperarem a
fim de que a proteção à PI não se torne uma barreira comercial; e sobre a não obrigação
dessas regras aos assuntos e casos posteriores a ela.
Assim, nota-se, que o órgão responsável pela regulamentação dos DPI,
internacionalmente, apesar de existir a OMPI, uma agência especializada no assunto, na
prática, é a OMC. No Art. 4 do TRIPS estabelece-se o acordo OMPI-OMC, cabendo a
primeira o fornecimento de conhecimento e know-how à segunda sobre PI, sendo a OMPI o
foro responsável pelo avanço da PI por outros instrumentos e tratados. Mas, existem, além
dessas organizações, algumas organizações supranacionais de caráter regional, como é o caso
da Organização Européia de Patente (EPO), Convenção Eurasiana de Patentes e a
Organização Regional Africana de Propriedade Industrial (ARIPO) e também algumas seções
especiais dentro de outras organizações que abordam o assunto, como é o caso da ALCA e da
União Européia
2.d – Paradoxo das patentes: desenvolvimento?
Depois desta análise de toda formação do Regime Internacional, das legislações
vigentes e dos procedimentos exigidos no território brasileiro e no exterior para a aquisição da
carta patente, essa seção se dedica a levantar pontos de análise sobre o papel das patentes
dentro das questões de desenvolvimento. Afinal, ao mesmo tempo em que a patente parece ser
necessária para estimular o inventor e garantir os direitos daqueles que se dedicam a
atividades inovativas, há fortes evidências de que ela não tem cumprido com seus papéis de
difusão e transferência tecnológica e conseqüentemente, de indutor de desenvolvimento; pelo
contrário tem contribuído para maior concentração tecnológica e servido aos interesses dos
países desenvolvidos.
Primeiramente, é importante definir que, para este trabalho, “desenvolvimento” não se
refere somente a um estágio de bons índices sociais e econômicos, com estabilidade política e
constantes taxas de crescimento a ser atingido pelos países. Entende-se aqui que o
desenvolvimento de um país é antes de mais nada o desenvolvimento humano, ou seja, “um
processo que amplia as possibilidades de escolha das pessoas, permitindo-lhes viver de modo
seguro, com liberdades e direitos plenos. O desenvolvimento humano requer que haja um
Cecília Megali Ogata
72
crescimento econômico sustentável e eqüitativo. Exige também a promoção da igualdade
entre homens e mulheres e a participação das pessoas nas decisões que afetam sua vida.”
(IPEA, 2004, p.41)
O famoso “Chutando a Escada” de Ha-Joon Chang, publicado em 2004, tem como
tese central a defesa de que as instituições e políticas “boas” recomendadas atualmente pelos
países desenvolvidos aos em desenvolvimento e que são usadas, por muitos autores, para
justificar o patamar de desenvolvimento atingido por aqueles países, na verdade, não foram as
utilizadas por eles em seus momentos de crescimento, desenvolvimento e ascensão. Pelo
contrário, valeram-se de políticas opostas.
Quanto às políticas de desenvolvimento econômico, Chang critica que todos os países
desenvolvidos usaram de medidas protecionistas, de subsídios, de práticas de espionagem e
outras ferramentas que hoje condenam, recomendando a implantação de aparatos que
facilitem a liberalização comercial e econômica. Nesse sentido, ele argumenta que até o
século XIX os países não haviam se empenhado, tão pouco exigido, instrumentos de proteção
à propriedade intelectual. A transferência de tecnologia ocorria por meio da importação do
inventor e do próprio invento. Com a evolução para produtos mais complexos começaram a
se organizar para propor essas regulamentações (Convenções de Berna e Paris), contudo,
continuaram violando essas regras até boa parte do século XX.
Ha-Joon Chang define como as instituições “boas”, a democracia, a burocracia e o
judiciário, a governança empresarial, as instituições financeiras, o bem-estar social e as
instituições trabalhistas e os direitos de propriedade.
Sobre a democracia, a tese comumente defendida é de que ela ajuda o
desenvolvimento econômico, sendo, portanto, indispensável. Contudo, a história mostra que
dos 19 países mais desenvolvidos, apenas cinco adotaram o sufrágio universal no começo do
século XX, a maioria o faz na segunda metade ou na década de 40. Assim também ocorre no
que diz respeito às questões de propriedade, principalmente, intelectual. Os primeiros regimes
instituídos pelos países desenvolvidos eram bastante “deficientes”, com altos custos dos
processos e verificação de originalidade muito frouxa, levando ao patenteamento de
tecnologias importadas e já em uso. A Suíça só teve uma lei de patentes comparável à dos
países desenvolvidos como ela, em 1954, sendo excluídas as substâncias químicas até 1978.
Na atualidade, o TRIPS foi posto como obrigatório aos países em desenvolvimento e
subdesenvolvidos, inclusive porque foi assinado dentro do acordo da OMC em regime de
“single undertaking”, ou seja, um único acordo para todas as questões discutidas na Rodada
do Uruguai, quem o assinasse, automaticamente estaria concordando com todos os demais
acordos no “pacote”.
Sintetizando, então, a idéia do autor, pode-se citar:
“Quando estavam em situação de catching-up, os PDs protegiam a indústria
nascente, cooptavam mão-de-obra especializada e contrabandeavam
Patentes: o regime internacional...
73
máquinas dos países mais desenvolvidos, envolviam-se em espionagem
industrial e violavam obstinadamente as patentes e marcas. Entretanto, mal
ingressaram no clube dos mais desenvolvidos, puseram-se a advogar o livrecomércio e a proibir a circulação de trabalhadores qualificados e de
tecnologia; também se tornaram grandes protetores de patentes e marcas
registradas. Assim, parece que as raposas têm se transformado em guardiãs
do galinheiro com perturbadora regularidade.” (CHANG, 2004, p. 114)
“No entanto, o que parece claro para nossa análise é que as instituições,
tipicamente, levaram décadas ou mesmo gerações para se desenvolver.
Nesse contexto, a exigência atual e tão generalizada de que os países em
desenvolvimento adotem, imediatamente ou nos próximos cinco a dez anos,
instituições de “padrão mundial”, ou que sofram punições por não o terem
feito, parece contrariar a experiência histórica dos próprios PADs38 que
fazem tal exigência.” (CHANG, 2004, p.200)
“[...] podemos concluir que, na aurora do desenvolvimento econômico, os
PADs operavam com estruturas institucionais muito menos desenvolvidas
do que as hoje existentes nos países em níveis de desenvolvimento
comparáveis. É ocioso dizer que o nível de desenvolvimento institucional
dos PADs estava muito abaixo dos “padrões globais” ainda mais elevados
com os quais os países em desenvolvimento têm sido exortados a se
conformar” (CHANG, 2004, p. 203)
Essa seria então uma visão de que o Regime de DPI não ajuda no desenvolvimento
dos países menos desenvolvidos, como no passado não foi fundamental para os desenvolvidos
de hoje. Pelo contrário, seria uma barreira tanto à transferência de tecnologia quanto a
aplicação desta nas atividades econômicas e sociais internas.
Em posição contrária, os estudos de Robert M. Sherwood (2002) defendem que a
proteção a PI pode ser tomada como um elemento de infra-estrutura do país e nesse sentido
beneficiar os países em desenvolvimento, o que configuraria uma nova teoria de PI, segundo
o autor, a do “benefício público” ou “estímulo ao desenvolvimento econômico”, ou ainda
“taxa de retorno social”.
Para Sherwood, com o desenvolvimento de novas tecnologias, a proteção a PI torna-se
evidente, facilitando o fluxo de conhecimento técnico para estudiosos e pesquisadores dos
países que estão dispostos a proteger tais conhecimentos, o que influenciará na hora de
planejar e decidir a atividade industrial. De acordo com sua pesquisa realizada junto ao
empresariado brasileiro da época (1992) a falta de uma proteção efetiva de patentes e
copyrights foi dada como uma razão para perdas, além disso 47% dos entrevistados
declararam ter tido perdas de segredos de negócio para outras companhias.
38
Países Desenvolvidos
Cecília Megali Ogata
74
Quanto às empresas estrangeiras, transnacionais, chamadas pelo autor de
multinacionais, ele mostra que encontram “saídas” mais facilmente para a ineficácia ou
inexistência de proteção, porque “[...] podem desenvolver sua tecnologia no estrangeiro e
depois escolher elementos que podem ser trazidos para o país que as acolhem, com um menor
risco de perda.” (SHERWOOD, 1992, p.137).
Destaca também a importância desses recursos de proteção para promoverem uma
maior interação universidades-indústrias, no sentido de que os pesquisadores se sentem mais
seguros para passarem seus conhecimentos e invenções ao setor privado. Outro ponto
incentivado pela proteção seria a criação de mais centros de pesquisas.
“A incapacidade das universidades dos países em desenvolvimento e
seus pesquisadores de obter rendimentos por meio de royalties
cobradas pelos resultados de sua pesquisa significa não apenas a perda
direta daquele dinheiro. Significa também a perda do reconhecimento
público de que as universidades produzem resultados positivos. E isto,
provavelmente tem uma influência não-declarada sobre a alocação de
recursos públicos escassos.” (SHERWOOD, 1992, p. 143)
A proteção forte à PI viabiliza um maior fluxo de informações e tecnologias, pois
inspira maior confiança para os inventores, uma redução dos riscos de perdas e,
consequentemente, pode atrair maiores investimentos internos e externos. Desta maneira o
autor coloca como mitos da proteção fraca a economia de divisas para o país, a promoção da
indústria nacional, a ajuda na aquisição tecnológica e a diminuição de dependência.
Para ele não há redução de custos porque esse raciocínio deixa de considerar que os
padrões de atividade e as instituições que seriam encorajados pela ausência da proteção,
podem desaparecer ou se tornarem insignificantes, assim a não ou pouca concorrência
tecnológica geraria uma elevação de preço. Além disso, argumenta o autor que a produção
industrial poderia se locomover para países que oferecessem maior proteção intelectual e
contra a pirataria.
A proteção fraca não estimula a promoção industrial porque nesses locais a indústria
local tende a começar seu desenvolvimento por meio de imitações, que não configuram
ganhos estratégicos e de conhecimento próprios. Ademais, para Robert Sherwood, uma
grande taxa de retorno social é sacrificada sem a proteção efetiva, pois a proteção ineficiente
não possibilita o desenvolvimento de uma atividade robusta e diferenciada, o que viabilizaria
o retorno à sociedade.
Patentes: o regime internacional...
75
O terceiro mito também é contestado pelo autor, porque não basta ter a tecnologia, o
seu uso e aplicação estão condicionados a quantidade e qualidade de conhecimento tácito já
existente no país, o que, como já dito anteriormente, pode ser reduzido sem o incentivo à
inovação e pesquisas, o qual advém de uma maior proteção dos resultados dessas atividades.
Por outro lado, também a “má impressão” do país internacionalmente no sentido desses DPI
gera uma resistência exterior a transferência de tecnologia.
Por fim, a diminuição da dependência é apontada por Sherwood como um mito,
porque para ele a ausência de proteção inibe a transferência de tecnologia, o que vai atrofiar
sua capacidade de gerar inovações e, por conseguinte, aumentar sua dependência, não reduzila.
Conclui o autor, que a proteção à PI deve ser parte da infra-estrutura do país, um dos
aparatos legais oferecidos por ele, é um meio pelo qual governo pode mudar de realizador de
pesquisas tecnológicas para prestador de serviços de extensão, o que não reduz seu papel de
incentivador e investidor em ciência básica, mas estimula os setores privados a investirem em
tecnologias mais avançadas. Os DPI como infra-estrutura também contribuem para o maior
vínculo empresa-universidade, para a boa imagem do país no exterior e leva ao envolvimento
do país em redes globais de tecnologias e estimula criatividade dentro da economia nacional.
“A implementação do sistema de propriedade intelectual é de importância
vital por causa do modo de pensar da população. O engenho e a criatividade
humanos não estão espalhados de modo desigual no mundo. São talentos
presentes em qualquer país. Em alguns, infelizmente, falta infra-estrutura
proporcionada por um sistema eficiente de proteção à propriedade
intelectual.” (SHERWOOD, 1992, p. 193)
Assim, parece ser o mais adequado que se faça uso de ambas as opiniões. Pois, se de
um lado o regime internacional, expresso através do TRIPS, impõe medidas inviáveis aos
países em desenvolvimento, por outro, o abando destes direitos também é igualmente inviável
na medida em que na atual configuração econômica mundial, os bens intangíveis são os de
maior valor agregado; e que a ampliação das capacidades científicas e tecnológicas nacionais,
é um pré-requisito para o desenvolvimento.
Mesmo elaborando de forma linear e clara sua posição, Sherwood parece partir de uma
falsa premissa de que a questão central relativa às patentes e à propriedade intelectual se
localiza no fato da existência ou não da proteção, no entanto, conforme descrito
anteriormente, a história da construção do Regime Internacional de Patentes mostra que
países que hoje são “menos desenvolvidos”, assinaram tratados relativos ao tema, antes de
Cecília Megali Ogata
76
países desenvolvidos, como, por exemplo, o caso do Brasil ante os Estados Unidos. A questão
é que no âmbito da OMPI cada país poderia excluir da proteção de patentes setores que
fossem considerados de interesse estratégico para o país. Desse modo, antes do TRIPS, o
Brasil não reconhecia patentes em medicamentos e alimentos, por entender que isso afetaria
negativamente a população de baixa renda, pela elevação dos preços da comida e dos
remédios, resultado inevitável da criação de um regime de monopólio sobre o setor, como
ficou comprovado depois de 1994, quando os preços médios dos medicamentos dobraram. Se
o argumento do senhor Sherwood estivesse correto, depois do TRIPS, as multinacionais de
medicamentos, para quem ele trabalhou durante as negociações em 1994, deveriam ter, depois
do novo acordo, aumentado seus investimentos em P&D no Brasil. E, na realidade, o que
ocorreu foi exatamente o contrário, ou seja, antes do TRIPS, a maioria das multinacionais de
medicamentos era obrigada pelo governo brasileiro a produzir no Brasil os sais básicos para a
produção dos medicamentos e, depois da lei, elas concentraram a produção em suas matrizes
e beneficiadas pelas “patentes de importação”.
Ainda que o TRIPS tenha disponibilizado algumas flexibilidades, das quais podem se
valer os países menos desenvolvidos, como: a liberdade para determinar a forma de
implementação do acordo, conforme seus sistemas jurídicos; a liberdade para escolher o
regime de exaustão dos DPI; o reconhecimento que os DPI devem contribuir para o bempúblico e desenvolvimento; o reconhecimento da necessidade de medidas que viabilizem as
transferências tecnológicas; a possibilidade de medidas especiais, como a licença
compulsória; as provisões para evitar práticas anticompetitivas em contratos de licenças; os
prazos diferenciados a países em desenvolvimento e de menor desenvolvimento relativo PMDR - para aplicação do acordo; e a obrigação dos países desenvolvidos de incentivar suas
empresas e instituições a realizarem transferência de tecnologia (Art.66.2); a aplicação dessas
flexibilidades seriam apenas a PMDRs, de modo que muitas delas não podem ser utilizadas
pelos “em desenvolvimento”. Além do mais, os prazos estabelecidos pelo acordo de 1994 já
venceram, colocando fim a essas flexibilidades. Outro ponto a se destacar é que alguns países
em desenvolvimento, como é o caso da China, que só entrou na OMC em 2001, e da Rússia
que ainda hoje pleiteia sua entrada, não se servirão dessas flexibilizações oferecidas aos
países que adotaram tais regulamentações anteriormente
Para Liliam Ane Cavalhieri da Cruz (2008) o regime de PI aumentou as importações
de tecnologias, os gastos com ajustes estruturais dentro dos países em desenvolvimento e os
fluxos de dividendos para os para os desenvolvidos, o que elevou a concentração tecnológica.
Para ela, a solução possível a esses países é uma correta adequação interna, política e
Patentes: o regime internacional...
77
legislativa, respeitando as regras internacionais, mas utilizando-as de maneira pró-competitiva
de acordo com seus graus de desenvolvimento e melhorar a administração das patentes, não
insistindo em reverter o sistema, algo que já parece estar consolidado.
Neste sentido, também Lastres e Cassiolato (2003) defendem, que há realmente uma
grande concentração das atividades de P&D e de inovação nos países ricos, a chamada
“triardização”, que compreende os Estados Unidos, a Europa Ocidental e o Japão. Esse pode
ser comprovado pela concentração dos depósitos de patentes:
“Os escritórios que mais recebem demandas para depósitos de patentes, segundo
dados da Ompi, são os do Japão, Estados Unidos, China, Coréia do Sul e o
Escritório Europeu de Patentes. De acordo com o relatório, as cinco regiões
representam 77% das demandas por depósitos de patentes e 74% das patentes
concedidas em todo o mundo.”39
Argumentam esses autores que essas atividades são estratégicas para as empresas (e,
conseqüentemente, países) e representam, portanto, importantes fatores de ganhos de
competitividade, por isso não são facilmente “exportadas”, como são os produtos. Desta
maneira, eles vêem que o Estado deve ter um papel importante para alavancar a capacidade do
país de produzir bens de maior valor agregado, seja com políticas de apoio à educação e
incentivo à P&D, seja com leis de incentivo à inovação.
A conhecida obra “Da imitação à inovação. A dinâmica do aprendizado tecnológico da
Coréia” de Linsu Kim (2005) pode ser tomada como um bom exemplo de um país que soube
lidar com esse regime internacional e se adaptar de forma a se desenvolver.
Até 1961 a Coréia do Sul era um país pouco desenvolvido como tantos outros do
mundo, apresentava PNB per capita inferior ao do Sudão. Contudo em 1962 a economia teve
um grande crescimento, chegando o país em 1995 a ser considerada a 11ª potência econômica
do mundo. Assim sendo, o livro aborda os aspectos relevantes que propiciaram esse grande
salto qualitativo e quantitativo na economia e no desenvolvimento do país.
