Curso de Campo - Sejam bem vindos!

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ECOLOGIA
NO
CERRADO
PROJETOS DE PESQUISA PRODUZIDOS
NO SÉTIMO CURSO "MÉTODOS DE
CAMPO EM ECOLOGIA" REALIZADO
NA RESERVA ECOLÓGICA DO IBGE NO
PERÍODO DE 1 A 15 DE MARÇO DE 1996
EDITADO POR
Raimundo P. B. Henriques,
Guarino R. Colli, e
John Du Vall Hay
UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA
DEPARTAMENTO DE ECOLOGIA
PÓS-GRADUAÇÃO EM ECOLOGIA
BRASÍLIA, DF
POLINIZADORESDelano M. S. da Silva;
Everton A. dos Santos; Rosane G. Colevatti.
CONTEÚDO
APRESENTAÇÃO iv
Raimundo P. B. Henriques
LISTA DE PROFESSORES
LISTA DE ALUNOS
14
v
v
PROJETOS EM GRUPO
DISTRIBUIÇÃO DIFERENCIAL DE
INSETOS GALHADORES E
MINADORES ENTRE HABITATS
Flávia S. Pinto; Guilherme H. B. de
Miranda; Saulo M. A. Andrade.
2
VISITAÇÃO DE FORMIGAS EM
NECTÁRIOS EXTRAFLORAIS DE
Qualea multiflora (VOCHISIACEAE) E
SEU POTENCIAL COMO AGENTE
ANTI-HERBIVORIA
Delano M. S. da Silva; Rosane G. Colevatti;
Everton A. dos Santos.
4
OCORRÊNCIA DE FORMIGAS EM
GALHAS DE Diospyros hispida D. C. NA
RESERVA ECOLÓGICA DO IBGE, DF
Carlos A. Bianchi; Felipe A. P. L. Costa;
Terezinha A. B. Dias.
6
ESTRATÉGIAS DE
FORRAGEAMENTO DE LAGARTOS
Flávia S. Pinto; Saulo M. A. Andrade;
Guilherme H. B. de Miranda
9
APOSEMATISMO: ADVERTÊNCIA
OU ATRAÇÃO?
Carlos A. Bianchi; Felipe A. P. L. Costa;
Terezinha A. B. Dias.
17
INFLUÊNCIA DO FOGO ANUAL NA
FLORÍSTICA E DENSIDADE DE
ESPÉCIES LENHOSAS DE
CERRADÃO
Delano M. S. da Silva; Everton A. dos
Santos; Rosane G. Colevatti.
19
EFEITO DO FOGO NA
ARQUITETURA DE ESPÉCIES
LENHOSAS DO CERRADO
Flávia S. Pinto; Guilherme H. B. de
Miranda; Saulo M. A. Andrade.
22
COMPARAÇÃO DE
CARACTERÍSTICAS DE FOLHAS DE
PLANTAS DE CERRADO E MATA DE
GALERIA
Carlos A. Bianchi; Felipe A. P. L Costa;
Terezinha A. B. Dias.
25
COMPARAÇÃO DO POTENCIAL DE
ÁGUA DE ESPÉCIES LENHOSAS DE
DIFERENTES GRUPOS FUNCIONAIS
Delano M. S. da Silva; Everton A. dos
Santos; Rosane G. Colevatti
27
DIVERSIDADE DE ORTHOPTERA
RELACIONADA À
HETEROGENEIDADE ESPACIAL
Carlos A. Bianchi; Felipe A. P. L. Costa;
Terezinha A. B. Dias.
11
COMPARAÇÃO DE MEDIDAS DE
TRANSPIRAÇÃO ENTRE PLANTAS
HEMIPARASITAS E SUAS
HOSPEDEIRAS
Flávia S. Pinto; Saulo M. A. Andrade;
Guilherme H. B. de Miranda.
29
ECOLOGIA FLORAL DE QUATRO
ESPÉCIES DO CERRADO:
FREQUÊNCIA DE VISITAS E
RELAÇÃO ENTRE
CARACTERÍSTICAS FOLIARES E
ii
HERBIVORIA EM ESPÉCIES
LENHOSAS DE MATA E DE
CERRADO
Delano M. S. da Silva; Everton A. dos
Santos; Rosane G. Colevatti.
31
DISTRIBUIÇÃO DE PLANTAS
PARASITAS SOBRE PLANTAS
HOSPEDEIRAS NA RESERVA
ECOLÓGICA DO IBGE (BRASÍLIA,
D.F)
Carlos A. Bianchi; Felipe A. P. L. Costa;
Terezinha A. B. Dias.
33
PROJETOS INDIVIDUAIS
PREDAÇÃO DE NINHOS ARTIFICIAIS
NO CERRADO: UMA COMPARAÇÃO
ENTRE DUAS FISIONOMIAS.
Carlos Abs Bianchi
44
DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL DE QUALEA
GRANDIFLORA MART. (VOCHYSIACEAE)
EM UM CERRADO DE BRASÍLIA, DF.
Delano Moody Simões da Silva
49
ESTRUTURA POPULACIONAL DE
Pseudobombax longifolium
(BOMBACACEA). DISTRIBUIÇÃO
ETÁRIA E TABELA DE VIDA
Delano M. S. da Silva; Everton A. dos
Santos; Rosane G. Colevatti.
35
ATIVIDADE FORRAGEIRA DE Atta
sexdens (LINNAEUS, 1758)
(HYMENOPTERA, FORMICIDAE):
RELAÇÃO COM TEMPERATURA E
UMIDADE RELATIVA DO AR
Everton Amancio dos Santos
55
TAXA DE OCORRÊNCIA DE
ESPÉCIES LENHOSAS COM
NECTÁRIOS EXTRAFLORAIS EM
CERRADO
Flávia S. Pinto; Guilherme H. B. de
Miranda;
Saulo
M.
A.
Andrade.
37
ESTRUTURA POPULACIONAL DE
UMA BORBOLETA “ESTALADEIRA”,
Hamadryas feronia (L.) (LEPIDOPTERA:
NYMPHALIDAE)
Felipe A. P. L. Costa
58
A COEXISTÊNCIA DE ESPÉCIES
CONGENÉRICAS E SEU NICHO
MORFOLÓGICO
Flávia S. Pinto; Guilherme H. B. de
Miranda; Saulo M. A. Andrade.
39
SIMILARIDADE FLORÍSTICA ENTRE
COMUNIDADES DE ESPÉCIES
HERBÁCEAS EM FITOFISIONOMIAS
EQUIVALENTES
Carlos A. Bianchi; Felipe A. P. L. Costa;
Terezinha A. B. Dias.
41
CONSIDERAÇÕES SOBRE A
DISPERSÃO SECUNDÁRIA DE
SEMENTES DE SOLANUM
LYCOCARPUM (SOLANACEAE) POR
FORMIGAS.
Flávia dos Santos Pinto
65
PADRÃO DE ATIVIDADE DO MICOESTRELA (CALLITHRIX
PENICILLATA) NO CERRADO DENSO
E CERRADÃO DA RESERVA
ECOLÓGICA DO IBGE, BRASÍLIA, DF
Guilherme H. B. de Miranda
71
ARQUITETURA E RIQUEZA DE
HERBÍVOROS EM Ouratea hexasperma
Baill. (OCHNACEAE), EM UM
CERRADO DA RESERVA
ECOLÓGICA DO IBGE, BRASÍLIA, DF
iii
Rosane G. Collevatti
75
EFEITOS DE DIFERENTES REGIMES
DE QUEIMA SOBRE A VEGETAÇÃO
LENHOSA DE CERRADO SENSU
STRICTO: TAXAS DIFERENCIAIS DE
REBROTAS
Saulo Marques de Abreu Andrade
82
iv
APRESENTAÇÃO
Nesta publicação são reunidas as contribuições de alunos e professores do sétimo curso
"Métodos de Campo em Ecologia", desenvolvido pelo curso de Pós-graduação em Ecologia do
Departamento de Ecologia da Universidade de Brasília, na Reserva Ecológica do IBGE (DF), de
1 a 15 de março de 1996.
Os trabalhos apresentados aqui são fruto de projetos diários orientados por professores,
além de projetos finais realizados pelos alunos individualmente. Estes trabalhos, tratam de
padrões e processos nas comunidades de Cerrado do Brasil Central. Alguns trabalhos são
baseados em dados observacionais, porém outros foram realizados através de experimentação.
O apoio financeiro ao curso foi proporcionado por Laercio Leonel Leite, Coordenador do
curso de Pós-Graduação em Ecologia da UnB. Queremos também agradecer a Maria Iracema
Gonzales, Diretora da Reserva Ecológica do IBGE, por sediar o curso na Reserva e Helena C.
Morais pela ajuda na revisão dos projetos finais. A todos os participantes do curso, alunos e
professores nossos sinceros agradecimentos, pela boa vontade e colaboração.
R. P. B. H.
G. R. C.
J. D. V. H.
v
LISTA DE PROFESSORES ORIENTADORES
Adriana G Moreira, Dr.
Reserva Ecológica do IBGE
Brasília, DF
Alexandre Fernandes Bamberg de Araújo, Dr
Departamento de Zoologia
Universidade de Brasília
Brasília, DF
Augusto César Franco, Ph.D.
Departamento de Botânica
Universidade de Brasília
Brasília, DF
Carlos Augusto Klink, Ph.D.
Departamento de Ecologia
Universidade de Brasília
Brasília, DF
Fábio Rúbio Scarano, Ph.D.
Departamento de Ecologia
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Rio de Janeiro, RJ
Mercedes Bustamante, Ph.D.
Departamento de Ecologia
Universidade de Brasília
Brasília, DF
Paulo S. Oliveira, Dr.
Departamento de Zoologia
Universidade de Campinas
Campinas, SP
Raimundo P. B. Henriques, Dr.
Departamento de Ecologia
Universidade de Brasília
Brasília, DF
Regina Macedo, Ph.D.
Departamento de Zoologia
Universidade de Brasília
Brasília, DF
Tarcisio S. Filgueiras, Dr.
Reserva Ecológica do IBGE
Brasília, DF
LISTA DE ALUNOS
Geraldo Wilson Fernandes, Ph.D.
Departamento de Biologia Geral
Universidade Federal de Minas Gerais
Belo Horizonte, MG
Guarino Rinaldi Colli, Ph.D.
Departamento de Zoologia
Universidade de Brasília
Brasília, DF
Heloisa Sinatora Miranda, Ph.D.
Departamento de Ecologia
Universidade de Brasília
Brasília, DF
Jader Soares Marinho, Dr
Departamento de Zoologia
Universidade de Brasília
Brasília, DF
Alunos do Curso de Mestrado
Carlos Abs Bianchi
Delano Moody Simões da Silva
Everton Amancio dos Santos
Flávia dos Santos Pinto
Guilherme H. B. de Miranda
Saulo Marques de Abreu Andrade
Terezinha Aparecida B. Dias
Alunos do Curso de Doutorado
Rosane Garcia Colevatti Pereira
Felipe A. P. L. Costa
John DuVall Hay, Ph.D.
Departamento de Ecologia
Universidade de Brasília
Brasília, DF
Mauro C. L. de Brito Ribeiro, Dr.
Reserva Ecológica do IBGE
Brasília, DF
vi
PROJETOS
DE
UM DIA
1
DISTRIBUIÇÃO DIFERENCIAL DE INSETOS
GALHADORES E MINADORES ENTRE
HABITATS1
Flávia S. Pinto; Guilherme H. B. de Miranda; Saulo
M. A. Andrade.
INTRODUÇÃO
Galhas são estruturas onde as larvas de
insetos se desenvolvem. Nestas estruturas, seja na
folha ou no caule, ocorre uma hiperplasia seguida de
uma hipertrofia originando um tipo de câncer que é
prejudicial ao crescimento e à reprodução da planta,
uma vez que os nutrientes são drenados para a galha.
Insetos minadores são indivíduos que similarmente
aos galhadores depositam sua larva na folha e esta
come o tecido paliçado da folha, formando assim
"trilhas" ou "túneis" na lâmina foliar.
As hipóteses que tentam explicar as
adaptações ecológicas das galhas são (1) que estas
seriam um dreno das substâncias das quais as larvas
se alimentam, (2) que estas formariam um microambiente para a larva, protegendo-a de alterações
abruptas do ambiente e, (3) também seriam uma
proteção contra inimigos como parasitóides,
predadores e patógenos.
Sabe-se que há uma distribuição diferencial
das galhas em ambientes xéricos (limitação
hidronutricional) e mésicos, uma vez que o inseto
galhador escolhe o melhor habitat para a exposição.
Dessa forma, propôs-se verificar se a limitação
hídrica e nutricional é importante na distribuição de
galhas de insetos em habitats diferindo na qualidade
hídrico-nutricional.
MATERIAL E MÉTODOS
Em uma área de cerrado da Reserva
Ecológica do IBGE, tomado aqui como o ambiente
xérico, foram feitas 3 coletas de 20 minutos,
coletando-se todas as galhas e minadores encontrados
(totalizando 9 coletas, considerando cada espécie de
planta uma galha). O mesmo foi feito para a mata de
galeria, tomada aqui como ambiente mésico. Todas
as espécies de galhas e minas foram contadas e
separadas por habitat.
significativa para galhas (p=0,009), mas não foi para
minas (p=0,352). Estes resultados indicam que
insetos galhadores usam preferencialmente ambientes
xéricos, provavelmente porque o parasitismo,
predação e a ação de patógenos são bem menores do
que no mésico. E que apesar da limitação hídrica e
nutricional ser bem acentuada no cerrado, o
"dreno"que se forma na galha, supre a larva
plenamente (G. W. Fernandes, com. pess.)
Sugere-se também que a concentração de
tanino, maior em espécies de ambiente xéricos,
possibilite uma maior sobrevivência, uma vez que os
patógenos são suscetíveis ao tanino, bem como a
ambientes secos, já que a ação de patógenos, como
fungos, é potencializada em ambientes úmidos.
Um dado importante a ser levantado é que,
mesmo com um maior número de espécies por metro
quadrado , a mata possui menos galhadores,
sugerindo que a ação de insetos galhadores
independe da riqueza da flora, ou então que a pressão
seletiva sobre grande parte das galhas presentes na
mata fez com que apenas uma pequena parte
resistisse à ação de parasitas, predadores e patógenos
e, que insetos que no passado colocaram suas larvas
em espécies de mata, hoje usam espécies do cerrado.
Pode-se interpretar esta distribuição
diferencial como resultante da maior sobrevivência e
menor mortalidade das galhas em ambientes xéricos
do em em mésicos. Por outro lado, a diferença não
significativa encontrada para o número de minadores
entre cerrado e mata pode ser interpretada supondose que as larvas dos minadores não ficam
estabelecidas em galhas mas, sim, percorrem a falha
para alimentar-se. Esperaria-se então que estas
buscassem um padrão mais estável, com menos ou
nenhuma limitação seja hídrica, térmica ou
nutricional.
Dessa forma, esperaria-se encontrar um
maior número de minas na mata do que no cerrado,
porém este padrão não foi observado, o que seria de
se supor que talvez a pressão seletiva por
parasitismo, predação ou ação de patógenos, bem
como por estresse hídrico, não seja importante na
taxa
de
sobrevivência
e
mortalidade
e
consequentemente não há uma distribuição
diferencial.
RESULTADOS E DISCUSÃO
A Tabela 1 mostra que o número de galhas
foi maior no cerrado do que na mata. Enquanto que
não foi observada diferença nos minadores (Tab. 1,
Figura1). Utilizou-se o teste do Wilcoxon para
comparar a mata e o cerrado: a diferença foi
1Prof. Orientador: Geraldo W. Fernandes
2
NÚMERO MÉDIO DE ESPÉCIES
20
CERRADO
MATA DE GALERIA
15
10
5
0
GALHAS
MINAS
Figura 1. Número médio de espécies de galhas e minas em plantas do cerrado e mata de galeria.
Tabela 1. Número de espécies de galhadores e minadores em cerrado e mata de galeria da Reserva Ecológica do
IBGE.
cerrado
mata de galeria
amostra
galhadores
minadores
galhadores
minadores
1
9
6
1
5
2
12
8
4
8
3
13
4
4
8
4
13
4
2
4
5
9
1
4
6
6
10
3
5
9
7
15
20
5
9
8
15
9
7
15
9
14
11
5
15
total
110
66
37
79
12,22
7,33
4,11
8,78
x
se
0,80
1,90
0,58
1,31
Tabela 2. Comparação das floras de mata de galeria e do cerrado (sensu lato) da Reserva Ecológica do IBGE (R. P.
B. Henriques, dados não publicados).
tipo de
área (ha)
família
gênero
espécie
espécie / km2
espécie /
vegetação
gênero
cerrado
981
83
318
742
75,6
2,3
mata de
104
110
290
529
508,6
1,8
galeria
3
VISITAÇÃO DE FORMIGAS EM NECTÁRIOS
EXTRAFLORAIS DE Qualea multiflora
(VOCHISIACEAE) E SEU POTENCIAL COMO
AGENTE ANTI-HERBIVORIA2.
Delano M. S. da Silva; Rosane G. Colevatti; Everton
A. dos Santos.
INTRODUÇÃO
Interações entre formigas e plantas com
nectários extraflorais (NEF) são bem descritas na
literatura. Plantas com NEF são visitadas por
formigas com dietas bem amplas, as quais passeiam
pela planta (patrulham) atrás do néctar produzido
pelos nectários. Em "troca" desse néctar as formigas
protegeriam estas plantas contra insetos herbívoros.
Nectários extraflorais têm uma grande ocorrência em
espécies lenhosas do cerrado, cerca de 25%,
ocorrendo numa grande variedade de táxons. Para
algumas destas espécies já foi demonstrado que a
presença de formigas na planta diminui a taxa de
herbivoria nas folhas e ou flores, podendo inclusive
aumentar o sucesso reprodutivo da planta.
Este trabalho tem como objetivos verificar
se: (1) plantas com NEF são mais visitadas por
formigas do que plantas sem NEF; (2) o padrão de
forrageamento das formigas sobre as plantas está
relacionado à localização dos NEF na folhagem da
planta; (3) formigas exibem comportamento
agressivo em relação a herbívoros potenciais
presentes nas plantas.
MATERIAL E MÉTODOS
O trabalho foi realizado numa área de
cerrado denso próximo à sede da reserva. A planta
com NEF utilizada foi Qualea multiflora
(Vochysiaceae), uma planta com porte arbustivo
arbóreo muito comum no cerrado do DF. Suas folhas
são opostas e seus nectários localizam-se na inserção
do pecíolo com o ramo. Foram
utilizados
22
indivíduos de Q. multiflora e 22 indivíduos de outras
espécies próximas que não possuíam NEF como
controle. Em cada planta foram contados o número
de formigas presentes na planta. Após esta contagem
utilizamos cupins para simular um herbívoro em
potencial e testamos a eficiência das formigas como
protetores. Estes cupins eram colados na face adaxial
de duas folhas com cola branca. Para verificar se a
eficiência das formigas como protetoras era igual
para toda a planta, pois os nectários só estão ativos
em folhas jovens, utilizamos um par de folhas jovens
e um par de folhas velhas, tanto em Q. multiflora
quanto no vizinho sem NEF.
Após colocarmos os cupins, acompanhamos
o comportamento das formigas em relação aos cupins
durante 10 minutos. Todo evento que ocorreu nesse
intervalo era anotado e ao final dos 10 minutos as
formigas eram coletadas para posterior identificação.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A tabela 1 apresenta as espécies de formigas
encontradas tanto em Qualea multiflora quanto na
planta vizinha. Dentro destas espécies, Camponotus
rufipes, Camponotus crassus e Zacryptocerus
pusillus foram as mais abundantes. Com relação ao
número de formigas encontradas patrulhando as
plantas observadas, encontramos que Q. multifora
possui um número significativamente maior de
formigas do que as plantas vizinhas sem NEF (Tab.
2). Além de visitarem mais as plantas com NEF as
formigas atacam mais cupins (iscas) nas plantas com
NEF do que nas plantas sem NEF (
χ
2
=9.95;
p=0,0016). Ambos resultados conferem com os
resultados encontrados na literatura mostrando a
eficiência das formigas como agentes antiherbívoros.
Podemos concluir que as formigas visitam
mais Qualea multiflora do que plantas sem NEF e
que além disso defendem melhor as plantas com NEF
(Objetivos 1 e 3), porém quando comparamos se este
ataque é maior em folhas novas (NEF ativos) que em
folhas velhas, verificamos que não existe diferença
significativa (
χ
2
=0,11; p=0,7385). Poderíamos
pensar que apesar de não existir diferença do ataque
poderia existir uma diferença do tempo para ocorrer o
ataque, mas este também não mostra uma diferença
significativa (Komogorov-Smirnov; Dmax=0,17;
p=1,0; Fig. 2).
Desse modo, mais uma vez foi comprovado
que formigas que visitam NEF's atuam como agentes
anti-herbívoros para estas plantas.
2 Prof. Orientador: Paulo Oliveira
4
FREQUÊNCIA (%)
5
Folha nova
4
Folha velha
3
2
1
0
1
2
3
4
5
6
7
TEMPO (MINUTOS)
FIGURA 1. Tempo de ataque ao cupins pelas formigas em folhas novas e velhas de Qualea multiflora.
Tabela 1. Espécies encontradas em Qualea multiflora e nas espécies vizinhas.
Espécie
Camponotus blandus
Camponotus crassus
Camponotus rufipes
Camponotus sp
Crematogaster sp
Pachycondyla villosa
Pseudomyrmex aff. flavidulus
Pseudomyrmex aff. gracillis
Pheidole sp
Zacryptocerus pusillus
Tabela 2. Número médio de formigas encontradas em cada espécie de planta.
ESPÉCIE
sd
U
x
Qualea multiflora
6,64
4,60
25,2153
Vizinho mais
1,18
1,14
próximo
p
<0,001
5
OCORRÊNCIA DE FORMIGAS EM GALHAS
DE Diospyros hispida D. C. NA RESERVA
ECOLÓGICA DO IBGE, DF3
Carlos A. Bianchi; Felipe A. P. L. Costa; Terezinha
A. B. Dias.
INTRODUÇÃO
Galhas ocorrem em espécies de plantas,
provocadas pela deposição de larvas de insetos
(chamados galhadores), promovendo uma hiperplasia
e/ou hipertrofia no local da deposição (geralmente
folhas e caule). As galhas entre outras funções,
podem servir de abrigo e fornecer nutrientes para o
desenvolvimento da larva. Entretanto é possível
registrar a utilização das galhas por outros
invertebrados, os quais podem predar ou não a larva
do galhador, ocupando o espaço disponível no
interior da mesma. Neste caso, a galha também
funcionaria como um abrigo. Dentre aqueles
ocupantes de galhas, podem ser citadas inúmeras
espécies de formigas.
