Reflexões sobre planejamento urbano, lazer e turismo como

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Reflexões sobre planejamento urbano, lazer e turismo como
instrumentos para a qualidade de vida
Profa. Dra. Rita Giraldi1
Prof. Dr. Edson Leite2
Resumo: Este trabalho analisa a atividade de planejamento entendida como um
processo sistemático e flexível, através de uma abordagem teórica e panorâmica, que
qualifica temáticas relacionadas às abordagens do turismo, lazer e tempo livre. O
presente estudo parte dos níveis de planejamento, passa pelo processo de planejamento,
operacionalização, elaboração do plano de atividades, controle e aferição permanente de
resultados para então analisar a importância do planejamento urbano em sua relação
com as atividades de lazer e turismo levando em conta os aspectos econômicos e
sociais, territoriais e espaciais além dos institucionais e políticos para que o mesmo atue
como um instrumento visando à obtenção de uma melhor qualidade de vida calcada na
valorização das atividades possibilitadas pelo tempo livre em sociedade.
Palavras-chave: Processo de Planejamento; Planejamento Urbano; Serviços Turísticos;
Qualidade de Vida.
A arquitetura e o urbanismo, que são os meios pelos quais os homens
fornecem à própria vida sua moldura útil, exprimem, exatamente,
os valores materiais e morais de uma sociedade.
Le Corbusier (1971:46)
1
Graduada em arquitetura, mestre e doutora em Ciências da Comunicação pela Escola de Comunicações
e Artes da Universidade de São Paulo, professora do Curso de Lazer e Turismo da Escola de Artes,
Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo, atua principalmente nas questões referentes ao
planejamento urbano, lazer e equipamentos de lazer. E-mail: [email protected]
2
Graduado em Direito – PUC-SP, mestre em Comunicação Social pela UMESP, doutor em Ciências da
Comunicação pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo e livre-docente pela
Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo. Professor no Curso de Lazer e
Turismo na EACH-USP e no Programa de Pós Graduação Interunidades em Estética e História da Arte –
USP. E-mail: [email protected]
INTRODUÇÃO
Quando se aborda a questão do planejamento urbano deve-se ter em mente que
duas variáveis são elementos constantes de análise: os fatos urbanos – expressos pela
sua dimensão física e construída – e a dimensão social e política. Estas duas variáveis
são tradicionalmente abordadas na dialética existente entre urbis x civitas.
Modernamente, ao englobar a cidade em um raio mais amplo de realidade,
outras dimensões ou aspectos se inter-relacionam, complicando cada vez mais o prisma
de análise que passa a incluir higiene, plástica, economia etc.
O homem está submetido a duas coordenadas: tempo e espaço. É nelas que flui a
vida individual e social (BACAL, 2003). Estas coordenadas de tempo e espaço possuem
aspectos particulares, principalmente se as analisarmos com relação às atividades
exercidas pelo homem e para as quais elas servem como cenário.
No que se refere ao tempo, podemos afirmar que sua importância na vida
humana decorre de que “a temporalidade se instaura como essencial condição da vida
humana. Somos ‘temporais’ no sentido que nossa existência se constrói no tempo e nele
decorre” (BACAL, 2003:15) Contudo, quando se considera o tempo em si ele é algo
misterioso e diversas são as perspectivas de estudo que têm tentado compreender sua
essência.
Quanto ao termo espaço, ele veicula uma ambigüidade de significados que
historicamente tem categorização anterior à do tempo. Filosoficamente, o espaço é algo
abstrato, que ocorre na esfera do ideal (ideia), só se tornando concreto quando lhe são
colocados parâmetros Dependendo do enfoque dado por cada área de estudo, o espaço
foi adjetivado como espaço geográfico, físico, econômico, político etc.