Dentre esses fatores o autor destaca a imitação, que não implica necessariamente em
falsificação e clonagem de mercadorias importadas, nem a violação de patentes e pirataria
intelectual. Os autores também contam como esses fatores a existência de um governo
dirigente, que estimulou o processo de aprendizado tecnológico e investiu em educação; os
Chaebols, que são grandes conglomerados de empreendimentos familiares, que funcionaram
como motores do processo; uma mão-de-obra disciplinada e esforçada; a estratégia voltada
para exportação; e a construção de crises pelo governo para propagação de aprendizado
tecnológico.
39
http://www.inovacaotecnologica.com.br/noticias/noticia.php?artigo=010175070816 acessado em 26 de
setembro de 2009 às 16horas.
Cecília Megali Ogata
78
Merecem
destaque, por servirem
como
exemplo aos
demais países em
desenvolvimento, as políticas de transferência de tecnologia, por meio da restrição dos
investimentos estrangeiros diretos, que permitiram que as empresas coreanas mantivessem
sua independência administrativa, criando novas bases para o aprendizado tecnológico e a
implementação de institutos públicos para desempenhar um papel fundamental nas atividades
avançadas de P&D industrial, mas principalmente, pelo fornecimento de pesquisadores
experientes e capazes de exercerem papeis de liderança nessas atividades. Também o uso da
engenharia reversa e a imposição do governo de metas ambiciosas que geravam crises que
exigiam a superação daquele determinado padrão tecnológico.
Pode-se dizer, portanto, que o sistema de patentes é, sim, importante, porque é tido
para muitos países e empresas como requisito para investimentos e estabelecimento de
relações, porque é uma maneira de se incentivar e recompensar inventores e porque, como
veremos a seguir, possui hoje um grande valor econômico. No entanto, é preciso que haja
maior habilidade governamental para converter esses recursos a seu favor, se aproveitar de
pequenas “brechas” e de parcerias com demais países em desenvolvimento para que juntos
possam cobrar um regime mais igualitário, que não queira, fazendo uso de um trecho de Kjeld
Jakobsen em “Comércio Internacional e Desenvolvimento” (2005), “A aplicação desse
tratamento igual a desiguais [...]” (p.108).
Essa cobrança por medidas mais afirmativas em defesa do desenvolvimento humano
perante os DPI parte também das ações da sociedade civil que tem se interado cada vez mais
do assunto, principalmente pelas informações espalhadas pela internet, e participado das
discussões do regime, não só em âmbito local. Existe inclusive um movimento conhecido
como A2K (Access to Knowledge) que defende a maior transferência tecnológica para países
em desenvolvimento e a estipulação de uma Agenda de Desenvolvimento relacionada à PI.
Um outro movimento, mais inusitado, é o Partido Pirata fundado na Suíça em 2006 que tem
como objetivos principais a abolição das patentes, a restrição de direitos de autor e garantia da
privacidade. Esse partido obteve 0,63% dos votos.
“Em última análise, a comunidade internacional deve estabelecer uma forma de
proteger a propriedade intelectual que não envolva sanções comerciais. As sugestões quanto a
possíveis reformas incluem uma “gradação” da propriedade intelectual, um modelo “Tripsminus”, um regime de propriedade intelectual com cláusulas derrogatórias específicas, e
regimes separados de propriedade intelectual para direitos individuais e coletivos” (IPEA,
2004, p.54). A Declaração de Doha sobre o TRIPS apresentou um importante avanço, nesse
sentido, ao reconhecer que os direitos determinados pelo acordo estão subordinados à
Patentes: o regime internacional...
79
questões de saúde pública. Mesmo assim ainda há muito a se fazer, afinal, “O objetivo
supremo do desenvolvimento não é criar mais riquezas ou alcançar maior crescimento, mas
expandir a gama de possibilidades de escolha de cada ser humano.” (IPEA, 2004, p.66).
2.e – O valor econômico das patentes
Para encerrar esse capítulo, pretende-se agora realizar uma breve aproximação das
questões da patente com as empresas transnacionais, a fim de já traçar uma introdução do
capítulo seguinte. Aproximação esta que se faz a partir do reconhecimento de que as patentes
passam a ser vistas e usadas como mercadorias em si mesmas, ou seja, deixam de ser apenas
um direito no campo jurídico para estarem também no econômico. Isso ocorre a partir da
percepção do homem e das grandes empresas de que a descoberta de um processo que acelera
determinada reação química ou a criação de um parafuso que não enferruja (passíveis de
aplicação industrial em grande escala e de geração maiores ganhos) podem ser
comercializados.
Quando se analisa a construção do regime, fica evidente que as empresas, na medida
em que se dão conta dessa “nova finalidade” da patente passam a exercer pressão sobre os
governos para implementação de regras mais rigorosas relativas à PI. Com a busca por novos
mercados e a internacionalização da produção das indústrias, estas deixam de ser locais e
passam para a posição de transnacionais, com isso, o requerimento de leis mais rigorosas
sobre PI aumenta, exigindo que não somente as leis internas garantam esses direitos, mas
também as dos outros países com que as transnacionais se relacionam.
Somado ao surgimento desse tipo de empresas está também a mudança de valor que os
bens intangíveis tem assumido nas últimas décadas: “At one time, the value of a corporation
lay in physical assetss – land, plants and raw materials. Today, intangible assets – often
protected by IP rights - make up na increasingly large percentage of the value of publicly
traded companies.” (EPO, 2007, p.17). O conhecimento e o acesso a ele são fontes de poder e
ganhos competitivos.
No contexto da globalização, existem muitos outros atores atuando nas mais diversas
esferas internacionais, o que torna a competitividade mais acirrada. Ademais, a facilidade de
locomoção das pessoas e de acesso a informações pela internet dificulta a manutenção
localizada dos fatores estratégicos da empresa. Também merece destaque a velocidade com
que novas tecnologias e aparelhos surgem no mundo, buscando melhorias que gerem maiores
Cecília Megali Ogata
80
resultados e mais lucratividade. Toda tecnologia tem um ciclo de vida que obedece a
invenção, o desenvolvimento, a maturidade, os desafios da competição, declínio gradual e o
desaparecimento, contudo, hoje em dia, esse ciclo tem durado em média dois anos, o que
pode ser considerado um tempo demasiadamente curto para evolução de novos produtos.
Todos esses fatores contribuíram e contribuem para que a patente seja vista como algo
extremamente necessário, um direito que garante a manutenção de recursos estratégicos e
possui valor econômico:
“So business now sees patent rights as a financial assets as well as right to a
pontential monopoly. The biggest companies, with the largest portfolios of patents,
deploy a armies of researches, accountants and lawyers to evaluate opportunities
around exploitation of their patents. And they understand that the value of these
assets is dependent on a workable system of regulation that is, in fact, already
overloaded.” (EPO, 2007, p.35).
Cada vez mais as grandes companhias e até mesmo as de menor porte tem notado a
importância dos DPI e, com isso, a pressão por uma harmonização mais rápida e global deste
sistema tem crescido. Quanto mais parecidos e homogêneos forem os sistemas, mais fácil será
para as empresas garantirem seus direitos e preservarem seus recursos ao longo do globo.
Embora haja do outro lado as questões de desenvolvimento social, como mostrado
anteriormente, há de se ter em mente que essas empresas são grandes atores internacionais e
que detêm em suas mãos um grande poder de barganha.
Um estudo realizado pelo European Patent Office – EPO – em 2007 sobre o sistema
de patentes, além de fornecer importantes informações sobre o nascimento do sistema e sua
atuação no mundo contemporâneo, realizou também estimativas para o futuro dentro dos
quatro cenários que analisava: o mercado, a geopolítica, a sociedade e a tecnologia. Sobre o
primeiro, no qual a força dominante vem do mercado, o escritório estima que em 2025 o
sistema de patentes esteja muito mais dinâmico, pois será vital pra as empresas como uma
defesa estratégica. Acredita-se ainda que haverá uma redução de preços no patenteamento o
que elevará os seus números.
Para o segundo cenário, no qual a maior força parte dos Estados, o EPO fala na
formação de blocos regionais mais intensa, inclusive no possível TAFTA (TransAtlantic Free
Trade Association), que incluiria os países mais ricos do globo, como EUA, os da União
Européia e o Canadá. Acredita-se que os blocos regionais irão acordar internamente suas
regras de patentes, mas que, em virtude do poder do TAFTA, a maior parte delas emanarão
deste bloco, deixando assim o TRIPS de ser tão relevante. Isso será acompanhado pela luta
contra a pirataria, pelo crescimento de países asiáticos, pela preocupação ambiental e pela
Patentes: o regime internacional...
81
formação de mais alianças Sul-Sul, inclusive para proteção de suas riquezas e diversidades
naturais.
No cenário em que a sociedade é maior força de pressão, as previsões são bastante
diferentes. As patentes em 2025 já estariam sendo abolidas em vários campos, priorizando,
pelo mercado, o uso de segredos, marcas, desenhos industriais e indicações geográficas. A
fim de não se reduzir a inovação, os estímulos partiriam de outras fontes, como ONGs e exescritórios de patentes, que informariam sobre outras formas de proteção. A sociedade estará
mais conectada e incluída nos processos de inovação, com uma participação mais ativa e
próxima das empresas, contando inclusive, com mais produtos liberalizados.
Por fim, sobre a tecnologia e sua relação com a patente, o EPO prevê que haverá uma
rápida adaptação do sistema às novas tecnologias, com proteções alternativas, mas também
que aumentarão as infrações e a competitividade. Alguns países tentarão levar a PI a outras
instancias também, como fizeram no passado com a OMC. Para uma melhor adequação às
demandas patentárias, crê-se que haverá uma distinção entre “soft patent” e “classic patent”,
sendo a primeira voltada a campos mais complexos, como softwares e a segunda voltada para
áreas mais clássicas, como a farmacêutica, afinal o modelo atual não enquadra todas as
especificidades de cada caso.
Conclui-se, portanto, que continuarão a existir demandas divergentes no campo dos
DPI, sobretudo no que tange as patentes, visto que essas são as mais utilizadas e lucrativas.
Caberá aos Estados, a sociedade e aos grandes empresários buscarem uma harmonização que
equilibre as questões de desenvolvimento e acesso a tecnologia e as demandas econômicas
das empresas e dos países de forma geral.
Cecília Megali Ogata
82
3. As transnacionais e as patentes: o grande valor da inovação
Durante muito tempo o estudo das Relações Internacionais esteve pautado apenas nos
Estados e nas Organizações Internacionais, contudo, com a crescente globalização, o espaço
“internacional” passou a ser ocupado por outros atores. Ultimamente, a multiplicidade desses
atores no sistema internacional é tão grande que vai além das corporações internacionais, das
organizações internacionais, das ONG, das transnacionais e inclui também as religiões/
igrejas, organizações criminosas internacionais, a opinião pública e até mesmo o próprio
indivíduo. Por exemplo, a Igreja Católica e o Islã que ultrapassaram fronteiras e limites
culturais: existem islâmicos no ocidente e cristãos no oriente, de modo que a ideologia
pregada por essas e outras religiões são assuntos que não dizem respeito apenas a uma
sociedade e local. A opinião pública é capaz de pressionar governos e lideranças sobre certas
decisões que nem sempre se encontram sob o território daquela. E o que dizer de organizações
como a Al Quaeda? Um grupo que consegue se organizar internacionalmente e promover um
ataque terrorista no território da maior potência global não deve ser subestimado enquanto um
agente do sistema internacional. E sobre os indivíduos pode-se afirmar que são pessoas nem
sempre possuidoras de grandes riquezas ou cargos políticos, mas que conseguem mobilizar a
opinião pública, colocar em xeque assuntos polêmicos e despertar o olhar de toda uma
sociedade para determinado fato.
Neste último capítulo, pretende-se analisar melhor um desses novos atores: as
empresas transnacionais.
Mesmo com algumas vertentes teóricas resistentes a reconhecer
esses novos agentes internacionais, como veremos adiante, dados oficiais mostram a todo
momento que algumas dessas empresas globais possuem rendimentos maiores que o PIB de
muitos países, como é o caso da Shell, cujas vendas equivalem ao triplo do PIB da Guatemala
e da Siemens que equivalem ao sêxtuplo do PIB da Jamaica40. Em virtude do seu domínio no
campo econômico, que se estende também para esferas políticas e sociais, elas se tornaram
atores capazes de promover e impulsionar mudanças que afetaram a todos, direta ou
indiretamente. Assim, entender o poderio e funcionamento desses grandes conglomerados
empresariais é algo fundamental para a atualidade globalizada das Relações Internacionais.
Nesse sentido, as empresas transnacionais são também um dos principais interessados
nos debates a respeito dos DPI, sobretudo a patente. Com já se comentou no capítulo anterior,
40
Disponível em : http://www.estadao.com.br/arquivo/economia/2002/not20020812p35633.htm acessado em 30
de março de 2010 às 10:45h
Patentes: o regime internacional...
83
a inovação tem garantido cada vez mais, maiores ganhos de escala para as grandes produtoras
mundiais de todos os tipos de produtos e serviços, desde alimentos até softwares.
Visando uma maior reflexão sobre a importância das patentes para as transnacionais, o
presente capítulo encontra-se estruturado em três seções: a primeira busca analisar melhor as
próprias empresas transnacionais, de maneira geral, busca mostrar como elas surgiram, como
funcionam e o poder que detêm; a segunda discorre sobre um setor específico dessas
empresas: a área de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D), área esta responsável pela parte de
inovação da empresa, de onde surgem os principais aprimoramentos e novos serviços e
produtos, por essa razão, é a área que se relaciona diretamente às patentes; e, por fim, a última
seção de todo este trabalho se dedica a unir todos os fatores estudados até aqui e demonstrar
como as patentes, apesar das novas tendências que surgem e que também serão analisadas,
ainda são importantes ferramentas para as transnacionais e como o seu regime interfere em
diversos atores e no próprio sistema internacional.
3.a – As empresas Transnacionais
Muitas empresas atingem um nível de produção em seu país que supera aquele
necessário, precisando exportar para outros mercados consumidores seus excedentes,
ganhando mais expandindo suas vendas para outros países; outras percebem que podem
aumentar a sua eficiência e a de seus bens se começarem não apenas exportar, mais também
fabricar em outros lugares; outras buscam expandir sua carteira de clientes, prestando serviços
em outros continentes e assim, cada vez mais, são internacionalizados serviços, produtos,
pessoas e empresas. Há alguns anos, apenas grandes e sólidas empresas conseguiam essa
proeza, mas hoje em dia, com os avanços tecnológicos e, sobretudo com os avanços nas áreas
de transporte e comunicação, pequenas e médias empresas já se inserem na esfera
internacional.
Tudo isso fez com que o ambiente econômico internacional se tornasse cada vez mais
competitivo. E para vencer essa competição as empresas se valem de recursos cada vez menos
palpáveis, sendo o principal deles a “capacidade de inovar”, pois é através da inovação que
paradigmas são superados e se expande o horizonte para uma serie de novas ferramentas e
soluções. Contudo, com tantos concorrentes, proteger esse ativo tão singular não é tão fácil, é
preciso um sistema sólido e confiável, um sistema aceito mundialmente e com garantias. É aí
que as patentes podem ser importantes: enquanto meio de proteger a inovação da concorrência
global acirrada e, mais do que isso, enquanto mais uma forma de geração de dividendos.
Cecília Megali Ogata
84
Mas antes é preciso entender melhor como funcionam essas grandes promotoras da
inovação: as empresas Transnacionais.
3.a.a – Origem e evolução: outro ator internacional
Alguns anos atrás, as Transnacionais (TNC) eram chamadas de Multinacionais41,
termo pelo qual são mais popularmente conhecidas, a mudança deve-se ao fato de que tais
empresas não pertencem à “múltiplas nações”, pois, possuem sede em um determinado país ao
qual legalmente pertencem e filiais em outros. Essa seria a definição mais clara de corporações
empresariais internacionais ou TNC. “Segundo Giddens, o termo transnacional é preferível,
porque indica que estas diferentes empresas operam através de diferentes fronteiras nacionais,
mais do que dentro de várias ou muitas nações.” (OLIVEIRA, 2004, p.251).
Para Robert Gilpin (2002, p.289) as Transnacionais podem ser definidas como: “[...]
empresas oligopolísticas cuja propriedade, administração, produção e atividade de
comercialização se estendem por várias jurisdições nacionais. Há um escritório central em um
país com uma rede de subsidiárias em outros países.”.
A emergência de empresas fora de suas fronteiras nacionais se inicia por volta dos
séculos XV e XVI, com as dinastias comerciais e bancárias dos Fugger, dos Ausburgos, que
prestaram serviços aos imperadores da Áustria e Inglaterra, com filiais em Viena e Londres.
No século XIX as TNC se destacaram nos setores de atividade mais importantes da
época: extrativista de carvão e aço, alimentício e farmacêutico.42 É importante ressaltar que
nesse período a Revolução Industrial já tinha ocorrido e as novas tecnologias desenvolvidas
por ela já estavam se espalhando pela Europa, havia o neo-colonialismo em busca de mais
matéria-prima e mercado consumidor e a facilitação da distribuição de mercadorias com
transportes mais modernos.
41
Há diferentes terminações quando se fala em empresas que possuem atividades além de suas fronteiras:
internacional (reagrupa suas operações internacionais ao nível de diretoria e lança estratégias de penetração em
mercados externos), multinacional (que reparte os recursos sem preocupação com as fronteiras e considera as
atividades externas tão importantes quanto as internas, mas possui influencia do Estado de origem na propriedade
e direção), supranacionais (juridicamente desnacionalizada e registrada junto a uma OI a qual pagará impostos,
mas não há nenhuma corporação deste tipo no mundo) e, por fim, a transnacional (pertence e é gerida por
nacionais, mas suas decisões escapam totalmente à ótica nacional), mas não há clareza nessa separação, visto que
são pequenas variações e que os autores americanos e europeus já cunharam os temos multinacional e
transnacional, para se referirem a esse tipo de indústrias.
42
São desta data: Cockerill (Bélgica, carvão e aço), Bayer (Alemanha), Nestlé (Suíça), Solvay (Bélgica), Lever
(Inglaterra), Michelin (França).
Patentes: o regime internacional...