Este trabalho analisa a ocorrência de
formigas em galhas de Diospyros hispida DC. As
questões a serem respondidas por este estudo são: (1)
quais são as espécies de formigas ocupantes de
galhas de D. hispida ; (2) as galhas ocupadas são
maiores do que as galhas não ocupadas?; (3) o
número de formigas aumenta com o tamanho da
galha?; (4) o número de formigas varia com o
tamanho da galha ocupada?
MATERIAL E MÉTODOS
Foram coletadas 71 galhas em 18 indivíduos
de D. hispida(entre 3 a 7 galhas por indivíduo) numa
área de cerrado próxima à sede da Reserva Ecológica
do IBGE, Distrito Federal. Cada galha coletada foi
acondicionada em sacos de papel individuais e,
posteriormente, triada no laboratório. Foi efetuada a
contagem dos orifícios presentes nas galhas,
estimado seu volume total, através da imersão em
água em proveta graduada (100 ml e 500 ml) e
caracterizada sua arquitetura interna (número de
cavidades). Após a abertura da galha, o número e a
espécie de formigas presentes foram registrados,
além da presença ou ausência da larva do galhador.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Dentre as 71 galhas coletadas, 31 delas
estavam ocupadas por formigas, 34 não estavam
ocupadas por formigas e 6 foram classificadas como
"podres" (quando estavam vazias e bastante
quebradiças) (Fig. 1). Dos 18 indivíduos de
Diospyros hispida, dos quais foram coletadas galhas,
14 apresentaram galhas ocupadas por formigas
(totalizando 15 galhas) de duas ou mais espécies.
Segundo os resultados apresentados na figura 1, 31
galhas apresentaram formigas e, destas, 15
apresentaram 2 ou mais espécies de formigas.
Foram encontradas 7 espécies de formigas
em 5 gêneros, como ocupantes das galhas de
Diospyros hispida. Um estudo similar realizado em
área de cerrado próximo à Belo Horizonte, Minas
Gerais, revelou a ocorrência de 7 espécies (6
gêneros) (Tab. 3). Não houve diferença significativa
(t=1,01; p>0.05; N=65) entre o volume das galhas
ocupadas por formigas (Tab. 1). A figura 2 mostra
que existe correlação entre o número de formigas
presentes nas galhas e o volume de cada galha,
apresentando gêneros como Zacryptocerus sp que
ocupou galhas de diferentes tamanhos com diferentes
números de indivíduos.
Quando são comparadas as espécies mais
abundantes, Zacryptocerus sp e Camponotus sp ,
quanto ao volume das galhas que ocupavam, também
não se verifica diferença significativa (t=0,14;
p>0.005; N=24) (Tab. 2).
Formigas de espécies diferentes ocupavam a
mesma galha (com entradas para cavidades
independentes) em um dos indivíduos de D. hispida.
Outro fato foi a presença de formigas do gênero
Zacryptocerus sp ocupando uma cavidade
independente em certa galha e em outra cavidade, a
presença de uma larva (possivelmente do galhador)
na mesma galha.
O estudo de ocorrência de formigas em
galhas de D. hispida revelou a existência de 7
espécies de formiga como ocupantes das galhas.
Estes resultados sugerem que as galhas são ambientes
importantes para o estabelecimento de colônias de
formigas. Paralelamente, as demais plantas de D.
hispida que apresentaram suas galhas ocupadas por
apenas uma espécie, sugerem a possível existência de
colônias destas espécies, espalhadas por 3 a 5 galhas
da mesma planta.
Não houve diferença significativa entre o
volume das galhas ocupadas quando foram usadas
todas as formigas ou foram usadas as duas espécies
mais abundantes (Zacryptocerus sp e Camponotus
sp). Pode-se concluir que não ocorre preferência por
tamanho de galhas, as formigas ocupam todas
independente do tamanho. Outra explicação para os
resultados encontrados é que o número de formigas
poderá diferir com o tamanho da galha, dependendo
do volume ocupado pelas formigas (seria necessário
calcular o volume dos indivíduos que formam a
colônia).
3 Prof. Orientador: Geraldo W. Fernandes
6
Número total de
galhas
Número de galhas
ocupadas
Número de galhas
não ocupadas
Número de galhas
podres
NÚMERO DE GALHAS
80
70
60
50
40
30
20
10
0
A
B
C
D
FIGURA 1. Número de galhas coletadas e distribuição nas quatro categorias de galhas.
140
NÚMERO DE FORMIGAS
120
100
80
60
40
20
0
0
10
20
30
40
TAMANHO DA GALHA (ML)
FIGURA 2. Relação entre o tamanho das galhas e o número de formigas (r=0,39; P < 0,05; N=23).
7
Tabela 1. Média e desvio padrão para o volume de galhas ocupadas e não ocupadas.
valor
ocupadas
9,9
x
s
7,6
t=1,01; p>0.05; N=65
não-ocupadas
11,7
7,6
Tabela 2. Comparação entre o volume das galhas ocupadas pelas espécies Camponotus sp e Zacryptocerus sp
Camponotus sp
Zacryptocerus sp
N
7,0
17
13,4
10,4
x
d.p
11,9
6,4
t=0,14; p>0,05; N=65
Tabela 3. Lista de gêneros e espécies na área do cerrado da reserva ecológica do IBGE e de um cerrado de Belo
Horizonte.
Brasília (IBGE)
Belo Horizonte
Camponotus pallescens
Camponotus sp1
Crematogaster sp.
Camponotus sp2
Pseudomyrmex aff. gracilis
Crematogaster brevispinosa
Solenopsis sp1
P. gracilis
Solenopsis sp2
Solenopsis sp1
Zacryptocerus pusillus
Lepthotorax sp
Zacryptocerus sp1
Zacryptocerus pusillus
8
ESTRATÉGIAS DE FORRAGEAMENTO DE
LAGARTOS4
Flávia S. Pinto; Saulo M. A. Andrade; Guilherme H.
B. de Miranda
INTRODUÇÃO
Duas estratégias de forrageamento são
conhecidas para lagartos não-herbívoros. As duas
baseiam-se nas relações de custo e benefício que
visam minimizar gastos energéticos, no caso, com a
procura de itens alimentares. Os "senta-e-espera" são
caracterizados por apresentarem sítios definidos de
forrageamento,
empreendendo
pequenos
deslocamentos para a obtenção de presas. São, por
isso, geralmente territoriais e utilizam principalmente
o estímulo visual na procura de presas. Os
forrageadores ativos, ou "procuradores", são
caracterizados por não apresentarem sítios definidos
de forrageamento, saindo em busca das presas,
utilizando principalmente o estímulo olfativo nesta
procura.
Estas duas estratégias, devido à demanda
energética que está envolvida, determinariam o tipo e
a quantidade das presas ingeridas. Teoricamente
lagartos do tipo "senta-e-espera" apresentariam
menor diversidade de itens na sua dieta, com
preferência por alguns desses itens. Isto é esperado
pois estes lagartos apresentam baixo gasto energético
com a procura dos itens, podendo energeticamente
esperar presas de maior retorno energético. Os
procuradores, por sua vez, sujeitos a um déficit
energético imposto pela procura ativa do alimento,
apresentariam na composição da sua dieta maior
diversidade de itens alimentares de diferentes
retornos energéticos.
O objetivo principal deste trabalho é
verificar a existência desses padrões para duas
espécies de lagartos do cerrado, uma considerada
"senta-e-espera" e um modelo aleatório por nós
produzido, através de medidas de frequência de
deslocamento e do estímulo utilizado na procura das
presas.
MATERIAL E MÉTODOS
Os dados foram obtidos através de censos
realizados de minuto a minuto a partir da
visualização direta dos lagartos. Foram registrados
dois tipos de comportamento com relação à atividade
desenvolvida no momento da observação (parado ou
andando) e caracterizado o tipo de estímulo utilizado
na procura de presas, através de visualização
contínua, quantificados a partir do número de
investidas em presas, considerando estímulos visuais
ou olfativos.
Os dados foram coletados na região da
Cachoeira de Queimados no Município de Unaí
(MG). A região é caracterizada pela existência de
matas de galeria associadas à afloramentos de rocha
às margens do rio.
Escolhemos para este estudo a espécie
Tropidurus oreadicus (Tropiduridae) bastante
frequente na área, sabidamente ”senta-e-espera”. Para
traçarmos comparações entre os dois modelos
propostos criamos um modelo aleatório, que atribui
uma mesma probabilidade de, para cada observação,
um lagarto imaginário estar parado (50%) ou
andando (50%), com relação ao padrão de atividade,
e de utilizar um estímulo visual (50%) ou olfativo
(50%), com relação ao estímulo utilizado. Os dados
observados e os dados do modelo foram confrontados
através do teste t pareado.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os dados brutos do censo realizado para
atividade e estímulo de T. oreadicus são mostrados
na tabela 1. Os mesmos dados obtidos para o modelo
aleatório criado estão representados na tabela 2.
Foram observados ao todo 20 indivíduos de T.
oreadicus. Ao todo foram 260 observações para
padrão de atividade e 64 observações para estímulo
utilizado.
O modelo não apresentou nenhum padrão
comportamental segundo a teoria de forrageamento
proposta. Em aproximadamente metade das
observações os indivíduos estavam parados (45,8%)
ou andando (54,2%) e utilizaram para a visualização
das presas tanto o estímulo visual (54,2%) quanto o
olfativo (48,4%).
Encontramos diferença significativa no
padrão de atividade quando comparamos o número
de observações de indivíduos encontrados parados
(t=-5,48 p=0,0001), o que corrobora o fato dos
lagartos considerados "senta-e-espera" apresentarem
baixa frequência de deslocamento.
Devido à grande abundância de T. oreadicus
na área vários comportamentos agonísticos foram
observados entre os indivíduos que habitavam locais
próximos mostrando a existência de territorialidade
para a população amostrada, corroborando o modelo
proposto para "senta-e-espera".
A fim de identificar realmente a existência
destes padrões, estudos considerando várias espécies
diferentes e de diferentes grupos taxonômicos devem
ser realizados, a fim de descartar possíveis relações
filogenéticas existentes e abrangendo maior variação
de padrões comportamentais. Além disso outras
características devem ser consideradas como o
número e a quantidade de itens alimentares ingeridos.
4 Prof. Orientador: Guarino R. Colli
9
Tabela 1. Padrão de atividade e estímulo utilizado por Tropidurus oreadicus. Os valores indicam o número de
observações.
atividade
estímulo
indivíduo
parado
andando
visual
olfativo
01
10
0
2
0
02
12
2
6
0
03
10
0
1
0
04
1
2
2
0
05
3
0
0
0
06
1
0
1
0
07
2
0
1
0
08
10
0
0
0
09
7
4
15
0
10
1
1
1
0
11
6
4
17
0
12
11
0
2
0
13
6
0
5
0
14
13
0
1
0
15
31
16
3
0
16
25
0
0
0
17
19
2
18
17
6
19
25
4
2
0
20
5
4
5
0
total
215
45
64
0
Tabela 2. Padrão de atividade e estímulo utilizado pelo modelo aleatório.
atividade
indivíduo
parado
andando
01
5
5
02
6
8
03
5
5
04
1
2
05
3
0
06
0
1
07
2
0
08
2
8
09
5
6
10
0
2
11
7
3
12
6
5
13
1
5
14
6
7
15
24
23
16
17
8
17
7
14
18
7
16
19
9
20
20
6
3
total
119
141
estímulo
visual
2
2
0
1
0
0
0
0
8
0
10
11
4
0
1
0
1
1
31
olfativo
0
4
1
1
0
1
1
0
7
1
7
1
1
1
2
0
1
1
33
10
DIVERSIDADE DE ORTHOPTERA
RELACIONADA À HETEROGENEIDADE
ESPACIAL5
Carlos A. Bianchi; Felipe A. P. L. Costa; Terezinha
A. B. Dias.
INTRODUÇÃO
A heterogeneidade espacial é importante na
determinação da diversidade de espécies. Variações
de tipo de solo acarretam mudanças na vegetação e,
consequentemente, o mesmo efeito na fauna. Logo,
ambientes mais heterogêneos tendem a suportar um
maior número de espécies em relação à ambientes
mais homogêneos, isto é, um aumento na
heterogeneidade espacial pode representar um
aumento na diversidade de espécies de flora e fauna.
A diversidade de espécies pode ser caracterizada de 3
formas: a diversidade α (alfa) ou diversidade
pontual, que se refere à diversidade de um ponto
amostrado; a diversidade β (beta), que avalia o
quanto a composição de espécies mudou de um ponto
amostrado para outro e por fim a diversidade gama,
que representa a diversidade regional.
O cálculo de diversidade beta é feito através
do Índice Whittaker (1960), dado pela fórmula:
Bw = (c / α ) − 1
onde: c=riqueza total de espécies das duas áreas e
α = soma do número de espécies das duas áreas
dividida por 2.
Este projeto teve por objetivos verificar a
composição de espécies de Orthoptera em uma área
de campo sujo, avaliando e investigando relações
com a existência de um gradiente na vegetação.
MATERIAL E MÉTODOS
O estudo foi realizado em uma área de
campo sujo na Reserva Ecológica do IBGE, Brasília,
DF; onde foram amostrados 6 pontos. Para cada
ponto efetuamos um levantamento da vegetação,
classificando as espécies ocorrentes em 3 categorias:
arbórea, arbustiva e herbácea; indicando o número de
espécies, o número de indivíduos para cada categoria,
além da altura do estrato.
Os cinco primeiros pontos estavam distantes
50 m um do outro, a distância do ponto 5 ao ponto 6
era de 200 m. Posteriormente 75 varreduras foram
efetuados num raio de 30 m do ponto amostrado,
coletando apenas os insetos Acridoidea (gafanhotos).
Em seguida, foram cronometrados 15 minutos para
uma nova coleta de gafanhotos, a qual era efetuada
com a localização visual de um exemplar e
consequentemente captura com rede de varredura. Os
espécimes
coletados
foram
separados
em
morfoespécies.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Foram identificadas 52 morfoespécies, num
total de 213 indivíduos coletados. A tabela 1 mostra o
número de morfoespécies e respectivo número de
indivíduos coletados para cada ponto. A figura 1
apresenta uma relação entre o número de espécies e a
distância percorrida. A curva apresentada na figura 1
mostra uma tendência à estabilização entre 50 e 60
morfoespécies, indicando que o número máximo de
espécies para a área pode estar próximo destes
valores.
A diversidade beta entre os pontos
amostrados é mostrada na tabela 2. Os valores
encontrados situam-se entre 0,44 (pontos 5,6) até 1,0
(pontos 1,4 e 1,6). Não foi verificado um padrão de
mudanças na diversidade entre as áreas amostradas.
Áreas próximas (dist=50 m) apresentaram tanto
valores altos de dissimilaridade (Bw1,2 =0,83) como
valores baixos (Bw2,3=0,45). Do mesmo modo,
áreas distantes apresentaram valores altos
(Bw1,6=1,0) (dist=400 m) e valores baixos
(Bw5,6=0,44; dist=200 m).
Os dados de vegetação da tabela 3 podem
ser agrupados em pares conforme riqueza e
densidade em cada ponto. Desta forma, podemos
afirmar que os pontos 1 e 3 são semelhantes em
riqueza de espécies e densidade de indivíduos,
porém, quanto aos Orthoptera, encontramos alto
valor de dissimilaridade (Bw1,3=0,83; tabela 2).
Os pares de pontos 2 e 4, e 2 e 5 foram
agrupados de acordo com riqueza e densidade,
respectivamente. Ambos apresentaram valores
médios de dissimilaridade, situados em torno de
0,615 ((Bw2,4 + Bw2,5)/2). Quanto aos pares 4 e 6, e
5 e 6, podemos encontrar o mesmo padrão, com valor
médio de dissimilaridade em torno de 0,55 ((Bw4,6 +
Bw5,6)/2).
A figura 2 apresenta os índices de
dissimilaridade ao longo dos pontos amostrados, com
valor alto de P1 a P2 (Bw1,3=0,83) e valores médios
de P2 até P6 (v. figura 2). Apesar do número baixo
de amostras de vegetação, o padrão encontrado foi
equivalente em todos os pontos, revelando uma
variação bastante sutil entre pontos. Quanto à
composição de espécies de gafanhotos de cada ponto,
é possível afirmar que tais variações estavam, de
certa forma, relacionadas às diferenças na vegetação,
entretanto, deve-se ressaltar novamente o número
amostral utilizado.
5 Prof. Orientador: Alexandre F. B. de Araújo
11
Tabela 1. Número de espécies e indivíduos coletados na área de estudo.
ponto
nº espécies
P1
08
P2
16
P3
21
P4
10
P5
27
P6
20
nº indivíduos
13
32
38
29
46
46
Tabela 2. Valores de diversidade usando o índice de Whittaker (1960) (Bw) na diagonal inferior e número de
espécies comuns na diagonal superior
pontos amostrados
P1
P2
P3
P4
P5
P6
P1
2
2
0
1
0
P2
0,83
10
5
8
9
P3
0,86
0,45
5
10
9
P4
1,00
0,61
0,67
8
5
P5
0,94
0,62
0,58
0,56
13
P6
1,00
0,50
0,56
0,66
0,44
Tabela 3. Valores de densidade e riqueza de espécies para a vegetação nos pontos amostrados.
ponto
densidade (ind./m2)
riqueza (nspp)
agrup.dens.riq.
P1
2,0
14
(1,3)
P2
3,3
24
(1,3)
P3
2,0
15
(2,5)
P4
2,8
23
(2,4)
P5
3,3
19
(4,6)
P6
2,8
20
(5,6)
12
60
50
40
30
20
10
0
50
100
150
200
250
300
350
400
450
DISTÂNCIA (m)
FIGURA 1. Relação entre o número de espécies e a distância.
P1
P2
P3
P4
P5
P6
/____0,83____/____0,45___/____0,67____/____0,56____/____0,44___/
50m
50m
50m
50m
50m
FIGURA 2. Índice de dissimilaridade de Whittaker (Bw) ao longo da área de estudo.
13
ECOLOGIA FLORAL DE QUATRO ESPÉCIES
DO CERRADO: FREQUÊNCIA DE VISITAS E
POLINIZADORES6
Delano M. S. da Silva; Everton A. dos Santos;
Rosane G. Colevatti.
INTRODUÇÃO
A polinização cruzada entre diferentes
espécies de plantas, mesmo que não resulte em
fertilização ou formação de híbridos, pode diminuir o
valor adaptativo ("fitness") da planta. Isso pode
ocorrer tanto no componente masculino, por perda de
pólen, quanto no feminino, por ocupação do espaço
estigmático com pólen de outras espécies, impedindo
a germinação de pólen co-específico.
As comunidades vegetais podem apresentar
diversos mecanismos que impedem a polinização
cruzada, como: (1) florescimento em épocas
diferentes do ano; (2) ântese (cobertura da flor) em
diferentes horários do dia; (3) utilização de diferentes
tipos de polinizadores (abelhas, beija-flores,
morcegos, etc); (4) partilha de polinizadores pelas
espécies vegetais. As diferenças na morfologia floral,
proporcionam uma deposição diferencial do pólen de
cada planta no corpo do polinizador, que corresponde
à posição de recepção pelo estigma. Assim, um
mesmo polinizador que visita várias espécies de
plantas de uma comunidade pode apresentar pólen de
cada espécie de planta em diferentes partes do corpo.
Além disso, espera-se que espécies com maior oferta
de "recompensa" pelo "serviço" do polinizador
(maior número de flores por planta, maior quantidade
de néctar, pólen, óleo) apresentem uma maior
frequência de visitas.
Foram encontradas, em uma área de cerrado
quatro espécies de plantas florindo em uma mesma
época do ano (março), e com flores abertas durante o
mesmo período do dia. Dessa forma, foi levantada a
questão que foi o objetivo geral desse trabalho: há
partição do recurso polinizador por estas quatro
espécies de plantas co-ocorrentes? Especificamente,
este trabalho tem como objetivo responder às
seguintes questões para cada espécie vegetal: (1)
quais os visitantes florais?; (2) quais os recursos
oferecidos pela planta e utilizado pelos visitantes?;
(3) qual a frequência das visitas?; (4) quais são os
principais polinizadores de cada espécie?; (5) esses
polinizadores são comuns às quatro espécies? Caso
sejam, há partilha do recurso polinizador?
MATERIAL E MÉTODOS
Este trabalho foi realizado na Reserva
Ecológica do IBGE, numa área de cerrado onde co6 Prof. Orientador: Jader S. Marinho Filho
ocorriam quatro espécies com hábito arbustivoherbáceo: Solanum lycocarpum (Solanaceae), Hyptis
sp (Labiatae), Diplusodon oblongus (Lythraceae) e
Banisteriopsis campestris (Malpighiaceae).
Para observação dos visitantes foi utilizado
o método "focal contínuo" de observação, no qual
cada espécie foi observada no período entre 8:10 e
11:30 h por um observador. Foram registradas as
seguintes observações: (1) espécie visitante; (2)
horário da visita; (3) recurso utilizado; (4)
comportamento de coleta do recurso. As frequências
foram analisadas pela análise de variância nãoparamétrica (Kruskal-Wallis) e teste para diferença
entre medianas. Não foi possível analisar as
distribuições de frequências de visitas por espécie de
abelha e frequência total devido ao número de
observações.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A tabela 1 apresenta os visitantes
encontrados nas quatro espécies estudadas e os
principais polinizadores. Os recursos encontrados em
cada flor e sua morfologia estão descritos abaixo:
- Solanum lycocarpum (Solanaceae): possui
anteras poricidas. Embora as flores sejam
morfologicamente hermafroditas, há evidências de
que há indivíduos funcionalmente femininos,
masculinos e hermafroditas. As flores não possuem
néctar, sendo o pólen o único recurso obtido pelas
abelhas pela vibração das anteras ("buzz
pollination"). A flor é actinomorfa e roxa.
- Hyptis sp (Labiatae): apresenta flor
zigomorfa, com as anteras dentro da corola. Essas são
projetadas para fora quando a abelha "força" a flor,
pousando na "plataforma" que possui guias de néctar
púrpura, contrastando com a flor branca.
Aparentemente há dicogamia (protandria), pois a
projeção do estigma para a parte externa da flor só
foi encontrada em flores cujas anteras estavam
murchas.
- Diplusodum oblongus (Lythraceae): a flor
é púrpura e actinomorfa. O estigma é projetado acima
da linha das anteras e, aparentemente, deve encostar
na cabeça dos visitantes de tamanho corporal maior
quando estão coletando néctar.
- Banisteriopsis campestris (Malpighiaceae):
A flor é branca, actinomorfa e possui 5 glândulas de
óleo nas sépalas, que é o recurso principal coletado
nessa flor, além do pólen. O gineceu é dialicarpelar
(tricarpelar).