Seguindo o princípio de adjetivação, temos o espaço urbano traduzido como
cidade. No entanto, segundo Mumford (1982:9), “não há definição que se aplique
sozinha a todas as suas manifestações, nem descrição isolada que cubra todas as suas
transformações”. Neste sentido, quando analisamos o espaço urbano e as atividades de
turismo e lazer temos que ter consciência de que o planejamento é instrumento de suma
importância uma vez que segundo Rodrigues (1988: 64-5):
(...) o ávido consumo dos produtos do turismo e do lazer relaciona-se
diretamente ao número de habitantes residentes em centros urbanos, não só
porque constituem um volume maior, mas também, sobretudo, pela ideologia
do hedonismo consumista, que é largamente difundida pela mídia, tornando-se
uma das características das sociedades pós-industriais.
Assim, torna-se necessária a compreensão do fenômeno do lazer e dentre deste,
o turismo e as possíveis relações que se pode estabelecer com o planejamento urbano,
tendo em vista que uma das variáveis primordiais para a vida humana é o espaço
arranjado e organizado para a prática de suas atividades.
LAZER E TURISMO
Quando um grupo humano percebe a possibilidade de usos alternativos do tempo
suas magnitudes e conteúdos formam um bem social, regulável nas sociedades
competitivas, como qualquer outro bem ou valor e a organização dos conteúdos do
tempo remete a padrões sociais de alocações do tempo. Tal momento reflete o estágio
de desenvolvimento de uma sociedade e sua escala de valores vigentes e a importância
do lazer e do turismo para uma dada comunidade. Entretanto, não basta que uma parcela
da população valorize os conteúdos de seus tempos livres, torna-se necessário que a
avaliação objetiva da importância do lazer e do turismo seja imprescindível aos
governos, aos planificadores e aos empresários que desejem conhecer todas as
implicações de suas atividades neste universo em particular e, deste modo, uma série de
mitos sobre o fenômeno pode ser desfeita e abrir o caminho para um novo exame de seu
verdadeiro potencial de propulsor de desenvolvimento.
A prestação dos serviços turísticos e de lazer é intangível. O profissional
envolvido na atividade deve proporcionar ao cliente a oportunidade de viver uma
experiência, um serviço percebido como algo gratificante, benéfico ou satisfatório. Tal
prestação de serviços envolve não apenas a criação de atividades, programas ou
facilidades - experiência turística -, mas também o planejamento de espaços adequados
e a venda dos produtos turísticos (TRIGO, 2000).
Inegavelmente, a questão do uso do tempo livre sempre se fez presente nas
diversas sociedades e a relevância deste em relação aos outros tempos baseia-se,
principalmente, nas conotações de satisfação pessoal que as atividades executadas
proporcionam a seus praticantes. No entanto, a falta de investigação empírica e teórica
no próprio segmento do turismo e do lazer se explica pela falta de reconhecimento de
que ele representa um importante fator de mudanças comportamentais, sociais e
culturais, assim como um elemento econômico com efeitos significativos.
Para que a atividade turística e de lazer traga, para toda a sociedade, resultados
positivos e o mínimo de custos é preciso que exista um bom planejamento para seu
crescimento não só no que tange as atividades em si, mas principalmente no que se
refere aos espaços destinados a tais atividades. Porém, tal ação só é possível mediante
pesquisas e estudos feitos por especialistas que darão as linhas mestras que possibilitem
concomitantemente o crescimento econômico e o desenvolvimento social.
A palavra lazer remete a um universo complexo de significações onde se
mesclam interpretações da moral, da religião, da filosofia e do senso comum. O termo
lazer é banhado em um sistema de pensamentos que faz dele condição da “felicidade” e
da “liberdade” humana. Apesar das diversas clarificações a palavra lazer continua
impregnada de um pesado coeficiente subjetivo e de fronteiras imprecisas na separação
entre a sua representação ideológica e a apreensão científica dos fenômenos abarcados
(LANFANT: 1972).
Em sua origem etimológica, a palavra lazer vem de longe, mas com um
significado não muito claro. Ela aparece na língua francesa no século XIII com o
vocábulo loisir que tem sua raiz no latim licere, que contém em sua essência a idéia de
permissão. Isso faz com que o sentido subjacente que exprime a idéia de lazer tenda
para um significado de ausência ou afrouxamento de diferentes formas de restrições ou
de dependência: ausência de regras, de obrigações, de repressões ou de censuras. Deste
modo, na linguagem de senso comum, as expressões derivadas do senso etimológico
aproximam-se de “ter ou tomar o tempo de fazer”, às quais se juntam “ter tempo de
fazer qualquer coisa de que se goste”. Com esse sentido, o lazer evoca a ausência de
constrangimentos temporais que indiquem uma qualidade subjetiva da ação.