85
Contudo, é no século XX que essas empresas se consolidam. Com o aperfeiçoamento
dos métodos, da gestão empresarial e da crescente concorrência, as empresas conseguiram
penetrar nos território de outros países mais fácil e eficazmente: “Ainda nas primeiras décadas
do século XX, em 1929, ocorreu o significativo caso de fusão da Unilever entre empresas
transnacionais, formada pela Unilever Limited, de Londres e a Unilever N. V., de Rotterdam.”
(OLIVEIRA, 2004, p.255).
Também em 1929, com a Crise da Bolsa de Valores de Nova Iorque, as TNC também
foram atingidas, tanto pelo endurecimento das leis que as regulavam nacionalmente por parte
dos governos, quanto pela queda na produção, demanda e preços. O processo depressivo
sofrido pelos países nesse período fez com que os governos passassem a adotar medidas de
proteção à indústria local.
Após a 2ª Grande Guerra, as TNC alcançaram escalas muito maiores, merecendo
destaque as norte-americanas que atuaram na reconstrução da Europa. Além da reconstrução
européia, a abolição dos direitos aduaneiros junto ao mercado comum europeu, a
generalização da sociedade de consumo43 e a substituição do carvão pelo petróleo propiciaram
o desenvolvimento de outras indústrias como a petroquímica, de automóveis e transportes.
Contudo, é a partir da década de 70, que há maior diversificação tanto dos setores
dessas empresas quanto de suas localizações: o processo industrial da maior parte dessas
grandes corporações deixa de se concentrar em um lugar ou apenas nos países do hemisfério
norte e atinge uma verdadeira escala mundial, é a reestruturação produtiva.
Transnacionais como Nike, Coca-Cola, Unilever, Shell, entre milhares outras fazem
parte do cotidiano de grande parte da população mundial e muitas dessas empresas se
tornaram fundamentais para a vida de muita gente, como é o caso de empresas alimentícias e
farmacêuticas que disponibilizam seus produtos em lugares que dificilmente poderiam ser
produzidos. “Empresas transnacionais, diferentes das nacionais, obtêm vantagens que se
traduzem em benefícios derivados das chamadas imperfeições do sistema econômico
43
“A sociedade de consumo é um termo cunhado pela economia e sociologia para designar o tipo de sociedade
que se encontra em uma avançada etapa do desenvolvimento industrial capitalista e que se caracteriza pelo
consumo massivo de bens e serviços disponíveis em quantidade maior que a demanda devido à elevada produção
dos mesmos. Esse padrão de sociedade está ligado ao conceito de capitalismo, ou seja, à livre circulação do
capital, produtos e pessoas, sem a intervenção do Estado. Trata-se da economia de mercado que tenta encontrar
um equilíbrio entre oferta e demanda. Desse modo, não há excedente de produção que possa afetar a acumulação
de capital por parte dos grandes produtores e investidores. O maior desafio da sociedade de consumo é
transformar o consumidor em um comprador compulsivo de produtos e serviços, aumentando a demanda e a
necessidade de aquisição de mercadorias. Assim, o mercado cria a necessidade no consumidor e este, por sua
vez, estabelece a demanda de consumir. Esse fato desencadeia o aumento da produção e, conseqüentemente, a
elevação dos lucros por parte daqueles que detém o capital, atingindo o princípio básico do capitalismo:
acumular capital.” (Cardoso, Fernanda Simplício; Ferreira, Cíntia Borges. Disponível em:
www.fae.edu/.../Cíntia%20Ferreira%20e%20Fernanda%20Simplício.pdf acessado dia 30/03/2010 às 11:05h )
Cecília Megali Ogata
86
internacional.” (OLIVEIRA, 2004, p. 264). Essas imperfeições são de mercado e marcadas
tanto pela fragilidade e necessidade de alguns Estados perante os produtos destas empresas,
quanto pelo caráter oligopolista destas em relação a certos bens, principalmente no que tange
a tecnologia e as inovações: “Inovação científico-tecnológica, constitui esse poder de
conhecimento uma das fortes armas dos monopólios transnacionais, fator de imponência e
domínio junto às empresas nacionais de pequeno e médio porte” (OLIVEIRA, 2004, p. 267).
Entendendo melhor como surgiram essas empresas, percebe-se que o grande impulsor
da internacionalização é a busca de maiores ganhos, maior lucratividade, que estão
relacionados, de alguma forma, à busca de matéria-prima mais barata, de mercado
consumidor e mão-de-obra mais eficaz e barata. Recentemente, porém, a globalização e o
avanço tecnológico fizeram com que essa busca pudesse ser generalizada como uma “busca
por vantagens competitivas44”, ou seja, busca se estar mais próximo, deter, aquele ativo que
garante a empresa ganhos maiores comparados aos seus concorrentes por criar um valor ao
cliente superior ao próprio custo (valor) da produção; e isso não significa mais apenas
insumos e trabalhadores, inclui também bens intangíveis, como acesso ao know-how
internacional e ao conhecimento e tecnologia:
“One manager stated: ‘We came here for cheap labour and the tax advantages, but
we are staying because of the expertise we have built up here. As far as assembly
and test are concerned we have more expertise here than we have in the U.S. We
sometimes have to send our Malaysian engineers to the States to solve their
problems.”( STOPFORD; STRANGE;,HENLEY 1991, p.147)
Além dessa variação de fatores impulsionadores da internacionalização, percebe-se ao
longo das décadas, que as próprias TNC modificaram sua lógica de acordo com o ambiente
global, em outras palavras, se globalizaram também. As principais mudanças, como afirmado
44
“Vantagem Competitiva é um conceito desenvolvido por Michael E. Porter no seu best-seller
Competitive Advantage e que procura mostrar a forma como a estratégia escolhida e seguida pela
organização pode determinar e sustentar o seu sucesso competitivo.A vantagem competitiva surge
fundamentalmente do valor que uma determinada empresa consegue criar para os seus clientes e que
ultrapassa os custos de produção. O termo valor aqui aplicado representa aquilo que os clientes estão
dispostos a pagar pelo produto ou serviço; um valor superior resulta da oferta de um produto ou serviço com
características percebidas idênticas aos da concorrência mas por um preço mais baixo ou, alternativamente,
da oferta de um produto ou serviço com benefícios superiores aos da concorrência que mais do que
compensam um preço mais elevado.Segundo Porter, existem dois tipos básicos de vantagem competitiva:
aliderança no custo e a diferenciação, as quais, juntamente com o âmbito competitivo, definem os diferentes
tipos de estratégias genéricas.Porter descreve ainda o instrumento básico para diagnosticar a vantagem
competitiva e para encontrar formas de a intensificar: a cadeia de valores. Através da cadeia de valores, a
organização é dividida nas suas actividades básicas (investigação e desenvolvimento, produção,
comercialização e serviço) o que facilita a identificação das fontes de vantagem competitiva.” ( Nunes,
Paulo, 2007, disponível em: http://www.knoow.net/cienceconempr/gestao/vantagemcompetitiva.htm
acessado dia 30/03/2010 às 10:55h)
Patentes: o regime internacional...
87
anteriormente, surgem a partir de 1970, com a instalação de um novo paradigma técnicoeconômico pautado na produção flexível de bens e serviços intensivos em informação.
Impulsionadas por uma vasta rede de infra-estrutura de telecomunicação, as TNC
modificaram seu modelo de atuação. Antes, a transnacionalização se dava pelo
estabelecimento de filiais praticamente idênticas à sede, porém menores, que produziam os
mesmos produtos e estabeleciam uma relação vertical com a matriz.
Atualmente, a transnacionalização nem sempre significa o estabelecimento de plantas
em outros países, podem ser escritórios, representantes, pequenas linhas de produção de um
só produto ou de um só componente e a relação matriz-filial é “horizontalizada”. Ou seja, na
qual a empresa está atenta a todas as esferas de toda cadeia de fornecimento e produção,
desde a área de Pesquisa e Desenvolvimento até a distribuição, cada linha de produção de
determinada peça ou produto, cada subsidiária é administrada de acordo com suas
especificidades, buscando mais a cooperação que a hierarquização.
Estando presente em diversos locais como uma única empresa, porém admitindo
especificidades em relação aos diferentes públicos que alcança, as TNC têm aumentado cada
vez mais seu poderio econômico.
“Directly or indirectly, they [TNC] have been estimated to control over one quarter
of the world’s economic activity outside their home countries; over half the world
trade in manufactured goods and even more of growing trade in services; 80 per
cent of the world’s land cultivated for export crops, and the lion’s share of workd’s
technological innovations.” (STOPFORD; STRANGE; HENLEY, 1991, p.15)
Isso deixa claro que tanto na esfera que dominam – a econômica - quanto nas esferas
políticas e sociais, as empresas transnacionais têm um poder de influência muito grande.
No entanto, algumas vertentes teóricas das Relações Internacionais são resistentes em
aceitar as empresas transnacionais como atores do sistema internacional. Os adeptos do
idealismo entendem que os interesses e a atuação de outros atores, como as ONGs e as OI
devem ser levados em consideração e que devido à expansão capitalista houve uma crescente
internacionalização de temáticas, que hoje o que se tem é uma interdependência45 mundial,
pois muitos assuntos já ultrapassaram a esfera estatal, e se tornaram supranacionais. Há
“multicanais”46de expressão de novas demandas, o poder militar já não é o mais poderoso e a
criação de Regimes Internacionais (regras, normas e leis elaboradas no bojo das OI para
45
“Interdependence, most simply defined, means mutual dependence. Interdepencence in worls politics refers to
situations characterized by reciprocal effects among countries or among in different countries.”(KEOHANE;
NYE, 2000, p.7)
46
Correnpondem a uma das característica da interdependência: “multiple channels connetc societies, including:
informal tiés between governmental eliities as well as formal foreign Office arrangements; [...] These channels
can be sumarized as interstates, transgovernamental, and transnational relations.” (KEOHANE; NYE, 2000,
p.21)
Cecília Megali Ogata
88
proteção e obtenção de algo na esfera mundial) figuram como o espaço em que empresas e
Estado atuam a fim de alcançar seus interesses, espaço esse, portanto, sem hierarquia formal,
mas com elementos de regulação.
Por outro lado, a segunda grande vertente das teorias de RI, o Realismo, vê o Estado
como o ator principal da política internacional e que deve buscar poder através de um cálculo
racional, sua sobrevivência, visto que nunca está garantida devido a ameaça constante de
outros Estados. Nas décadas de 60 e 70 Kenneth Waltz, funda o neorealismo ou realismo
estrutural, que passa a propor o entendimento do Estado como uma Unidade Política – a
principal, mas não a única.
Pode-se dizer que, a respeito do que pensam os neorealistas, as TNC, talvez não
tenham ainda o mesmo poder que os Estados e a recente crise econômica47 veio provar isso,
quando muitos bancos precisaram da ajuda governamental para não fecharem; também podese dizer que essas empresas não tenham o poder direto sobre alguns assuntos de escala global,
como o combate ao HIV ou a erradicação da fome mundial. Contudo, como Hans
Morgenthau48 sugere como primeiro princípio da teoria do realismo político, que a analise
internacional deve se basear na racionalidade e objetividade, parece um tanto quanto racional,
observar que a realidade conta com grandes conglomerados empresariais a frente (e também
atrás) de importantes decisões e consideráveis montantes de dinheiro.
Em seu livro “Rival States, Rival Firms”, que debate, em linhas gerais, a atual relação
entre os Estados e as Multinacionais49 e como essas vêm em grande medida pressionando e
barganhando com os países, John Stopford, Susan Strange and John S. Henley afirmam que as
mudanças no sistema mundial são produto de infinitas ações de todos os atores, sejam eles
indivíduos, empresas, estados ou organizações internacionais e vão além ao dizerem que
“Taken together, their [atores do sistema internacional] actions have limited the independent
options for states during the last two decades.” (STOPFORD; STRANGE; HENLEY, 1991,
p.204).
3.a.b - Funcionamento e poderio econômico
As TNC, na sua grande maioria funcionam com uma sede/matriz, no seu país de
origem e subsidiárias em outros países, mas há grandes variações desse modelo, pois algumas
47
Iniciada em agosto 2008
Teórico alemão, pioneiro na teoria realista de RI
49
Termo utilizado pelos autores ao longo do livro
48
Patentes: o regime internacional...
89
atuam apenas através de escritórios, enquanto outras possuem plantas inteiras, até maiores que
as localizadas no país “natal”, em países estrangeiros.
É por meio do chamado Investimento Externo Direto (IED) que essas empresas atuam
de forma mais efetiva no exterior.
“O IED, na concepção do Fundo Monetário Internacional (IMF, 1998), designa um
investimento que visa adquirir um interesse duradouro em empresa cuja exploração
ocorre em outro país que não no investidor, com o objetivo de influir efetivamente
na gestão da empresa em questão. Assim, de acordo com a sua natureza, o IED é
concebido em uma perspectiva de longo prazo. Ou seja, ele é caracterizado, de um
lado, por um elevado grau de irreversibilidade, do outro, pela permanência também
elevada na economias receptoras. Contudo, mesmo que o IED não apresente o
mesmo grau de volatilidade que os outros fluxos de capitais (em especial
investimentos em portfólio), os dados históricos mostram um padrão de flutuação
cíclico, que entre outros fatores é função das expectativas de rentabilidade ligadas
ao desempenho da empresa receptora do investimento.” (CRISTINI; AMAL, 2006,
p.13)
Os IEDs das TNC são montantes financeiros que se traduzem em diversos tipos de
investimentos, que influem diretamente na transferência de capitais, na produção e no
mercado global e com isso acabam por dominar em grande parte a economia mundial.
“[...] MNC’s [multinacionais] decision whether to export a product from its home
market or to invest abroad in order ro service a foreign market will strongly affect
the location of economic activities and the rates of economic growth around the
world. In this fashion, the activities of MNCs can have a profound impact on
international economic affairs. MNCs are not merely substitutes for trade; indeed
they attempt to extend their power and control over foreign economies. It is clear
that multinational firms desire not only to arn immediate profits, but also to change
and influence the rules or regimes governing trade and international competition in
order to improve their long-term positions.”(GILPIN, 2001, p.281)
No entando, o IED não é distribuido de maneira uniforme: “Although FDI50 has grown
rapidly, in developing countries, most FDI has been placed in the United States and Europe,
while only a small percentage of U.S. foreign direct investment has gone to developing
countries.” (GILPIN, 2001, p.289). Essa concentração localizada que ocorre com os
investimentos também ocorre com outros fatores da empresa. Alguns autores destacam que as
lideranças, de onde emanam as principais decisões da empresa e as definições de estratégias
permanecem no país sede, algo que ocorre também com os setores de maior valor agregado da
empresa, como o de P&D (sobre isso há controvérsias que serão analisadas na próxima
seção).
50
Sigla americana para IED, derivada de: Foreign Direct Investment
Cecília Megali Ogata
90
As TNC, por meio da internacionalização do seu processo produtivo, contam também
com o comércio intra-firma (dentro da mesma empresa, mas entre as diversas subsidiárias)
como uma outra forma de realizarem movimentações financeiras e interferirem no panorama
da economia mundial, pois uma parte substancial do comércio mundial é representada pela
importação e exportação de componentes e produtos intermediários, produzidos por diferentes
subsidiárias de uma mesma TNC em diferentes países.
É preciso ter em mente, no entanto, que mesmo empresas que competem no mesmo
mercado, pertencem a um mesmo “nicho”, desenvolvem diferentes estratégias e organizações
para lidarem com as adversidades do mercado global e as incertezas geradas pelos
movimentos da globalização. Isso porque parte significativa do que é e como funciona a
empresa deriva do modo de vida, de pensar, da cultura e da política de seu país de origem,
pois diferenças nacionais ainda são preservadas e reforçadas no cenário internacional. Por
exemplo: na Alemanha e no Japão as empresas criam vínculos mais fortes com seus
funcionários evitando ao máximo a demissão, os trabalhadores costumam passar a carreira
inteira na mesma companhia, o que acaba criando um forte sentimento de lealdade; enquanto
em países como Estados Unidos e Reino Unido, a base da relação empresa-funcionário são os
contratos de prestação de serviço, o horizonte dos empregados é bem menor dentro da
empresa.
Além da diferença na relação que a empresa cria com seu empregado, podemos
encontrar ao longo do globo inúmeras diferenças no modo como as TNC buscam combinar
seus recursos e capacidades e com isso obter maior ganho em escala. De acordo com
pesquisadores do Massachusetts Institute of Tecnology (MIT), autores do livro “How we
compete”, organizado por Suzanne Berger, o modelo prevalecente das firmas na década de 80,
era o do “kit de avião”, no qual cada peça encaixava-se perfeitamente a outra e cada era
projetada para se encaixar a um único lugar. Contudo, com o passar dos anos, esse modelo
evoluiu e se assemelha, atualmente, mais ao jogo infantil chamado “Lego”, no qual é possível
se criar diferentes modelos usando as mesmas peças.
As pressões geradas pelo surgimento de novos competidores (principalmente na região
do sudeste asiático e nos países emergentes) e as mudanças na economia internacional fizeram
com que as companhias se tornassem mais sensíveis aos custos do trabalho (salários) e do
capital. Somada a este fato, a importância crescente de ativos intangíveis, antes pouco
estudados e analisados pelas empresas, como o conhecimento, as habilidades individuais dos
funcionários e capacidade de inovação, fez com que as companhias buscassem manter dentro
de suas paredes o menor número possível de operações, no caso, somente as mais importantes
Patentes: o regime internacional...
91
para o sucesso do produto ou serviço e de maior valor agregado. É o que Berger chama de
“sistema Modular”. No sistema Modular há a necessidade de se estabelecer determinados
padrões, frutos de acordos ou de um produto já consolidado, para que não haja incongruência
no fornecimento de peças, produtos e serviços ao longo do globo.
