ALTERNATIVA RÁPIDA E DE BAIXO CUSTO PARA A

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ALTERNATIVA RÁPIDA E DE BAIXO CUSTO PARA A ANÁLISE DE CHUMBINHO
PELA PERÍCIA CRIMINAL
Bruno Sabino
Perito Criminal
Químico Forense
O aldicarb trata-se de substância do grupo dos carbamatos, presente no produto comercial
Temik®, com finalidade inseticida e nematicida, sendo formulado pela impregnação de grânulos
de gesso com solução de aldicarb e um agente de liga, recebendo ainda uma camada de
cobertura. Tal formulação visa à redução da formação de poeira e conseqüente risco de
exposição por via cutânea. Assim, o produto apresenta-se na forma de grânulos de cor cinzaescuro. O aldicarb na forma de grânulos é amplamente encontrado no comércio irregular sob o
nome “chumbinho”, sendo indevidamente utilizado como raticida (1).
Figura 01: Estrutura química do Aldicarb
2-methy-2-(methyltio)propionaldehyde O-methylcarbamoyloxime (IUPAC)
Figura 2 – Flagrante do comércio ilícito do chumbinho nas ruas do Centro do Rio de Janeiro
Mensalmente, são recebidos no Serviço de Perícias de Química (ICCE-Rio de Janeiro) diversos
alimentos envolvidos em ocorrências relacionadas à ingestão proposital ou acidental de
“chumbinho” em casos envolvendo ingestão acidental, suicídio ou homicídio. Assim, incluindo
apenas resultados comprovadamente positivados pelas análises químicas, dão entrada no serviço
cerca de 80 casos por ano, incluindo apreensões do material na forma em que é comercializado
no comércio informal, de fácil identificação e presença em materiais que sugerissem seu uso para
ingestão humana ou animal. Pode-se afirmar que o aldicarb é o principal composto químico
responsável por óbitos (homicídios ou suicídios) provocados por intoxicação exógena.
O material (alimento) supostamente contaminado e recebido nestas condições apresenta
características diversas, podendo ser essencialmente líquido (café, leite, sopas, sucos e outras
bebidas) ou sólido (carne crua ou preparada, biscoitos recheados, confeitos etc).
FIGURA 3
Detectada a presença de grânulos, o procedimento usual é a separação dos grânulos e extração
por solvente orgânico ou, para líquidos, a extração líquido-líquido e em seguida, execução de
técnica de cromatografia em camada fina contra padrões do produto comercial (2). Temos
observado nas análises forenses realizadas rotineiramente em nosso ICCE-Rio de Janeiro que tal
técnica, apesar de efetiva em boa parte dos casos, levando à convicção da presença do aldicarb
no alimento, encontra algumas dificuldades, especialmente no que concerne a matrizes ricas em
proteínas e gorduras (leite e carne) de difícil recuperação da substância por simples extração.
Além disso, a técnica apresenta limitações inerentes à mesma em relação à sensibilidade do
método.
Outro agravante verificado é o estado de degradação de alguns materiais recebidos para perícia,
oriundos de todo o Estado do Rio de Janeiro, muitas vezes recebidos meses depois da ocorrência,
dificultando sobremaneira os procedimentos de extração e análise.
Outro fator que pode interferir na análise cromatográfica é a metabolização ou degradação do
composto. No metabolismo do aldicarb (no solo), após a dissolução da substância presente no
grão, esta é convertida por oxidação aos metabólitos (sulfóxido aldicarb e sulfona aldicarb), que
serão hidrolisados a oximas e nitrilas e posteriormente degradados a compostos mais simples. A
análise cromatográfica requer adicionalmente, a disponibilidade de padrões dos metabólitos de
aldicarb (1; 2).
O aldicarb, assim como seus dois metabólitos iniciais, outros carbamatos e os organofosforados é
um inibidor da enzima acetilcolinesterase, sendo este efeito o responsável pela intoxicação em
diversos níveis podendo causar o óbito. O aldicarb é considerado o mais potente carbamato do
mercado, sendo a dose letal (via oral) em ratos: DL50=1mg/kg (3), classificado como
extremamente tóxico pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anexo III, Portaria número
3 de 16/01/1992).
Atualmente, encontra-se disponível na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Laboratório de
Toxicologia Enzimática – Instituto de Biologia) uma metodologia de análise de água e alimentos
para verificação da contaminação no campo (agricultura), baseada na inibição de enzima
acetilcolinesterase obtida a partir de cérebro de rato, sendo que desta forma pode-se identificar e
quantificar (em equivalentes de metil paration) organofosforados e/ou carbamatos incluindo o
aldicarb (4,5). O laboratório de toxicologia enzimática produz, para utilização própria e para
comercialização um “kit” necessário à análise por espectrofotometria composto do preparado
enzimático, do substrato (acetiltiocolina) e de um reativo de cor (Ditionitrobenzeno). O “kit”
completo permite em média a realização de 80 reações e tem validade para 6 meses.
Considerando o levantamento estatístico realizado no serviço de Perícias de Química calcula-se
que 2 “kits” seriam necessários a cada semestre. O “kit” atualmente é fornecido pelo valor de
R$180,00, a um custo de cerca de R$2,25 por análise.