Os dois sentidos - objetivo e subjetivo - do lazer são freqüentemente tomados
um pelo outro e essa ambigüidade do vocábulo é uma constante fonte de confusão,
inclusive com outros termos que designam atividades executadas no tempo livre
individual, como a recreação, por exemplo. Segundo Dumazedier (1976), o lazer
aparece como parte da vida social e individual, em que a caracterização e as
modalidades de expressão são principalmente definidas e determinadas por variáveis
culturais e psicológicas. Contudo, existem variáveis estruturais que condicionam certas
formas de expressão de lazer, mas que não são consideradas como determinantes ou
explicativas, são casos em que acontecem rupturas entre o “tempo imposto” pelas
obrigações produtivas e sociais e o “tempo livre” para a satisfação íntima dos interesses
pessoais.
O turismo, por sua vez, tem sido objeto de amplos estudos no que se refere às
dimensões econômicas, sociais e até mesmo espaciais (MATHIESON; WALL, 1990).
Acreditamos que isso se deva, principalmente, aos impactos que o turismo desencadeia
nos núcleos receptores da atividade. No entanto, seja para as atividades de lazer ou
turísticas é premente um planejamento adequado que possibilite ganhos para todos os
sujeitos envolvidos no processo.
PROCESSO DE PLANEJAMENTO
Para melhor compreender o planejamento urbano é necessário em primeiro lugar
compreender o que é o processo de planejamento. Desde as sociedades primitivas o
planejamento fazia parte da realidade como necessidade de sobrevivência e evoluiu
enormemente a partir da Revolução Industrial.
O planejamento é, na realidade, um recurso metodológico que o homem, através
da abstração, ordena, dirige e impulsiona aos fenômenos que deseja visando atingir
metas propostas de forma racional. Os conceitos de planejamento passam por diferentes
abordagens inter-relacionando variáveis que denotam focos diferenciados.
O significado de planejamento perpassa pela identificação de uma série de
variáveis, objetivando escolher um curso de ação que, com base em análises científicas,
permita alcançar os objetivos e metas que foram estabelecidas anteriormente, prevendo
o curso dos acontecimentos. Trata-se de um processo contínuo de tomada de decisões
coerentes com os objetos que foram propostos. É um processo sistemático e flexível
cuja finalidade consiste em atingir os objetivos que sem esta ação dificilmente seriam
alcançados.
A conceituação de planejamento agrupa, ainda, as idéias de um sistema de idéias
organizado racionalmente para determinar mentalmente o que fazer na realidade depois
de examinadas as circunstâncias concorrentes. É um processo de determinação de
objetivos e de meios para a consecução dos mesmos, um modelo normativo de teorias
operacionais. Trata-se de um mecanismo orientado para o futuro, um projeto de um
futuro desejado e dos meios efetivos para torná-lo realidade. Enfim, é um processo
contínuo de pensamento sobre o futuro de determinação de estados desejados e dos
cursos de ação para que esses estados sejam alcançados.
Todas as definições de planejamento deixam evidentes duas idéias: a de
complexidade (sistema, processo, mecanismo) e a de ação voltada para o futuro
constituindo uma intervenção deliberada, com base no conhecimento racional do
processo sócio-econômico e de suas leis. O planejamento turístico é um segmento
específico desse processo geral (MOLINA, 1997; BISSOLI, 2000). É inegável,
entretanto, que o turismo – como prática do tecido urbano – possui como fator
interveniente o próprio planejamento da urbe.
PLANEJAMENTO URBANO
O planejamento urbano fornece a base para alcançar o desenvolvimento das
atividades existentes no urbano e seus respectivos espaços de modo integrado. Ao
planejar o urbano é necessário que se tenha em consideração os diversos componentes
do desenvolvimento do núcleo dentro da estrutura da região e do meio ambiente natural,
construído e sócio-econômico local.