“In a growing number of industries, managers of brand-name firms no
longer run manufacturing, but buy it from contract manufacturers that have
been able to capture significant parts of the production system. Top-quality
performance in many complex manufacturing operations used to require
carrying out all important functions either in-house or else in the plants of
closely controlled “captive” suppliers. Today the same level of performance
can be achieved through coordination of a supply chain with multiple
autonomous firms located along the links between product definition and
sale to the final customer. Given the availability of new technology options
and the whip of severe economic pressures, most large multinational
corporations have transformed themselves into organizations focused on a
smaller set of core competencies.” (BERGER, 2006, p.83 e 84)
Desta forma, a maneira como cada empresa vai se adaptar essa nova realidade varia e
não há um modelo ótimo e nenhum que ganhe sempre. A Dell, empresa americana do ramo da
informática, tem como grandes diferenciais a possibilidade do cliente customizar seu
computador da maneira que melhor lhe agradar e a rápida entrega deste produto, para tanto,
em “casa” (Estados Unidos) ela é responsável apenas por reunir todas as peças no final. Podese dizer, portanto, que a empresa tem como principais fontes de sua riqueza e geração de valor
o marketing, a inovação na forma como o cliente se relaciona com o produto e a distribuição,
as quais permanecem sob o próprio teto da empresa.
Outra estratégia é a de manter a produção em casa, como fazem a Sony e boa parte das
empresas italianas do ramo da moda. A primeira alega que além de estar menos sujeita às
vulnerabilidades da produção no exterior, domesticamente ela conta com uma mão de obra
mais especializada e acostumada com os produtos da firma, o que faz com que haja um
elevado índice de lançamentos a todo o momento, que é um grande diferencial da Sony. No
segundo caso também há a preferência pela mão-de-obra nacional por se tratarem de produtos
de altíssima qualidade, mas essas empresas contam como importante vantagem competitiva a
força de suas marcas (Gucci, Dolce e Gabbana, Versace, entre outras) e do selo “Made in
Italy”, que é associado à luxo e elevada qualidade.
A Intel, líder no ramo de microprocessadores, adota outra estratégia, a empresa produz
apenas componentes separados, os quais são exportados e utilizados por diversas empresas ao
Cecília Megali Ogata
92
longo do globo. Já a FIAT optou por ter não apenas fábricas, mas também escritórios de
criação no Brasil a fim de facilitar a captura da demanda nacional.
Essa revolução modular criou inúmeras novas possibilidades de ação para as TNC de
diferentes países e aumentou a possibilidade de disputa mais igualitária. Possibilitou também
um contato maior da empresa com seus consumidores finais, o que facilita a captação das
novas tendências e das diferentes necessidades de cada local, expandindo consideravelmente a
capacidade de inovação e de se desenvolverem novas atividades. Existem empresas hoje
especializadas apenas na distribuição, outras apenas na fabricação de determinados
componentes, outras só em criação de designs. Novas áreas de atividades, sobretudo serviços,
estão surgindo diariamente.
Porém, todo esse processo de transnacionalização também é passível de críticas.
Conforme já mencionado anteriormente, desde a década de 70 essas empresas têm
apresentado progressivos índices de vendas, movimentações financeiras e crescente poderio
de influência sobre padrões de consumo e sociais. Isso fez com que as TNC passassem a ser
vistas como grandes vilãs: ora como ferramentas do “imperialismo” americano; ora como
difusoras de um capitalismo desenfreado.
É verdade que são as grandes empresas, as maiores poluidoras do meio ambiente,
também são, por meio de massivas estratégias de marketing, importantes formadores de uma
“cultura global” e incentivadoras do consumismo. Além disso, ao utilizarem modernas
máquinas acabam gerando desempregos estruturais. Contudo, são elas que possibilitaram o
contato de povos distantes com produtos de outros locais, o fornecimento de medicamentos
em larga escala e o desenvolvimento de tecnologias e inovações em todas as áreas da ciência,
inclusive aquelas para sanarem o mal que causam (um verdadeiro paradoxo tecnológico).
Transnacionais são ainda mais atacadas quando se trata de seu poder sobre os Estados.
Por meio do seu poderio sobre diversos setores da economia, essas grandes empresas
conseguem exercer determinada “pressão” sobre os Estados para que esses ora modifiquem
suas leis a favor de interesses particulares da firma, ora implantem políticas que também as
favoreçam, isso ocorre em vários países, principalmente em relação às leis trabalhistas,
políticas de isenção fiscal e, conforme visto no capítulo anterior, com os DPI.
Quanto a essa relação entre TNC e Estado, se estabelece um grande debate, não apenas
quanto à autonomia dos países, mas também quanto aos direitos sociais, que por vezes são
suprimidos por questões econômicas. Ocorre que as empresas buscam o maior retorno pelo
menor investimento, quanto mais arriscado o investimento, mais se espera como retorno;
enquanto governos mensuram de forma diferente seus ganhos, baseados em taxas de retorno
Patentes: o regime internacional...
93
não apenas econômico, mas também social. Desta maneira, o que parece bom para as
empresas, não necessariamente é para o país, principalmente porque a ótica primordial das
TNC é uma ótica global, pois opera na dinâmica global, ao passo que o país, apesar de
também estar nesse cenário, participa majoritariamente da dinâmica nacional, tendo assim,
interesses, por vezes, muito distintos.
“All our evidence shows clearly that multinational are not secondary at all.
They are increasingly indispensable allies, whether liked or not. They too
are competing for world market shares as a mean to wealth and survival.
But whereas the state needs the production of the world market to be located
on its territory, no matter who is organizing it, the firm needs the production
for the world market to be under its ultimate control no matter where it is
located – and in many cases, no matter who possess title to ownership.”
(STOPFORD; STRANGE; HENLEY, 1991, p.212)
Um exemplo clássico dessa rivalidade se processa justamente no campo da inovação e
tecnologia. É desejo de muitos países “hospedeiros” dessas TNC, que ocorra a transferência
de tecnologia, ou seja, que a empresa não use os recursos do país apenas para produzir, mas
que deixe nele um pouco de aprendizado, que transfira conhecimento, informação e a
tecnologia utilizada por ela, a fim de aumentar a capacidade local do país na área. Porém isso
nem sempre ocorre, na maioria dos casos esses recursos-chaves ficam retidos na sede da
empresa e nos escritórios nacionais, como veremos mais adiante.
Mesmo com tantas adversidades envolvendo essa relação TNC-Estado, há ainda
muitos países, sobretudo os menos desenvolvidos, que disputam a presença de subsidiárias de
grandes corporações. Segundo Stopdord, Strange e Henley (1991, p.215) é essa competição
que parece ter reduzido consideravelmente o poder de barganha dos Estados, o que não
significa dizer que eles não mantêm um considerável poder sobre as firmas estrangeiras, mas,
que a razão das TNC estarem se sobressaindo é a natureza da competição por mercados
mundiais, a nova estrutura produtiva mundial, que alterou o valor dos fatores controlados pelo
Estado, como mão-de-obra e matéria-prima no mercado global, passando a valorizar mais os
bens intangíveis, a inovação e a informação, os quais estão, na sua maioria, sob o poder de
grandes corporações.
“The interaction between governments wanting to change firms’ behaviour
and firms resisting or acceding to pressure throws up a kaleidoscope of
responses. The tussles between headquarters and subsidiaries can lead to
unexpected outcomes that sometimes help and sometimes hinder host
states.” (STOPFORD; STRANGE; HENLEY, 1991, p.168)
Cecília Megali Ogata
94
Não se pretende aqui esgotar esse embate a respeito dessa relação tão delicada entre
Estado e TNC, o importante é não subestimar a potência de nenhum deles frente às
modificações internacionais.
3.b – Pesquisa e Desenvolvimento
Depois de uma visão geral de como as TNC chegaram ao patamar de desenvolvimento
atual, como tem se relacionado com os novos modelos de produção e como tem influenciado
na formação de novas estratégias e áreas de atuação, deseja-se agora analisar, em especial, a
área de P&D dessas empresas. Esse aprofundamento em um determinado setor se faz
necessário à medida que é nele que ocorrem as inovações, criações e é onde o conhecimento e
a informação são os principais insumos. Mas também se pretende comentar a questão da
pesquisa e do desenvolvimento (P&D) de maneira geral ao redor do mundo, suas influências
no mercado global e suas tendências atuais.
Primeiramente será feita uma análise da área de maneira mais abrangente, destacando
sua importância e seu papel, enquanto parte de uma TNC e também como um setor da
economia mundial. E, num segundo momento, debater a grande questão que se relaciona com
os fatores intangíveis da empresa: esses ativos e essas habilidades desenvolvidos dentro da
P&D são transnacionalizados? Ou se encontram localizados e centralizados nas matrizes
dessas empresas transnacionais?
3.b.a – O que é e pra que serve P&D?
A sigla P&D é cada vez mais conhecida ao redor do mundo, tanto por estudantes,
quanto por governantes e empresários. Ela serve para designar um setor da economia e
também uma área interna de algumas fábricas e organismos governamentais ou não, que se
dedicam à Pesquisa de novos materiais, fórmulas e processos e ao desenvolvimento de
modernos aparelhos, máquinas, modelos de gestão, produtos e serviços. Em resumo, é uma
área que se dedica à inovação, seja ela em um bem físico ou em algo não palpável, como uma
estratégia e serviços. Ela pode ser desenvolvida tanto pelo governo, em instituições de ensino,
de pesquisa, em laboratórios nacionais e em empresas nacionais; quanto por universidades,
públicas e privadas ou ainda por empresas de todos os ramos e tamanhos. Mantendo o foco do
trabalho, a análise se concentrará neste último caso: as empresas, sobretudo as TNC.
Patentes: o regime internacional...
95
A importância cada vez maior dessa área se deve ao fato de que, no mercado mundial,
cada vez mais são os bens intensivos em tecnologia e conhecimento que estão sendo
valorizados, em detrimento de outros intensivos em matéria-prima e mão-de-obra. Além
disso, novos conceitos, como portabilidade, maleabilidade, flexibilidade, velocidade e design,
estão se consolidando, exigindo das empresas o desenvolvimento de produtos cada vez
menores, mais sofisticados, com mais funções e de rápido lançamento e disponibilidade
comercial.
“Even in the lowest-end producers, competing only on price, we usually
found them making some affords at an R&D [Research and Development –
Pesquisa e Desenvolvimento] function to come up with new products that
would help them diversify and thereby lower the company’s risk.”
(STRANGE, 2006, p.194)
“Indeed, the proportion of goods in international trade with medium-high or
high technology content rose from 33 percent in 1976 to 54 percent by 1996
(World Bank, 1999).” (RODRIGUEZ; SALMI; DAHLMAN, 2008, p.19)
“(…) a company that introduces new technological products to the market
has productivity 23 percent higher than a company that does not innovate.
(…) In addition, a 1 percent increase in R&D intensity would be associated
with increase of 0.2 percent in the firm’s productivity – and almost 0.5
percent for firms specialized in standard products.” (RODRIGUEZ;
SALMI; DAHLMAN, 2008, p.83)
Mas essas empresas também têm investido em outra forma de inovação, a reinvenção,
ou seja, estão utilizando materiais e mecanismos já desenvolvidos, para novas funções,
acrescentando modificações, realizando melhorias e com isso, economizando dinheiro e
tempo sem deixar de inovar e se adaptar na mesma velocidade das demandas mundiais.
Afinal, reinventar não deixa de ser inventar.
Embora todos os tipos de empresa possam inovar, essa atividade ainda é
majoritariamente concentrada nas TNC não só por demandar grandes investimentos, mas
porque
“On the one hand innovation is a key engine of internationalisation as it largely
contributes to make it profitable to compete in foreign markets. On the other hand,
internationalisation cretes important innovation opportunities. In this context,
multinationals play a key role in the international exploitation and generation of
innovative advantages.” (CASTELLANI; ZANFEI, 2006, p.9).
Desta forma, a inovação e a transnacionalização caminham lado a lado, uma
usufruindo da outra. Firmas com elevado gasto em P&D estão mais propícias a lançar
inovações que poderão ser exploradas em diferentes mercados, não apenas em casa e, em
contrapartida, se internacionalizando, a empresa tem mais acesso a novos e diferentes
Cecília Megali Ogata
96
conhecimentos. Castellani e Zanfei (2006) acreditam que a vantagem competitiva não está em
um único país, mas em vários e que quanto maior for a variedade de acessos, conhecimentos e
inovações, mais dinâmica será a competição e que, quanto menor for o custo do
conhecimento, maior será sua aplicação e o uso de tecnologias, o que, por sua vez,
incrementará a divisão do trabalho inovativo. Em outras palavras, quanto maior for a
capacidade e habilidade de lidar com diferentes contextos, maior será o acesso a
oportunidades e menores os riscos, devido à possibilidade de contato com recursos
heterogêneos, isso tudo facilita a atuação em diferentes mercados.
No entanto, para aproveitar esse conhecimento “espalhado” ao longo do globo, a
transnacional precisa de muita organização, inclusive para que o conhecimento e a inovação
utilizados ou descobertos em um lugar possam ser transferidos de maneira correta aos demais.
Segundo o relatório “Knowledge and Innovation for Competitiveness in Brazil”, do
Banco Mundial, publicado em 2008, há três tipos de inovação: a criada, ou seja, que parte de
um ponto zero, para algo totalmente novo; a adquirida e adaptada, que a empresa ou
instituição tem acesso por meio de licenças, acordos ou contratos e adapta a sua realidade
particular; e a absorvida e utilizada, que se vale de recursos internos ao país de origem para
inovar e criar.
O que mostra que a inovação não está apenas na criação de objetos totalmente novos,
por exemplo, o caso do McDonalds, cuja empresa não criou algo novo, mas criou uma nova
categoria de mercado, o conceito de fast foods: “[...] a inovação tem mais a ver com a busca
pragmática da oportunidade do que com idéias românticas sobre a fortuna acidental, ou com
pioneiros solitários que pugnam por sua visão contra todas as adversidades.” (VALÈRY,
2000, p.311). Compartilha desta mesma idéia a pesquisadora do MIT, Susan Strange (2006, p.
146): “[...] the core strenghts of innovative and successful companies are not located in the
products themselves, but rather in the capabilities a firm possesses and develops for carrying
out particular functions.”.
Desta maneira, fica claro que a inovação dentro das TNC não precisa partir
necessariamente de laboratórios de P&D, mas podem ser oriundas de todos os setores dela, é
afetada pela sua organização e acaba influenciando o IED. Contudo, deve-se deixar claro que,
à luz da teoria de Shumpeter, um produto, serviço ou processo, totalmente novo garante
ganhos muito superiores à simples incrementações, como o inventor do MP3, gerou uma
revolução muito maior do que o do MP4, que apenas aumentou algumas funções e
capacidades do aparelho. É em busca dessa vantagem que as TNC têm investido cada vez
mais em P&D. Alguns dados confirmam essa idéia:
Patentes: o regime internacional...
97

Década de 1990 o investimento em P&D dos países da OCDE e Coréia do Sul esteve
acima de 2% do PIB. (BUAINAIN, et al. s/d51, p.1)

Das 700 empresas que mais investem em P&D, 98% são transnacionais, algumas delas
investem mais do que todos os gastos de alguns países desenvolvidos, como Espanha,
Israel e Suíça. (CASTELLANI; ZANFEI, 2006, p.1)

Empresas líderes em tecnologia, como IBM e Fujitsu, gastam em média 10% dos seus
dividendos em P&D e as farmacêuticas, 20%.

80% das realizações em P&D nas principais economias mundiais advêm das TNC
(GOMES, 2006, p.14)
Esses dados mostram como as empresas têm consciência da importância de se investir
em P&D para se manterem na dianteira do mercado internacional.
“Firms will differ in their international involvement according to their
endogenous choices to invest in competence creation and innovation.”
(CASTELLANI; ZANFEI, 2006, p.82).
“Their [transnacionais] investments in competitive innovation have proved
decisive in determining who gains leadership on the world stage and who
loses. (…) The dynamics of competition are such that firms’ capacities can
be regarded as more important than industry-level economics in
determining the international division of labour for specific projects.”
(STOPFORD, STRANGE, HENLEY, 1991, p.66).
“In sum, these results point two distinct channels for becoming stablished in
the market as an innovative firm. One channel in through more
sophisticated inventive activities – thatis, R&D in the conventional sense.
This kind of activity may or may not translate into salable products, but
once it does, a firm well positioned to widen its portfolio of products in the
marketplace. The second channel is through high-skilled workers who are
able to transform existing technologies into new products.” (RODRIGEZ;
DAHLMAN; SALIM, 2008, p.87)
3.b.b – Concentração ou não?
Uma vez compreendido melhor a que se destinam os laboratórios e escritórios de P&D
e a sua importância dentro da TNC, cabe agora abordar uma questão corrente a cerca do
grande debate que se instaurou sobre a internacionalização ou não dessa área da empresa. De
um lado estão aqueles que defendem que o setor, por ser tão estratégico para a
competitividade da empresa, não é colocado “fora de casa”, a fim de evitar riscos; e do outro
51
Disponível em:
http://www2.desenvolvimento.gov.br/sitio/sti/publicacoes/futAmaDilOportunidades/futIndCadProdutivas.php
acessado em 8/12/2009 às 14h
Cecília Megali Ogata
98
lado, estão aqueles que acreditam que a internacionalização dessa área contribui para o
desenvolvimento da empresa por colocá-la em contato com mais conhecimentos e maiores
oportunidades.
De acordo com os estudiosos desta segunda hipótese, as principais vantagens e razões
para a empresa instalar centros de P&D em outros países são: o acesso a maiores volumes de
informação e diferenciados tipos de conhecimento; o caráter indisciplinar da ciência, que por
si mesma, tende a dispersar; a possibilidade de estabelecer diferentes arranjos de cooperação;
ter acesso a mais recursos para inovar e com isso adquirir e acumular vantagens competitivas;
aumentar as possibilidades de especialização; maior facilidade de proteger inovações já
desenvolvidas; contato e acesso a novos mercados; e a importância do saber técnico e do
conhecimento tácito, que se encontra em cada indivíduo e nação e que não podem ser
compartilhados ou adquiridos de outra forma senão pelo aprendizado direto e contato com as
pessoas.
Os professores italianos, Davide Castellani e Antonello Zanfei, acreditam que a
internacionalização da P&D não apenas existe como tende a ser aumentada devido a essas
importantes vantagens que ela oferece. Para eles,
“Enterprises and business units belonging to the multinational group and located in
different countries are not only able to passively adapt knowledge generated
elsewhere. They are also able to generate and circulate new information, and are
more and more tied to one another by means of cultural (value and languages,
rather than hierarchical linkages. ” (CASTELLANI; ZANFELI, 2006, p.23).