A figura 1 mostra a frequência de visitas por
intervalos de tempo de 30 min., para cada espécie de
planta, somando todos os visitantes florais. Essas
frequências foram diferentes, pela análise de
variância de Kruskall-Wallis (Kw=14,5966; p=
0,0022). O teste para medianas mostra que há
diferenças no pico de visitação entre S. lycocarpum e
14
Hyptis sp (
χ
2
=7,14; mediana=5,6; p=0,0075), S.
lycocarpum e B. campestris (
χ
2
=7,14;
mediana=5,5; p=0,0075); Hyptis sp e D. oblongus
(
χ
2
=5,33; mediana=60; p=0,0209), D. oblongus e
B. campestris (
χ
2
=7,14; mediana=7,5; p=0,0075),
mas não entre S. lycocarpum e D. oblongus
(
χ
2
espécies. Entretanto, um estudo mais detalhado, com
coleta de pólen das plantas e exame do pólen no
corpo da abelha, será necessário para conclusões
mais precisas. Além disso, foram agrupados
indivíduos machos e fêmeas dessa espécie de abelha.
É possível que machos e fêmeas estivessem
coletando recursos diferentes, como é comum para
abelhas de outros grupos como Euglossini,
Anthophorini, etc.
=2,40; mediana=2,0; p=0,1217) e Hyptis sp e B.
campestris (
χ
2
=2,57; mediana=11; p=1,1088).
O principal polinizador potencial de S.
lycocarpum foi Epicharis sp Em Hyptis sp foi o
Lepidoptera Lycaenidae sp1., Epicharis sp e
Myschocytharus sp (Vespidae). Para D. oblongus
foram as espécies de abelha Trygona spineps,
Epicharis sp e Megachilidae sp. Para B. campestris,
Epicharis sp Anthophoridae sp1 e um grupo de
abelhas Trygona spineps, Paratetrapedia sp1 e sp2,
as quais foram reunidas na contagem de visitas, uma
vez que era impossível distinguí-las no campo. A
figura 2 mostra a distribuição de frequência de visitas
dos principais polinizadores, para cada planta.
Como Epicharis sp foi a espécie comum
entre as quatro espécies de plantas, foi analisada a
diferença entre a frequência de visitas para S.
lycocarpum e B. campestris, uma vez que nas outras
duas espécies a frequência de visitas foi muito baixa.
A análise de Mann-Whitney mostrou que não há
diferença entre elas (U=1,4610; p=0,2268).
Apesar de não ter sido possível realizar uma
análise para diferença nas distribuições de frequência
de visita de Epicharis sp nessas duas plantas, o
gráfico sugere (Fig. 2) que quando há um aumento de
frequência de visitas em uma das espécies há uma
diminuição na outra. Além disso a frequência total de
visitas e a frequência de visita de Epicharis sp em B.
campestris foi bem maior que as outras espécies. Isso
ocorreu, provavelmente, porque B. campestris
apresentava um grande número de flores por ramo e
uma alta densidade de flores no que foi considerado a
"mancha" da planta. Dessa forma, Epicharis sp além
das outras abelhas, visitam várias flores dessa planta.
Esse padrão de maior frequência de visitas a plantas
com maior densidade de flores é bastante comum.
Além disso Epicharis sp é uma espécie coletora de
óleo, o que pode explicar sua maior frequência em B.
campestris.
Quanto à partição do recurso polinizador,
considerando principalmente Epicharis sp, não foram
encontradas evidências de deposição diferencial de
pólen das várias espécies. Aparentemente Epicharis
sp coletou principalmente óleo em B. campestris,
pólen em S. lycocarpum e néctar nas outras duas
25
Solanum lycocarpum
Diplusodon obolgus
Hyptis sp.
20
Banisteriopsis campestris
15
10
5
0
1
2
3
4
5
6
7
INTERVALO DE TEMPO
FIGURA 1. Frequência de visitas nas flores por
intervalo de tempo para cada espécie de planta
estudada. Intervalos 1: 8:10-8:39, 2: 8:40-9:09, 3:
9:10-9:39, 4: 9:40-10:09, 5:10:10-1039, 6: 10:4011:09, 7: 11:10-11:39.
15
12
10
8
6
4
A
Epicharis
2
0
1
2
3
4
5
12
10
8
6
4
2
0
12
10
8
6
4
2
6
7
C
Trigona spineps
Epicharis sp.
Megachilidaesp1
Myschocytharus sp
Lycaenidae
Epicharis sp
B
0
12
10
8
Myschocytharus sp
D
Lycaenidae
Epicharis sp.
6
4
2
0
FIGURA 2. Frequência de visitas por intervalos de tempo para os principais polinizadores de cada espécie de
planta. A. Solanum lycocarpum; B. Hyptis sp; C. Diplusodon oblongus; D. Banisteriopsis campestris.
16
APOSEMATISMO: ADVERTÊNCIA OU
ATRAÇÃO?7
Carlos A. Bianchi; Felipe A. P. L. Costa; Terezinha
A. B. Dias.
INTRODUÇÃO
Camuflagem
e
aposematismo
são
consequências evolutivas da predação por
organismos que se orientam visualmente. Enquanto a
camuflagem diminui as chances de que uma presa
potencial seja encontrada, o aposematismo diminui as
chances de que um animal impalatável seja injuriado
por predadores generalistas.
Para testar a hipótese de que larvas
aposemáticas de insetos são evitadas por aves
insetívoras, foi conduzido um experimento utilizando
larvas artificiais. Especificamente, foi testado se: (1)
os danos e/ou a remoção seriam mais frequentes nas
larvas monocromáticas (verdes ou amarelas) do que
nas larvas coloridas (=aposemáticas; larvas pretas
com 2 faixas transversais, uma vermelha e outra
alaranjada); (2) os danos e/ou a remoção nas larvas
evidentes (amarelas, contrastando com o fundo verde
das folhas) seriam mais frequentes do que nas larvas
camufladas (verdes) e aposemáticas. Em resumo, nós
testamos se a frequência de danos foi decrescente
entre os 3 tipos de larvas, a saber:
amarelas>verdes>coloridas.
MATERIAL E MÉTODOS
Larvas artificiais (com 3,5 - 5,0 cm de
comprimento e 0,35 - 0,50 cm de diâmetro) foram
feitas com massa de modelar e colocadas sobre as
folhas de uma planta, quase sempre ao longo da
nervura principal.
Dentro de uma área de "cerradão", na
Reserva Ecológica do IBGE (Brasília, D.F.), nós
estabelecemos 3 transectos paralelos e distantes 5
metros entre si. Ao longo de cada um deles, foram
distribuídas, de modo alternado, 153 larvas (51
amarelas, 52 verdes e 50 coloridas), cada uma sobre
uma planta (alturas entre 40 - 130 cm).
Nós esperamos 3 horas para o início das
vistorias, durante a qual os danos encontrados em
cada larva foram classificados de acordo com o
suposto agente causador; formigas (geralmente
presentes), outros artrópodos (vespas) e aves.
Especialmente nos 2 últimos casos, nós inferimos o
agente dos danos de acordo com o aspecto das
marcas encontradas. Ao final, apenas uma larva,
entre as 153 colocadas, desapareceu e nós decidimos
excluí-la das análises posteriores.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Das 153 larvas distribuídas, 52 foram
reencontradas com algum tipo de dano. A ocorrência
de danos não difere das proporções relativas dos 3
tipos de larvas (Tab. 1), sugerindo que as larvas
foram danificadas independentemente da sua
coloração. Assim, ao contrário do que era esperado,
larvas "aposemáticas" foram tão frequentemente
danificadas quanto larvas monocromáticas. Além
Tabela 1. Visitantes florais das quatro espécies de plantas estudadas (V) e polinizadores potenciais (P).
visitante
S. lycocarpum
Hyptis sp
D. oblongous
B. campestris
Bruchidae sp1
V
V
V
Chrysomelidae sp1
V
V
Curculionidae sp1
V
Miridae sp1
V
Camponotus sp1
V
Lycaenidae sp1
P
V
V
Brachigaster sp1
V
Myschocytharus sp
P
V
Anthophoridae sp1
P
Anthophoridae sp2
P
Anthophoridae sp3
P
Anthophoridae sp4
P
Epicharis sp
P
P
P
P
Paratetrapedia sp1
P
Paratetrapedia sp2
P
Xylocopa sp
P
Megachilidae sp1
P
Nanotrigona sp
V
Trigona spineps
P
P
P
7razão
4/6
4/6
5/14
Profª.p/(p+v)
Orientadora: Regina Macedo 4/4
17
disso, como as formigas foram responsáveis pela
maioria dos danos, esses resultados indicam a
ausência de discriminação por aqueles animais entre
os 3 tipos de larvas.
Nesse ponto, nós reanalizamos os dados,
comparando apenas as larvas danificas por "vespas"
contra todas as outras e o valor obtido para o
χ
2
foi
significativo (Tab. 2). Embora os baixos valores em
algumas células exijam uma análise mais cuidadosa,
a magnitude das diferenças e sua natureza (ca. 60 %
devido à célula "colorida-vespa") apontam na direção
de
que
as
larvas
aposemáticas
foram
preferencialmente danificadas.
Ainda que a composição da massa de
modelar utilizada possa diferir com as cores (e ter
influenciado os resultados), nós imaginamos uma
explicação alternativa: larvas aposemáticas podem
ser mais facilmente encontradas e utilizadas por
alguns artrópodos predadores. Sendo assim, é
tentador imaginar os benefícios que esses predadores
teriam utilizando um recurso alimentar (e.g., larvas
aposemáticas) que é evitado ou pouco utilizado por
predadores vertebrados (e.g., aves).
Tabela 1. Comparação do número de larvas
danificadas de acordo com a sua coloração.
cor
nº larvas
nº larvas
coletadas
danificadas1
amarelo
51
17
verde
52
17
colorida
49
19
total
152
53
1 Número esperado de larvas danificadas, de acordo
com a sua abundância relativa.
t=0,298 (g.l=2; p>0,05)
Tabela 2. Comparação das larvas danificadas por
vespas contra os outros de diferentes cores.
cor
danos por
outros danos +
vespas
sem danos
amarelo
2
49
verde
1
51
colorida
10
39
total
13
139
Kolmogorov-Smirnov, p<0.001)
18
INFLUÊNCIA DO FOGO ANUAL NA
FLORÍSTICA E DENSIDADE DE ESPÉCIES
LENHOSAS DE CERRADÃO8
Delano M. S. da Silva; Everton A. dos Santos;
Rosane G. Colevatti.
INTRODUÇÃO
O cerrado é uma savana tropical
caracterizada por uma vegetação rasteira, na qual há
predomínio de gramíneas, com árvores e arbustos
esparsos. Este tipo de vegetação pode ser
caracterizado ainda pela estacionalidade climática,
com períodos secos bem marcados, onde é frequente
a ocorrência de fogo. Atualmente, especula-se que a
ocorrência de fogo no cerrado seja um dos fatores
determinantes da vegetação. O objetivo deste estudo
foi analisar a composição florística de duas áreas
(uma afetada anualmente pelo fogo, e outra
protegida), a fim de investigar a influência do fogo
na composição, densidade e diversidade de espécies
lenhosas.
MATERIAIS E MÉTODOS
Este estudo foi realizado numa área de
cerrado denso, localizada na reserva ecológica do
IBGE, e outra área adjacente, situada no Jardim
Botânico de Brasília. Selecionamos duas áreas, das
quais a primeira está protegida do fogo, tendo sofrido
apenas uma queimada nos últimos 20 anos (em
1994). A segunda área, por sua vez, sofre queimadas
anuais. Estas duas áreas estão separadas entre si
apenas por um aceiro de 20 m.
A densidade de plantas foi estimada usando
o método de ponto-quadrante. Em cada uma das
áreas, traçamos uma linha de 100m perpendicular ao
aceiro. A cada cinco metros, medimos as distâncias
do ponto até o vizinho mais próximo de cada
quadrante, considerando a circunferência mínima do
tronco de 15 cm. Ao todo, amostramos 20 pontos e
80 indivíduos em cada área.
Calculamos o número de espécies e a
densidade em cada área, as frequências absoluta e
relativa e a densidade de cada espécie, comparamos
as densidades absoluta e relativa das principais
espécies de cada área e, por fim, fizemos uma análise
gráfica para comparar as curvas de diversidade de
cada área.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Ao compararmos o número de espécies e a
densidade total das duas áreas (Tab. 1), verificamos
que a área queimada apresenta tanto um maior
número de espécies (32 spp. contra 25 spp. da área
protegida), quanto uma maior densidade total
(1733,22 contra 1597,49 da área protegida).
Ao contrário do que esperávamos, o número
de espécies e a densidade observados neste estudo
foram maiores na área queimada. A alta densidade na
área queimada pode ter ocorrido devido à resistência
natural ao fogo, ou a uma alta taxa de recrutamento,
ou ainda ao crescimento de estruturas vegetativas
(caules) que são estimuladas pelo fogo. Porém, não
são suficientes para uma análise conclusiva do
problema.
Quando comparamos as densidades absoluta
e relativa das principais espécies de ambas as áreas
(Tab. 2), notamos que apenas uma espécie,
Eremanthus glomerulatus, ocorre somente na área
queimada. É possível que esta espécie seja favorecida
pelo fogo devido a adaptação especiais ainda
desconhecidas.
Observamos
também
que
Didymopanax macrocarpum parece ser indiferente ao
fogo, uma vez que sua densidade é alta tanto na área
queimada quanto na área protegida. Vale notar ainda
que no gênero Qualea houve inversão entre as áreas,
com Q. parviflora sendo mais abundante na área
queimada e Q. multiflora apresentando maior
densidade na área protegida.
Para verificar diferenças na diversidade de
espécies nas duas áreas realizamos uma análise de
valor de importância. A figura 1 mostra que as curvas
de diversidade de ambas áreas são bastante
semelhantes, o que nos leva a sugerir que o fogo não
causou diferenças na diversidade de espécies.
1000
Cerradão Protegido
Cerradão Queimado
100
10
1
0
10
20
30
40
SEQUÊNCIA DE ESPÉCIES
FIGURA 1. Curvas de valor de importância vs.
sequência de espécies para os cerradão protegido e
cerradão queimado.
8 Prof. Orientador: Fábio R. Scarana
19
Tabela 1. Número de espécies e densidade de plantas nas áreas queimadas e não queimadas.
área queimada
área protegida
nº de espécies
32
25
densidade (ind./ha)
1733
1597
Tabela 2. Densidade das principais espécies de plantas nas áreas queimadas e protegidas de cerradão.
espécie
área queimada
área protegida
densidade
%
densidade
Eremanthus glomerulatus
210
12
Didymopanax macrocarpum
193
11
261
Sclerolobium paniculatum
175
10
16
Qualea multiflora
13
1
260
%
16
1
16
APÊNDICE 1. Densidade, frequência absoluta e relativa das espécies encontradas na área queimada.
espécies
frequência absoluta densidade relativa densidade absoluta
Erementhus glomerulatus
10
0,12
210,08
Didymopanax macrocarpum
09
0,11
192,57
Qualea parviflora
08
0,10
175,07
Miconia ferruginata
04
0,05
87,53
Roupala montana
04
0,05
87,53
Blepharocalyx salicifolia
03
0,04
70,03
Byrsonima crassa
03
0,04
70,03
Guapira noxia
03
0,04
70,03
Myrcinia guianensis
03
0,04
70,03
Rourea induta
03
0,04
70,03
Ouratea hexasperma
03
0,04
70,03
Dalbergia violacea
02
0,03
52,52
Erythroxylum suberosum
02
0,03
52,52
Hymenaea stilbocarpa
02
0,03
52,52
Lafoensia pacari
02
0,03
52,52
Qualea multiflora
02
0,03
52,52
Symplocus rhamnyfolia
02
0,03
52,52
Vochysia thyrsoidea
02
0,03
52,52
Byrsonima coccolobifolia
01
0,01
17,51
Eriotheca pubescens
01
0,01
17,51
Kielmeyera coriacea
01
0,01
17,51
Lauracea
01
0,01
17,51
Copaifera langsdorfii
01
0,01
17,51
Caryocar brasiliensis
01
0,01
17,51
Neea theifera
01
0,01
17,51
Myrtaceae
01
0,01
17,51
Qualea grandiflora
01
0,01
17,51
Piptocarpha rotundifolia
01
0,01
17,51
Sclerolobium paniculatum
01
0,01
17,51
Stryphnodendron barbatimao
01
0,01
17,51
Strychnos pseudoquina
01
0,01
17,51
Palicourea rigida
01
0,01
17,51
TOTAL
1733,22
20
APÊNDICE 2.Densidade, frequência absoluta e relativa das espécies de plantas encontradas na área protegida.
espécies
frequência absoluta densidade relativa densidade absoluta
Didymopanax macrocarpum
13
0,16
260,15
Sclerolobium paniculatum
13
0,16
260,15
Caryocar brasiliense
05
0,16
101,62
Qualea multiflora
06
0,08
130,07
Piptocarpha rotundifolia
06
0,08
130,07
Vochysia thyrsoidea
03
0,04
65,04
Stryphnodendron barbatimao
04
0,05
81,30
Dimorphandra mollis
02
0,03
48,78
Dalbergia violacea
02
0,03
48,78
Guapira noxia
02
0,03
48,78
Aspidosperma tomentosum
02
0,03
48,78
Miconia ferruginata
02
0,03
48,78
Blepharocalyx salicifolius
06
0,08
130,07
Myrtacea 1
01
0,01
16,26
Styrax ferruginea
01
0,01
16,26
Palicourea rigida
01
0,01
16,26
Connarus sp.
01
0,01
16,26
Rapanea guianensis
01
0,01
16,26
Rourea induta
01
0,01
16,26
Davilla elliptica
01
0,01
16,26
Qualea parviflora
01
0,01
16,26
Byrsonima verbascifolia
01
0,01
16,26
B. crassa
01
0,01
16.26
Eriotheca pubescens
01
0,01
16,26
Pterodon pubescens
01
0,01
16,26
TOTAL
1597,49
21
EFEITO DO FOGO NA ARQUITETURA DE
ESPÉCIES LENHOSAS DO CERRADO9
Flávia S. Pinto; Guilherme H. B. de Miranda; Saulo
M. A. Andrade.
INTRODUÇÃO
O fogo ocorre comumente no cerrado,
afetando sua fauna e flora de diversas maneiras. Com
respeito à vegetação, os efeitos do fogo podem ser
classificados em três níveis de intensidade
decrescente: (1) morte do indivíduo, com
consequente diminuição da densidade populacional ;
(2) dano total, com a parte aérea do indivíduo
totalmente destruída e (3) dano parcial, com a parte
aérea parcialmente destruída. A recuperação da
planta após o fogo se dá por rebrotamento que pode
ser: (1) subterrâneo, a partir de raízes ou outras
estruturas subterrâneas; (2) basal, da base do caule
remanescente ou (3) aéreo, das extremidades ou
porção lateral do caule ou ramos remanescentes. A
arquitetura da planta que sofreu a ação do fogo
depende do tipo de investimento para recuperação
pós-queima (rebrota). Os dois primeiros tipos citados
de rebrota provocam alteração na arquitetura da
planta. A distribuição horizontal e vertical da
biomassa, por sua vez, é determinante das
características do próximo fogo (tipo, intensidade e
taxa de dispersão).
Nosso objetivo neste projeto foi comparar a
vegetação lenhosa de uma área sujeita a um regime
regular (bienal) de queimada com uma área protegida
por um período relativamente longo (> 20 anos). A
hipótese é que espécies arbóreas de áreas queimadas
possuem diferenças em relação à áreas não
queimadas, aumentando o número de brotos após
uma queimada (entouceiramento). Essas diferenças
são temporárias, caso não haja recorrência do fogo.
Como premissa, considerou-se que cada rebrota
correspondia a um indivíduo.
MATERIAL E MÉTODOS
A coleta de dados foi feita em duas áreas de
cerrado da Reserva Ecológica do IBGE : (1) área
queimada em 1992 e 1994, após um período de 16
anos de proteção contra o fogo e (2) área protegida
do fogo a mais de 20 anos. A primeira área localizase próximo à cerca de divisa com o Jardim Botânico,
no limite leste da reserva e a outra área, atrás do
refeitório nas proximidades das construções da sede
da reserva.
Em cada uma das áreas foram identificados
e tiveram seus respectivos números de rebrotas vivas
e de rebrotas mortas contados todas as plantas
lenhosas que se encontravam a uma distância
perpendicular não superior a um metro de uma linha
de 50 metros estendida aleatoriamente e que tinham
mais de cinco centímetros de diâmetro de caule.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Na área queimada bienalmente foram
identificadas 22 espécies lenhosas em 78 indivíduos
amostradas. Ouratea hexasperma (N=11) foi a
espécie mais frequente. Na área controle, 114
indivíduos de 41 espécies foram amostrados. Na
Tabela 1 estão listadas as cinco espécies mais
frequentes em cada uma das áreas, correspondendo a
55% (área queimada) e a 40% (área controle) dos
indivíduos amostrados em cada área. Cinco das
espécies do cerrado queimado foram encontrados
apenas uma vez. O mesmo se deu com 11 espécies da
área controle.
O índice de similaridade de Jaccard para as
duas áreas foi de 31%, uma vez que apenas 15
espécies eram comuns às duas áreas amostradas. O
valor foi considerado baixo, não sendo possível
precisar se o fogo seria o único responsável por isto,
ou se seria parte do padrão de mosaico do cerrado, ou
algum outro fator responsável não conhecido.
A figura 1 mostra a frequência de rebrotas
vivas (20) em 78 indivíduos. A classe mais frequente
foi a de 1 rebrota (N=33). Apenas seis espécies não
tiveram representantes nesta classe, cinco dessas seis
espécies ausentes na classe de uma rebrota foram
justamente as que foram encontradas uma única vez
na área. Quarenta e um dos 78 indivíduos amostrados
apresentaram mais de uma rebrota. O número
máximo de rebrotas foi observado nas espécies com
distribuição por classes mais variadas, apresentando
alto grau de entouceiramento (figuras 3 e 4).
As rebrotas mortas indicando a existência de
queimadas anteriores à última também foram
contadas (130 rebrotas, variando de 1 a 6 por
indivíduo) (Fig. 2). O valor mais frequente foi na
classe de uma rebrota. Na área controle foram
contados 114 indivíduos, somente dois apresentaram
mais de uma rebrota viva (uma Miconia fallax com 4
rebrotas vivas e uma Vellozia flavicans com 3
rebrotas vivas). Nenhuma rebrota morta foi
encontrada.