A importância e a necessidade do planejamento urbano recaem na necessidade
de impedir a desorientação e o erro cometido pela ignorância ou falta de previsão. O
planejamento está em função de realidades específicas e de ações interdisciplinares
conjuntas que integram esforços de arquitetos, urbanistas, sociólogos, economistas etc.
O planejamento urbano é orientado, especialmente, pelos seguintes princípios
(FERRARI,1982):
• da inerência: que define que o planejamento é indispensável;
• da universalidade: que tenta prever as variáveis e todas as conseqüências –
até onde seja possível –, levando em conta todas as opiniões;
• da unidade: que abrange facetas que devem ser integradas num conjunto
coerente;
• da previsão: que determina que o planejamento é intrinsecamente previsão;
• da participação: que requer a participação de todos os níveis e setores da
administração.
Ao conceituar o planejamento enquanto atividade deve-se ressaltar o seu caráter
permanente, uma vez que esta atividade se volta ao acompanhamento da evolução de
determinada realidade dinâmica, característica que enfatiza o produto da atividade
planejadora enquanto seqüência de decisões baseadas em séries de proposições, de
forma continuada e permanentemente revista.
Deve-se diferenciar planejamento de plano uma vez que o plano é elemento
pronto e acabado a ser exposto sobre a realidade visando à sua transformação, enquanto
que o planejamento é um processo de trabalho permanente. No processo de
planejamento, os planos são a expressão localizada, temporal e espacial de um conjunto
de medidas, visando à evolução da realidade, devendo ser objeto de permanente
atualização.
NÍVEIS DO PLANEJAMENTO
O planejamento pode ser entendido como possivelmente inerente a qualquer
âmbito da atividade humana, desde a organização da vida pessoal do indivíduo até a
elaboração de estratégias para a resolução de quaisquer problemas em âmbito mundial,
como a produção de alimentos, o combate às moléstias, o controle da explosão
demográfica etc. Assim, o planejamento pode ser traduzido através de diversos níveis,
em correspondência ao âmbito do problema que se objetiva resolver.
O âmbito do planejamento se refere a toda uma gama de interesses que
envolvem a comunidade, abrangendo os problemas de desenvolvimento econômico, os
relacionados ao bem-estar social e aqueles relativos à organização do espaço.
A partir do parâmetro físico para o estabelecimento do âmbito do planejamento,
são estabelecidos os níveis do planejamento. Como exemplo de nível de planejamento
pode-se considerar um parâmetro com âmbito nacional, em que o primeiro nível pode
ser o global ou nacional.
A
partir
desse
primeiro
nível,
podem
ser
estabelecidos
sucessivos
desdobramentos, correspondendo aos diversos conglomerados específicos que
participam do espaço e da comunidade nacional. A estes desdobramentos podem
corresponder, sucessivamente, os níveis macro-regional, regional, estadual, microregional e local (LE CORBUSIER, 1971). Portanto, níveis são processos de ordenação
de meios, visando à melhoria das condições no âmbito de cada uma das especificações
espaciais citadas ou processos de sistematização de atividades, estruturados de acordo
com os interesses específicos de uma determinada localidade e tendo em vista a
melhoria de vida de sua população.
A multisetorialidade do planejamento decorre da organização dos meios para
atingir determinados fins. Dessa maneira, a atividade planejadora entendida no seu
conjunto deve levar em conta os aspectos econômicos e sociais, os aspectos territoriais e
espaciais e também os institucionais e políticos.
Somente a partir de uma ordenação integrada de todos estes aspectos setoriais
será possível obter o efeito da atividade planejadora, no sentido de contribuir para a
melhoria progressiva da realidade existente.
O planejamento é, portanto, uma atividade multisetorial a ser desenvolvida em
diferentes níveis de amplitude com o objetivo de atender integradamente à melhoria da
realidade global (PERLOFF, 1973).
As escalas de planejamento são constituídas pelas áreas de abrangência que o
planejamento “pontual” pode exercer, levando em consideração os dados espaciais e
temporais disponíveis. Pode-se trabalhar, sob esta perspectiva, com diversas escalas
uma vez que cada uma delas corresponderá a um nível de intencionalidade.