Os autores defendem que as subsidiárias contam e devem contar com autonomia para
lidarem com os desafios e oportunidades do ambiente local, mesmo estando sempre ligadas a
uma coesão interna. Isso porque, desta maneira, as filiais podem desenvolver projetos e
produtos que melhor se adaptem à cultura local, à capacidade de absorção de aprendizado dela
e ao consumidor local, conseguindo criar vantagens com base nas competências locais
disponíveis. Além disso, estando em contato com outros diversos conhecimentos, muitas
vezes complementares aos que a empresa já possui, a subsidiária pode produzir novas
tecnologias.
Portanto, para esses autores italianos, as principais vantagens na internacionalização
da P&D são: aumento do processo de aprendizado pelo contato com diferentes pessoas,
culturas e conhecimentos; redução dos riscos, pelo conhecimento mais profundo do local e
consumidores; transmissão e captação de conhecimento tácito, que só ocorre quando em
contato direto com as pessoas e lugares, assim como o conhecimento social, intrínseco a cada
sociedade. Eles apresentam mais uma vantagem de que a produção no exterior de P&D seria
Patentes: o regime internacional...
99
benéfica ao país receptor dessas subsidiárias, devido à transferência de tecnologia,
possibilidades de treinamento e financiamento e melhora na competição internacional do país.
Contudo, não dispensam a existência de um escritório central com função de impor normas
para a produção internacionalizada da P&D, não com intuito de centralização, mas para evitar
que as subsidiárias deixem de repassar suas “descobertas” e deixem lacunas na transmissão de
informação intra-firma.
Também Rogério Gomes52 defende esse mesmo ponto de vista. Segundo ele, a
internacionalização da P&D é o “IED procurando ativos estratégicos” (2006, p. 141),
movimento que, segundo o mesmo autor, se inicia na década de 80. Esses laboratórios de
P&D podem ser classificados em quatro tipos, de acordo com a função que realizam. O
primeiro deles seria o “laboratório de suporte local”, que realiza atividades tradicionais de
adaptação e confecção de produtos e processos, ajustando-os de acordo com as
especificidades periféricas e do local onde se encontram. O segundo tipo seria o “laboratório
integrado de suporte”, responsável por atividades como definição de formato comercial,
fontes de pesquisa especializadas e adaptações de acordo com a demanda de clientes. O
terceiro deles é do tipo “regionalmente integrado” que se dedica a criação de produtos de
implementação aos produtos das transnacionais, com estreitamento de funções de engenharia,
comercialização e administração. E, por fim, os “laboratórios internacionalmente integrados”,
que atuam na pesquisa básica e aplicada para a transnacional, integrando-se com outras
unidades do mesmo tipo, independentemente da produção subsidiária. Nesses laboratórios a
autonomia é proporcional à complexidade das atividades que realizam, quanto mais
complexa, mais independente da matriz é a subsidiária.
Gomes, em “Empresas Transnacionais e Internacionalização da P&D”, defende como
tese central, que este movimento que se inicia na década de 80, “[...] tem se expandido
consideravelmente tanto quantitativa, como qualitativamente, resultando em uma reconhecida
tendência de fortalecimento da P&D nas unidades em países estrangeiros.” (2006, p.142).
Para ele, diferentemente do que propõem os estudos tradicionais do assunto, a P&D não é
geograficamente localizada nas nações industrializadas e nem centrada no país de origem, as
forças que retiam esse setor, como economia de escala53, economia de aglomeração54,
52
Professor Assistente Doutor da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho. Tem experiência na
área de Economia , com ênfase em Crescimento, Flutuações e Planejamento Econômico. Atuando
principalmente nos seguintes temas: redes de produção, redes de inovação, laboratórios de P&D,
Descentralização, Dispersão e duplicação de P&D.
53
"Existe economia de escala quando a expansão da capacidade de produção de uma firma ou indústria causa um
aumento dos custos totais de produção menor que, proporcionalmente, os do produto. Como resultado, os custos
médios de produção caem, a longo prazo". (Bannock et alii, 1977). "Aquela que organiza o processo produtivo
Cecília Megali Ogata
100
demanda e mecanismos de controle e coordenação, já não são suficientes para contrariar o
movimento global de transações de pessoas, produtos, conhecimentos, informações e ciência.
Embora o autor acredite na crescente internacionalização dessa área, com uma leitura
mais detalhada do livro, percebe-se que em vários pontos ele mesmo evidencia a forte
tendência ainda a concentrar e localizar esses fatores estratégicos da empresa:
“Ainda que as atividades de P&D executadas pelas ETNs [empresas
transnacionais] se mantenham geograficamente mais concentradas que
outras formas de investimento direto estrangeiro (IDE) e mais
circunscritas às nações industriais, a nova organização industrial que
emerge da luta competitiva tornada global está forçando a crescente
dispersão das funções de maior valor adicionado.” (p.131 [grifo nosso])
“É por intermédio da terceirização de todas as atividades não relacionadas
diretamente com o estabelecimento e a manutenção do poder de
mercado, que as empresas detentoras de marca mundiais reafirmam o
amplo controle das funções de alto valor adicionado, como, por exemplo,
a definição, a concepção e a comercialização do produto.” (p.17 [grifo
nosso])
“Em geral, excetuando-se as estratégias de marketing e o “núcleo duro”
da P&D, grande parte das demais funções estão sendo terceirizadas.” (p.67
[grifo nosso])
Rogério Gomes ainda afirma (p.98) que as empresas líderes tecnológicas estão mais
aptas a expandir suas atividades além-fronteiras. Essa afirmação parece bastante óbvia, pois
uma vez que a empresa se tornou líder, conta com mais recursos e segurança (inclusive
financeira) para arcar com essa expansão. No entanto, deve-se ter em mente que a maioria
dessas empresas só atinge a posição de líderes depois de terem centralizado fortemente seus
recursos principais, como P&D, quando partem para a internacionalização deles é porque já
possuem condições de se manterem na dianteira. O autor cita o caso da Nokia, que em 2001,
iniciou um processo de transferência para subcontratadas da maior parte de suas fábricas de
equipamentos para infra-estrutura e componentes, excetuando as unidades produtoras de
celulares. Mas, deve-se perceber que essa exceção não foi aleatória: este é o principal produto
de maneira que se alcance, através da busca do tamanho ótimo, a máxima utilização dos fatores que intervêm em
tal processo. Como resultado, baixam-se os custos de produção e incrementam-se os bens e serviços". (SAHOP,
1978). Disponível em:http://portalgeo.rio.rj.gov.br/mlateral/glossario/T_Economia.htm#e acessado em
30/03/2010 às 11:42h
54
Economias de aglomeração consistem em ganhos de produtividade que são atribuídos à aglomeração
geográfica das populações ou das atividades econômicas. “Como a fonte dos ganhos de produtividade se situa no
exterior das empresas, no meio que as rodeia, fala-se de economias externas ou externalidades [...]” (POLÈSE,
1998, p.77). Disponível em: http://www.eumed.net/tesis/jass/9.htm acessado em 30/03/2010 às 11:59h
Patentes: o regime internacional...
101
da empresa, como o próprio autor deixa claro ao dizer: “O grupo Nokia gasta
aproximadamente 8% do total das vendas em atividades de P&D e metade deste percentual no
segmento de telefonia móvel.” (2006, p. 185).
Nesse sentido é que se estabelece a corrente divergente à internacionalização de P&D.
Segundo os pesquisadores da área, a P&D, por ser um ativo essencialmente estratégico para a
transnacional nesse panorama internacional globalizado e de crescente valorização do
conhecimento, da informação e das tecnologias, não é internacionalizada. Pois, isso
significaria por em risco os elementos-chave para a competitividade da empresa no mercado
mundial. Ela estaria sujeita a ter suas inovações copiadas e disseminadas para outras
empresas, ou mesmo ficaria sujeita à vontade da subsidiária em transferir tal inovação.
“As firms have increased their presence in foreign markets, some distancing
form their home economies have taken place and their national identities
have been attenuated; yet, the greater part of firm’s production, R&D, and
activity remains in the home economy.” (GILPIN, 2001, p.294)
“Furthermore, control over corporate finances is normally retained in the
home country. The key elements of research and development are also still
retained in the home economy” (GILPIN, 2001, p.299)
José Eduardo Cassiolato e Helena Maria Martins Lastres, estudiosos da área e
defensores do “não-tecnonoglobalismo”, afirmam que a não internacionalização da P&D se
deve ao fato de sua natureza estratégica; à necessidade de manutenção da sua coesão interna.
Eles entendem que há sim, descentralização da P&D em algumas empresas (muito mais em
Desenvolvimento do que em Pesquisa), mas que quando isso ocorre, é feito com grande
coordenação centralizada e se dirige a países desenvolvidos.
“Aponta-se também, contrariamente ao que se apregoa, considerável inércia
na internacionalização das atividades de P&D por parte das EMs [empresas
multinacionais]: estas não internacionalizam suas atividades de P&D na
mesma proporção em que internacionalizam suas atividades produtivas.”
(CASSIOLATO; LASTRES, 2005, p.1231)
“A globalização tende a reforçar o caráter cumulativo das vantagens
competitivas dos grandes conglomerados, cujo campo de atuação é cada vez
mais global, mas cujas redes e centros de decisão localizam-se em seu
próprio país.” (CASSIOLATO; LASTRES, 2005, p.1243)
“Most R&D remains at home, too. In 2000, U.S. multinationals carried out
R&D expenditures of $131.6 billion (87 percent of the total) in the United
States while doing $19.8 billion of R&D in their overseas affiliates”
(BERGER, 2006, p.281)
Cecília Megali Ogata
102
Segundo o artigo 7 do TRIPS:
“A proteção e a aplicação de normas de proteção dos direitos de propriedade
intelectual devem contribuir para a promoção da inovação tecnológica e para a
transferência e difusão de tecnologia, em benefício mútuo de produtores e usuários
de conhecimento tecnológico e de uma forma conducente ao bem-estar social e
econômico e a um equilíbrio entre direitos e obrigações.”
Mas os dados mostram que essa transferência não é levada em consideração pela
maioria das empresas transnacionais e seus países de origem: 73,2% de todas unidades de
P&D se concentram nos Estados Unidos, União Européia e Japão. (CASSIOLATO;
LASTRES, 2005).
De acordo com Paulo César Siqueira, coordenador executivo do acompanhamento e
avaliação do Programa de Apoio aos Núcleos de Excelência (PRONEX) do CNPq,
transferência de tecnologia pode ser definida como:
“processo pelo qual a indústria incorpora ao seu patrimônio uma tecnologia
desenvolvida em um outro setor ou por uma outra agência, pertencente ou não à
mesma empresa. No plano internacional, indica a incorporação ao patrimônio de um
país de uma tecnologia desenvolvida no exterior.” (2000, p.1)
No caso do Brasil isso é especialmente verdade: apesar de o país ser um importante
receptor de IED, ele é pouco importante objeto de gasto com P&D por parte das subsidiárias.
“Porém, o aumento dos IED no Brasil nos anos 90 não foi acompanhado por
uma ampliação dos gatsos com P&D por parte das subsidiárias das EMs
[empresas multinacionais] norte-americanas. [...] Os gastos em P&D das
subsidiárias norte-americanas na União Européia, Japão e Canadá
representavam 79,2% do total em 2000” (CASSIOLATO, LASTRES, 2005,
p.1228).
No Brasil, os gastos em P&D são majoritariamente públicos e bastante vinculados às
grandes empresas nacionais, como Embraer, Petrobrás, Embrapa, Usiminas, entre outras. De
acordo com um estudo do Banco Mundial, publicado em 2008, sobre o conhecimento e a
inovação no Brasil para desenvolvimento de competitividade, 55% do investimento em
inovação no país vem do governo, contra apenas 30% nos Estados Unidos. Mas o país não
está deficitário apenas quando comparado com potências mundiais, em 2000 apenas 0,18%
das patentes mundiais foram brasileiras, contra 1,7% da Coréia do Sul, um país também de
médio desenvolvimento.
Ainda segundo o documento, a má infra-estrutura de telecomunicações, estradas,
portos, aviação, energia e a carência de investimentos em educação são grandes obstáculos a
serem superados para incrementação dos mecanismos de inovação no país. Além disso, a
P&D desenvolvida aqui é efetiva em gerar conhecimento conceitual, não inovador e
103
tecnológico, isso acaba por desconectar as academias das empresas, deixando uma lacuna
entre o conhecimento produzido e o efetivamente utilizado.
Como se pode perceber a área de P&D é fundamental para as inovações da empresa,
não é a única capaz de inovar, mas é de onde surgirão as invenções pioneiras e as que gerarão
mais lucros e ganhos competitivos. Por isso as TNC tem destinado tanta verba para o seu
desenvolvimento e aprimoramento, mas também para sua proteção, afinal é ela a “galinha dos
ovos de ouro”. Dada essa importância, fica mais fácil a compreensão do porquê de concentrar
e localizar esses setores junto à cabeça da empresa, aos líderes e ao país de origem. Embora
algumas evidências, como estudam Gomes, Castellani e Zanfei, mostrem que há um
crescimento na internacionalização da P&D, isso só ocorre quando a empresa já é líder de
mercado, ou seja, está num patamar superior na competição global; ou quando ela tem uma
estrutura interna muito organizada capaz de manter sob controle todas as subsidiárias; ou
quando o país ou região alvo é desenvolvido.
“They [transnacionais] insisted on retaining complete ownership and control
over those newer technologies which the thought might produce world-class
products” (STOPFORD; STRANGE; HENLEY, 1991, p.168)
3.c - A importância das patentes para as transnacionais
Embora o título do capítulo e do próprio trabalho se relacionem à importância
específica das patentes para as TNC se fez necessário uma abordagem preliminar do
panorama mundial no qual essas empresas transnacionais se inserem e de onde surgiram não
apenas elas, mas também os Direitos de Propriedade Intelectual (capítulo 1), passando-se
depois para uma análise de como funcionam e se consolidaram os DPI, em especial as
patentes (capítulo 2) e agora, focando-se nas empresas e em como utilizam e precisam desses
direitos/recursos.
Uma vez analisadas essas informações prévias, já se tem uma idéia, a partir da maneira
como foram consolidados os DPI e de como as empresas globais buscam obter ganhos cada
vez maiores no mercado e de que as patentes funcionam essencialmente como proteção aos
ativos mais estratégicos das TNC: a inovação. Por isso, esse capítulo pretende realizar uma
junção das idéias discutidas ao longo do texto para sintetizar o pensamento que se procurou
demonstrar no trabalho.
Há alguns séculos, pensar em patente significaria pensar em proteger o inventor,
premiá-lo com um direito exclusivo. Atualmente, pensar em patente é pensar em proteger
também, mas não apenas uma pessoa e, sim, uma empresa inteira, uma equipe de cientistas
104
que dedicaram a vida a uma descoberta, o esforço de equipes imensas de P&D e um nicho de
mercado. Além de significar a busca por recompensas pelo elevado investimento financeiro e
de tempo.
Essa amplitude que a proteção patentária tomou deve-se primeiramente às mudanças
que vem ocorrendo desde a década de 70, quando um novo paradigma tecnológico (de
avanços na área da informática, da comunicação, dos transportes e outras) se impôs sobre o
antigo modelo de produção hierarquizado, rígido e centralizado na obtenção de ganhos por
menores preços de matéria – prima e mão-de-obra. No novo modelo flexibilizado, que se
espalha pelo mundo, a busca de vantagens ocorre em diversas áreas, intensifica-se a
terceirização da produção e se preocupa mais em competir nas inovações do que nos preços.
“A primeira coisa a desaparecer é a concepção tradicional do modus
operandi. Depois de muita demora, os economistas estão saindo do estágio
em que viam apenas a competição por preços. Logo que as concorrências de
qualidade e do esforço de venda são admitidas nos sagrados recintos da
teoria, a variável preço é desalojada de sua de sua posição dominante.
Entretanto, a atenção ainda é praticamente monopolizada pela concorrência
dentro do padrão rígido de condições invariantes, em particular, métodos de
produção e formas de organização industrial. Mas, na realidade capitalista,
diferentemente de sua descrição de livro-texto, não é esse tipo de
concorrência que conta, mas a concorrência através de novas
mercadorias, novas tecnologias, novas fontes de oferta, novos tipos de
organização (a grande unidade de controle em larga escala) –
concorrência que comanda uma vantagem decisiva de custo ou
qualidade e que atinge não a fímbria dos lucros e das produções das
firmas existentes, mas suas fundações e suas próprias vidas. A eficiência
desse tipo de concorrência, perto do outro, é assim como um bombardeio
comparado a se forçar uma porta – e é tão mais importante que passa a ser
relativamente indiferente saber se a concorrência no sentido comum
funciona mais ou menos prontamente; em qualquer dos casos, a poderosa
alavanca que, no longo prazo, expande a produção e reduz os preços é
feita de outro material.” (SHUMPETER, 1984, P.114 [grifo nosso])
Esse raciocínio é chave para se entender a importância das patentes para as TNC: a
partir do momento em que os preços deixam de ser o mais importante na competição global,
não basta fazer o computador mais barato, ele tem que ser mais barato, mais equipado, com
mais funções e disponível em pouco tempo para o consumo. Dessa maneira, obter mão-deobra e matéria-prima mais baratas é necessário, mas não são eles os geradores de vantagens
competitivas. Essas vantagens estarão em outros recursos, frutos da capacidade de inovar da
empresa, seja nos seus serviços ou produtos. Isso fez também, com que o ciclo de vida das
invenções se reduzisse drasticamente, sendo lançados no mercado vários produtos a cada mês,
fazendo com que o prazo de lançamentos seja fundamental para o sucesso da firma.
Patentes: o regime internacional...
105
“No mundo contemporâneo, o desenvolvimento econômico baseia-se,
fundamentalmente, na capacidade de os países gerarem, apropriarem-se e
aplicarem o conhecimento na geração e distribuição de riquezas. A própria
riqueza vem assumindo, cada vez mais, formas intangíveis. O ativo
intelectual das empresas é a base sobre o qual se assenta a competitividade.