9 Profª. Orientadora: Heloisa S. Miranda
22
Tabela 1. Espécies lenhosas mais frequêntes nas áreas amostradas.
cerrado queimado
espécies
Ouratea hexasperma
Kielmeyera coriacea
Miconia fallax
Davila elliptica
Byrsonima coccolobifolia
cerrado controle
espécies
Rourea induta
Rapanea guianensis
Dalbergia violacea
Qualea parviflora
Roupala montana
n
11
9
6
6
6
n
18
8
7
6
6
35
30
25
REBROTOS VIVOS
20
REBROTOS MORTOS
15
10
5
0
1
2
3
4
5
6
7
8
9 10 11 12
NÚMERO DE REBROTOS
FIGURA 1. Número de plantas com rebrotos vivos e rebrotos mortos em um cerrado submetido a queimada bienais
modais.
23
6
6
Miconia fallax
5
Ouratea hexasperma
5
4
4
REBROTOS VIVOS
3
REBROTOS MORTOS
REBROTOS VIVOS
3
REBROTOS MORTOS
2
2
1
1
0
0
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10 11 12
NÚMERO DE REBROTOS
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10 11 12
NÚMERO DE REBROTOS
FIGURA 2. Número de rebrotos em duas espécies de plantas em um cerrado sumetido a queimadas bienais modais.
24
COMPARAÇÃO DE CARACTERÍSTICAS DE
FOLHAS DE PLANTAS DE CERRADO E
MATA DE GALERIA10
Carlos A. Bianchi; Felipe A. P. L Costa; Terezinha
A. B. Dias.
INTRODUÇÃO
Características foliares como tamanho,
dureza e coloração afetam a interação das plantas
com fatores físicos e bióticos do ambiente. Por
exemplo se a quantidade de energia luminosa varia
entre dois habitats, nós deveríamos esperar que as
plantas ajustassem suas características para manter
um mesmo nível de eficiência. O objetivo desse
trabalho foi comparar características entre plantas de
um trecho de cerrado com outro de mata ciliar. Mais
especificamente nós testamos se: 1) o tamanho, a
dureza e a coloração das folhas diferia entre estes
habitats, 2) de modo semelhante, a presença de pêlos
e látex.
Tabela 1. Tamanho médio e desvio padrão de folhas
de mata de galeria e cerrado (t=2,74; p<0,05; GL=58)
área(cm2)
cerrado
mata
X
52,2
112,4
s
49,8
109,7
20
CERRADO
MATA DE GALERIA
18
16
14
12
10
8
6
MATERIAL E MÉTODOS
Este trabalho foi realizado em dois tipos de
vegetação: uma área cerrado e uma área de mata de
galeria, dentro da Reserva Ecológica do IBGE
(Brasília, DF). Em cada área amostramos plantas de
30 espécies (altura mínima de 1m), ao longo de uma
linha de 50 metros. Para cada planta foram
registradas as seguintes características foliares:
comprimento e largura máxima; área foliar,
coloração; presença ou não de pêlos e látex. A dureza
relativa de cada folha foi estimada como uso de um
"penetrômetro" (3 folhas/planta e 3 medições/folha).
4
2
0
1
3
4
5
6
7
8
9
10
11
CLASSES DE DUREZA
FIGURA 1. Número de espécies de plantas de
cerrado e mata de galeria por classes de dureza de
folha. Classes: 1: 0-1; 2: 1-2; 3: 2-3; ...; 11: 10-11.
30
25
RESULTADOS E DISCUSSÃO
O tamanho médio das folhas do cerrado foi
menor do que as folhas de mata de galeria (Tab. 1). A
diferença observada foi significativa, indicando que
as plantas da mata apresentavam folhas maiores. O
grau de dureza média das folhas do cerrado parece
ser maior do que das folhas da mata (Fig. 1). A figura
2 mostra o resultado da classificação das folhas
segundo a cor. Nota-se que a mata de galeria
apresenta maior frequência de folhas escuras que as
folhas do cerrado. Por fim, não parece haver
diferença na presença de látex e pêlos entre as folhas
das duas áreas (Fig. 3)
2
CERRADO
MATA DE GALERIA
20
15
10
5
0
5GY(Clara)
7,5GY(Escura)
FIGURA 2. Distribuição das folhas de indivíduos em
duas classe de verde em plantas do cerrado e mata de
galeria.
10 Prof. Orientador: John Du Vall Hay
25
30
25
COM PÊLO
SEM PÊLO
COM LÁTEX
20
SEM LÁTEX
15
10
5
0
CERRADO
MATA DE
GALERIA
FIGURA 3. Número de indivíduos em relação a
presença de pilosidade e presença de látex nas folhas
de plantas do cerrado e mata de galeria.
26
COMPARAÇÃO DO POTENCIAL DE ÁGUA
DE ESPÉCIES LENHOSAS DE DIFERENTES
GRUPOS FUNCIONAIS11
Delano M. S. da Silva; Everton A. dos Santos;
Rosane G. Colevatti.
INTRODUÇÃO
A água para as plantas além das funções já
conhecidas para outros organismos tem um
importante papel no transporte de nutrientes do solo
(raízes) para as partes aéreas (folhas). Este transporte
ocorre devido a um gradiente do potencial de água
(v) das raízes para as folhas sendo que o fluxo vai do
potencial menos negativo para o mais negativo. Isso
é de grande importância para as plantas pois elas
podem controlar a direção deste gradiente da seguinte
forma: os estômatos presentes nas folhas abrem-se
criando um potencial negativo que deslocará o fluxo
de água das raízes para as folhas, pois o v das raízes é
menos negativo. Quando esta água desloca-se leva
consigo os nutrientes armazenados na raiz.
Vários fatores estão influenciando este
potencial de água como podemos ver na fórmula
descrita abaixo:
v= p + m,
onde v=potencial osmótico; m=potencial de matriz e
p=potencial de pressão. O potencial osmótico está
relacionado à quantidade de soluto e o aumento deste
diminui o potencial de água. O potencial de matriz
está relacionado à permeabilidade das paredes e o
aumento deste potencial diminui o potencial de água.
O potencial de pressão está relacionado à pressão dos
vasos e este aumenta o potencial de água. O objetivo
deste trabalho é comparar o potencial de água das
folhas de espécies lenhosas de diferentes grupos
funcionais do cerrado.
na câmara com o seu pecíolo de fora. Lacra-se esta
câmara e introduz-se um gás inerte (N2), o qual
aumenta a pressão da câmara. Quando sai uma gota
de água do pecíolo fecha-se o sistema e considera-se
estabelecido o equilíbrio entre as células da folha e a
seiva do xilema, admitindo-se que a pressão do gás
contrabalance exatamente o potencial de água das
células da folha. A unidade de pressão utilizado foi o
bar.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os resultados obtidos na câmara de pressão
estão reunidos na tabela 2. Os resultados
apresentados na tabela 1 mostram que obtivemos
diferenças apenas nas espécies que são justamente as
espécies coletadas antes de uma chuva.
MATERIAL E MÉTODOS
Este trabalho foi realizado numa área de
cerrado localizada na Reserva Ecológica do
IBGE/DF, em dois horários distintos: 7:00 e 12:00. O
primeiro funciona como nosso "ponto zero", pois
imagina-se que nesse horário tanto folhas como
raízes estão no seu grau máximo de saturação. O
outro período mostraria a variação do v.
As espécies utilizadas e o grupo funcional
de cada uma estão descritas na tabela 1. Para cada
espécie foram utilizados 3 indivíduos e de cada um
foram retiradas 3 folhas. Estas folhas foram
colocadas num isopor com gelo para manutenção do
v.
Para medirmos o v utilizamos uma câmara
de pressão. O método consiste em colocar uma folha
11 Profª. Orientadora: Mercedes Bustamante
27
Tabela 1. Lista das espécies lenhosas estudadas e seus grupos funcionais (al= acumuladora de alumínio, n-al= não
acumuladora de alumínio).
grupo funcional
espécie
perene
al
Vochysia elliptica (Vochysiaceae)
n-al
Roupala montana (Proteaceae)
n-al
Ourateae hexasperma (Ochnaceae)
n-al
Styrax ferrugineus (Styracaceae)
n-al
Sclerolobium paniculatum (Leguminosae)
decídua
al
Qualea grandiflora (Vochysiaceae)
al
Qualea parviflora (Vochysiaceae)
n-al
Dalbergia violacea (Leguminosae)
n-al
Pterodon pubescens (Leguminosae)
Tabela 2. Potencial de água médio (bar) para as espécies estudadas.
ESPÉCIES
7:00
Vochysia elliptica*
-1,7 (0,3)
Roupala montana*
-3,0 (0,5)
Ourateae hexasperma*
-2,2 (0,6)
Styrax ferrugineus
-2,0 (0,0)
Sclerolobium paniculatum
-2,7 (0,3)
Qualea grandiflora
-1,3 (0,6)
Qualea parviflora*
-1,5 (0,5)
Dalbergia violacea
-1,2 (0,3)
Pterodon pubescens*
-2,2 (0,6)
* Espécies medidas antes da chuva.
14:00
-5,0 (2,7)
-14,0 (8,4)
-7,0 (4,8)
-2,3 (1,1)
-2,7 (0,6)
-2,0 (0,0)
-5,0 (1,0)
-4,1 (0,6)
-7,6 (5,8)
∆
3,3
11,0
4,8
0,3
0,0
0,7
3,5
0,9
5,7
28
COMPARAÇÃO DE MEDIDAS DE
TRANSPIRAÇÃO ENTRE PLANTAS
HEMIPARASITAS E SUAS HOSPEDEIRAS1
Flávia S. Pinto; Saulo M. A. Andrade; Guilherme H.
B. de Miranda.
INTRODUÇÃO
As
plantas
parasitas
apresentam
especializações
radiculares
(haustórios)
que
permitem a sua fixação em outras plantas
(hospedeiras), de onde retiram nutrientes e água. O
haustório retira seiva (bruta ou elaborada) do
hospedeiro para a planta parasita. Algumas parasitas
entretanto não perderam a capacidade de fazer
fotossíntese e são portanto chamadas de
hemiparasitas.
A condução de seiva é possível devido à
relação entre o potencial hídrico dentro dos vasos da
condução e o potencial hídrico do ar, em plantas não
submetidas a estresse hídrico. A diferença de
potencial hídrico entre esses dois sistemas possibilita
a condução da seiva dentro dos vasos da planta. Essa
diferença é obtida principalmente através da perda de
vapores d'água das folhas realizadas através dos
estômatos. A perda d'água por transpiração produz
um potencial hídrico negativo que permitiria a
condução da seiva da raiz para os sítios de
fotossíntese. Entretanto vários fatores afetam a
abertura estomática e consequentemente a taxa de
transpiração, com a concentração de CO2, estresse
hídrico e patógeno.
Como
se
comportariam
plantas
hemiparasitas neste sistema? Espera-se que plantas
para obterem seiva dos vasos condutores da
hospedeira deveriam criar um potencial hídrico
negativo maior do que o criado pela hospedeira,
através, principalmente, do aumento da transpiração
foliar. Espera-se, portanto, um aumento na
condutância das espécies hemiparasitas em
comparação com suas hospedeiras.
O objetivo deste trabalho é determinar
condutâncias
estomáticas:
(1)
se
plantas
hemiparasitas apresentam condutância maior do que
suas hospedeiras e (2) se plantas parasitas afetam o
comportamento fisiológico das hospedeiras.
Q. multifora foi Psittacanthus robustus e em K.
coriacea. foi Phthirusa ovata.
Medidas de condutânica (c), densidade de
fluxo de fóton fotossintéticos (PPFD) e temperatura
(T) foram feitas em cinco folhas, previamente
marcadas, para os seis indivíduos, com o auxílio de
um porômetro. As medidas foram tomadas de hora
em hora, no intervalo da 8:00 hs às 12:30 hs. Ao todo
cinco repetições foram feitas para cada planta
observada. Nas plantas parasitas as medidas foram
tomadas na porção abaxial e adaxial da folha, e para
as espécies hospedeiras apenas na porção abaxial,
devido à distribuição de estômatos.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Tanto Qualea multiflora quanto Kielmeyera
coriacea não parasitadas apresentaram valores de
condutância menores que plantas parasitadas da
mesma espécie (Fig. 1 e 2, respectivamente). Tais
resultados sugerem que plantas parasitadas
apresentam resposta fisiológica à presença de
parasitas.
As espécies parasitas também apresentaram
respostas às variações de aumento da condutância
com a variação da PPFD. Isto é mais marcante em
Phthirusa ovata (Fig. 4 e 5). As espécies parasitas
apresentaram taxas de transpiração maiores que as
espécies hospedeiras parasitadas ou não (Fig. 1 e 2)
indicando que tais plantas utilizariam em parte a
diferença de condutância na formação de uma
pressão hidrostática positiva que permitiria a
obtenção de seiva da planta hospedeira. Entretanto
nos horários da manhã em que a PPFD era baixa o
mesmo padrão não foi observado, indicando, mais
uma vez, que a condutância destas espécies parasitas
é afetada pelo grau de insolação na planta.
MATERIAL E MÉTODOS
Foram estudados dois indivíduos de
Kielmeyera coriacea e dois de Qualea multifora com
e sem plantas parasitas em um cerrado da Reserva do
IBGE (Brasília D.F). A planta parasita encontrada em
1 Prof. Orientador: Fábio Scarano
29
2500
2000
800
Psittacanthus robustus
Qualea parviflora
(parasitada)
Qualea paarviflora (não
parasitada)
700
600
500
1500
400
300
1000
Psittacanthus robustus
200
500
100
Qualea paarviflora (não
parasitada)
0
0
8:00
Qualea parviflora
(parasitada)
9:00
10:00
11:00
8:00
12:00
9:00
TEMPO (hora)
1400
Phithirusa ovata
Kielmeyera coriaceae
(parasitada)
1200
Kielmeyera coriaceae
(não parasitada)
1000
11:00
12:00
700
600
500
400
800
300
600
Phithirusa ovata
200
400
Kielmeyera coriaceae
(parasitada)
100
200
Kielmeyera coriaceae
(não parasitada)
0
0
8:30
10:00
TEMPO (hora)
9:30
10:30
TEMPO (hora)
11:30
12:30
8:30
9:30
10:30
11:30
12:30
TEMPO (hora)
FIGURA 1. PPFD e condutância estomática em Qualea parviflora parasitada e não parasitada por Psithacanthus
robustus.
FIGURA 2. PPFD e condutância estomática de Kielmeyera coriacea parasitada e não parasitada por Phitirusa
ovata.
30
RELAÇÃO ENTRE CARACTERÍSTICAS
FOLIARES E HERBIVORIA EM ESPÉCIES
LENHOSAS DE MATA E DE CERRADO13
Delano M. S. da Silva; Everton A. dos Santos;
Rosane G. Colevatti.
INTRODUÇÃO
As
características
fenotípicas
dos
organismos servem, geralmente, como indicadores do
tipo de habitat que eles ocupam, bem como podem
fornecer evidências do tipo de nicho ocupado por
esses mesmos organismos. Nas plantas, o tipo de
folha e outras características como cor, dureza,
pilosidade, presença ou ausência de látex, entre
outros, são importantes para proteção contra a
herbívoros.
Neste trabalho, procuramos investigar as
características foliares presentes em espécies
lenhosas de cerrado e de mata, com o objetivo de
correlacionar algumas características das folhas com
a presença de herbivoria. Analisamos principalmente
a relação entre a dureza foliar e a incidência de
herbivoria.
MATERIAIS E MÉTODOS
Este trabalho foi realizado na reserva
ecológica do IBGE, em Brasília, em duas áreas
distintas: uma de cerrado, outra de mata. Em cada
uma das áreas, traçamos uma linha de 50 m de
comprimento. Ao longo de cada linha, coletamos 30
espécies de plantas lenhosas com altura média de 2m.
De cada espécie, amostramos 25 folhas e verificamos
a ocorrência ou não de sinais de herbivoria
produzidos por galhadores, minadores, mastigadores
ou sugadores e, em seguida, anotamos o número de
folhas afetadas em cada espécie. Paralelamente,
retiramos 3 folhas de cada espécie, para medidas de
dureza foliar. As medidas foram realizadas com um
perfurômetro.
Na figura 2, podemos observar o grau de
dureza foliar das espécies de cerrado e de mata,
projetados contra a percentagem de folhas afetadas
por herbívoros. Neste gráfico, notamos que as
espécies de mata estão concentradas principalmente
nas menores classes de dureza, enquanto as de
cerrado estão distribuídas em todas as classes de
dureza, com a maioria das espécies colocadas nos
grupos de maior dureza. Ainda na figura 2,
constatamos que existem tanto espécies de cerrado
com alta dureza e baixa herbivoria, quanto espécies
de mata com baixa dureza e baixíssima taxa de
herbivoria.
Guapira noxia possui um grau de dureza
relativamente alto, e uma taxa de herbivoria
altíssima. Além destes dois exemplos, Vochysia
elliptica, que é uma espécie encontrada no cerrado,
apresenta um grau de dureza relativamente alto, e
uma taxa de herbivoria quase nula. O cerrado
apresentou uma dureza ( x =4,86) maior do que a
mata de galeria ( x =0,82), estas diferenças foram
significativas (t=7,01; p<0,001)
A partir dos resultados obtidos, podemos
concluir que: (1) as espécies de cerrado geralmente
apresentam um grau de dureza foliar maior que o das
plantas de mata; (2) Parece que não há relação
significativa entre a dureza foliar e a taxa de
herbivoria, nem nas espécies de cerrado, nem nas de
mata.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os dados relacionados à dureza foliar das
espécies lenhosas de cerrado e de mata estão
representados na figura 1. Neste gráfico, podemos
observar que as folhas da maioria das espécies de
mata são moles (tenras), ao passo que as das espécies
de cerrado são duras. Estes resultados sugerem que as
plantas de cerrado são geralmente esclerotizadas, a
fim de protegê-las contra perdas de água. Por outro
lado, as espécies de mata apresentam folhas mais
finas, pois nesse tipo de ambiente a umidade é maior
que a do cerrado. Portanto, o risco de perder água é
bem menor nas plantas da mata do que no cerrado.
13 Prof. Orientador: John Du Vall Hay
31
20
CERRADO
MATA DE GALERIA
18
16
14
12
10
8
6
4
2
0
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
CLASSES DE DUREZA
FIGURA 1. Distribuição das folhas por classes de durezas em plantas de cerrado e mata de galeria.
100
MATA DE GALERIA
CERRADO
90
80
70
60
50
40
30
20
10
0
0
5
10
15
DUREZA FOLIAR
FIGURA 2. Relação entre dureza foliar e a porcentagem de herbivoria em espécies lenhosas de cerrado e mata de
galeria.
32
DISTRIBUIÇÃO DE PLANTAS PARASITAS
SOBRE PLANTAS HOSPEDEIRAS NA
RESERVA ECOLÓGICA DO IBGE (BRASÍLIA,
D.F)14
Carlos A. Bianchi; Felipe A. P. L. Costa; Terezinha
A. B. Dias.
INTRODUÇÃO
Plantas hemi-parasitas ocorrem nas plantas
do Cerrado. A infecção das plantas hospedeiras
ocorre quando uma semente da planta hemi-parasita é
nela depositada e se estabelece. Como a dispersão de
Phthiruza ovata e Psittacanthus sp é ornitocórica, é
de se supor que plantas hospedeiras que também
tenham este tipo de dispersão, sejam mais infectadas
por estas hemi-parasitas devido à maior visitação por
pássaros. Também quando estabelecido um
parâmetro mínimo de altura das plantas hospedeiras,
aquelas mais abundantes em determinada área seriam
mais infectadas. Além disso poderia se supor que a
ocorrência de plantas hemi-parasitas estaria mais
concentrada em plantas hospedeiras mais altas do que
baixas, uma vez que os pássaros evitariam o solo por
pressão da predação. Com o objetivo de levantar
dados que corroborassem as hipóteses anteriormente
descritas realizou-se um levantamento das espécies
vegetais presentes e das plantas hemi-parasitas
associadas em uma área de cerrado da Reserva
Ecológica do IBGE (Brasília, D.F).
Considerando-se todas as 56 espécies
(parasitadas e não-parasitadas), existe uma relação
significativa entre o número de plantas encontradas e
o número com hemi-parasitas. (Fig. 1). Quando as
plantas não infectadas são excluídas da análise, a
correlação é maior (r=0,57; p < 0,005; N=17). O
número de plantas parasitadas por classe de altura é
apresentado na Tabela 2. Utilizando apenas as duas
primeiras classes de altura não houve diferença
significativa (
χ
2
=0,99; p>0,05; GL=1).
MATERIAL E MÉTODOS
Percorremos ao longo de uma trilha, cerca
de 180m, amostrando plantas com altura superior a
1,0m que estavam até 5 m de cada lado desta trilha.
Estas plantas foram identificadas botânicamente no
campo e posteriormente classificadas pelo tipo de
dispersão de frutos. A altura delas foi estimada,
anotando-se a presença ou ausência e o número de
hemi-parasitas em cada planta hospedeira. Para as
análises estatísticas, nós utilizamos o teste do quiquadrado e análise de regressão pelo método dos
mínimos quadrados.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Foram amostradas 407 plantas de 61
espécies. Comparou-se o número de plantas com e
sem parasitas de dispersão ornitocórica com plantas
dispersas por outros agentes (Tab. 1) e verificamos
que a diferença não foi significativa. Este resultado
indica que plantas de dispersão ornitocórica não estão
necessariamente mais infectadas por plantas hemiparasitas do que plantas que possuem outro tipo de
dispersão.
14 Prof. Orientador: Raimundo P. B. Henriques
33
10
8
6
4
2
0
0
10
20
30
40
NÚMERO DE PLANTAS
FIGURA 1. Número de plantas infectadas em relação ao número total de plantas de cada espécie. Cada ponto se
refere a uma espécie, existem pontos superpostos. r=0,42; p=0,001; N=56.
10
8
6
4
2
0
0
10
20
30
40
NÚMERO DE PLANTAS
FIGURA 2. Número de plantas infectadas em função do número total de plantas de cada espécie. Existem pontos
superpostos. r=0,57; p=0,02; N=17.
Tabela 1. Número de plantas com e sem parasita e tipo de dispersor da semente.
tipo de dispersão
com parasitas
sem parasitas
pássaros
25 (22,9)
249 (251,1)
não pássaros
9 (11,1)
124 (121,9)
total
34
373
χ
2
total
274
133
407
=0,062; P > 0,05; GL=1
Tabela 2. Frequência de parasitas em plantas de diferentes classes de altura.
altura (m)
com parasitas
sem parasitas
1,00 - 3,99
308
25
4,00 - 6,99
56
7
> 7,00
11
0
total
375
32
total
333
63
11
407
34
ESTRUTURA POPULACIONAL DE
Pseudobombax longifolium (BOMBACACEA).
DISTRIBUIÇÃO ETÁRIA E TABELA DE
VIDA15
Delano M. S. da Silva; Everton A. dos Santos;
Rosane G. Colevatti.