PROCESSO DE PLANEJAMENTO
O processo de planejamento engloba a motivação, que leva à elaboração do plano, sua
implementação, implantação e controle – que permite analisar as necessidades de
revisão e as possibilidades de continuidade do planejamento. Esse processo pode ser
representado graficamente da seguinte maneira:
Motivação
Elaboração do plano
Implantação
Implementação
(continuidade)
controle
(REVISÃO)
OPERACIONALIZAÇÃO DO PLANEJAMENTO
A operacionalização do planejamento se dá através dos mecanismos
institucionais existentes, por intermédio dos quais são tomadas decisões que influem no
processo de desenvolvimento do planejamento. Assim, a participação de cada uma das
entidades atuantes se efetiva através de canais institucionais aos quais elas se
relacionam ou mesmo, de forma autônoma, por iniciativa própria. Isso resulta em uma
somatória de esforços, nem sempre coordenados e coerentes entre si (TYLER;
GUERRIER, 2001).
Para evitar a ausência de planejamento há a necessidade de se instituir um
processo, objetivando orientar a coordenação dos organismos que atuem no local,
visando compatibilizar suas ações em função de objetivos comuns fixados com vistas ao
melhor desempenho das estruturas de organização da comunidade. Dentro desta visão,
cabe verificar qual, ou quais, dos mecanismos institucionais existentes têm melhor
capacidade de assumir essa coordenação do processo do planejamento.
São exemplos de entidades participantes da atuação do planejamento em nível
local:
a) instituições governamentais locais: prefeitura, câmara municipal, empresas
de serviços públicos locais, instituições escolares, de saúde etc.;
b) instituições de natureza comunitária local: associações de bairros,
comunidades paroquiais, agremiações recreativas, sociais, esportivas,
profissionais ou políticas etc.;
c) instituições empresariais, de produção ou de prestação de serviços, com
interesse ou orientação estritamente local;
d) organismos governamentais de nível regional ou estadual: órgãos judiciais,
coletoria estadual, casa da agricultura, entidades educacionais, de saúde, de
promoção social, órgãos descentralizados de empresas ou entidades
estaduais prestadoras de serviços públicos – a exemplo de serviços de água e
esgoto, rodoviário, de comunicações – etc.;
e) organismos governamentais de nível nacional: instituições militares,
organismos descentralizados da administração federal, agências de empresas
ou entidades federais prestadoras de serviços, entidades educacionais
federais etc.;
f)
organismos governamentais de interesse internacional: representações
diplomáticas etc.;
g) instituições de natureza comunitária não local: agremiações políticas,
associações de municípios etc.;
h) instituições empresariais de produção ou de prestação de serviços de
orientação extra-local regional, nacional ou mesmo multinacional, e/ou com
interesses estritamente locais.
Essa relação, não discriminatória, mostra a amplitude dos graus de interferência
na vida local na medida em que se multiplicam as entidades que, de uma forma ou de
outra, participam das atividades que se desenvolvem a nível local.
Para desencadear o processo de planejamento, com possibilidades de êxito, é
necessário ter em vista os diversos elementos ou fases desse processo incluindo a
consciência do problema a ser equacionado; a correta elaboração do plano e dos
conceitos básicos do planejamento; o preparo da implementação do plano e da
formulação dos respectivos instrumentos e o permanente controle e aferição dos
resultados decorrentes da ação planejadora (MOLINA, 1997).
Porém, é imprescindível que haja consciência da necessidade do planejamento
de forma a levar a administração do local a assumir essa tarefa, com seriedade e em
caráter permanente. Essa necessidade de planejamento pode ser sentida através de
pressões e obrigações de caráter institucional ou legal, como ocorre (no caso de haver)
para obtenção de quaisquer recursos por parte da administração do local, a
subordinação, à existência de um plano diretor ou de desenvolvimento.