[...] No processo de concorrência as inovações se traduzem na invenção de
novos bens e serviços e na contínua reinvenção das coisas.” (BUAININ; et
al, s/d55, p.1).
“Em suma, a “informação processada”, isto é, “o conhecimento”, passa a ser
a pedra de toque do novo padrão de competição. Mais competitiva será a
empresa que dispuzer de mais ciência, mais tecnologia e mais cooperação
das pessoas e da rede de entidades conectadas com sua produção e com seu
mercado.” (PASSOS, 2000, p.149).
“Intangible advantages are created by investments in technology, marketing
and skills organization. These provide firms with product and service
differentiation that allows them to compete on other bases than merely those
of costs and prices. These ‘intangibles’ are growing in importance in NFP
[New Form of Production – Nova Forma de Produção] structures to provide
alternative forms of scale benefit to leading firms and erect further barriers
to entry.” (STOPFORD; STRANGE; HENLEY, 1991, p.75)
Devido a esse novo panorama internacional, as TNC buscam se manter enquanto
empresas competitivas no mercado investindo em pesquisas de longo prazo que garantirão
opções futuras e assim, maior flexibilidade da companhia para reagir às incertezas de
mercado.
Sabendo que seus produtos e serviços estão ficando cada vez mais sofisticados para
atender aos seus consumidores e cada vez mais repletos de inovações, que exigem grandes
investimentos, as TNC precisam buscar equilibrar seus gastos, “economizando” em outras
áreas nas quais a mão-de-obra possa ser mais barata, os insumos mais acessíveis e o trabalho
menos elaborado.
“It is also pretty evident that, in manufacturing – and indeed in mining and
agriculture – the nature of innovatory technology is such that both the
products and the process of their production are becoming more capital
intensive and less labour intensive than those they replace. The combination
of added costs of investment and diminished time for the realization of
profits from the product or process has effectively pushed firms into seeking
larger markets from which to extract the income necessary to amortise the
debts incurred for capital investment in time to be ready for next wave of
55
Disponível em:
http://www2.desenvolvimento.gov.br/sitio/sti/publicacoes/futAmaDilOportunidades/futIndCadProdutivas.php
acessado em 8/10/2009 às 14h
Cecília Megali Ogata
106
technological innovation. This, it is now argued, is a more powerful force
behind the internationalization of industrial production than saving in
transaction costs made possible by enlarging the size and scope of the firm.”
(STOPFORD; STRANGE; HENLEY, 1991, p.77-9 apud STRANGE, 1998,
p.27 e 28)
“Although some of the most important MNCs [multinacionais] are not hightech, it is not coincidental that many MNCs predominant in industries
characterized by extensive and expensive research and development
activities. Obviously, such firms are anxious to appropriate for themselves
all the results of their R&D effords.” (GILPIN, 2001, p.284)
Como os custos e riscos dos investimentos em P&D são muito elevados, muitas
empresas, a fim não ficarem à margem do processo atual de competição mundial, tem
buscado alternativas. Algumas realizam parcerias com universidades e centros de pesquisa
nacionais e outras buscam outras empresas que terceirizam esses serviços, são as chamadas
empresas de “pesquisa sob contrato”. Nos dois primeiros casos há alguns complicadores
devido a questões burocráticas, como o preço a ser cobrado, visto que laboratórios públicos
fazem uso de um bem público; para quem fica a patente da invenção; quem trabalhará no
projeto e como vai receber. Mas também, oferece uma considerável economia tendo em vista
que tais centros de pesquisa já dispõem de infra-estrutura e pessoal treinado.
O caso das empresas de “pesquisa sob contrato” é diferente porque se trata de uma
empresa, como outra, mas cujo produto é uma idéia, uma inovação, uma invenção. Essas
indústrias surgiram na década de 50 para atender a necessidade de pequenas e médias
empresas, mas hoje já existem várias em diversos países que prestação serviços inclusive para
grandes transnacionais. De acordo com Rogério Gomes (2006), a terceirização da produção
de P&D reduz os riscos da expansão do setor para outros países, diminui o custo de se manter
uma capacidade ociosa e possibilita maior flexibilidade na organização e expansão geográfica
da firma.
“The spurs to create aliances are the rising costs of research, the
quickening pace of technological change and the costs of entry to heavily
regulated markets. All these mean that even large multinationals may not
have sufficient resources to succeed on their own. Alliances provide the mix
of scale and flexibility needed to generate sufficient revenues for nextgeneration product development. [...] Alliances include many forms of joint
venture, outsourcing agreements, product licences and co-operative
research. They differ from older forms of association in that they are twoway trades of complementary strengths among competitors.” (STOPFORD;
STRANGE; HENLEY, 1991, p.92)
Patentes: o regime internacional...
107
A ausência de um sistema eficaz de patentes pode ser tão prejudicial quanto um
sistema muito rígido, pois, como defendem Stopford, Strange e Henley (1991), muitas
empresas preferem não patentear e manter a invenção sob segredo, do que contar como
fizeram e tornar isso público:
“[...] the patent system does not give away the vital clue to an innovative product of
process, innovating enterprises now increasingly prefer to keep their knowledge to
themselves in order to preserve their options on when, where and how to market it.”
(STOPFORD; STRANGE; HENLEY, 1991, p.38).
“Despite, or perhaps because of, the TRIPS debate, many firms increasingly rely on
unpatented ‘know-how’. […] many are also reluctant to issue licences in key
territories for fear of creating new competition.”( STOPFORD; STRANGE;
HENLEY, 1991, p.215).
“The resultant exports are, however, dependent upon the multinationals; relatively
few local suppliers have yet broken out to provide an independent, though
necessarily volatile, supply capability. The price of such dependency is that local
suppliers are vulnerable when each new generation of technology arrives to upset
existing patterns of supply.” (STOPFORD; STRANGE; HENLEY, 1991, p.87).
Embora muitos autores entendam e justifiquem a importância das patentes para as
empresas e até mesmo como um direito do indivíduo, a questão sobre os desequilíbrios entre
países ricos e pobres, entre empresas nacionais e TNC e entre os lucros e o bem social ainda é
uma problemática corrente. Pois não há como negar que há sim, elevada concentração de
desenvolvimento tecnológico e científico e processamento de conhecimento nos países
historicamente mais desenvolvidos e nas empresas que conseguiram se inserir na lógica
global.
“Como 96% das patentes industriais registradas no mundo constituem privilégios
concedidos a titulares residentes em países desenvolvidos, à tais nações deveriam
naturalmente caber as obrigações contidas no Artigo 7 de TRIPS, na busca de um
melhor balanço entre direitos e obrigações.” (ALÁRIO JR; OLIVEIRA, 2000, p.50
e 51).
Além de fatores históricos e da desigualdade de poder de barganha no estabelecimento
do Regime Internacional de DPI, os países em desenvolvimento e de menor desenvolvimento
relativo ainda encontram outro grande complicador: o desconhecimento a respeito do que
vem a ser as patentes e de como elas podem ser lucrativas.
“Conforme dados da Association of University Technology Managers, a taxa
de patenteamento na universidades aumentou consideravelmente desde a
implantação da Bayh-Dole Act56. O estudo da AUTM nas 13º principais
56
“The Bayh-Dole Act allows for the transfer of exclusive control over many government funded inventions to
universities and businesses operating with federal contracts for the purpose of further development and
commercialization. The contracting universities and businesses are then permitted to exclusively license the
Cecília Megali Ogata
108
universidades indetificou ainda a existência de 9300 licenças ativas de
comercialização.” (SCHOLZE; CHAMAS, 2000, p.86)
Ainda de acordo com essa pesquisa, descontadas as despesas e a parcela que
permanece para instituição, a média de premiação do pesquisador corresponde a 8 mil dólares
ao ano.
“[...] o baixo desempenho das universidades e centros de pesquisa
brasileiros, relativamente ao patenteamento de suas invenções, deve-se,
entre outros fatores, à falta generalizada de reconhecimento de que a patente
constitui importante indicador tecnológico, revelando a excelência
tecnológica da instituição, bem como aos desconhecimento dos benéficos
econômicos da exploração dessas criações intelectuais.” (SCHOLZE;
CHAMAS, 2000, p.88).
Alguns institutos de pesquisa, como EMBRAPA e FIOCRUZ e algumas universidades
como a Federal de São Carlos, a Federal do Rio de Janeiro, a Universidade de São Paulo, a
Estadual de Campinas e a Federal de Minas Gerais criaram políticas, grupos e fundações de
apoio ao assessoramento dos inventos e das patentes destes a fim de tentar reverter essa
situação.
Outro problema levantado pelos países menos desenvolvidos é a questão da duração
da patente, como já comentado no capítulo anterior, de 20 anos que cria um monopólio sobre
a invenção. Contudo, na lógica das empresas, que não é a mesma dos Estados, é justamente
esse monopólio que se busca, pois sua obtenção significa maior competitividade e a
exclusividade lhe garante lucratividade muito superior. Além disso, segundo uma pesquisa
feita por alunos da Faculdade de Economia e Administração da USP (2008) publicada em
Revista de Administração e Inovação, a proteção a uma inovação por apenas cinco anos não é
suficiente para que as maiores empresas do mercado consigam alguma vantagem competitiva
além do retorno dos gastos com P&D.
Mas, de acordo com Denis Borges Barbosa57 devido à grande capacidade de dispersão
do conhecimento e dos bens imateriais, o não retorno dos investimentos em atividade
econômica de pesquisa seria bastante prejudicado, ocorrendo uma falha de mercado. A fim de
inventions to other parties.” Datada de dezembro de 1980. (disponível em: http://www.cptech.org/ip/health/bd/
acessado em 18 de março às 15:28h).
57
Advogado e professor carioca atua nas áreas de direito internacional e direito empresarial, mais
especificamente nas áreas de propriedade intelectual e características jurídicas do mercado. Inclusive foi
Delegado e Assessor e várias Conferência Diplomáticas e reuniões internacionais na World Intellectual Property
Organization, United Nations Conference on Trade and Development, General Agreement on Trade and Tariffs,
assim como em reuniões bilaterais com vários Governos estrangeiros. Atuou ou atua como consultor para a
UNCTAD, a OMS, o ICTSD-UNCTAD, o Sistema Econômico Latino Americano, o Itamarati, o INPI, o
Ministério da Saúde, o Ministério da Ciência e Tecnologia (CGEE) e o CADE. Disponível em:
http://denisbarbosa.addr.com/denis2.htm acessado em 24 de março de 2010 às 9:47h.
Patentes: o regime internacional...
109
se corrigir essa falha é que foram criados os DPI, no entanto, à medida que esses permitem
um monopólio, estariam criando uma nova falha de mercado. Desta maneira, o debate entre as
empresas e os Estados a respeito dos DPI, e principalmente das patentes, é constante, não
podendo se defender apenas o lado estatal, pois:
“As empresas respondem por mais de 70% dos inventos patenteados no
mundo, posto que a patente de invenção é um bem econômico de alto valor
comercial por gerar um monopólio de mercado que assegura elevado retorno
aos investidores bem sucedidos. São as empresas que respondem, no mundo
inteiro, pelos pesados investimentos de longo prazo e elevado risco
aplicados em patentes de invenção, ainda que generosamente subsidiados
pelos governos, e que se traduzem em retornos comerciais consideráveis
(vide situação privilegiada da industria farmacêutica norte-americana, cuja
lucratividade é o dobro da média apresentada pelo setor químico). “Estimase, a nível internacional, que a cada US$ 1,5 a US$ 2 milhões investidos em
P&D, deva surgir uma patente de invenção.” (ALÁRIO JR; OLIVEIRA,
2000, p.46 e 47)
No pós-guerra, o padrão de competição internacional se baseava em vantagens
comparativas estáticas, ou seja, os determinantes eram mão-de-obra barata, recursos naturais
disponíveis e acesso a mercados. Os ativos intangíveis eram incorporados aos produtos,
marcas e máquinas de maneira mais simples e já maturadas, o que facilitava a proteção. Era
uma competição sensível a preços e a diferenciação se processava na maneira como eram
aproveitados e utilizados os insumos.
A partir de 1970, esse padrão se modifica, para uma competição “centrada na
capacidade de traduzir desejos ou necessidades em produtos” (AVILA, 2006). Em outras
palavras, a competição agora é por vantagens comparativas dinâmicas, pautadas em diferentes
e modernas tecnologias e na constante atualização e transmissão de conhecimentos e
informações, impulsionadas pelos avanços nas áreas de comunicação e transportes. Aumentase a importância dos ativos intangíveis e da inovação os quais por sua vez são muito fáceis de
serem dispersados, isso faz com que a proteção se torne mais necessária. Contudo, tão
importante quanto ter a idéia e protegê-la é a capacidade de realizá-la no mercado antes que
seus concorrentes a façam.
“A propriedade intelectual possibilita transformar o conhecimento em
princípio um bem quase-público em bem privado e é o elo de ligação entre o
conhecimento e o mercado (Lastres; Ferraz, 1999). A intensidade do
desenvolviemnto científico e tecnológico, a aproximação e a interpenetração
entre ciência e tecnologia (aproximando a ciência do mercado de forma não
experimentada anteriormente), a redução dramática do tempo requerido, a
redução do ciclo de vida dos produtos no mercado; a elevação dos custos de
Cecília Megali Ogata
110
pesquisa e desenvolvimento e dos riscos implícitos na opção tecnológica; a
incorporação da inovação como elemento da ampliação da competitividade;
e, particularmente, a capacidade de codificação dos conhecimentos, aumenta
a importância da proteção à propriedade intelectual como mecanismo de
garantia dos direitos e de estímulo aos investimentos.” (BUAINAIN;
CARAVALHO, 2000 apud BUAINAIN et al, s/d58, p.2)
De acordo com relatório do EPO, a função primeira da patente e das demais formas de
PI é permitir que a inovação seja transacionada e que produtos e serviços sejam trazidos ao
mercado de uma forma que justifique o investimento prévio para desenvolvimento desses
bens, no entanto, o relatório ressalta que, devido às mudanças na forma organizacional e de
produção das empresas (inclusive com aumento da terceirização) o propósito e o valor das
patentes tem se modificado de apenas uma forma de proteção para partes fundamentais dos
ativos da empresa.
“So business now sees patent rights as a financial assets as well as a right
to a potential monopoly. The biggest companies, with the largest portfolios
of patents, deploy armies of researchers, accountants and lawyers to
evaluate opportunities around the exploitation of their patents. And they
understand that the value of these assets is dependent on a workable system
of regulation that is, in fact, already abroad.” (EPO, 2007, p.35)
Então, as principais motivações para as empresas buscarem o mecanismo de patentes
seriam cincoa: a exploração comercial como ativo de alto valor agregado, a possibilidade de
fazer licenciamentos e licenciamentos cruzados, a prevenção contra a imitação, o bloqueio o
acesso dos concorrentes a determinadas tecnologias e a manutenção uma elevada reputação
no cenário mundial, uma vez que as patentes funcionam como fortes indicadores de
performance. Para as grandes empresas são interessantes principalmente aquelas patentes que
cobre muitos aspectos marginais e tecnologias mais simples, pois essas patentes ficam, assim,
mais sujeitas a infrações de outras firmas e, consequentemente, ao pagamento de royalties.
Também de acordo com esse relatório, à medida que algumas empresas alocam em
outros países algumas atividades ligadas à P&D, a tendência a se preocupar com a proteção e
as patentes desses inventos e inovações é aumentada. Isso comprova o que já havia sido dito
anteriormente: mesmo quando a empresa externaliza alguma atividade de P&D, ela mantém
sob seu domínio os frutos dessa atividade e busca logo obter o direito de propriedade do bem
(tangível ou não) para si.
58
Disponível em:
http://www2.desenvolvimento.gov.br/sitio/sti/publicacoes/futAmaDilOportunidades/futIndCadProdutivas.php
acessado em 8/10/2009 às 14h
Patentes: o regime internacional...
111
“Some multinationals are starting to see the threat from this development
and are already changing the way they exploit their patents portfolio in
order to head off competitionfrom emerging companies – before the tipping
point. The OECD59 report cities Hitachi, which earned licensing revenues of
¥ 43 bn in 2002, then changed its licensing policy in 2003 from one of
openness to a more closed approach. “to preserve its competitive
advantages through greater control of inventions.”. Why? The rapid
improvement in the technology of Korean and Chinese competitors. The
OECD concludes that “holding strong patents seems to be a key success
factor”, a lesson not lost on South Korea in particular.” (EPO, 2007, p.56)
Desta maneira, “Quando a proteção à propriedade intelectual é fraca, a gestão dos
intangíveis deve valorizar estratégias que reduzam os riscos de imitação pelos concorrentes.”
(BUAINAIN; CARVALHO, 2000, p.149), como as alianças estratégicas e o licenciamento
cruzado. A primeira se refere ao estabelecimento de acordos entre empresas para estabelecer e
usufruir de complementaridades entre suas habilidades e capacitações, já o segundo é uma
estratégia que permite que uma empresa use produtos e/ou processos que outra empresa possui
patenteados e vice-versa, sem o pagamento de royalties. Essa é uma prática cada vez mais
utilizada pelas grandes empresas como Microsoft, Toyota, Nokia, entre outras.
Apesar de algumas áreas poderem colaborar no que tange as questões das patentes, o
regime internacional, materializado no acordo TRIPS, ainda é muito falho ao tentar
estabelecer regras iguais a setores diferentes. Por exemplo, para as empresas de fármacos e
biotecnologia, a patente funciona mais como um mecanismo de proteção do que de defesa,
como é o caso das firmas que desenvolvem semicondutores e softwares, inclusive o ciclo de
vida dos produtos e a exigência de investimentos são bem diferentes. Isso acaba gerando
muitas contradições dentro não apenas das discussões globais sobre o assunto, mas também
nas políticas internas de cada país, que são altamente influenciadas por grupos lobbistas
dessas empresas. Além disso, a patente é mais relevante para inovações em produtos, do que
em processos.
O caso da IBM é um tanto quanto peculiar, pois a empresa, líder no setor de softwares
e também no número de patentes (3248 registros só no escritório americano em 2004),
anunciou em 2005 que liberaria em torno de 500 patentes para o domínio público, sem exigir
pagamentos de royalties. De acordo com John E. Kelly, vice presidente da empresa, essa
política pode ser considerada de “desarmamento”, porém não de entrega de todos projetos
(BERGER, 2006,p.263). Deve-se observar nesse caso, que a empresa está disponibilizando
59
Sigla inglesa para OCDE – Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico.