INTRODUÇÃO
O cerrado apresenta duas estações bem
definidas, que podem ser caracterizadas pela
precipitação: uma estação chuvosa, que ocorre entre
os meses de outubro a abril, e uma estação seca que
ocorre entre maio a setembro. Muitas das espécies
desse ambiente desenvolveram um padrão de
crescimento relacionado a esse padrão sazonal de
chuvas e, portanto, de disponibilidade de água: uma
estação de crescimento, na época chuvosa e uma
estação onde há perda das folhas e o crescimento é
interrompido.
Algumas das espécies que apresentam este
tipo de estratégia de crescimento apresentam uma
diferenciação nos caules e ramos, com a presença de
nós ou cicatrizes correspondentes à queda das folhas
e parada no crescimento. Cada entre-nó tem a idade
de um ano (do início da estação chuvosa ao fim).
Dessa forma pela contagem do número de entre-nós
podemos calcular a idade de uma planta. A partir
desses dados é possível determinar a distribuição
etária da população, obter uma Tabela de Vida
Estática e traçar curvas de sobrevivência. Esses dados
nos dão uma idéia da estrutura da população
indicando, além do padrão de mortalidade nas faixas
etárias, aspectos da dinâmica populacional
relacionados ao recrutamento de indivíduos.
Pseudobombax longifolium (Bombacaceae)
é uma das espécies do cerrado que apresenta o padrão
de crescimento sazonal, com diferenciação dos
módulos de crescimento de cada estação de
crescimento
(estação
chuvosa).
Ocorre,
preferencialmente, próximo às matas de galeria.
Assim, os objetivos do nosso trabalho foram
determinar a distribuição etária de uma população de
P. longifolium, obter a Tabela de Vida Estática e
traçar a curva de sobrevivência.
MATERIAL E MÉTODOS
Em uma área de 10.400 m2 (1,04 ha) foram
registrados todos os indivíduos de P. longifolium,
medindo-se a circunferência na base do caule,
próximo ao solo. Nos indivíduos em que era possível
contar o número de módulos de cada estação a idade
era determinada. Foi possível determinar através das
15 Prof. Orientador: Raimundo P. B. Henriques
marcas de carvão deixadas nas plantas depois da
última queimada na área (1994), que cada módulo
cresce apenas uma vez por ano.
Com os dados de circunferência e idade
desses indivíduos foi feita uma Regressão Linear
Simples, para estimar a idade daqueles indivíduos
cuja contagem de módulos não foi possível,
utilizando o modelo: y=a + bx onde "y"= idade em
anos, e "x"= circunferência, em centímetros, na base
do caule. Com a estimativa da idade dos indivíduos,
estes foram agrupados em classes de idade, para
obtenção da Tabela de Vida Estática da população.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Foram encontrados 119 indivíduos na área,
resultando em uma densidade de aproximadamente
114 indivíduos/ha. A Figura 1 mostra a relação entre
a circunferência na base do tronco e a idade dos
indivíduos, além da reta de regressão obtida. A partir
da equação de regressão (y=- 6,6985 + 0,91332x) foi
obtida a idade de todos indivíduos da população,
cujos módulos não foi possível contar.
A maioria dos indivíduos estão concentrados
nas classes etárias 0 - 19 anos. Esse resultado sugere
que a população está se regenerando localmente,
recrutando indivíduos jovens.
A Tabela 1 apresenta a Tabela de Vida
Estática da população que mostra a curva de
sobrevivência mostrada na Figura 3, sugere um
padrão intermediário entre as curvas do Tipo II e
Tipo III. Nas curvas de sobrevivência do Tipo II, a
taxa de mortalidade é constante nas classes etárias
(padrão comum para mortalidade de sementes), já no
tipo III a taxa de mortalidade é alta nas faixas etárias
mais baixas, caindo rapidamente e se estabilizando
para as faixas etárias maiores.
50
40
30
20
10
0
0
10
20
30
40
50
CIRCUNFERÊNCIA (cm)
FIGURA 1. Relação entre a circunferência na base
do tronco e idade em indivíduos de Pseudobombax
35
longiflorum em uma área de cerrado. O ponto aberto
no gráfico não foi incluído nas análises. Equação de
regressão: Y=0,91X - 6,69; r=0,84; p<0,001; N=25.
50
40
30
20
10
0
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
CLASSES DE IDADE
FIGURA 2. Distribuição de idades de uma população de Pseudobombax longiflorum em uma área de cerrado.
Classes de idade: 1: 0-9; 2: 9-19,4; 3: 19,4-29,7; ...; 11: 101,7-112,0 (veja Tabela 1).
1
0,1
0,01
0,001
0
20
40
60
80
100
120
IDADE (ANOS)
FIGURA 3. Curva de sobrevivência para uma população de Pseudobombax longiflorum em área de cerrado.
Tabela 1. Tabela de vida estática para uma população de Pseudobombax longiflorum em uma área de cerrado.
idade (anos)
meio da classe
indivíduos
sobreviventes
taxa de sobrevivência
(anos)
0-9
4,5
44
119
1,00
9-19,4
14,2
48
75
0,63
19,4-29,7
24,5
15
27
0,23
29,7-39,9
34,8
04
12
0,10
39,9-50,3
45,1
03
08
0,07
50,3-60,6
55,4
01
05
0,04
60,6-70,9
65,7
01
04
0,03
70,9-81,1
75,9
00
03
0,03
81,1-91,4
86,2
01
03
0,03
91,4-101,7
96,6
01
02
0,02
101,7-112,0
106,9
01
01
0,01
36
TAXA DE OCORRÊNCIA DE ESPÉCIES
LENHOSAS COM NECTÁRIOS
EXTRAFLORAIS EM CERRADO16
Flávia S. Pinto; Guilherme H. B. de Miranda; Saulo
M. A. Andrade.
INTRODUÇÃO
Os nectários extraflorais (NEF) são
estruturas presentes em diversas espécies de plantas,
sendo responsáveis pela liberação de dissacarídeos
excedentes que atraem insetos nectarívoros, em
especial formigas. Estes insetos podem desempenhar
um papel de proteção da planta hospedeira contra
seus inimigos naturais, aumentando a aptidão das
plantas com NEF o que resulta em uma interação
mutualística "frouxa".
Diversos estudos mostram a existência de
uma alta correlação negativa da frequência de NEF e
formigas (diversidade, dominância e taxa de
predação) e a latitude ou altitude. Neste projeto,
foram obtidos, as frequências de espécies e de
indivíduos lenhosos com NEF em uma área de
cerrado da Reserva Ecológica do IBGE e
comparando com dados publicados sobre áreas de
cerrado vizinhas (Jardim Botânico e Fazenda Água
Limpa).
Na Tabela 2, estão listadas as 14 espécies
com NEF e a posição dessas estruturas nestas
espécies. A maior parte dos NEF (108ind/5spp)
ocorre nas folhas. Em menor escala, ocorrem em
ramos (35 ind/3spp), tricomas glandulares
(13ind/25spp), estípulas (12ind/1sp), sépalas
(8ind/1sp) e ráquis (6ind/2spp). Duas espécies com
NEF nas folhas Rapanea guianensis e Banisteriopsis
sp respondem por mais de 50% dos indivíduos com
NEF e por quase 20% do total de indivíduos
amostrados (Tab. 2).
A porcentagem das espécies com NEF em
folhas e estruturas associadas alcança cerca de 70%
(127). Este valor pode ser resultante do alto valor
adaptativo decorrente da presença dos NEF mais
perto ou na própria folha, aumentando a proteção
desta contra herbívoros.
Algumas das espécies arbóreas mais
abundantes do cerrado (Qualea parviflora, Qualea
grandiflora, Caryocar brasiliense) possuem NEF. Na
Tabela 3, uma síntese dos dados de frequência de
espécies com NEF e de abundância dessas espécies
para outras regiões é mostrada. Estes resultados
somados aos obtidos no presente trabalho
corroboram a hipótese do gradiente latitudinal
sugerindo que os NEF são mais importantes nos
trópicos.
MATERIAL E MÉTODOS
Para o levantamento das espécies lenhosas
com mais de um metro de altura, foi percorrido um
trecho de cerrado denso no sudeste da Reserva
Ecológica do IBGE. Neste trecho, foram
identificados, a nível de espécie, os 500 primeiros
indivíduos lenhosos ao longo de uma linha. Foram
incluídas plantas a uma distância máxima da linha.
Exemplares de identificação duvidosa ou ignorada
tiveram amostras coletadas e foram posteriormente
identificadas em laboratório. Nas listas de espécies,
foram identificadas a espécies com NEF e contados
os números de indivíduos de cada espécie a fim de se
obter a frequência.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Foram identificadas 66 espécies lenhosas
para 500 indivíduos encontrados no cerrado. Cerca
de 21,2% das espécies (14) e 36,4% dos indivíduos
(182) possuem NEF (Tab. 1). Estes valores
assemelham-se aos valores calculados em outros
levantamentos florísticos do cerrado na APA do
Gama-Cabeça de Veado, em particular àqueles que
apresentam maior número de indivíduos. Eventuais
diferenças
metodológicas
de
diferentes
levantamentos de campo foram desconsiderados.
16 Prof. Orientador: Paulo S. Oliveira
37
Tabela 1. Porcentagem de espécies com nectários extraflorais (NEF) e suas abundâncias em diferentes áreas do
Distrito Federal.
FAL
JBB
IBGE/JBB
presente estudo
Nº de espécie
49
37
25 / 33
66
Nº de espécie c/ NEF (%)
16 (N=8)
19 (7)
20 (5) / 12 (4)
21 (14)
Nº de indivíduos
461
2010
80/80
500
Nº de indivíduos c/ NEF (%)
39 (181)
34 (686)
25 (20) / 20 (16)
36,4 (182)
fonte
Ratter (1986)
Azevedo et al.
Silva et al. com.
(1990)
pes.
FAL Fazenda Água Limpa; JBB Jardim Botânico de Brasília; IBGE Reserva Ecológica do IBGE
Tabela 2. Lista de espécies lenhosas com nectários extraflorais e a porcentagem de indivíduos amostrados.
espécies
local do NEF
% (no. de indivíduos)
Rapanea guianensis
folhas
28,6 (52)
Banisteriopsis sp
folhas
25,3 (46)
Qualea multiflora
ramos
13,2 (24)
Ouratea hexaspema
estípulas
6,6 (12)
Bauhinia sp 1
tricomas glandulares
6,0 (11)
Caryocar brasiliense
sépalas
4,4 (8)
Qualea parviflora
ramos
3,9 (5)
Jacaranda sp.
folhas
2,8 (5)
Qualea grandiflora
ramos
2,2 (4)
Stryphnodendron adstringens
ráquis
1,7 (3)
Enterolobium gomiferum
ráquis
1,7 (3)
Arrabidea sp.
folhas
1,7 (3)
Tabebuia ochracea
folhas
1,1 (2)
Bauhinia sp.2
tricomas glandulares
1,1 (2)
total
100(182)
Tabela 3. Porcentagem de espécies com NEF e suas abundâncias em diferentes regiões.
área
espécies com NEF
% de indivíduos com
fonte
NEF
Regiões Temperadas
5
14
Keeler, 1981
América Central
até 80
Bentley, 1977
Floresta de terra firme*
19
Morelatto & Oliveira, 1991
Canga*
50
Morelatto & Oliveira, 1991
Mato Grosso
25
30
Oliveira & Oliveira Filho, 1991
São Paulo
20
8-22
Oliveira & Leitão Filho, 1987
* Floresta Amazônica
38
A COEXISTÊNCIA DE ESPÉCIES
CONGENÉRICAS E SEU NICHO
MORFOLÓGICO17
Flávia S. Pinto; Guilherme H. B. de Miranda; Saulo
M. A. Andrade.
INTRODUÇÃO
Segundo a "Teoria de Competição", espécies
com nichos semelhantes não podem coexistir uma
vez que pode ocorrer exclusão competitiva com
extinção de uma das espécies. Espécies que são
ecologicamente parecidas, vivem juntas, logicamente
há uma diferenciação entre seus nichos. Assim podese assumir que entre espécies congenéricas a
competição é maior, já que são mais semelhantes
entre si do que com espécies de outros gêneros. Com
isso o objetivo do projeto foi verificar diferenças nas
existência do nicho morfógico de espécies
congenéricas de plantas em uma área de cerrado.
MATERIAL E MÉTODOS
Numa simplificação do nicho morfológico
das espécies, já que o nicho não é bidimensional mas
sim, multidimensional, tomou-se a relação área foliar
X comprimento foliar, como uma representação do
nicho das espécies congenéricas de plantas. E assim
comparar as diferenças entre estes nichos
morfológicos. Para isso, foram escolhidos 10
indivíduos de cada uma das espécies de Miconia,
Qualea e Byrsonima (Tab. 1) e coletadas 5 folhas de
cada indivíduo. Mediu-se então a largura e o
comprimento de cada folha e, utilizou-se a forma da
elipse para o cálculo da área foliar. Área de uma
elipse (Ae)=πab/4, onde a=largura da folha e
b=comprimento da folha.
diferenciação dos nichos foliares, uma vez que suas 3
espécies possuem o mesmo porte.
A separação do nicho foliar das espécies
pode ser que esteja, não no nicho foliar mas sim, em
outros nichos morfológicos das plantas como,
sistema radicular, arquitetura da copa, estratégia de
utilização dos nutrientes, etc. Outra explicação é a de
que constrangimentos filogenéticos, não permitem
grandes diferenças nos nichos foliares das espécies
estudadas.
Tabela 1. Espécies estudadas e suas formas de vida.
espécie
forma de vida
Byrsonima coccolobifolia
arbusto grosso
Byrsonima verbascifolia
arbusto grosso
Byrsonima crassa
arbusto grosso
Miconia ferruginata
arbusto grosso
Miconia phalax
arbusto fino
Miconia albicans
arbusto fino
Qualea parviflora
arbórea
Qualea grandiflora
arbórea
Qualea multiflora
arbórea
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A figura 1 mostra a relação do nicho para as
3 espécies de Miconia. O porte das espécies de M.
phalax e M. albicans é a mesma (Tab. 1), dessa
forma esperaria-se que o nicho morfológico fosse
mais "distante", já que possuem o mesmo porte, isto
é, para não possuírem o mesmo nicho as espécies
buscariam mudanças na área de suas folhas para uma
diferente aptidão de cada uma e consequente
diferenciação de seus nichos.
A mesma relação pode ser apresentada para
o gênero Qualea (Fig. 2), onde todas as espécies são
arbóreas (Tab. 1) e esperaria-se uma diferenciação de
seus nichos foliares (Fig. 2).
Para o gênero Byrsonima assumiu-se que o
resultado encontrado exemplificou melhor a
17 Prof. Orientador: Raimundo P. B. Henriques
39
500
Miconia albicans
Reta de regressão
Miconia fallax
Reta de regressão
Miconia
ferruginata
Reta de regressão
400
300
200
100
0
-3
2
7
12
17
22
27
COMPRIMENTO DA FOLHA (cn)
FIGURA 1. Relação entre área e comprimento de folhas de Miconia emárea de cerrado.
300
Qualea parviflora
Reta de regressão
Qualea multiflora
Reta de regressão
Qualea grandiflora
Reta de regressão
200
100
0
0
5
10
15
20
COMPRIMENTO DA FOLHA (cn)
FIGURA 2. Relação entre área e comprimento de folhas de Qualea em área de cerrado.
600
Byrsonima crassa
Reta de regressão
Byrsonima
coccolobifolia
Reta de regressão
Byrsonima
verbascifolia
Reta de regressão
500
400
300
200
100
0
0
5
10
15
20
25
COMPRIMENTO DA FOLHA (cn)
FIGURA 3. Relação entre área e comprimento de folhas de três espécies de Byrsonima em área de cerrado.
40
SIMILARIDADE FLORÍSTICA ENTRE
COMUNIDADES DE ESPÉCIES HERBÁCEAS
EM FITOFISIONOMIAS EQUIVALENTES18
Carlos A. Bianchi; Felipe A. P. L. Costa; Terezinha
A. B. Dias.
INTRODUÇÃO
Na vegetação dos Cerrados, muitas
formações
campestres
são
de
fisionomias
semelhantes, sugerindo um alto grau de similaridade
na composição específica. O objetivo desse trabalho
foi descrever e comparar a composição em espécies
herbáceas de três fisionomias campestres numa área
de Cerrado.
MATERIAL E MÉTODOS
O trabalho de campo foi desenvolvido em 3
áreas destro da Reserva Ecológica do IBGE (Brasília,
DF), a saber: campo limpo (CL), brejo (BR) e
"cascalheira"(CAS), (todas são de fisionomias
campestre, apresentando arbustos).
Para descrever a composição específica, nós
amostramos aleatoriamente 2 parcelas (1 x 1m) em
cada uma das 3 áreas. Ainda no campo, nós
identificamos e contamos o número de indivíduos de
cada espécie presente nas parcelas. Como índices de
similaridade entre 2 áreas, nós utilizamos os
seguintes índices de similaridade: (a) Jaccard (Sj):
Sj=a/a+b+c; (b) Sorensen (Ss): Ss=2a/2a+b+c; (c)
Czekanowski (Sc): Sc=2 min (xi, i)/ (xi+i); onde, a=
número de espécies comuns as 2 áreas; b e c =
número de espécies exclusivas nas áreas 1 e 2,
respectivamente; min (xi, i)=menor número de
indivíduos para as espécies encontradas nas 2
amostras; xi e i=número de indivíduos da espécie "i"
encontrados nas 2 áreas.
Além disso, nós comparamos a diversidade
específica das áreas, utilizando o índice de ShannonWiener (H'):
H'= - ∑pi ln pi ;
onde pi é a abundância relativa da espécies "i".
O número de indivíduos e espécies
encontradas variam entre as áreas, a saber: "CL"(153
indivíduos de 30 espécies); "BR" (39 de 7) e
"CAS"(58 de 16). Na verdade, a composição
específica de cada área foi virtualmente exclusiva,
com apenas 1 espécie ocorrendo no "CL" e na
"CAS".
Os valores obtidos para os índices de
similaridade entre "CL" e "CAS" são mostrados na
Tabela 1. O fato da única espécie em comum ter sido,
ao mesmo tempo, uma das mais abundantes, explica
o aumento obtido para Sc, quando comparado aos
outros índices. Deve-se notar que Sc mede a
similaridade entre amostras, levando em conta as
abundâncias relativas das espécies em comum.
Os índices de diversidade para as 3 áreas
estão mostrados na Tabela 2. A diferença nos valores
obtidos para "CL" e "CAS" parece resultar mais do
número de espécies do que da equitabilidade. Por
outro lado, o baixo valor obtido par "BR" se deve
tanto à sua pobreza específica como também à baixa
equitabilidade (mais de 50% dos indivíduos
pertenciam a uma única espécie).
Por fim, a Tabela 3 apresenta o número de
espécies "invasoras" encontradas. Curiosamente,
essas plantas só foram encontradas na "CAS", onde
chegam a compor mais de 60% do total de espécies.
Concluindo, nossos resultados indicam que
as Graminae dominam a paisagem das formações
campestres no Cerrado estudado, tanto pela riqueza
como pela abundância das espécies. Por sua vez, a
riqueza específica parece ser o resultado de que as
espécies se substituem ao longo de certos habitats
encontrados nos Cerrados.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Considerando todas as 6 parcelas
amostradas, contamos 250 indivíduos, pertencentes a
52 espécies de 17 famílias botânicas. O número de
espécies por família é mostrado na Figura 1, onde é
fácil notar a predominância das Graminae (ca. 31%
do
total).
Essa
predominância
aumenta
tremendamente quando comparamos as abundâncias
relativas (Fig. 1). Esses resultados sustentam nossa
impressão original de que as Graminae constituem o
principal componentes das formações campestres.
18 Prof. Orientador: Tarcisio S. Filgueiras
41
35
NÚMERO DE ESPÉCIES
30
NÚMERO DE INDIVÍDUOS
25
20
15
10
5
0
GRAMÍNEA
LEGUMINOSAE COMPOSITAE MELASTOMATACEA
OUTRAS 13
FAMÍLIAS
FIGURA 1. Número de espécies e indivíduos por famílias.
Tabela 1. Similaridade florística entre campo limpo e cascalheira.
índice de similaridade (%)
Jaccard
Sorensen
2,2
4,3
Tabela 2. Diversidade e equitabilidade em três tipos de vegetação no cerrado.
tipo de vegetação
campo limpo
brejo
diversidade
2,754
1,409
equitabilidade
0,810
0,724
Czekanowski
8,5
cascalheira
2,366
0,874
Tabela 3. Número de espécies nativas, invasoras e espécie dominante em relação ao total de espécies na área da
cascalheira.
número de espécies (%)
espécie dominante
% do total
nativas
6 (37,5)
Mesosetum lolliforme
17
invasoras
10 (62,5)
Vernonia ferruginata
7
total
16 (100,0)
42
PROJETOS
INDIVIDUAIS
43
PREDAÇÃO DE NINHOS ARTIFICIAIS NO
CERRADO: UMA COMPARAÇÃO ENTRE
DUAS FISIONOMIAS.
Carlos Abs Bianchi
RESUMO
A predação de ninhos em aves representa
um dos principais fatores de mortalidade para a
classe. Estudos com ninhos artificiais têm sido
utilizados para investigar padrões de predação em
diversos ambientes. Este trabalho investigou a
predação de ninhos artificiais em duas fisionomias de
Cerrado (sensu lato): mata de galeria e cerradão, na
Reserva Ecológica do Roncador (IBGE), Brasília,
DF; comparando taxas de predação, freqüência de
retirada de ovos e efeitos de borda. Os resultados
obtidos mostraram não haver diferenças nas taxas de
predação entre as duas fisionomias, entretanto, o
padrão de retirada entre mata e cerradão foi diferente,
na mata de galeria a taxa de predação atingiu o
máximo no segundo dia enquanto que no cerradão a
taxa de predação se mantave constante ao longo do
período de estudo. Os ovos colocados na borda da
mata foram estatisticamente mais predados do que
aqueles colocados no interior; porém, não houve
diferença entre borda e interior para o cerradão;
sugerindo que o efeito de borda é mais intenso na
mata de galeria.
INTRODUÇÃO
A predação representa uma importante
variável na determinação de diversas características
das comunidades; diversos estudos já foram
realizados em várias partes do mundo (Sih et al.
1985), enfocando a interação predador-presa. A
predação pode ser definida como qualquer interação
na qual ocorre fluxo de energia de um organismo
para outro ou, de uma forma mais simples, como o
consumo de um indivíduo (a presa) por outro (o
predador) (Begon 1990).