A metodologia permite a detecção dos compostos mencionados na forma residual, em níveis de
até 10ppb em equivalentes de metil paration, correspondente a cerca de 20% de inibição
enzimática atendendo as quantidades permitidas pela legislação (Portaria 518/2004 do Ministério
da Saúde). O método baseia-se na concentração da amostra com retenção em coluna de carvão e
extração por solventes, incubação e determinação por espectrofotometria da inibição causada a
uma preparação enzimática em presença do substrato e de um reagente de cor. O resultado revela
a presença de carbamatos e/ou organofosforados e uma curva padrão previamente construída
permite a sua quantificação (5).
De modo geral, casos analisados nos laboratórios forenses são considerados “envenenamentos”,
onde as concentrações do pesticida são elevadas. Além disso, muitas vezes a contaminação
ocorre em alimentos, de forma não homogênea. Assim, em uma adaptação às análises forenses,
usualmente é feita a extração do princípio ativo nas matrizes recebidas, seguida de diluição para
verificação da presença do inibidor enzimático (carbamato) nas mesmas. O método não inclui a
quantificação do produto “temik” ou do princípio ativo, mas sua constatação em altas
concentrações, resultando em elevada inibição enzimática , sendo o mesmo um método simples e
prático a ser implementado nas atividades de rotina deste ICCE-Rio de Janeiro. O método pode
ainda ser utilizado como uma investigação preliminar no caso onde amostras suspeitas não
apresentam características que indiquem a presença do produto “temik”, incluindo ou excluindo
uma contaminação por compostos organofosforados e/ou carbamatos.
No decorrer do ano de 2007, tendo ocorrido diversas situações reais onde grânulos
compatíveis com os do produto a base de aldicarb eram verificados ou mesmo onde o registro de
ocorrência relacionava casos de óbito à ingestão de alimento (intoxicação exógena) e não sendo
conclusiva a análise pelo método de cromatografia em camada fina, buscou-se um método
alternativo, confiável, específico para proceder tais análises, começando então um trabalho em
conjunto com o Laboratório de Toxicologia Enzimática do Instituto de Biologia da Universidade
do Estado do Rio de Janeiro, sob responsabilidade de Dr. Mauro Velho. O trabalho foi conduzido
nas dependências da UERJ, com materiais conduzidos pelos Peritos Criminais Bruno Duarte
Sabino e Hannah Felícia Rozenbaum do Serviço de Perícias de Química do Instituto de
Criminalística Carlos Eboli. Inicialmente foram feitas contaminações propositais em alimentos
diversos e determinação por via enzimática da presença do inibidor (carbamato), em seguida,
materiais e alimentos (casos reais) que tiveram a presença do aldicarb constatada pelo método
disponível no Serviço de Perícias de Química tiveram seus extratos analisados pelo método
enzimático, confirmando em todos os casos, a presença do inibidor. Subseqüentemente, materiais
onde não foi possível firmar convicção da presença de aldicarb por cromatografia em camada
fina, foram analisados, muitas vezes revelando a contaminação, constatando ser o método
enzimático de maior sensibilidade frente ao método cromatográfico disponível até então.
A pesquisa gerou um trabalho que foi publicado na renomada revista forense Journal of
Forensic Sciences sob o título: “Development
of a simple and low-cost enzymatic methodology for
quantitative analysis of carbamates in meat samples of forensic interest” (6).
Pelas reações verificadas, a
aplicação do método enzimático na análise forense é feita de forma pioneira no Brasil pelo
Estado do Rio de Janeiro.
O método pode ainda ser adaptado à realidade do Instituto Médico Legal, onde muitas
vezes ocorre a verificação de grânulos característicos no conteúdo estomacal e após extração e
análise dos mesmos, não se consegue concluir pela presença de aldicarb.
FIGURA 4
Além da elevada sensibilidade, e simples execução, o método demanda poucos requisitos
para que seja implementado nas dependências do Serviço de Perícias de Química do ICCE e o
presente projeto apresenta então as condições materiais para tal implementação.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. Ballesteros, E., M. Gallego, and M. Valcarcel, Automatic gas chromatographic determination
of N-methylcarbamates in milk with electron capture detection. Anal Chem, 1993. 65(13): p.
1773-8.
2. Juhler, R.K., Optimized method for the determination of organophosphorus pesticides in meat
and fatty matrices. J Chromatogr A, 1997. 786(1): p. 145-53.
3. Lima, K. and E. Spinelli, Análise por cromatografia em camada delgada do inseticida
carbamato Aldicarb em material post mortem. Revista Brasileira de Toxicologia, 1997. 10(1): p.
9-12.
4. Cunha Bastos, V.L.F., Cunha Bastos, J., Lima, J.S. and Castro Faria, M.V., Brain
acetylcholinesterase as an in vitro detector of organophodphorus
and carbamate
insecticides in water. Water Research,1991. 25(7): p. 835-40.
5. Lima, J.S., Cunha Bastos, J., Cunha Bastos, V.L.F. Cunha, J.C., Moraes, F.F.M., Ferreira,
M.F.A., Moreira, J.C. and Castro Faria, M.V. Methyl parathion activation by a partially purified
rat brain fraction. Toxicol Lett, 1996. 87(1): p. 53-60.
6.
Sabino, B. D., Torraca, T. G., et al. (2010). Development of a simple and low-cost enzymatic methodology for
quantitative analysis of carbamates in meat samples of forensic interest. J Forensic Sci, 55, 3, 808-12.
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