Cecília Megali Ogata
112
patentes que já não constituem mais vantagens competitivas para ela. Além disso, ela somente
fez isso quando já possuía a posição de liderança no mercado, o que mostra que as empresas
realmente buscam reter em e para si os ativos e inovações mais estratégicos e que, uma vez
atingida a liderança, ela pode abrir mão de alguns recursos que ainda assim permanecerá na
dianteira dos negócios.
Nota-se que mesmo quando a empresa internacionaliza algumas partes da sua P&D,
ainda mantém, aquilo que considera vital para sua performance localizado e centralizado:
“As we learned in interviews with Taiwanese original design manufacturers
(ODMs), they find themselves doing a growing amount of design services for Dell,
in addition to manufacturing the parts. But Dell still controls the vital part of
design: knowledge of customer and ability to respond rapidly to new demands.”
(BERGER, 2006, p.152)
Mas, manter a produção no local de origem ou apenas as partes vitais parece ir na
contra-mão da idéia de TNC, porém, a busca de vantagens em diferentes lugares e por
matéria-prima mais barata e abundante não exige mais a proximidade física devido ao
desenvolvimento dos transportes e da comunicação. Além disso, a busca por mão-de-obra
barata que é sempre apontada como um dos principais fatores para a internacionalização das
empresas, não tem parecido verdade incondicional, pois, com o contínuo e crescente uso de
automação os salários representam hoje, cerca de apenas 5% dos gastos empresariais
(BERGER, 2006).
Os pesquisadores do MIT que trabalharam com Berger concluem, ao fim do segundo
capítulo, que empresas cujas soluções se baseiam na redução dos custos de salários e
benefícios sociais, sempre tendem a perder, pois os salários representam uma pequena parte
dos custos da firma. Para Berger,
“The activities that succeed over time are, in contrast, those that build on
continuous learning and innovation. These allow companies to build capabilities –
brand name, long-term working relations with suppliers and customers, intellectual
property, specialized skills, reputation – all of which are out of reach to companies
whose only assets are their access to cheap labor.” (BERGER, 2006, p.54).
De acordo com os pesquisadores do MIT, esse novo modelo de produção, chamado
“modular”, não implica necessariamente sair de casa, embora poucas sejam as empresas que
mantêm a produção localizada. As principais vantagens destacadas pelos empresários é que os
trabalhadores locais já possuem o know-how necessário e que é uma forma de reter esse
conhecimento nos domínios da firma e, assim, consequentemente, preservar as principais
vantagens competitivas das empresas.
Patentes: o regime internacional...
113
“Outside of the United States and Europe, there are relatively few fab-less
IC (integrated circuits) design firms with real innovative capabilities. The
highly trained and creative talent they need to recruit is a scarce resource in
most countries.” (BERGER, 2006, p.178)
Ao contrário da Dell, que tem como diferencial o serviço (rápida entrega e
possibilidade de adaptação do produto à demanda individual do cliente), a Sony é uma
empresa que investe pesadamente em P&D, aproximadamente 6,4 % de suas rendas (em
2003) e busca criar mercados totalmente novos. Isso a torna menos vulnerável aos ciclos de
negócios, sobretudo por ser uma empresa essencialmente japonesa, com produção no Japão, o
que possibilita que nem mesmo o “how to do” seja ensinado, transmitido como facilidade,
sendo a localização também uma forma de proteção: “Because outsourcing can lead to leaks
in intellectual property, Sony tries to prevent this, or at least slow it down during the window
of opportunity of new-product introduction, when the highest margins are made.” (BERGER,
2006, p.157).
Em algumas empresas, inclusive, são os trabalhadores de produção que ajudam a gerar
patentes, como é o caso da Anagram60 (Minnesota), na qual os funcionários ajudaram a fazer
a máquina mais rápida do mundo, de acordo com gerente isso foi possível devido a elevada
capacidade da mão-de-obra local. Além disso, algumas áreas de todos os setores industriais
ainda não podem ser dissociadas umas das outras, precisam de presença, de contato, como é o
caso da japonesa Ulvac61: “The information needed to move form prototype to producing on a
larger scale cannot be standartized and translated into digital code.” (BERGER, 2006,
p.220), ademais, o presidente da empresa afirmou aos pesquisadores, que outro motivo é que
60
Founded in 1977, and part of the Ascam family of companies since 1998, Anagram delivers more than just
the highest quality foil balloons in the industry, we also offer the largest portfolio of licenses and licensed
character products. Our Headquarters and Manufacturing Facility is located in Minneapolis, MN where you will
find a dedicated staff of Manufacturing Specialist that produce balloons 24 hours a day, 7 days a week, an
industry-leading Creative team including trend, color and design specialists, R&D, Quality Control, Customer
Service, Administration Support, Sales and Marketing. Our state-of-the-art, proprietary manufacturing
technology ensures that our Distributors and Retail Partners have the best balloons in the industry that offer the
highest quality and the latest innovation Anagram products are marketed in over 140 countries. Anagram is
prepared to support our customers' marketing activities world wide, either through our Minneapolis office, or
one of our sales and distribution facilities located in the United Kingdom, Australia, Mexico, and Japan.
Disponível em: http://anagramballoons.com/ acessado em 23 abril 2010.
61
Founded in Japan in 1952, ULVAC is an international corporation that designs, manufacturers and markets
equipment and materials for industrial applications of vacuum technology. Today, ULVAC is a leading global
supplier of production systems, instrumentation, pumps and vacuum components used in the semiconductor, flat
panel display, disk/magnetic media, and industrial manufacturing markets. The corporation is comprised of some
36 individual companies engaged in all sectors of the vacuum industry. The ULVAC name is derived from the
company's conceptual foundation - "The ULtimate in VACuum Technology". Disponível em: www.ulvac.com
acessado em 30/03/2010 às 13:10h
Cecília Megali Ogata
114
a empresa quer preservar e proteger as suas PIs a fim de evitar que, através da terceirização ou
de joint ventures, ocorra o uso de sua tecnologia por outros.
“Exploiting this tacit knowledge was so important that companies built
organizations around preserving and encapsulating it within their own
walls. The organizations of the most successful vertically integrated
enterprises, such as IBM and Hitachi, were centered around capturing the
firm’s formal knowledge (often protected by patents or in proprietary
process technology) and combining it with the hands-on knowledge and the
expertise of employees.” (BERGER, 2006, p.140)
“Polegato calls this intelligent “offshoring”: All the high-skilled parts stay
home; the rest is done in low-wage labor markets.” (BERGER, 2006, p.258)
“To start, in sectors like electronics and textiles that have been the most
heavily affected by globalization, changes have taken place via a
fragmentation of production that makes it possible to break apart stages of
research, development, design, manufacturing, and marketing and move
them to different companies and locations around the world. Where
fragmentation of production is technically possible, companies need to keep
within their own walls only those activities in which they can compete with
the best in the world. In fact, they have to be able to match their
performance with best-in-class across each of their functions.” (BERGER,
2006, p.51)
É justamente essa uma das conclusões que a equipe liderada por Berger chega ao fim
do 11º capítulo: nesse novo panorama de competição intensa, as empresas estão realmente
preocupadas em “não criar um competidor”. Para isso elas se valem tanto da manutenção de
ativos estratégicos no território de origem, quanto dos DPI e também do chamado “blackbox”, ou seja, incorporar novas tecnologias aos produtos e processos de maneira tal que seja
impossível que os competidores realizem engenharia reversa.
“As important as any of these technical capabilities, the fab has to convince
its customers that it can protect their intellectual property (IP). The fab
cannot compete with its own customers and survive. It has to manage the
business in a way that prevents the leakage of one customer’s IP to the
others. The files created by the chip designer and dent to the fab contain
information on the positioning of microcomponents. If this leaked out, the
designs could be copied and made into counterfeits, and rival could learn
each other’s secrets.” (BERGER, 2006, p.81)
“American-led firms also worry about their intellectual property
disappearing when they deal with Taiwanese ODM62 companies. A manager
at a telecom equipment company explained that though the Taiwanese
62
Original Design Manufacturing
Patentes: o regime internacional...
115
ODMs were very efficient, they bring a lot of intellectual property risk –
“they scare the hell out of us” – and so the decision was to use Flextronics
(a U.S.-based contract manufacturer) instead.” (BERGER, 2006, p.158)
Pode-se dizer, portanto, que embora em alguns casos as empresas optem por obter
vantagens competitivas através de uma diferente estrutura de vendas ou prestação de serviços,
elas estão essencialmente inovando. Além disso, mesmo que algumas inovações não sejam
passíveis de patentes, as empresas buscam protegê-las de alguma forma, seja mantendo sua
administração e coordenação localizada, seja por um dinâmico e eficaz mecanismo de
organização entre as cadeiras de suprimentos. Contudo, como citado por diversos autores
acima, a patente é um importante recurso de caráter jurídico que possibilita de um lado a
preservação de uma inovação e o seu monopólio pelo detentor da carta patente e com isso a
preservação de uma vantagem competitiva; e do outro que essa inovação se torne pública e
acessível (por meio de pagamento de royalties).
Assim, a patente, nesse atual sistema globalizado, é um importante recursos para as
empresas transnacionais, principalmente porque ao se expandirem ao redor do mundo,
potencializam a existência de concorrentes em cada lugar em que se instalam, além dos
demais também globalizados que competem no mercado mundial.
Cecília Megali Ogata
116
Considerações Finais:
Todo estudo que envolva a globalização, por mais detalhado e completo que seja,
dificilmente dará conta de tantos fatores que estão envolvidos e relacionados a ela. Na
primeira parte deste capítulo procurou-se, de maneira geral demonstrar algumas das mudanças
e características mais recentes desse processo, tais como: a reestruturação produtiva, a ameaça
ao poder estatal por parte dos novos atores transnacionais, as inovações nos meios de
comunicação, a rapidez de locomoção e redução de custos propiciada pelo avanço na área de
transportes, a facilidade de locomoção dos indivíduos entre as diversas fronteiras estatais e,
principalmente, as mudanças de paradigmas no que tange a importância crescente de ativos
intangíveis, tanto para economia, quanto para o próprio desenvolvimento social.
Contudo, ao contrário do que possa parecer, a globalização não é uma força centrífuga,
que distribui de forma uniforme por todos os lugares esses avanços técnicos e científicos. Pelo
contrário, trata-se de uma fora centrípeta que permite às grandes corporações se aproveitar das
crescentes facilidades de transporte e comunicação, bem como da desregulamentação e
abertura das fronteiras para concentrar a produção nas localidades em que possam obter o
máximo lucro proporcionado pela posse de ativos específicos relacionados principalmente a
capacidade de inovação tecnológica. Claro, pode-se argumentar que até mesmo nos países
subdesenvolvidos do tão esquecido continente africano, onde até mesmo falta água potável, é
possível tomar uma Coca-Cola, mas a questão é que, nesse caso, trata-se apenas de uma
comercialização, não necessariamente de uma produção local, do fornecimento de postos de
trabalho ou investimentos no país: os fluxos, ao se tornarem mais fáceis e ágeis, livram as
empresas e demais tores internacionais de manterem instalações industriais em todos os
lugares em que seus produtos, físicos ou não, estão.
Se isso se aplica a um bem material, é especialmente válido para os imateriais. Para
alguns grandes pesquisadores do assunto, o caso da tecnologia é o mais evidente, pois não
haveria o “tecnoglobalismo”, mas sim, uma concentração cada vez maior desse ativo e
recurso, nos países desenvolvidos, sobretudo nas sedes da empresa. Isso porque a informação,
o conhecimento e principalmente a inovação, são as principais matérias-primas desse novo
século, atribuindo a ele inclusive, o nome de “Era da Informação e do Conhecimento”. Desta
maneira, nenhum país ou empresa quer correr o risco de internacionalizar sua principal fonte
de garantia de competitividade.
Trata-se que a competição atual global, não se processa, como anteriormente, em
termos de preço, mas sim em inovação. Ou seja, se anteriormente, se tornava líder do
Patentes: o regime internacional...
117
mercado a empresa que conseguisse produzir ao menor custo possível, ao passo que nos dias
de hoje, torna-se líder do mercado, a empresa que consegue inovar mais e melhor em seus
produtos, pois a inovação possibilita que o consumidor aceite pagar um pouco mais, acima do
mercado, para ter um aparelho mais moderno, com mais funções e um design mais arrojado.
Em virtude disso, tomando como pressuposto que o capitalismo tem como
características primárias e inerentes a desigualdade e a propriedade para sua perpetuação e
evolução e que, a globalização é um processo fruto desse modelo capitalista, os direitos de
propriedade intelectual surgem, então como uma forma de apropriação dos bens imateriais.
Se, na nova “Era da Informação e do Conhecimento”, o que garante uma melhor
competitividade da empresa são ativos essencialmente imateriais, esses direitos surgem para
tornar possível sua aquisição, apropriação e mesmo comercialização.
Porém, como demonstrado no texto, os DPI não são recentes. O que é recente é
conotação a eles atribuída, principalmente no caso das patentes. Quando surgem, no século
XV em Veneza, têm como principal objetivo a proteção do inventor, como uma recompensa
pelo seu esforço, evitar que seja copiado indiscriminadamente sem um retorno a ele; e tornar
público tal invento, de modo que toda sociedade possa saber, como, com o que foi feito e para
que serve, podendo copiá-lo ou mesmo melhorá-lo, mas reconhecendo a titularidade do feito
ao seu inventor. Atualmente, em virtude de todas as modificações acima citadas, esses direitos
passaram a funcionar como estratégias de obtenção de vantagem competitiva, mas, mais do
que isso, se tornaram ferramentas de monopólio.
Pode parecer um tanto quanto incoerente dizer que a patente (que exige do inventor
que este revele para sociedade como chegou a tal invento e como fazê-lo) propicie monopólio
e isso até a década de 1970 poderia ser mesmo incoerente, mas o fato é que desde então as
mudanças sobretudo nas áreas de comunicação e transportes, tem propiciado um intercâmbio
muito maior de informações e também maior acesso a diferentes insumos e mercados, isso
tudo fez com que a capacidade de inovar aumentasse consideravelmente, proporcionando o
aparecimento de novas tecnologias quase diariamente. O ciclo de vida das tecnologias está
muito reduzido, ao longo de dois anos, inúmeras tecnologias se tornam obsoletas, seja por
uma inovação total, seja por uma inovação incremental. Ademais, os royalties, pagos à
empresa ou pessoa proprietária da patente são muito elevados. Assim, ao conceder uma
patente de 20 anos para uma empresa, esta fica, de fato, com o monopólio de tal invenção.
Este fato se confirma, por exemplo, com o caso da IBM mencionado no texto, que desde 2005
vem “liberando” algumas de suas patentes para o domínio público, certamente essas já estão
ultrapassadas.
Cecília Megali Ogata
118
Esse atual Regime de patentes e PI que se estabeleceu com base em tratados do século
XIX (de Berna em 1886 e de Paris em 1883), mas que adquire novas características com a
assinatura do Acordo sobre Propriedade Intelectual na OMC (Trips), aumentando sua
abrangência, tanto no sentido de valer para mais países, quanto no sentido de aumentar os
objetos passíveis de patenteamento, foi imposto pelos países desenvolvidos aos países
emergentes e de menor desenvolvimento relativo de maneira a literalmente, “chutarem a
escada” pela qual subiram. Os países desenvolvidos não se utilizaram das patentes enquanto
estavam começando seu desenvolvimento e suas atividades industriais, pelo contrário,
utilizaram de cópia, pirataria, às vezes chamando tais processos eufemisticamente de
“engenharia reversa” e só passaram a defender tais direitos, quando já se encontraram no topo
da economia mundial. Quando estes perceberam a importância que os ativos intangíveis
estavam tendo na economia mundial e quando as próprias empresas transnacionais notaram
como poderia ser desvantajoso se internacionalizar para países cujos mecanismos de proteção
não fossem suficientemente rígidos e que poderiam acarretar perda de competitividade,
passaram a realizar fortes pressões sobre seus governos e organizar lobbies para que tal
assunto fosse discutido em âmbito internacional e, mais do que isso, para que fosse levado
para a esfera comercial.
Em outras palavras, a partir do memento que tanto empresas, quanto estados percebem
a crescente importância das inovações, do conhecimento e das informações para ganhos de
vantagens competitivas, eles procuram uma forma de inserir tal assunto na sua esfera de
poder, no caso a econômica – comercial. Desta forma, os assuntos relacionados à PI, que na
sua origem nada têm a ver com comércio e por isso mesmo, eram regulados por um órgão
especial da ONU, a OMPI, passa a ser tratado na OMC. Isso acarretou não apenas perda do
poder de barganha dos países menos desenvolvidos, uma vez que os acordos na OMC estão
sujeitos ao mecanismo de entendimento único (single-undertaking, ou seja, ou se assina tudo,
o “pacote” inteiro, ou nada), mas também reduziu o poder da OMPI, desviando o foco de
outras questões relacionadas a PI como desenvolvimento, distribuição e transferência de
tecnologia.
Em todo esse processo de criação, construção, consolidação e mudança de foco do
regime internacional de patentes (de PI), as empresas transnacionais, que se tornaram
importantes atores do sistema internacional, capazes de influenciar todas as atividade sócias,
são agentes ativos. Mesmo que não negociando diretamente, seus interesses foram expressos
pelas atitudes dos governos dos países a que pertencem (pelo menos juridicamente). Portanto,
em praticamente todos os assuntos, mas em especial no que tange o caso do regime
Patentes: o regime internacional...
119
internacional de PI, elas não podem ser tidas como atores secundários, seja por seu poderio
econômico, seja pelo seu poder de influenciar políticas.