Predação de ninhos é a causa principal de
mortalidade em diversas espécies de aves (Cintra
1988; Martin 1987; Angelstam 1986; Gates e Gysel
1978) e certamente apresenta padrões variáveis de
intensidade entre espécies e entre áreas. A
intensidade da predação sobre os ninhos pode ser
influenciada por vários fatores, tais como, o sítio de
nidificação (Martin 1987), a fragmentação de
ambientes (Santos e Tellería 1992, Angelstam 1986),
ou ainda a densidade e atividade de predadores
(Gates e Gysel 1978; Ruxton e Gurney 1994).
A realização de experimentos utilizando
ninhos artificiais tem sido uma ferramenta bastante
importante para testar algumas predições em
ecologia; entretanto, segundo Martin (1987), os
ninhos artificiais são mais conspícuos em relação aos
naturais, porém menos predados, devido à imagem de
procura desenvolvida pelos predadores associada aos
ninhos naturais. Tal aspecto representa uma restrição
para comparações de taxas de predação obtidas por
este tipo de experimento com taxas de predação de
ninhos naturais.
Sih et al. (1985), em revisão sobre o tema,
afirmam não haver diferenças marcantes nos padrões
gerais de predação quando considerada a variação
latitudinal, entretanto a quantidade de estudos
comparativos ainda é pequena. Os estudos
comparativos de taxas de predação entre áreas mais
abertas e áreas de cobertura vegetal mais densa
revelam haver diferenças entre as duas, sendo mais
alta em áreas de formações florestais.
Os objetivos deste trabalho foram: (1)
comparar as taxas de predação entre duas formações
florestais do bioma Cerrado: mata de galeria e
cerradão (Ratter, 1991); (2) comparar a freqüência de
retirada e os padrões de predação para as duas
fisionomias (3) comparar as taxas de predação entre
dois subgrupos de ninhos: ninhos de borda e ninhos
de interior, em ambas as áreas, visando testar o efeito
de borda sobre a predação.
MATERIAL E MÉTODOS
O presente trabalho foi realizado na Reserva
Ecológica do Roncador - IBGE (15˚ 55’ 58” S e 47˚
51’ 02” W), Brasília-DF; no período de 12 a 15 de
março de 1996, durante o curso “Métodos em
Ecologia de Campo” do Programa de Pós-graduação
em Ecologia da Universidade de Brasília.
Foram selecionadas para o estudo uma área
de Mata de Galeria e uma área de Cerradão (Ratter
1991), distantes aproximadamente 2 quilômetros
entre si, onde foi estabelecido um gradeado para cada
área. Cada gradeado era formado por cinco linhas
compostas por sete pontos, e uma linha composta por
cinco pontos, totalizando 40 pontos por gradeado. A
distância entre as linhas e os pontos foi estabelecida
em 10 metros, a mesma fixada entre os pontos de
cada linha (Figura 1).
O gradeado foi dividido em dois subgrupos:
subgrupo “borda” e subgrupo “interior”. A primeira
linha de cada área foi estabelecida paralelamente a
estrada, a 5 metros de distância desta, no sentido
borda-interior e, as três primeiras linhas (A, B, C)
representaram o subgrupo “borda”, enquanto as
linhas subsequentes (D, E, F) representaram o
subgrupo “interior”.
Os ninhos artificiais foram confeccionados
manualmente com palha seca e, para cada ponto, foi
depositado no chão, um ninho com dois ovos de
codorna (Coturnix coturnix). Tendo em vista o
44
objetivo de apenas efetuar-se registros de predação,
sem testar a capacidade dos predadores em localizar
os ninhos, estes foram colocados nos pontos dos
gradeados sem qualquer camuflagem. Os ninhos
foram considerados predados quando o ninho e/ou
um ou ambos os ovos foram removidos. As revisões
aos ninhos eram feitas no turno da manhã, num
intervalo de 24 horas para as duas fisionomias.
Durante a revisão, eram registrados a ocorrência ou
não de ataque ao ninho, as coordenadas dentro do
gradeado dos ninhos atacados, o número de ovos
predados e a presença ou ausência de cascas e/ou a
distância destas (quando encontradas) dos ninhos
predados. Os ninhos atacados não tinham seus ovos
repostos, reduzindo desta forma, ao longo do tempo,
a disponibilidade de ovos nos sítios de estudo.
Para as análises dos resultados, foram
aplicados teste de qui-quadrado (χ2) para testar a
significância das taxas de predação de ovos em cada
fisionomia (mata e cerradão) e as taxas de predação
entre borda e interior, além das representações
gráficas dos valores de predação do experimento.
RESULTADOS
Foram predados 66 (41,25%) dos 160 ovos
utilizados no experimento, sendo 37 (23,12% do
total) na mata e 29 (18,13% do total) no cerradão. A
Figura 1 mostra os gradeados estabelecidos dentro de
cada fisionomia e o dia de predação dos ninhos.
As taxas de predação para a mata e o
cerradão corresponderam a 46,25% e 36,25%,
respectivamente, em relação ao total de ovos para
cada fisionomia. O número de ovos predados em
cada área é apresentado na Tabela 1, onde pode-se
verificar que não houve diferença significativa entre
áreas (χ2= 1,65; P= 0,1989; g.l.=1; n= 80).
A freqüência de retirada de ovos para a mata
foi bastante diferente daquela obtida para o cerradão.
A Figura 2 mostra que a taxa de predação foi
aproximadamente a mesma ao longo do estudo no
cerradão, contrastando com os valores obtidos para a
mata, onde verifica-se um pico no segundo dia do
experimento, diminuindo depois.
A predação em ambas as áreas, quanto ao
efeito de borda, apresentou resultados diferentes
(Tabela 2). Para a mata, houve diferença significativa
(χ2= 9,95; P= 0,0016; g.l.= 1; n= 40) entre os ninhos
predados na borda (n= 14) e os ninhos do interior (n=
5). No cerradão, o ataque aos ninhos da borda (n= 8)
foi semelhante ao ataque dos ninhos do interior (n=
6) (χ2= 0,80; P= 0,3702; g.l.= 1; n= 40).
Apenas um ninho na mata e três ninhos no
cerradão tiverem seus ovos predados em diferentes
dias do experimento. Os demais ninhos tiveram os
dois ovos predados num mesmo dia.
DISCUSSÃO
Os resultados obtidos neste experimento
mostram não haver diferença entre as taxas de
predação na mata de galeria e no cerradão. Santos e
Tellería (1992), encontraram valores diferentes para
predação entre um ambiente aberto (área de plantio
de fazenda) e um ambiente florestal. Entretanto,
Andrén et al. (1985) e Angelstam (1986) não
encontraram diferenças significativas entre ambientes
abertos contra ambientes fechados na Escandinávia.
Sugere-se que diferenças na densidade vegetal
estariam associadas a diferenças nas taxas de
predação, isto é, ambientes tipicamente florestais
sofreriam uma pressão de predação maior em relação
aos ambientes mais abertos, devido, entre outros
fatores, à maior diversidade. Embora neste estudo a
taxa de predação na mata de galeria tenha sido maior
que no cerradão a diferença não foi significativa. As
taxas de predação poderiam variar em um gradiente
de acordo com o aumento na densidade e diversidade
da vegetação de uma determinada área. A mata de
galeria representa um típico ambiente florestal, com
vegetação bastante densa. Dentre as fisionomias do
bioma cerrado (sensu lato), o cerradão é aquela com
características mais próximas de uma formação
florestal, podendo inclusive apresentar espécies de
plantas típicas de mata (Ratter 1991).
A freqüência de retirada dos ovos para cada
dia foi diferente entre as duas fisionomias (Figura 2),
tendo o cerradão apresentado uma taxa constante de
predação, quando comparado com aquele registrado
para a mata. A disposição dos ninhos neste
experimento (gradeados com ninhos distantes 10
metros entre si) foi diferente de outros estudos que
utilizaram ninhos artificiais. Santos e Tellería (1992)
utilizaram transectos com 30 metros de distância
mínima entre ninhos; Andrén et al. (1985) colocaram
transectos com distância mínima de 300 metros entre
ninhos e Angelstam (1986), utilizou transectos com
distância mínima de 500 metros. A disposição dos
ninhos em transectos pode diminuir as chances de
ataque por um mesmo predador, supondo-se que este
tenha uma área de vida radial. Ninhos dispostos em
gradeados, estão mais sujeitos à predação se a maior
parte do gradeado estiver dentro da área de vida de
um predador potencial. Logo, distâncias maiores
entre os ninhos e a disposição destes em transectos,
diminuiriam relativamente as chances de ataque por
um mesmo indivíduo. O pico de predação registrado
para a mata no segundo dia (Figura 2) pode ou não
representar a ação de um único predador, visto que os
ninhos atacados neste dia estão próximos entre si
(Figura 1); entretanto, não existem evidências
maiores que comprovem este fato.
As taxas de predação (Tabela 2)
correspondentes aos subgrupos “borda” e “interior”
foram significativamente diferentes apenas na mata,
45
enquanto no cerradão, o ataque aos ninhos do
primeiro subgrupo não diferiram do segundo. O
resultado obtido para a mata não difere dos dados
existentes na literatura. Santos e Tellería (1992)
encontraram maior incidência de predação em ninhos
colocados na borda, assim como Angelstam (1986) e
Andrén et al. (1985). Este diferente resultado obtido
entre mata e cerradão sugere que o efeito de borda
pode ser mais intenso na mata do que no cerradão, e
pode estar relacionado a uma variação abrupta da
fisionomia da mata de galeria para o cerrado, o que
não ocorre no cerradão onde a variação é mais
gradual. Entretanto, outras variáveis devem ser
investigadas para melhor interpretação destes
resultados.
homogeneity. American Naturalist 144(3): 537541.
SANTOS, T. e TELLERÍA, J. L. 1992. Edge effects
on nest predation in Mediterranean fragmented
forests. Biological Conservation 60: 1-5.
SIH, A.; CROWLEY, P.; MCPEEK, M.;
PETRANKA, J. e STROHMEIER, K. 1985.
Predation, competition and prey communities: a
review of field experiments. Ann. Rev. Ecol.
Syst. 16: 269-311.
AGRADECIMENTOS
Gostaria de agradecer a H. C. Morais, J. D.
Hay e R. Colevatti pelas sugestões nas análises
estatísticas do manuscrito. A D. M. Silva pelo auxílio
nas análises estatísticas e pela leitura e sugestões ao
manuscrito. A Reserva Ecológica do Roncador
(IBGE) por fornecer apoio logístico ao curso
“Métodos em Ecologia de Campo”. A R. P. B.
Henriques por organizar o curso, pelas sugestões ao
trabalho e auxílio em algumas etapas do trabalho de
campo. A C. A. Moreira pela assistência na
elaboração do manuscrito. E aos colegas que
participaram do curso de campo, pelas inúmeras
horas de trabalho e descontração em conjunto.
BIBLIOGRAFIA
ANDRÉN, H.; ANGELSTAN, P.; LINDSTRÖM, E.
e WIDÉN, P. 1985. Differences in predation
pressure in relation to habitat fragmentation: an
experiment. Oikos 45(2): 273-277.
ANGELSTAM, P. 1986. Predation on groundnesting birds' nests in relation to predator
densities and habitat edge. Oikos 47(3): 365-373.
BEGON, M.; TOWSEND, J. L. e HARPER, C. R.
1990. Ecology. Individuals, Populations and
Communities. 2nd edition, Blackwell Science
Inc. New York, USA.
CINTRA, R. 1988. Reproductive Ecology of the
Ruddy Ground-Dove on the Central Plateau of
Brazil. Wilson Bulletin 100(3): 443-457.
GATES, J. E. e GYSEL, L. W. 1978. Avian nest
dispersion and fledging success in field-forest.
Ecology 59(5): 871-883.
MARTIN, T. E. 1987. Artificial nest experiments:
effects of the nest appearance and type of
predator. Condor 89: 925-928.
RATTER, J. A. 1991. Guia para a vegetação da
Fazenda Água Limpa. (Brasília, DF). Editora da
Universidade de Brasília, Brasília, DF.
RUXTON, G.D. e GURNEY, W.S.C. 1994. Deriving
the functional response without assuming
46
CERRADÃO
7
MATA
7
6
6
5
5
4
4
3
3
2
2
1
A
B
C
D
E
F
1
A
B
C
D
E
F
LEGENDA
PREDAÇÃO NO 1° DIA
PREDAÇÃO NO 2° DIA
PREDAÇÃO NO 3° DIA
PREDAÇÃO NO 4° DIA
NINHOS NÃO-PREDADOS
Figura 1. Mapa das áreas de estudo com a representação dos gradeados e data de predação dos ninhos depositados
para o estudo realizado na Reserva Ecológica do Roncador (IBGE), Brasília, DF (letras= colunas; números= linhas).
Tabela 1. Comparação do número total de ovos predados e não-predados entre a mata de galeria e o cerradão na
Reserva Ecológica do Roncador (IBGE), Brasília-DF.
Categoria
Mata de Galeria
Cerradão
Total
Predados
37
29
66
Não-predados
43
51
94
Total
80
80
160
(χ2= 1.65; P= 0.1989; n= 80)
Tabela 2. Comparação de predação dos ninhos nos subgrupos “borda” e “interior” nas duas áreas de estudo na
Reserva Ecológica do Roncador (IBGE), Brasília, DF.
Categoria
Mata de Galeria
Cerradão
Borda
Interior
Borda
Interior
Predados
14
5
8
6
Não-predados
5
16
11
15
(mata): (χ2= 9,95; P= 0,0016; g.l.= 1; n= 40)
(cerradão): (χ2= 0,80; P= 0,3702; g.l.= 1; n= 40)
47
35
MATA
30
CERRADÃO
25
20
15
10
5
0
1
2
3
4
Tempo (dias
Figura 2. Número de ovos predados na mata e no cerradão para os quatro dias do experimento na Reserva Ecológica
do Roncador (IBGE), Brasília, DF.
48
DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL DE QUALEA
GRANDIFLORA MART. (VOCHYSIACEAE) EM UM
CERRADO DE BRASÍLIA, DF.
Delano Moody Simões da Silva
RESUMO
Este estudo tem como objetivo comparar o
padrão de distribuição espacial de Q. grandiflora em
duas áreas de cerrado sensu stricto, sendo uma
protegida contra o fogo a aproximadamente 20 anos e
a outra sofendo queimadas bienais desde 1989,
localizadas na Reserva Ecológica do IBGE, BrasíliaDF. Foram encontrados 75 indivíduos de Q.
grandiflora na área de cerrado protegida e 19 na
outra área. Em ambas as áreas o padrão foi agrupado,
indicando que o fogo não altera o padrão de
distribuição. A distribuição das freqüências de
circunferência do fuste para as duas áreas, não difere
estatisticamente, porém na área protegida indivíduos
com menos de 11 cm de circunferência foram mais
freqüentes, talvez indicando um maior recrutamento
nesta área.
INTRODUÇÃO
A maioria dos estudos fitossociológicos
realizados no cerrado tiveram como principais
objetivos determinar a riqueza e a densidade das
espécies vegetais de uma determinada área. Os
poucos estudos realizados sobre o padrão de
distribuição espacial de árvores do cerrado
geralmente dão maior ênfase ao padrão do conjunto
de árvores de uma comunidade e não ao padrão de
cada população presente na comunidade (Meirelles &
Luiz, 1995). Poucos estudos foram realizados com
ênfase na população (Oliveira et al., 1989).
Indivíduos de populações vegetais podem
estar distribuídos no espaço de três maneiras: regular,
aleatório e agregado. O padrão de distribuição
regular é o menos encontrado na natureza (Kershaw,
1958), sendo o agregado o mais comum (Kershaw,
1958; Hubbell, 1979; Gerig-Smith, 1979; San Jose et
al., 1991; Silberbauer-Gottsberger & Eiten, 1987,
Oliveira et al., !989). Segundo Kershaw (1959) o
padrão de distribuição de uma dada população pode
ser atribuído à vários fatores, como:
1.Características da espécie: crescimento vegetativo
ou o modo de dispersão de suas sementes;
2.Sociológicos: interação animal-planta ou plantaplanta;
3.Fisiográficos:
ambientes
em
mosaico
(microhabitat).
O fogo é um fator de perturbação importante
para o cerrado (Coutinho, 1979), sendo que o modo
como ele afeta o cerrado tanto ao nível de populações
como de comunidades vegetais ainda não é bem
conhecido. Dessa forma pouco se sabe sobre a
influência do fogo na distribuição espacial de
espécies vegetais no cerrado.
Os objetivos deste trabalho são (1)
identificar e comparar o padrão de distribuição
espacial de Qualea grandiflora em duas áreas de
cerrado com diferentes regimes de queimada; (2) e
comparar a estrutura destas duas populações.
MATERIAL E MÉTODOS
Este trabalho foi realizado na Reserva
Ecológica do IBGE (15˚ 55’ 58” S e 47˚ 51’ 02” W),
Brasília-DF, durante a disciplina “Métodos em
Ecologia de Campo” pelo curso de Pós-graduação em
Ecologia da Universidade de Brasília no período de
11 a 14 de março de 1996. Foram utilizadas duas área
adjacentes de cerrado sensu stricto (Coutinho, 1978;
Ratter, 1991) com dois históricos de queimada
diferentes. Uma das áreas é queimada de dois em
dois anos desde 1989, enquanto a outra foi queimada
uma única vez através de uma queimada acidental em
outubro de 1994, depois de 20 anos de proteção
contra o fogo. Ao longo deste trabalho nós
chamaremos a primeira área de cerrado bienal e a
segunda de cerrado controle. Qualea grandiflora
Mart. (Vochysiaceae) é uma espécie de hábito
arbóreo-arbustivo comum nos cerrados de Brasília
(Ratter, 1991), possuindo uma ampla distribuição
geográfica (Ratter & Dargie, 1990). Perde suas folhas
uma vez por ano no final da estação seca (Morais et
al., 1995), iniciando em seguida a brotação foliar e
floral (Barbosa, 1983).
Dentre os diversos métodos de amostragem
e índices que podem ser usados para detectarmos o
padrões de distribuição espacial e a densidade de
plantas (Brower et al., 1989), optou-se por utilizar a
amostragem por parcelas, com diferentes dimensões,
pois no caso de uma espécies de padrão agregado o
tamanho da unidade amostral que conseguirá detectar
o tipo de padrão espacial é influenciado pelo tamanho
do grupo de indivíduos (Meirelles & Luiz, 1995). Foi
demarcada uma área de 80x80m, tanto no cerrado
bienal quanto no controle, dividida em 64 parcelas de
10x10m. Dentro de cada parcela foi contado o
número total de indivíduos de Q. grandiflora e
medida a circunferência do fuste ao nível do solo de
cada indivíduo.
Para detectarmos o grau de agrupamento ou
a distribuição espacial de Q. grandiflora utilizamos
dois índices (Brower et al., 1989): Morisita(Id) e o
coeficiente de dispersão (CD). Para o índice de
Morisita, se Id= 1,0 a distribuição é aleatória; se Id=
49
0 a distribuição é uniforme e se Id >1,0 a distribuição
tende a ser agrupada. O coeficiente de dispersão é
calculado através da razão da variância sobre a
média. Se CD < 1 então a população é uniforme; se
CD > 1 a população é agrupada e se CD= 1 a
população é aleatória. A significância de ambos os
testes é testada através de um teste qui-quadrado (χ2)
(Brower et al., 1989). Além do índice de Morisita e
do coeficiente de dispersão, analisamos graficamente
os padrões de agrupamento pelo método descrito por
Goldsmith & Harrisson (1976), que possibilita
visualizar melhor em que escala e em qual
intensidade está ocorrendo o agrupamento, através da
análise da variância do número de indivíduos que
ocorrem em diferentes tamanhos de parcelas. A
utilização de mais de um índice ou método indica
com melhor segurança o padrão a ser aceito (Usher,
1975).
RESULTADOS
Foram encontrados 75 indivíduos de Q.
grandiflora no cerrado controle e 19 no cerrado
bienal. A figura 1 mostra um croqui das áreas
marcadas com o número de indivíduos encontrados
em cada parcela para as duas áreas. Analisando desta
forma parece que no cerrado controle a distribuição
tende a ser homogênea, enquanto no cerrado bienal
parece ser agrupada, porém é necessário se testar se
isto é verdade e em que tamanho de parcela isto está
ocorrendo.
A Tabela 1 resume os resultados
encontrados para o índice de Morisita (Id) para três
tamanhos de parcelas (10x10, 20x20 e 40x40) com os
seus respectivos χ2. No caso do cerrado controle só
no primeiro tamanho não detectou-se o padrão
agrupado, enquanto no cerrado bienal em todos os
tamanhos foi detectado este padrão. Este mesmo
resultado foi encontrado para o coeficiente de
dispersão (Tab. 2).
A figura 2 mostra através da variância
encontrada em cada unidade de amostragem onde
ocorrem os agrupamentos e em que intensidade eles
ocorrem. Em ambas as áreas os indivíduos tendem a
ser agrupados, sendo que no cerrado controle os
picos ocorrem nos tamanhos de parcelas 4 e 16
(20x20m e 40x40m) e no cerrado bienal ocorrem
picos nos tamanhos 8 e 32 (40x20m e 80x40m).
As distribuições de circunferência de fuste
encontradas nas duas áreas estão resumidas na figura
3. Não existe uma diferença significativa entre essas
duas distribuições (Komogorov-Smirnov= 0,09; p=
1,0). É importante salientar que a divisão das classes
foi feita de maneira arbitrária e não biológica. Isso se
deve ao fato de que no cerrado controle a maioria dos
indivíduos estavam rebrotando com vários ramos da
base (observ. pess.) e isto mascara a circunferência
real de indivíduos com mais de 10 cm de
circunferência (< 10 cm= plântula ou jovem).
Levando este fato em consideração podemos notar
que no cerrado controle indivíduos com
circunferência inferior a 11 cm são mais freqüentes.
Isto pode indicar um maior recrutamento nesta área
quando comparada ao cerrado bienal (Fig. 3). Além
disso, se as rebrotas estão ocorrendo principalmente
na base, como foi dito acima, uma maior
circunferência pode indicar um maior número
rebrotas na base no cerrado controle, mas este dado
não foi quantificado. Porém se isso for uma verdade
pode explicar as maiores circunferências encontradas
nesta área.
DISCUSSÃO
Os dados aqui apresentados sobre a
distribuição espacial de Q. grandiflora, não diferem
dos dados encontrados na literatura. Meirelles & Luiz
(1995) estudando várias espécies de árvores do
cerrado encontraram 65 indivíduos de Q. grandiflora
em uma área de 100x100m com um padrão de
distribuição agregado. Gottsberger & SilberbauerGottsberger (1983), também em um hectare,
encontraram 183 indivíduos de Q. grandiflora com
um padrão com alguns agrupamentos. Este padrão
agrupado segundo alguns autores não tem relação
com o modo de dispersão ou pelo menos este não é
tão determinante para o padrão (Gottsberger &
Silberbauer-Gottsberger, 1983; San Jose et al., 1991).