A obrigatoriedade, nem sempre é fator decisivo na formação de uma consciência
frente à necessidade do planejamento, podendo dar origem à elaboração de planos de
caráter meramente formais. De forma mais decisiva que a simples imposição legal, a
necessidade de planejamento pode se evidenciar através de problemas efetivamente
existentes, criando pressões sobre a administração, no sentido de equacioná-los. Esta
necessidade se torna cada vez mais real na medida em que os problemas, principalmente
os urbanos, se agravam e passam a atingir diretamente a população.
A solução de problemas urbanos exige, cada vez mais, uma visão integrada de
seu conjunto, uma vez que soluções parciais não costumam atingir o cerne do problema
podendo, até mesmo, agravá-los.
Outro fator que deve ser levado em conta para o desencadeamento do
planejamento de um local é a motivação em relação à atividade planejadora, importante
tanto no que diz respeito aos administradores, como também à própria população local.
Pode surgir a partir da própria consciência dos problemas e, assim, tornar-se o impulso
inicial para o desencadeamento de uma mentalidade de planejamento.
FATORES PARA A ELABORAÇÃO DE UM PLANO
A partir da conscientização frente à necessidade e importância de instaurar um
processo de planejamento, a administração deve optar inicialmente pela forma que lhe
parecer mais adequada para a condução desse processo. Várias são as formas de
trabalho (WOILER; MATHIAS, 1996)
que podem ser adotadas para elaboração de um plano, no entanto, duas são
básicas: os recursos financeiros e os técnicos.
Quanto aos recursos financeiros, a administração poderá decidir sobre:
1) utilização de recursos humanos, financeiros e técnicos disponíveis na
administração local, acionando-os para a criação de um processo interno de
elaboração do plano e utilizando, eventualmente, a orientação técnica de
órgãos especializados. Para tanto, é necessária a existência de recursos
mínimos que garantam a efetivação e continuidade do trabalho de
planejamento;
2) utilização de recursos financeiros próprios e contratação dos serviços
profissionais de empresa especializada para a elaboração do plano ou para
orientação do pessoal administrativo local na elaboração do mesmo,
contando para tanto com a assistência técnica de órgãos oficiais;
3) obtenção de empréstimos para elaboração do plano, através de agências
oficiais de financiamento, entregando a elaboração à responsabilidade de
uma empresa especializada, sob a fiscalização do órgão financiador.
Quanto aos aspectos técnicos envolvidos na elaboração de um plano é
importante levar em consideração os seguintes fatores condicionantes:
1) recursos técnicos necessários em termos de material e pessoal;
2) possibilidade de efetivação de levantamentos preliminares sumários,
necessários à confecção de termos de referência, que especificam as
necessidades e objetivos mínimos que devem ser atendidos pelo plano;
3) criação de organização local para o planejamento, que permita a assimilação
dos trabalhos efetuados;
4) análise e escolha da forma mais apropriada para alocação dos recursos
necessários através de concorrências, convites ou outras formas, atentando
ao fato de que existem normas legais que regem esta matéria.
FASE DE IMPLANTAÇÃO
A fase de implantação no planejamento tem igual ou maior importância que a
elaboração do plano, pois é mediante a implantação que se transformam em realidade as
proposições podendo-se nesta fase, através de cuidadoso controle, aferir propostas
elaboradas e sugerir retificações para manter o processo de desenvolvimento no rumo
desejado. Três pontos merecem destaque nesta fase:
1) organização administrativa: de fundamental importância a implantação
efetiva das medidas propostas pelo planejamento na parte institucional,
inclusive a curto-prazo, para garantir uma base administrativa eficaz. Há
necessidade de um sistema de planejamento que atue em nível conceitual e
executivo, cuidando das questões de controle arquitetônico e urbanístico
(inclusive quanto à elaboração de projetos públicos), programação e controle
orçamentário e centralização de informações;
2) previsão financeira: necessária à adequação dos planos de ação às
possibilidades financeiras da administração local, devendo ser acionados os
controles de execução orçamentária, principalmente no que se refere aos
investimentos;
3) legislação: a garantia para a implantação das propostas de um plano é dada
pela existência de uma legislação que trace normas oficializando e
institucionalizando as diretrizes preconizadas no plano.