Desta forma, como se procurou demonstrar no texto, as TNC são grandes beneficiadas
desse regime, pois é delas que advém uma elevada parcela da inovação do planeta, pois os
custos de P&D são muito elevados. Essa evidência, mostrou também que a preocupação com
as patentes tende a se tornar cada vez maior, para essas empresas, devido ao fato de gerarem
grandes vantagens competitivas e assegurarem monopólio de determinada tecnologia. A
relação das TNC com as patentes, evidencia, portanto, não apenas a real mudança no padrão
de competição mundial, mas também como novos atores do sistema internacional não podem
ter sua força de influência negligenciada e também, como os países mais desenvolvidos
atuam de maneira (ainda) a impor suas vontades para atender suas necessidades e interesses
específicos, não globais e universais.
Enfim, o estudo das patentes e das PI é uma rica fonte de análise de várias facetas do
sistema internacional, permite observar diferentes óticas que um mesmo assunto pode
assumir, como diversos atores estão de fato interligados e como ainda há muito a ser feito
para que os princípios universais se tronem, de fato universais.
Cecília Megali Ogata
120
Referências:
ALÁRIO JR, DANTE; OLIVEIRA, NELSON BRASIL de. A Inovação Tecnológica e a
Indústria nacional. . In: Revista Parcerias Estratégicas, n.8, 2000. p.45-53.
ALBAGLI, S. Novos espaços de regulação na era da informação e do conhecimento. In:
LASTRES, M. H. M.; ALBAGLI, S.(Org.). Informação e globalização na era do
conhecimento. Rio de Janeiro: Campus, 1999. p.290-313.
ALMEIDA, P.R. Globalização e as desigualdades: quais as evidências? In: A Grande
Mudança: conseqüências econômicas da transição política no Brasil. São Paulo: Editora
Códex, 2003; pp. 117-122.
ÁVILA, J. A. P. C. A importância das marcas, patentes e outras formas de Propriedade
Intelectual para competitividade das empresas. 2006. Apresentação em Power Point
disponível em: http://www.acrj.org.br/IMG/pdf/doc-297.pdf acessado em 20 maio 2009.
BARROS, B. da Silva; BELAS, C. A. (coord.). Curso de Introdução à Propriedade
Intelectual. Museu Paraense Emílio Goeldi, Belém, PA, 2004.
BAUMANN, R.; CANUTO, O.; GONÇALVES, R. Globalização financeira e globalização
produtiva. In: ______ Economia Internacional. Teoria e Experiência Brasileira. Rio de
Janeiro: Campus, 2001. p.221-233.
BUAINAIN; et al. Propriedade Intelectual e inovação tecnológica: algumas questões para
debate
atual.
[20--]
Disponível
em:
http://www2.desenvolvimento.gov.br/sitio/sti/publicacoes/futAmaDilOportunidades/futIndCa
dProdutivas.php acessado em 8/12/2009 às 14h.
BUAININ, A. M.; CARVALHO, S. M. P. de. Propriedade Intelectual em um mundo
Globalizado. In: Revista Parcerias Estratégicas, n.9, 2000. p.145-153.
BAYLIS, J.; SMITH, S. Introdução. In: ________ Globalization of World Politics. An
introduction to international relations. 3. ed. Oxford: Oxford University Press, 2001. p.1-13.
BUENO, Francisco da Silveira. Dicionário da Língua Portuguesa. São Paulo: FTD, s/a.
BERGER, S. (org.). How we compete. 2.ed. Estados Unidos: Acurrency Book, 2006.
CARBONE, P. P. et.al. Gestão por competências e gestão do conhecimento. Rio de
Janeiro: Editora FGV, 2006.
CASTELLANI, D.; ZANFEI, A. Multinational firms, Innovation and Productivity.
Cheltenham, UK: Edward Elgar, 2006.
CASSIOLATO, J.E. A economia do conhecimento e as novas políticas industriais e
tecnológicas. In: LASTRES, M. H. M.; ALBAGLI, S.(Org.). Informação e globalização na
era do conhecimento. Rio de Janeiro: Campus, 1999. p.164-189.
Patentes: o regime internacional...
121
CASSIOLATO J.E.; LASTRES, H. M. M. Tecnoglobalismo e o papel dos esforços de P,D&I
de multinacionais no mundo e no Brasil. In: Seminários temáticos para a 3ª Conferência
Nacional de C&T&I, Parcerias Estratégicas, n.20, jun. 2005. p. 1225-1245.
CHANG, Ha-Joon. Chutando a escada: a estratégia do desenvolvimento em perspectiva
histórica. Trad. Luiz Antônio Oliveira de Araújo. São Paulo: Editora UNESP, 2004.
CLARK, I. Globalization and the post-cold war order. In: BAYLIS, J.; SMITH, S.
Globalization of World Politics. An introduction to international relations. 3. ed. Oxford:
Oxford University Press, 2001. p.728-742.
COX, M. From the cold war to the war terror. In: BAYLIS, J.; SMITH, S. Globalization of
World Politics. An introduction to international relations. 3. ed. Oxford: Oxford University
Press, 2001. p.132 – 157
CRISTIANI, M.; AMAL, M. (coord.). Investimento Direto Externo no Mercosul: o papel
da Europa. Rio de Janeiro: Konrad-Adenauer, Stiftung, 2006. p.13-43.
CRUZ, L. A. C. da. O regime global da propriedade intelectual e a questão do
desenvolvimento: o poder dos países em desenvolvimento no campo multilateral. 2008. 140
f. Dissertação (Mestrado em Relações Internacionais) - Instituto de Filosofia e Ciências
Humanas da Universidade Estadual de Campinas, 2008.
DERTOUZOS, M. O que será: como o novo mundo da informação transformará nossas
vidas. Tradução de Celso Nogueira. São Paulo : Companhia das Letras, 1997
DUPAS, G. Impactos Sociais e Econômicos das novas tecnologias de informação. In:
SIMPÓSIO INTERNACIONAL: "IMPACTOS DAS NOVAS TECNOLOGIAS DE
INFORMAÇÃO: UNIVERSIDADE E SOCIEDADE", 1999, São Paulo. Disponível em:
http://www.ime.usp.br/~cesar/simposio99/Dupas.htm acessado em 17 junho 2009.
EUROPEAN PATENT OFFICE. Scenarios for the future. How might IP regimes evolute by
2025? What global legitimacy might such regimes have?. 2007
FINGERL, E.; GARCEZ, C. Economia do conhecimento e a atuação do BNDES:
considerando os intangíveis. In: INSTITUTO DE ESTUDOS DO TRABALHO E
SOCIEDADE. Rio de Janeiro: trabalho e sociedade. Ano 2, nº especial, dezembro 2002
FISHER, Willian. Theories of Intelectual Property. In: Stephen Munzer (ed.), New Essays in
the Legal and Political Theory of Property. Inglaterra: Cambridge University Press, 2001.
GANDELMAN, M. Poder e conhecimento na economia global. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 2004.
GILPIN, R. A economia política das relações internacionais. Tradução: Sérgio Bath.
Brasília: editora UNB, 2002. p.257-290.
_________. Global political economy. Understanding the international economic order.
Princeton: Princeton University Press, 2001. p. 278 – 304.
Cecília Megali Ogata
122
GOMES, R. Empresas Transnacionais e Internacionalização da P&D. Elementos de
organização industrial da economia da inovação. São Paulo: editora UNESP, 2006.
GOULART, A. Informação. Precisamos definir esse termo. 2004. Disponível em:
http://observatoriodaimprensa.com.br/artigos.asp?cod=286DAC002 acessado em 30 maio
2009.
HESSE, C. The rise of IP 700 B.C. – A.D. 2000: one idea in balance. In: Daedalus, spring –
2002. p.26-45.
JAKOBSEN, K. Comério internacional e desenvolvimento. São Paulo: Editora Fundação
Perseu Abramo, 2005. p.105-109
KIM, L. S. Da imitação à inovação. A dinâmica do aprendizado tecnológico da Coréia.
Tradução Maria Paula G. D. Rocha. Campinas: Editora UNICAMP, 2005.
KON, A. Tecnologia e trabalho no cenário da globalização. In: DOWBOR, L.; IANNI, O.;
RESENDE, Paulo –EdgarA (Org.). Desafios da Globalização. 5.ed. Petrópolis: Vozes, 1997.
p.60-69.
KRASNER, Stephen D. Structural causes and regimes consequences: regimes as intervening
variables. In: KRASNER, Stephen D. International regimes. Ithaca: Cornell University
Press, 1995.
LASTRES, M. H. M.; FERRAZ, J. C.. Economia da Informação, do Conhecimento e do
Aprendizado. In: LASTRES, M. H. M.; ALBAGLI, S.(Org.). Informação e globalização na
era do conhecimento. Rio de Janeiro: Campus, 1999. p.27-58
LASTRES, M. H. M.; CASSIOLATO, J. E. Novas Políticas na Era do Conhecimento: o foco
em arranjos produtivos e inovativos locais. In: Revista Parcerias Estratégicas, n.17, 2003.
p.5-31. Disponível em: http://www.cgee.org.br/arquivos/pe_17.pdf acessado em 17 maio
2009.
LASTRES, M. H. M. et al. Globalização e Inovação Localizada. Rio de Janeiro, 1998.
Disponível em: http://www.ie.ufrj.br/redesist/P1/texto/NT01.PDF acessado 06 junho 2009
acessado em 1 de junho de 2009.
MALDONADO, J. Tecno-globalismo e o Acesso ao Conheciemnto. In: LASTRES, M. H.
M.; ALBAGLI, S.(Org.). Informação e globalização na era do conhecimento. Rio de
Janeiro: Campus, 1999. p.105-122.
MCGREW, A. Globalization and global politics. In: BAYLIS, J.; SMITH, S. Globalization
of World Politics. An introduction to international relations. 3. ed. Oxford: Oxford
University Press, 2001. p.19-40.
NYE Jr., J. S. O paradoxo do poder americano :porque a única superpotência do mundo
não pode prosseguir isolada. Tradução de Luiz Antônio Oliveira de Araújo. São Paulo : Ed.
da UNESP, 2002.
Patentes: o regime internacional...
123
OLIVEIRA, M. O. de. Relações Internacionais. Estudos de Introdução. 1. Ed.(2001) 4.
tiragem. Curitiba: Juruá, 2004.
PASSOS, C. A. K. Novos modelos de Gestão e as Informações. In: LASTRES, M. H. M.;
ALBAGLI, S.(Org.). Informação e globalização na era do conhecimento. Rio de Janeiro:
Campus, 1999. p.58-84.
__________. Gestão empresarial inovadora como questão estratégica. In: Revista Parcerias
Estratégicas, n.8, 2000. p.128-155.
PNUD. Como colocar o comércio global a serviço da população. Brasília: IPEA : ENAP :
PNUD. 2003.
POZZO, R. Immanuel Kant on Intelectual Property. In: Trans/Form/Ação, v.29, nº2. São
Paulo, 2006. p. 11-18.
RODRÍGUEZ, A.; DAHLMAN, C.; SALMI, J. Knowledge and Innovation for
competitiveness in Brazil. THE WORLD BANK, 2008.
SCHOLTE, J. A. Global trade and finance. In: BAYLIS, J.; SMITH, S. Globalization of
World Politics. An introduction to international relations. 3. ed. Oxford: Oxford University
Press, 2001. p.600-615
SCHOLZE, S.; CHAMAS, C. Instituições públicas de pesquisa e o setor empresarial: o papel
da inovação e da propriedade intelectual. In: Revista Parcerias Estratégicas, n.8, 2000. p.8592.
SCHUMPETER, J. A. Processo de destruição criativa. In: ______ Capitalismo, Socialismo e
Democracia. Rio de Janeiro: Zahar, 1984. p.110 – 116
SCHUMPETER, J. A. Teoria do desenvolvimento econômico. 1982.
SHERWOOD, R. Propriedade Intelectual e Desenvolvimento. Tradução Heloísa de arruda
Villela. São Paulo: editora USP, 1992.
SPOSATI, Aldaíza. Globalização: um novo mundo e velho processo. In: DOWBOR, L.;
IANNI, O.; RESENDE, Paulo –EdgarA (Org.). Desafios da Globalização. 5.ed. Petrópolis:
Vozes, 1997. p.43-49.
STOPFORD, J.; STRANGE, S.; HENLEY, J. S. Rival States, Rival Firms. Competition for
world market shares. Cambridge: Cambridge University Press, 1991.
TANIS, Daniel ; CRUZ, Hélio Nogueira da . Modelo Evolucionário para Tempo de Duração
de Patentes e Inovação. In: Revista de Administração e Inovação, v. 5, 2008. p. 67-86.
THORSTENSEN, V. OMC – Organização mundial do Comércio: as regras do comércio
internacional e a nova rodada de negociações multilaterais. 2.ed. São Paulo: Aduaneiras, 2001
Cecília Megali Ogata
124
VALÈRY, N. The Economist Technology Quarterly. In: The Economist, 2001. p. 311 -.
Disponível em: http://www.economist.com/surveys/displaystory.cfm?story_id=E1_TRGGND
acessado 25 novembro 2009 às 17h.
VIGEVANI, T. Globalização e política: ampliação ou crise da democracia?. In: Ladislau
Dowbor; Octávio Ianni; Paulo-Edgar Resende. (Org.). Desafios da globalização. Petrópolis:
Vozes, 1998. p. 285-296.
Bibliografia Consultada:
ALBUQUERQUE, E. da Motta e. Patentes segundo a abordagem neo-shumpeteriana: uma
abordagem introdutória. In: Revista de Economia Política. V.18 nº 4(72), 1998. p. 65-82.
ATAÍDE, M.E. M. O lado perverso da globalização na sociedade da informação. In:Ciência
da
Informação. vol.
26 no.
3. Brasilia Sept./Dec. 1997.
Disponível
em:
http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0100-19651997000300006&script=sci_arttext acessado
em 15 junho 2009 às 9h
BAYLIS, J.; SMITH, S. Globalization of World Politics. An introduction to international
relations. 3. ed. Oxford: Oxford University Press, 2001.
BARBOSA, D. B. A Propriedade Intelectual e a teoria de Marketing Failure. 2002
Disponível
em:
http://www.google.com.br/url?sa=t&source=web&ct=res&cd=1&ved=0CBoQFjAA&url=htt
p://denisbarbosa.addr.com/32.doc&rct=j&q="Propriedade+Intelectual+e+a+teoria"&ei=7yPK
S5PFIs-nuAfhpeWGBQ&usg=AFQjCNF1fppomQTN3XripOLUvdBdQeVi-w acessado em 7
abril 2009.
BARTON, J. H. et al. The evolution of the trade regime. Princeton: Princeton University
Press. 2006. p.139-143.
CHEREM, M.T.C. S.; SENA JR., R. DI. Comércio Internacional e desenvolvimento: uma
perspectiva brasileira. São Paulo: Saraiva, 2004.
DOWBOR, L.; IANNI, O.; RESENDE, Paulo –EdgarA (Org.). Desafios da Globalização.
5.ed. Petrópolis: Vozes, 1997.
GRIFFITHS, M. 50 Grandes estrategistas das Relações Internacionais. Tradução Vânia de
Castro. São Paulo: Contexto, 2004.
KARAN, F. H..Conhecimentos tradicionais, propriedade intelectual e política externa
brasileira. 2008. 197 f. Dissertação (Mestrado em Relações Internacionais) - Instituto de
Filosofia e Ciências Humanas. UNICAMP. 2008.
KEOHANE, R.; NYE, J. Power and Interdependence. 3td ed. Ed:Harper-Collins Publishers,
2000.
LASTRES, M. H. M.; ALBAGLI, S.(Org.). Informação e globalização na era do
conhecimento. Rio de Janeiro: Campus, 1999.
Patentes: o regime internacional...
125
PEREIRA, L. V. Sistema de propriedade Intelectual no Contexto Internacional. In:
SCHUWARTZMAN, S. (coord.). Ciência e Tecnologia no Brasil: Política industrial,
mercado de trabalho e instituições de apoio. Rio de Janeiro: FGV, 1995. p.82-113.
RODRIK, D. One economics. Many Recipes. Princeton: Princeton University Press. 2007.
p.99-152.
ROMERO, J. In: Diário do Senado Federal, dia 12/11/2003. Disponível em:
http://www.senado.gov.br/sf/publicacoes/diarios/pdf/sf/2003/11/11112003/36196.pdf
acessado em 15 junho 2009.
RORTRUP-NIELSEN, J. R. O estabelecimento de prioridades num novo contexto sócioeconômico, a visão de um industrialista. In: Revista Parcerias Estratégicas, n.8, 2000.
p.301-311.
ROSENBERG, B. Propriedade Intelectual In: THORSTENSEN, V.; JANK, M. S. (coord.) O
Brasil e os grandes temas do comércio internacional. São Paulo: Lex; Aduaneiras, 2005.
p.273-297.
SIQUEIRA, P. C. As empresas de pesquisa sob contrato: um exemplo de integração
pesquisa-indústria. In: Revista Parcerias Estratégicas, n.8, 2000. p.54-83.
STRANGE, Susan. Mad Money. Michigan: The University Michigan Press. 1998. p. 1-42 e
179-191.
Sites consultados:
www.inpi.gov.br
www.wipo.int
www.historiadomundo.com.br
http://br.geocities.com
http://www.cipi-qf.org.br
http://www.notapositiva.com/dicionario_economia
http://history.berkeley.edu/faculty/Hesse/
http://www.artigosbrasil.net
http://www.brasilescola.com
http://www.ufmg.br/prpq/LegPICT&IT.html
http://www.deolhonaspatentes.org.br
http://www.inovacaotecnologica.com.br
http://pt.shvoong.com/
http://www.epo.org/
http://www.estadao.com.br/arquivo/economia
http://www.knoow.net
http://portalgeo.rio.rj.gov.br
http://www.eumed.net/tesis
http://www2.desenvolvimento.gov.br
http://www.cptech.org
www.ulvac.com
www.consciencia.org
http://anagramballoons.com/
Monografias IGEPRI é um produto do Instituto de Gestão Pública
e Relações Internacionais da Univerisidade Estadual Paulista “Júlio
de Mesquita Filho”. Nosso trabalho tem por objetivo promover e difundir ideias e práticas transparentes de Gestão Pública nos âmbitos
das Relações Internacionais. Os trabalhos aqui presentes são de autoria exclusiva de seus idealizadores e possuem o intuito de enriquecer
cada vez mais o conhecimento nessas áreas.
Download