Talvez este padrão no caso de Q. grandiflora esteja
mais associado ao microhabitat. Como o cerrado é
um ambiente em mosaico talvez isto explique melhor
a formação de agrupamentos, porém não temos dados
para fazer este tipo de afirmação.
O cerrado bienal apresentou uma menor
densidade total de indivíduos e um menor número de
indivíduos com menos de 11 cm de circunferência
quando comparado com o cerrado controle (Fig. 3).
Ramos (1990) sugere que o fogo pode levar a uma
diminuição da densidade quando este ocorre em altas
freqüências, apesar de seus dados não mostrarem isto
pelo pouco tempo de estudo. A autora sugere que
queimadas frequentes levam a uma diminuição no
recrutamento, uma alta mortalidade de plântulas e um
grande impacto em indivíduos com menor porte.
Outra questão que a autora levanta é que plantas que
são freqüentemente queimadas sempre estão repondo
suas folhas, tornando-se cada vez mais susceptíveis
ao ataque de patógenos, parasitas e herbívoros, sendo
que estes poderiam aumentar a taxa de mortalidade
destas. Kellman (1986) também sugere que plântulas
têm maior mortalidade e que plantas com rebrota
basal também teriam maior mortalidade. O autor
ainda sugere que regimes freqüentes de queimadas
poderiam levar algumas populações à extinção
naquele local. Q. grandiflora tem um crescimento
50
inicial muito lento (Paulilo et al., 1993), além de uma
baixa taxa fotossintética nesse período (Felippe &
Dale, 1990). Sendo assim, talvez isso indique que ela
demore um tempo relativamente longo para atingir
um tamanho suficiente para que o fogo ao passar,
mate apenas a parte aérea e não o indivíduo como um
todo, explicando o menor número de indivíduos com
circunferência inferior a 11 cm no cerrado bienal.
Outro fato que reforça esta hipótese é que mais
importante que o tamanho seria a circunferência do
indivíduo para que este sobreviva após uma
queimada (Ramos, 1990). No caso de Q. grandiflora
além de suas plântulas com tamanho e circunferência
reduzido, suas rebrotas da base, apesar de serem de
um indivíduos já estabelecido, também têm estas
características. Desse modo além das rebrotas
estarem na base, mais susceptíveis à morte (Kellman,
1986), elas têm uma circunferência muito pequena,
talvez assim explicando uma possível maior
mortalidade destas.
Desse modo com relação ao padrão de
distribuição encontrado para Q. grandiflora parece
que a freqüência de queimadas não está
influenciando este, pois nas duas áreas o padrão é
agregado. Por outro lado, ocorreu uma redução da
densidade de Q. grandiflora na área bienal em todas
as classes de tamanho, provavelmente devido à
freqüente destruição da parte aérea e da mortalidade
de plântulas e rebrotas a cada queimada.
AGRADECIMENTOS
Gostaria de agradecer a J. D. Hay pelas
críticas e sugestões ao manuscrito. A F. S. Pinto e L.
C. Baumgartem pelo leitura e críticas do manuscrito.
À Reserva Ecológica do IBGE por ceder o local e
pelo apoio logístico ao curso “Métodos em ecologia
de Campo”. A R. P. B. Henriques por organizar o
curso e pelas sugestões ao trabalho. A S. Marques
pelo apoio e descontração no campo. E a todos os
companheiros do curso de campo de 1996 pelos
momentos de trabalho e diversão em conjunto.
BIBLIOGRAFIA
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reprodutiva de três espécies de Qualea
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Tabela 1 - Resultados obtidos para o índice de Morisita em três tamanhos de parcelas, para Q. grandiflora em duas
áreas de cerrado na Reserva do IBGE.
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SAN JOSE, J. J.; M. R. FARIÑAS & J. ROSALES.
1991. Spatial pattern of trees and structuring
Tamanho
10x10
20x20
40x40
* p < 0,001
Cerrado controle
Id
χ2
Cerrado Bienal
Id
1,18
1,13
1,13
76,04
36,15*
12,74*
2,62
2,43
1,57
χ2
92,16*
40,79*
13,21*
Tabela 2 - Resultados obtidos para o coeficiente de dispersão (CD) em três tamanhos de parcelas, para Q.
grandiflora em duas áreas de cerrado na Reserva do IBGE.
Tamanho
Cerrado controle
Cerrado Bienal
2
CD
CD
χ
χ2
10x10
1,21
76,04
1,46
92,16*
20x20
2,41
34,14*
2,72
40,79*
40x40
4,24
12,74*
5,12
15,34*
* p < 0,001
52
13
3
3
4
3
2
1
2
1
3
3
1
1
1
1
1
1
2
3
1
1
1
1
1
1
1
3
1
2
3
3
1
1
2
1
4
2
1
1
1
3
80 m
80 M
Cerrado Controle
1
2
1
2
2
1
2
1
2
1
2
80 m
2
80 m
CERRADO BIENAL
Figura 1- Esquema da área marcada nos dois tratamentos com o número de indivíduos de Q. grandiflora
encontrados em cada parcela.
53
8
7
6
5
CC
4
CB
Variâ3
2
1
0
0
1
2
4
8
16
32
Tamanho das parcelas
Figura 2- Gráfico demonstrando a intensidade do agrupamento e em que tamanho de parcela ele ocorre, através da
variância do número de indivíduos em cada tamanho de parcela, para Q. grandilfora em duas áreas de cerrado na
Reserva do IBGE. CC= Cerrado controle; CB= Cerrado Bienal. Tamanhos correspondem: 1= 10x10 (64 par.); 2=
20x10 (32 par.); 4= 20x20 (16 par.); 8= 40x20 (8 par.); 16= 40x40 (4 par.) e 32= 80x40 m (2 par.).
25
20
CC
15
CB
10
5
0
0-10
11-20
21-30
31-40
41-50
>50
Classes de circunferência
Figura 3- Distribuição das freqüências de circunferências do fuste para Q. grandiflora em duas áreas de cerrado na
Reserva do IBGE nas duas áreas. CC= Cerrado controle; CB= Cerrado bienal.
54
ATIVIDADE FORRAGEIRA DE Atta sexdens
(LINNAEUS, 1758) (HYMENOPTERA,
FORMICIDAE): RELAÇÃO COM
TEMPERATURA E UMIDADE RELATIVA DO
AR
Everton Amancio dos Santos
RESUMO
O ritmo de atividade diária da formiga
cortadeira Atta sexdens foi estudado durante três dias
numa área de cerrado situada na Reserva Ecológica
do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE), em Brasília. As observações foram feitas em
um ninho, com intervalos de uma hora. Em cada
observação, registrou-se o número de formigas que
entravam e saíam do formigueiro, durante o intervalo
de um minuto. No minuto seguinte, coletou-se com
uma pinça todo o material vegetal que estava sendo
forrageado pelas formigas. Medidas de temperatura e
umidade relativa do ar foram tomadas em cada
observação, utilizando-se um psicrômetro. Os
resultados obtidos mostram que o forrageamento
ocorre tanto à noite quanto durante o dia, desde que
não seja interrompido por chuvas. No início da
manhã, entre 6 e 7h, foi observado o retorno intenso
de formigas ao ninho, com subsequente reinício das
atividades por volta das 8h, sugerindo uma espécie de
"mudança de turno". Aparentemente, a chuva tem um
papel mais importante do que a temperatura e a
umidade sobre o forrageamento de Atta sexdens.
INTRODUÇÃO
Entre as mais de 800 espécies de formigas,
estão as cortadeiras dos gêneros Atta (saúvas) e
Acromyrmex (quenquéns), que possuem o hábito de
cortar e transportar fragmentos vegetais diversos para
seus ninhos subterrâneos (Della Lucia & Oliveira
1993), os quais são usados como substrato para o
cultivo de fungos que lhes servem de alimento
(Weber 1966). Tais hábitos fazem dessas formigas
uma das principais pragas da agricultura das regiões
tropicais e subtropicais (Mariconi 1970).
Devido aos prejuízos causados à agricultura,
essas formigas têm despertado a atenção das pessoas
desde o século XVI e várias pesquisas têm tratado
desses insetos. Contudo, embora a quantidade de
estudos sobre as saúvas e quenquéns seja imensa, a
maioria dos trabalhos trata de aspectos ligados ao
controle das formigas, restando muito ainda por fazer
no campo da ecologia e do comportamento desses
organismos.
Entre os trabalhos relacionados à ecologia e
ao comportamento dessas formigas, alguns tratam do
comportamento forrageiro (e.g. Hodgson 1955;
Cherrett 1968; Lewis et al. 1974a; Gamboa 1975;
Mintzer 1979; Fowler & Robinson 1979; Brener &
Protomastro 1992; Brener 1993), outros tratam de
aspectos como ritmo diário e sazonal de atividade
(e.g. Wetterer 1990), influência dos fatores
ambientais no padrão de forrageamento (e.g. Lewis et
al. 1974b; Gamboa 1976; Maciel et al. 1995),
distribuição de espécies de plantas atacadas ao longo
das trilhas e estratégias territoriais (e.g. Brener &
Sierra 1993), padrão de movimentação ao longo das
trilhas (e.g. Forti et al. 1984) e impacto da atividade
forrageira no fluxo de energia dos ecosistemas (e.g.
Lugo et al. 1973).
Neste trabalho, procurou-se investigar a
relação entre o padrão diário de forrageamento da
formiga Atta sexdens e os fatores ambientais
temperatura e umidade relativa do ar.
MATERIAL E MÉTODOS
Este estudo foi realizado na Reserva
Ecológica do IBGE Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística, também conhecida como RECOR. A
área constitui-se numa das Unidades de Conservação
Permanentes do Bioma Cerrado e está situada a
35Km ao sul do centro de Brasília, entre 15€ 56'41"S
e 47o53'07''W.
A RECOR está localizada na Chapada
Brasília, com uma altitude média de 1100 metros. O
clima local é estacional, com duas estações bem
definidas: uma seca, de abril a setembro; outra
chuvosa, que vai de outubro a março. A vegetação é
dividida em ceradão, cerrado, campos, brejos e
veredas e matas ciliares. O presente estudo foi
realizado numa antiga área de cerrado, atualmente
bastante modificada por espécies exóticas.
O ritmo de atividade diária de
forrageamento de Atta sexdens foi monitorado
durante um período de três dias (12, 13 e 14 de
março de 1996). Nos dias 12 e 13, não foi possível
cobrir 24 horas de observação, devido a fortes chuvas
que impediram a atividade das formigas. As medidas
foram tomadas em intervalos de uma hora. A cada
observação, registrou-se, durante um minuto, o
número de formigas que entrava e saía do ninho e
coletou-se com uma pinça todo o material vegetal
que estava sendo forrageado pelas formigas.
Paralelamente, foram tomadas medidas de umidade
relativa do ar e de temperatura, utilizando-se um
psicrômetro. Nas observações noturnas, utilizou-se
uma lanterna de testa, o que pode ter alterado o
comportamento das formigas, segundo Hodgson
1955 e Maciel et al. 1995. No laboratório, todo o
material vegetal coletado foi seco em estufa a 60oC,
durante 24 horas, e o peso seco (biomassa) medido
com precisão de 0,01g.
55
RESULTADOS
Durante o primeiro dia de observação, a
atividade das formigas teve sequência ao longo de
todo o dia, tendo sido interrompida por uma forte
chuva a partir das 18h. Embora as formigas
estivessem ativas durante todo o dia, o forrageamento
ocorreu apenas das 7 às 14h. A temperatura oscilou
entre 18 e 27 oC, com atividade forrageira em todo o
intervalo de temperatura, sendo que os picos
ocorreram entre 23 e 27oC. A umidade do ar variou
entre 61 e 90% ao longo do dia, com pico de
forrageamento entre 61 e 74%. Os picos de
forrageamento aconteceram entre as 12 e 14h.
No segundo dia de observação, a atividade
das formigas foi monitorada das 6 às 19h. A
temperatura variou entre 18 e 28oC, com máxima às
15h e mínima entre 6 e 7h. A umidade relativa do ar
variou entre 60 e 95%, com màxima às 7h e mínima
às 16h. O pico máximo de forrageamento ocorreu às
16h, sob temperatura de 26oC e umidade do ar de
60%.
O último dia de observação compreendeu
um período de 24 horas de atividade. A temperatura
variou entre 16 e 27oC, com máxima às 13h e
mínima à zero hora. A umidade do ar oscilou entre
64 e 90%, com máximas entre zero hora e 6h e
mínimas entre 12 e 14h. O forrageamento teve seu
pico máximo entre 21 e 23h, mas apresentou um pico
menor das 2 às 4h.
Ao longo dos três dias de observação,
verificou-se que no início da manhã houve uma
interrupção quase total e, por vezes, total nas
atividades das formigas. Este fato pode ser
comparado a uma espécie de "mudança de turno", em
que um grupo de formigas substitui outro em suas
atividades.
DISCUSSÃO
Os efeitos da temperatura, luminosidade e
umidade sobre o comportamento forrageiro de
formigas dos gêneros Atta e Acromyrmex tém sido
amplamente estudado tanto nos trópicos quanto nas
zonas subtropicais e temperadas, porém as
conclusões ainda são muito diversas. Hodgson
(1955), por exemplo, afirma que o aumento da
intensidade luminosa e da temperatura determina o
ritmo de atividade da espécie tropical Atta
cephalotes. Cherrett (1968), também trabalhando
com Atta cephalotes, verificou que as mudanças
diárias e sazonais no padrão de atividade forrageira
estão relacionadas com a temperatura e a umidade, ao
menos em espécies tropicais. Lugo et al. (1973)
observaram que Atta colombica tem seu pico de
forrageio ao meio dia, quando as temperaturas são
mais elevadas.
Em Acromyrmex versicolor versicolor,
Gamboa (1976) constatou que a temperatura do solo,
mais que a temperatura do ar, determina a presença
ou ausência de atividade de formigas na superfície,
assim como o término do forrageio. Porém, ele
observou que outros fatores como umidade e
intensidade
luminosa
podem estar
agindo
conjuntamente para provocar tais respostas. Mintzer
(1979) verificou que em Atta mexicana o forrageio se
inicia após temperaturas de 12oC e que é
interrompido quando a temperatura chega a 14oC.
Fowler & Robinson (1979) trabalharam com Atta
sexdens no Paraguai e notaram que fatores
ambientais como temperatura podem determinar os
períodos de forrageamento em formigas do gênero
Atta, mas outros fatores como disponibilidade de
recursos podem estar envolvidos.
Hölldobler & Wilson (1990) dizem que as
formigas são extremamente termofílicas; por isso, as
variações climáticas são consideradas determinantes
de seus ritmos forrageiros, especialmente nos climas
subtropicais e temperados. Segundo Hölldobler &
Wilson (1990), cada espécie de formiga opera numa
faixa de temperatura e umidade que funciona como
um envelope. Brener (1993) sugere que os padrões de
atividades forrageiras de Atta laevigata não são
determinados por fatores ambientais, e sim por
necessidades nutricionais. Contudo, ele ressalta que
fatores climáticos extremos poderiam também
ocasionar mudanças nos padrões de forrageio e
alguns desses fatores, especialmente temperatura,
possuem nos ambientes tropicais um papel mais
importante como limitante e/ou disparador do que
como regulador da atividade das formigas.
Contrariamente, Maciel et al. (1995)
atribuem um papel muito importante à temperatura
como reguladora da atividade forrageira de
Acromyrmex subterraneus subterraneus. Vale notar
que a correlação de Spearman realizada por Maciel et
al. (1995) mostrou-se positiva e significativa apenas
quando relacionava temperatura mínima e número de
operárias em atividade. Este resultado pode ser uma
evidência de que, conforme sugerido por Brener
(1993), a temperatura atua mais como um fator
limitante e/ou disparador do que como um regulador.
A partir dessas informações, é possível notar o
quanto as opiniões relativas ao comportamento
forrageiro dos Attini são divergentes.
Os resultados obtidos neste trabalho
mostram que Atta sexdens forrageia tanto durante o
dia quanto à noite, exceto quando chuvas fortes
interrompem o forrageamento. A atuação da chuva
como bloqueadora da atividade das formigas já havia
sido notada por vários pesquisadores (e.g. Hodgson
1955; Lugo et al. 1973; Lewis et al. 1974a, 1974b;
Holldobler & Wilson 1990). As medidas relativas à
56
temperatura e à umidade mostram que esta espécie
forrageia sob temperaturas que variam de 16 a 28oC,
e umidade relativa do ar de 58 a 95%.
AGRADECIMENTOS
Sou muito grato ao Saulo Marques, por ter
cedido o psicrômetro; à Rosane Collevatti, pelo
empréstimo do relógio e pela ajuda na análise dos
dados; ao Felipe Costa, pelas críticas e sugestões; ao
Raimundo Henriques, pela orientação e auxílio com
bibliografia; à June Springer de Freitas, por ter
permitido o uso do seu computador e, por fim, ao
pessoal do IBGE, por ter viabilizado a realização do
Curso de Campo em sua Reserva Ecológica..
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57
ESTRUTURA POPULACIONAL DE UMA
BORBOLETA “ESTALADEIRA”, Hamadryas
feronia (L.) (LEPIDOPTERA: NYMPHALIDAE)
Felipe A. P. L. Costa
INTRODUÇÃO
Hamadryas
Hübner
(Nymphalidae:
Nymphalinae) é um gênero composto por 20 espécies
de borboletas restritas ao Novo Mundo,
especialmente os Neotrópicos (Jenkins, 1983).
“Assenta-pau” e “estaladeira” são dois dos vários
nomes populares atribuídos a esses insetos em
diferentes regiões brasileiras. Os nomes fazem alusão
ao hábito dos adultos pousarem sobre o tronco de
árvores e aos ruídos que produzem em vôo (não em
todas as espécies), respectivamente.
Hamadryas feronia L. é uma espécie de
ampla distribuição, encontrada desde o sul dos EUA
(Ehrlich & Ehrlich, 1961), passando pela América
Central (DeVries, 1987) e chegando ao sul do Brasil
(Brown, 1992). Não há dimorfismo sexual e a
distinção entre machos e fêmeas depende do exame
da genitália. Os adultos se alimentam de frutos e
seiva fermentados (Brown, 1992) e as larvas utilizam
como hospedeiras plantas da família Euphorbiaceae,
notadamente espécies dos gêneros Dalechampia
Plum. e Tragia Plum. (DeVries, 1987; Brown, 1992).
Como de resto acontece com todas as
espécies dos gênero, machos e fêmeas de H. feronia
pousam de cabeça para baixo e com as asas abertas
sobre o tronco de árvores. Nessas circunstâncias, um
indivíduo pode facilmente passar desapercebido.
Quando perturbada, uma borboleta em repouso pode
exibir um vôo breve, retornando ao mesmo tronco,
ou, se a perturbação for brusca ou persistente, ela
pode abandonar seu sítio original e, depois de um
vôo errático, pousar em outro substrato mais ou
menos próximo.
Nesse trabalho, eu apresento os resultados
de um programa de captura-marcação-recaptura (CM-R) com uma população (sensu Brown & Ehrlich,
1980) de H. feronia. Os resultados obtidos mostram
que (1) pelo menos a curto prazo, machos e fêmeas
podem permanecer fiéis e restritos a uma área de vida
reduzida; (2) entre os machos, o grau de dano nas
asas influencia o acesso a uma fonte potencial de
alimentação e, talvez indiretamente, a sua
probabilidade de acasalamento.
MATERIAL E MÉTODOS
O trabalho de campo foi realizado, entre os
dias 11 e 14 de março de 1996, na Reserva Ecológica
do IBGE (15˚50’ S e 47˚50’ W), Brasília, DF. Um
sítio de estudo foi estabelecido em torno de uma
árvore de “ipê-roxo”, Tabebuia impetiginosa (Mart.
ex DC) Standl. (Bignoniacae), plantada à margem de
uma estrada asfaltada dentro da Reserva. Essa árvore,
com ca. 3,5 m de altura, estava com uma ferida na
base do tronco que atraia muitos visitantes: abelhas,
vespas, drosófilas, mariposas, um besouro
Curculionidae e, além de H. feronia, pelo menos 7
espécies de borboletas, com destaque para uma
borboleta “80”, Callicore (= Catagramma) sorana
(Godart), e uma “canoa-azul”, Prepona laertes
(Hübner).
Aproveitando
a
descontinuidade
da
2
vegetação, eu delimitei uma “ilha”, com ca. 1950 m ,
em torno da árvore de T. impetiginosa (doravante
referida apenas como “ipê”), contendo 85 “troncos”
(arbustos e árvores, as mais altas com 8-9 m de
altura, além de 3 postes de iluminação) e afastada de
ilhas vizinhas por trechos de vegetação
predominantemente herbácea. Além de um certo
isolamento, o local foi escolhido pela aparente
facilidade de se encontrar indivíduos de H. feronia.
Há registros de que outras espécies de Hamadryas
ocorrem dentro da Reserva (Ferreira, 1982), mas
nenhuma delas foi vista durante a realização desse
trabalho.
Outras duas agregações de H. feronia foram
notadas nas proximidades do sítio de estudo: a
primeira (A-50), distante ca. 50 m na direção NE, e a
segunda (A-240), distante ca. 240 m e em torno do
alojamento da Reserva; além disso, apenas mais 2
indivíduos foram observados a ca. 70 m na direção
SW. Depois de iniciado esse trabalho, ca. 15
borboletas foram capturadas e/ou observadas nessas
agregações, mas nenhum indivíduo havia sido
anteriormente capturado no sítio de estudo. A única
evidência direta de movimentação entre essas áreas
foi a recaptura de um macho (#22), no dia 14, nas
proximidades de A-50. Contudo, menos de 2 horas
depois, ele foi novamente capturado no limite
nordeste do sítio de estudo.
No último dia de trabalho de campo, eu
medi a posição dos troncos em relação à estrada e fiz
um mapa detalhado do local. Sobre o mapa, e
considerando apenas os 24 troncos nos quais houve
pelo menos uma captura, foram calculadas as
distâncias entre troncos vizinhos (os lados de um
polígono ligando todos os 24 troncos) e a distância de
cada tronco em relação ao ipê.
Para a captura das borboletas dentro do sítio
de estudo, foi estabelecida uma rotina de inspeção,
tomando-se o ipê como ponto de partida. No início de
cada inspeção, eu registrei a hora do dia, as espécies
e o número de borboletas pousadas no ipê. Ao final,
foram executadas 55 rotinas de inspeção pela manhã
e à tarde (exceto no dia 12, quando o turno da tarde
foi suspenso com a chegada das chuvas). Na noite do
dia 11, foi feita uma rápida visita ao local.