CONTROLE E AFERIÇÃO PERMANENTE DOS RESULTADOS
Um último aspecto do processo de planejamento a ser ressaltado é o controle e
aferição permanente dos resultados decorrentes da ação planejadora. De certa forma,
esta fase tem início simultaneamente à própria elaboração do plano, na medida em que
já se procura adequar as ações de intervenção na realidade às diretrizes que estão sendo
formuladas no plano e, num processo reflexo, levar às diretrizes do plano os resultados
de qualquer ação desenvolvida, visando adequar perfeitamente aquelas diretrizes à
realidade.
Ao implantar as proposições de um plano, através dos instrumentos estruturados
há necessidade de se estabelecer procedimentos que permitam aferir sistematicamente e
permanentemente os resultados efetivos que se obtêm a partir das ações realizadas. Os
mecanismos de controle devem permitir a constatação de desvios nas propostas ou nos
instrumentos utilizados de forma a possibilitar sua correção de maneira bastante
dinâmica. Trata-se, basicamente, de uma realimentação do processo de planejamento
(PETROCCHI, 2001). Procedimentos básicos desse controle são:
•
a verificação permanente dos fenômenos urbanos através do levantamento e
acompanhamento de indicadores da realidade;
•
a instituição de mecanismos de apuração e fiscalização dos resultados da
aplicação dos instrumentos legais;
•
a instituição de sistemas de informações, voltados ao planejamento,
programados para a sua permanente atualização;
•
a implantação, manutenção e atualização de sistemas cadastrais;
•
a criação de mecanismos de controle de atuação pública mediante aferição
permanente da implantação de programas e da realização orçamentária.
PLANEJAMENTO URBANO E QUALIDADE DE VIDA
Aspectos relativos à densidade demográfica, empregos e saúde pública são pauta
de grandes discussões que envolvem o espaço urbano e a qualidade de vida, bem como
a questão do lazer dos citadinos.
Quando se fala em citadinos ou megalopolitanos devemos levar em conta que,
sem sombra de dúvida, eles são os agentes do crescimento urbano, cujo processo é
irreversível. Por outro lado, as questões relativas a esse crescimento passam, também,
pelas possibilidades de maiores investimentos de infra-estrutura e tecnologia, além dos
processos migratórios. As grandes cidades ainda são reflexos de uma alta densidade
populacional que convive cotidianamente com diversos problemas, dentre os quais: o
uso do tempo livre que expressa o modus vivendi da sociedade atual e que certamente
refletirá sobre a futura (SANTINI, 1987).
Ao abrirmos cotidianamente o jornal nos deparamos com dezenas de dados
estatísticos que procuram delimitar uma paisagem da situação de vida do homem
contemporâneo, principalmente, no que diz respeito aos denominados países
subdesenvolvidos ou em desenvolvimento.
Já há duas décadas debatia-se sobre a inflação humana, apontando-se algumas
mega-metrópoles e discutindo-se que o padrão material de vida havia melhorado, apesar
de uma resistência para com a alteração dos padrões de comportamento que se
mantinham os mesmos frente ao planejamento familiar. No início desta década, o debate
continua o mesmo e a grande preocupação ainda é sobre as condições de vida do
homem contemporâneo. Para obter tal resposta, a busca se respalda na obtenção de
dados quantitativos para tentar medir a chamada qualidade de vida. Mas será possível
medir qualidade de vida através de índices relativos a renda, aquisição de bens, acesso a
informações etc.?
No que consiste, realmente, qualidade de vida?
Alllardt (1988) estabelece três níveis como parâmetros para definir a qualidade
de vida do ser humano: ter, amar e ser. Cada um desses patamares possui atributos
próprios que podem ser adquiridos simultaneamente ou não. Segundo Allardt, a esfera
do ter corresponde à aquisição de meios de sobrevivência e está situada no nível
objetivo da vida. As duas esferas seguintes – amar e ser – expressam um critério
subjetivo de análise, pois no amar está incluso o prestígio, o status e o reconhecimento;
no ser encontra-se a satisfação própria, fazer coisas interessantes e a auto-realização.
Nesta teoria podemos pressupor que o uso do tempo livre - preenchido com atividades
discricionárias3 - possa contribuir para mensurar as duas esferas subjetivas,
principalmente se no âmbito do planejamento urbano tais atividades forem
contempladas com espaços organizados e animados para sua concretude.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir do advento do capitalismo, os valores culturais permeados pelo apelo
consumista resumiram o homem a promotor e, ao mesmo tempo, expectador de sua
produtividade. Sua capacidade de produção e, conseqüentemente, sua capacidade de
consumo de bens materiais são parâmetros pessoais e sociais para a avaliação que o
situa entre o sucesso e o fracasso. Em decorrência do enorme progresso tecnológico,
especialmente das últimas décadas, que vem transformando as relações entre capital e
trabalho, o homem passa a ter horários específicos e pré-determinados de jornada
laboral e é dentro dessa ordem social, que passa a existir o tempo livre definido como o
tempo no qual o indivíduo não está diretamente atrelado a sua condição de agente de
produção, derivando daí uma questão crucial para o homem e a sociedade
contemporânea: o que fazer com esse tempo que “sobra” da atividade produtiva?
Treinados que fomos a nos qualificar - positiva ou negativamente - por valores
determinados externamente e com objetivos às vezes obscuros, mas que perseguimos
com obstinação cega, fica difícil atuarmos com habilidade numa esfera desconhecida,
despojada de obrigações e deveres formais que nos remetem à memórias infantis
carregadas de sutilezas como o prazer, a felicidade e a alegria. O ser humano
contemporâneo perdeu os elos da cadeia que o definem como tal em sua plenitude.
Observa-se grande inadequação para a vida fora do ambiente de trabalho. As
pessoas não sabem o que fazer com o tempo que excede à atividade produtiva e
precisam re-aprender o quê e como fazer coisas em seu tempo livre. Observa-se nos
momentos de lazer sentimentos de tédio, solidão, insatisfação, sensação de vazio e de
inutilidade.
3
O sentido adotado para atividades discricionárias é de que o indivíduo, em seu tempo livre, pode optar dentre as
várias atividades que lhe sejam possíveis exercer. Tal opção se baseia nos graus de liberdade que possuímos, que por
sua vez, possuem referencial com o contexto cultural em que estamos inseridos.
O ambiente sufocante e competitivo do trabalho acompanha o indivíduo em seu
tempo livre, uma vez que ele não equilibra o tempo dedicado para as atividades
produtivas com o das atividades prazerosas ou lúdicas que o mantém ligado às suas
necessidades de foro íntimo e necessidades intrínsecas, cuja satisfação é responsável em
última análise pela sobrevivência psíquica e, também, pela integridade física. Neste
contexto, o equilíbrio entre os diferentes e vários âmbitos de atuação do homem pleno
pode se traduzir em qualidade de vida. Segundo Amaury Souza (1972:53):
(...) a melhor qualidade de vida pertence à cidade que mais possibilite à sua
população acesso a maior número de modos alternativos de vida. A maneira
como a cidade impõe gastos diferenciais de tempo físico à sua população (...)
é, nesta perspectiva, a medida exata do grau em que ela se aproxima da Cidade
do Homem ou da bête noire do progresso industrial.
A opção pela avaliação do emprego e planejamento do espaço urbano como
referente de qualidade de vida em função de sua relação com o lazer e o turismo tem
respaldo, principalmente, por possibilitar a manifestação das idiossincrasias e ao mesmo
tempo, pela tendência à valorização das atividades possibilitadas no tempo livre em
sociedade.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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1988.
BACAL, Sarah S. Lazer e o universo dos possíveis. São Paulo: Aleph, 2003.
BISSOLI, M. Angela M. A. Planejamento turístico municipal com suporte em sistemas
de informação. São Paulo: Futura, 2000.
DUMAZEDIER, Joffre. Lazer e cultura popular. São Paulo: Perspectiva, 1976.
FERRARI, Célson. Curso de planejamento municipal integrado. 3 ed. São Paulo:
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LANFANT, Marie-Françoise. Les théories du loisir. Sociologie du loisir et ideológies.
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