58
Durante as inspeções, eu evitei capturar
borboletas que não estivessem pousadas, com
exceção daquelas capturadas voando em torno do ipê
(nesse caso, eu evitei capturar as borboletas exibindo
“vôos de perseguição”, muitas vezes envolvendo 3
ou 4 indivíduos). Borboletas em fuga, depois de uma
primeira tentativa de captura malsucedida, foram
perseguidas e eventualmente capturadas até uma
distância de ca. 10 m do tronco original.
Para cada borboleta capturada, eu registrei o
tronco de pouso, o estado das asas (numa escala de 1
a 5, de acordo com a quantidade de danos) e o sexo.
A avaliação do estado das asas visou, basicamente,
estimar a proporção da superfície perdida e não o seu
estado de descamação ou senescência. Embora
houvesse um componente temporal no acúmulo de
danos, alguns fatores podem ter reduzido
bruscamente a superfície útil das asas. Por exemplo,
em duas ocasiões, eu flagrei lagartos sobre árvores
com borboletas pousadas e desconfio que certos
danos (particularmente na base das asas anteriores)
tenham sido produzidos durante investidas desses
predadores. Machos e fêmeas começaram a ser
reconhecidos com segurança apenas na manhã do dia
12 e os indivíduos capturados antes disso foram
classificados quanto ao sexo na primeira recaptura.
Na primeira captura, as borboletas
receberam uma marca e um número nos dois lados
das asas anteriores (escritos com uma caneta Pilot
vermelha de ponta fina), tomando-se o cuidado de
não atrapalhar o padrão de camuflagem. O tempo de
retenção na primeira captura de cada borboleta foi
cronometrado e elas foram liberadas no ponto exato
em que foram encontradas ou defronte do tronco em
que estavam pousadas. Eu não registrei o
comportamento das borboletas após a liberação, mas
em algumas ocasiões elas voltaram a pousar sobre o
tronco original.
Utilizando o mapa feito para o sítio de
estudo, foram calculados dois parâmetros da
movimentação dos indivíduos recapturados:
(1) di: a distância percorrida pelo indivíduo i entre a
primeira e a segunda capturas (di1), entre a segunda e
a terceira (di2), e assim por diante. Para as recapturas
no mesmo tronco, d= 0;
(2) D1: a distância total percorrida pelo indivíduo i,
que foi igual à soma dos seus valores de d. Para as
borboletas recapturadas apenas uma vez, Di= di1.
Como um teste preliminar, eu investiguei se
o tempo de retenção (tR) afetou os parâmetros de
movimentação das borboletas recapturadas. Para isso,
foi feita uma análise de regressão linear (mínimos
quadrados) entre tR vs. di1 e tR vs. Di. Nenhuma das
análises produziu índices significativos (maior valor
absoluto de t= 0,95; P > 0,3; mantendo-se H0: b= 0),
mesmo quando os valores iguais a zero (i.e., di1 ou
Di= 0) foram ignorados (maior valor absoluto de t=
0,79; P > 0,4).
Esses resultados mostram que a variação
registrada em tR (amplitude: 51-282 sec; média= 118
sec; N= 61) não foi suficiente para afetar a
movimentação das borboletas posteriormente
recapturadas. Em outras palavras, o “trauma” da
captura parece não ter alterado a probabilidade de
recaptura dos indivíduos (mas veja Morton, 1984) e,
sendo assim, o tempo de retenção foi excluído das
análises
posteriores.
Como
um
exemplo,
circunstancial e drástico dessa conclusão, vale
registrar sobre um casal capturado em cópula no dia
13. Após a captura (16:15 h), a fêmea (#58) e o
macho (#59) permaneceram retidos por ca. 90 min
(na sombra, dentro de um saco de papel). Depois
disso, eles foram marcados e liberados e, embora o
macho não tenha sido reencontrado, a fêmea foi
recapturada no dia seguinte, próxima ao ponto de
liberação.
Os testes estatísticos empregados nesse
artigo seguem Siegel (1971) e Sokal & Rohlf (1981).
Os valores críticos obtidos foram comparados com
valores tabelados fornecidos por Fisher & Yates
(1971) e Rohlf & Sokal (1981). O valor crítico obtido
para o teste-G foi submetido, quando apropriado
(veja Sokal & Rohlf, 1981, p. 704 e 727), a uma
correção pelo método de Williams. No que se segue,
“g.l.” indica os respectivos graus de liberdade.
RESULTADOS
Esforço de Amostragem
Durante os 4 dias de trabalho de campo,
foram capturados 64 indivíduos de H. feronia dentro
do sítio de estudo: 28 fêmeas (F), 27 machos (M) e 9
cujo sexo permaneceu desconhecido (?) (2 na Tabela
I). O número de capturas aumentou com o esforço de
amostragem, de tal modo que o “tempo de espera”
para uma captura foi semelhante em 3 dos 4 dias (4
na Tabela I). No dia 13, a redução no tempo de
espera provavelmente refletiu um aumento no nível
de atividades das borboletas, depois de um dia
(12/III) parcialmente chuvoso. Nos períodos sem
chuvas, o nível de atividade, como medido pelo
número de borboletas encontradas no ipê, se manteve
ao longo do dia, com um aumento acentuado apenas
no final da tarde (Fig. 2).
Levando em conta todas as recapturas, 53%
das borboletas (34/64: 16F + 14M + 4?) foram
reencontradas pelo menos uma vez, em 82 episódios
de recaptura (3 na Tabela I). Deixando de lado as
recapturas no mesmo dia, 51% das borboletas
marcadas nos 3 primeiros dias (29/57: 13F + 12M +
4?) foram reencontradas pelo menos uma vez nos
dias seguintes, em 43 episódios de recaptura (Tabela
59
II). Com esses resultados, e admitindo uma razão
sexual de 1:1 (veja adiante), foi possível estimar o
tamanho da população dentro do sítio de estudo.
Usando o Índice de Lincoln-Petersen, o tamanho
final estimado foi de 79 borboletas (Tabela II). Essa
estimativa está muito próxima do número de troncos
no local (85) e levanta a suspeita de que um limite
superior ao número de indivíduos residentes foi
imposto pelo número de troncos disponíveis. Uma
suspeita que é reforçada se comparamos o número de
capturas em diferentes setores dentro do sítio de
estudo (Fig. 1).
Razão Sexual
As proporções finais de machos (27/55) e
fêmeas (28/55) capturados suportam facilmente a
hipótese de uma razão sexual de 1:1. Além disso, a
proporção de machos e fêmeas recapturados ao
menos uma vez foram semelhantes, não importando
se a comparação incluía (14/27 M e 16/28 F; G=
0,15; P > 0,5) ou não (12/25 M; 13/23 F; G= 0,35; P
> 0,5) recapturas no mesmo dia. Em outras palavras,
machos e fêmeas foram igualmente abundantes e
igualmente prováveis de serem recapturados,
indicando semelhanças comportamentais entre
indivíduos dos dois sexos.
Nos 3 dias com amostragens pela manhã e à
tarde (o que exclui o dia 12), a proporção de capturas
envolvendo machos e fêmeas oscilou (2 e 3 na
Tabela I), mas sem nenhum desvio significativo de
uma razão sexual de 1:1. Houve, entretanto, uma
diferença consistente entre os sexos quanto ao
principal turno de amostragem (manhã vs. tarde):
71% (40/56) das capturas de machos aconteceram
pela manhã, enquanto, no mesmo período, foram
feitas apenas 44% (27/61) das capturas envolvendo
fêmeas. Para os machos, mas não para as fêmeas,
esse resultado é significativamente diferente do
esperado sob a hipótese de igualdade no número de
captura nos dois turnos (Tabela III). Isso mostra que
a “disponibilidade” dos machos efetivamente diminui
durante o dia, talvez por eles terem reduzido seu
nível de atividades, permanecendo mais tempo em
“refúgios” (dentro ou fora do sítio de estudo).
Movimentação
A movimentação de machos e fêmeas dentro
do sítio de estudo, medida pelos parâmetros d e D,
foram semelhantes. A distância total percorrida pelos
machos (DM= 43,94 m; s= 29,88 m; N= 14) foi um
pouco maior que a das fêmeas (DF= 36,22 m; s= 21,9
m; N= 16), mas a diferença não foi significativa (t=
0,814; P > 0,4). A distância média percorrida entre
recapturas foi virtualmente idêntica entre os dois
sexos: dM= 16,64 m (N= 37 recapturas) e dF= 16,56
m (N= 35). Esses resultados sustentam a observação
feita
anteriormente
sobre
semelhanças
comportamentais entre machos e fêmeas.
Embora a distância percorrida entre
recaptura tenha variado inversamente com o tempo
de espera (4 e 5 na Tabela I), sugerindo um efeito da
densidade na movimentação diária das borboletas,
uma análise de regressão mostrou que essa relação
não foi significativa (H0: b= 0; t= -2,64; gl= 2; P >
0,1). Ainda que o reduzido tamanho amostral tenha
impedido a descoberta de uma eventual relação entre
a densidade e a movimentação das borboletas, devese notar que os resultados dos dois primeiros dias
provavelmente representaram subestimativas. Assim,
enquanto as médias para os dias 13 e 14 incluíram
tanto a distância entre capturas sucessivas no mesmo
dia como também a distância percorrida desde a
última captura no dia anterior, a média para o dia 11
envolveu apenas a distância entre recapturas naquele
dia. Por fim, como já foi notado, no dia 12 o esforço
de amostragem esteve restrito ao turno da manhã.
Em função dos resultados acima, todos os
valores obtidos foram agrupados (machos + fêmeas +
desconhecidos) e a distribuição de frequências das
distâncias percorridas foi comparada com a distância
entre os troncos dentro do sítio de estudo. Se a
movimentação das borboletas foi predominantemente
uma movimentação entre troncos vizinhos seria de se
esperar que as respectivas distribuições mostrassem
uma certa concordância. Alternativamente, foi feita
uma comparação entre a distribuição de frequências
das distâncias percorridas e as distâncias entre os
troncos e o ipê.
A Figura 3 mostra a distribuição de
frequências das distâncias percorridas pelos
indivíduos recapturados ao lado das frequências
esperadas de acordo com (1) as distâncias entre
troncos vizinhos; (2) as distâncias dos troncos em
relação ao ipê. Um teste-G para bondade de ajuste
mostrou que a distância percorrida pelas borboletas
foi muito semelhante à distância dos troncos em
relação ao ipê (G= 1,004; gl=2; P > 0,5), mas não em
relação à distância entre troncos vizinhos (G=
26,304; gl= 1; P < 0,001), sustentando a interpretação
de que a movimentação dentro do sítio de estudo foi
principalmente pelo acesso ao ipê. Esse resultado é
mais facilmente interpretado se levamos em conta
que o ipê foi a única fonte evidente de alimentação
para os adultos dentro do sítio de estudo.
Danos nas Asa e o Acesso ao Ipê
A classificação das borboletas capturadas de
acordo com o estado das asas é mostrado na Figura 4.
Uma comparação entre machos e fêmeas (teste-U de
Mann-Whitney), mostrou que ambos estavam
igualmente danificados (t= 0,164; g.l.= 52; P > 0,8).
Apesar disso, deve-se notar a presença exclusiva de
fêmeas na última classe, supostamente as mais velhas
60
entre todas as borboletas capturadas. Uma dessas
fêmeas já tinha perdido metade das asas posteriores
quando foi capturada.
Agrupando os resultados de machos e
fêmeas, uma comparação entre os indivíduos
capturados ao menos uma vez no ipê (15/27 M; 18/28
F) contra aqueles que foram capturados apenas nos
outros troncos (12/27 M; 10/28 F), produziu
resultados distintos. Para as fêmeas, o resultados
obtido (U= 83; P > 0,1) indicou que o grau de danos
não diferiu entre as borboletas dos dois grupos,
enquanto, entre os machos, a diferença encontrada foi
significativa (U= 126; P < 0,05) e mostrou que os
machos capturados no ipê tinham asas menos
danificadas.
Aparentemente, os machos com as asas mais
danificadas tinham chances reduzidas de acesso e/ou
permaneciam menos tempo no ipê. Evidências
circunstanciais sugerem que essas borboletas podem
permanecer pousadas por períodos prolongados de
tempo. Assim, no dia 11, eu cheguei a registrar a
permanência de um macho (#15, classe 4 de dano)
por quase 6 horas (11:45 até 17:06 h, voando em
seguida) num mesmo sítio de pouso. A diferença no
estado das asas entre os indivíduos dos dois sexos
capturados no ipê levanta a suspeita de que os
machos foram mais tolerantes com as fêmeas
danificadas, talvez por elas ainda representarem
parceiras potenciais.
DISCUSSÃO
A população estudada de H. feronia pode ser
descrita como um conjunto de machos e fêmeas
igualmente abundantes e gravitando em torno de uma
fonte potencial de alimentação (a seiva do ipê). A
presença de indivíduos de H. feronia no ipê durante
todo o dia (i.e., entre 8:30 e 17:30 h), ao lado de
outras espécies de borboletas e de outros insetos,
sugere que a disponibilidade de seiva foi mais ou
menos permanente. Além do fluxo de seiva, um
limite superior ao número de indivíduos residentes
parece ter sido imposto pela disponibilidade de
troncos nas proximidades do ipê.
Por qualquer dos critérios utilizados (i.e.,
incluindo capturas no mesmo dia ou não), a taxa de
recaptura
foi
elevada,
principalmente
se
compararmos com os valores normalmente obtidos
em estudos com populações de borboletas (e.g.,
Ehrlich, 1984) e, mais importante, com outros
estudos envolvendo espécies de Hamadryas (e.g.,
Ross, 1963; DeVries, 1983; veja ainda Young, 1974).
Como os recursos alimentares normalmente
explorados pelos adultos são relativamente efêmeros
(i.e., frutos em decomposição) seria de se esperar
uma alta vagilidade e, assim, uma probabilidade
reduzida de recaptura. No entanto, recursos que
permanecem disponíveis por mais tempo podem
permitir o estabelecimento de populações com
membros mais sedentários, como parece ter sido o
caso do presente estudo.
A diferença observada na captura de
machos, mas não na de fêmeas, de acordo com o
turno de amostragem, sugere, num primeiro
momento, a existência de padrões distintos na
exploração de uma mesma fonte de alimentação. Por
outro lado, é possível que essas diferenças tenham
sido reflexo de uma hierarquia mais acentuada entre
os machos pelo acesso ao ipê (veja Marini-Filho,
1996). Machos com as asas mais danificadas podiam
estar reduzindo seu nível de atividades,
permanecendo mais tempo empoleirados em
"refúgios", dentro ou fora do próprio sítio de estudo.
O acesso dos machos ao ipê foi influenciado
pelo estado das suas asas, talvez porque os machos
com as asas danificadas (i.e., com um tamanho
efetivo reduzido) fossem mais frequentemente
afastados pelos outros. O acúmulo de danos, além de
reduzir o tamanho efetivo das asas, pode alterar sua
funcionalidade em determinados contextos, como,
por exemplo, em disputas entre machos (veja Otero,
1986; Marini-Filho, 1996). Existem evidências de
que o tamanho das asas em Hamadryas afeta o
resultado de disputas intra- e interespecíficas pelo
acesso a uma fonte potencial de alimento (veja
Marini-Filho, 1996).
O presente trabalho foi realizado no final da
estação chuvosa de Brasília (dezembro a março) e o
encontro do casal #58 e #59 (um macho da classe 2
com uma fêmea da classe 5 de danos) indica que as
fêmeas ainda estavam receptivas, ao mesmo tempo
que sugere que elas são capazes de acasalamentos
múltiplos (veja Ehrlich & Ehrlich, 1978). A presença
de fêmeas no ipê, a despeito do estado das suas asas,
pode ter tido um componente sexual. Sendo mais
tolerantes com as fêmeas danificadas, os machos com
acesso ao ipê podiam aumentar o número de
parceiras potenciais. Por outro lado, se o ipê, além de
um sítio de alimentação foi usado como um local
para encontro de parceiros, os machos com as asas
danificadas
tiveram chances
reduzidas
de
acasalamento.
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62
Tabela I. Amostragem de indivíduos de H. feronia: (1) esforço de amostragem (minutos); (2) capturas e (3)
recapturas por turno de amostragem (entre parêntesis, o número de indivíduos recapturados); (4) tempo de espera
para efetuar uma captura; (5) distância média percorrida pelos indivíduos recapturados.
11/MAR
12/MAR
13/MAR
14/MAR
Total
1.Tempo(min)
427
215
482
315
2.Capturas
22
7
28
7
64
a. manhã
macho
8
4
4
1
fêmea
3
0
6
3
?
4
3
b. tarde
macho
2
7
1
fêmea
3
11
2
?
2
3. Recapturas
10 (9)
12 (9)
38 (27)
22 (18)
82 (34)
a. manhã
macho
5
5
15
7
fêmea
2
3
5
8
?
0
4
2
0
b. tarde
macho
1
4
1
fêmea
1
11
6
?
1
1
0
4.1/2+3 (min)
12,20
11,32
7,30
10,86
5. Distância (m)
14,80
14,47
18,52
17,75
(a)
Tabela II. Estimativas do tamanho da população (Ni) de H. feronia .
11/MAR
13/MAR
(b)
12/MAR
Marcados (Mi)
0
8
18
Não Marcados
22
7
28
Soma (Ci)
22
15
46
Ni
39,11
71,74
14/MAR
17
7
24
79,17
(a)
usando-se o Índice de Lincoln-Petersen, com a correção de Bailey (veja Southwood, 1978), Ni= Ri(Ci + 1) / (Mi
+ 1); onde Ni é a estimativa para o tamanho da população no dia i; Ri é o total de indivíduos marcados antes do dia
i; Ci é o total de indivíduos capturados no dia i; Mi é o número de indivíduos capturados no dia i que já estavam
marcados;
(b)
capturas apenas pela manhã.
63
Tabela III. Capturas envolvendo machos e fêmeas de H. feronia, com teste-G para heterogeneidade sob a hipótese
de que metade das capturas diárias aconteceram em cada turno de amostragem.
a. Machos
manhã
tarde
g.l.
G
11/MAR
13
3
1
6,738
P < 0,01
13/MAR
19
11
1
2,159
P > 0,1
14/MAR
8
2
1
3,855
P < 0,05
40
16
Total
3
12,752
P < 0,01
Agrupado
1
10,626
P < 0,01
Heterogeneidade
2
2,126
P > 0,3
b. Fêmeas
manhã
tarde
11/MAR
5
4
1
0,111
P > 0,7
13/MAR
11
22
1
3,738
P > 0,1
14/MAR
11
8
1
0,476
P > 0,3
27
34
Total
3
4,325
P > 0,2
Agrupado
1
0,805
P > 0,3
Heterogeneidade
2
3,520
P > 0,1
64
CONSIDERAÇÕES SOBRE A DISPERSÃO
SECUNDÁRIA DE SEMENTES DE SOLANUM
LYCOCARPUM (SOLANACEAE) POR
FORMIGAS.
Flávia dos Santos Pinto
RESUMO
Este trabalho sugere mais um caso de
benefício do grupo Attine sobre plantas do cerrado,
indicando formigas do gênero Atta como possíveis
dispersoras secundárias de Solanum lycocarpum. Na
reserva Ecológica do IBGE (Brasília - D.F.) S.
lycocarpum (Solanaceae) ocorre associada a ninhos
de formigas do gênero Atta (sauveiros). Um censo
realizado em cerrado sensu stricto mostrou que dos
23 sauveiros amostrados, 65,2 % possuíam um ou
mais indivíduos de lobeira. Apenas 23% dos
indivíduos de Solanum estavam sobre sauveiros, e
44,6% estavam associados com outros grupos de
formigas. Atta cf. goiana foi observada coletando
sementes desta espécie localizadas nas fezes de
Chrysocyon brachyurus (Mammalia - Canidae), seu
principal dispersor, assim como sementes no fruto.
As sementes foram carregadas para dentro do ninho,
o que poderia estar explicando a alta ocorrência desta
espécie associada à sauveiros.
INTRODUÇÃO
A dispersão de sementes e o estabelecimento
das plântulas representam os estágios mais sensíveis
na história de vida de uma planta (Terbogh 1990);
sendo essencial para essas duas fases a qualidade do
microhabitat onde estas sementes são depositadas
(Hladik & Miquel 1990). O comportamento dos
dispersores pode determinar o padrão de distribuição
dessas sementes e, consequentemente, definir as
condições nas quais as plântulas se estabelecerão
(Howe 1990; Howe & Smalwood 1982).
O consumo de frutos por vertebrados, que
ingerem ou não as sementes, tende a dispersá-las em
grupos, e em vários locais, levando a uma grande
variação de microambientes onde elas são
depositadas (Hartgerink & Bazzard 1984). Este
locais, entretanto, podem ser propícios ou não para o
seu estabelecimento.
As sementes descartadas nas fezes são, por
vezes, utilizadas por formigas que atuam como pósdispersores (Roberts & Heithaus 1986; Kaspari 1993;
Levey & Byrne 1993; Loiselle 1990), causando um
rearranjamento delas no ambiente. Esta relocação
permite maior variação de microambientes que,
muitas vezes, representam sítios seguros para o
estalecimento das plântulas (Culver & Beattie 1983;
Heithaus 1981; Horvitz & Schemske 1986; Andersen
1988; Levey & Byrne 1993).
A dispersão de sementes por formigas,
denominada mirmecocoria, não é uma síndrome
comum (van der Pijl 1969), tendo sido assumida
como uma interação mutualística ainda pouco
documentada (Beattie 1985). A mirmecocoria
geralmente está relacionada à presença de elaiosomas
nas sementes, sendo escassos os estudos sobre a
dispersão de sementes de plantas não mirmecócoras,
por formigas.
Estudos conduzidos por Gottsberger &
Silbebauer-Gottsberger (1983) confirmam a baixa
ocorrência de mirmecocoria também para o cerrado.
Das 271 espécies estudadas apenas 10% tinham
formigas como seu dispersor principal. Entretanto
52% apresentaram dispersão zoocórica (realizada por
animais, principalmente vertebrados) mostrando a
importância da possível utilização das sementes
depositadas nas fezes. Essas relações entretanto são
pouco conhecidas para o cerrado.
Solanum lycocarpum St. Hil. (Solanaceae) é
uma espécie arbustiva comum em ambientes
perturbados (Sacco et al 1985; Oliveira-Filho &
Oliveira 1988), estando entre as espécies de
distribuição mais ampla nos Cerrados (Sarmiento
1983). Esta espécie possue frutos grandes, de casca
grossa e resistente, com grande quantidade de
sementes (de 600 a 800 segundo Lombardi & Motta
Junior 1993). Quando maduros caem ao chão sem
entretanto romper a casca, estando sujeitos à ação de
patógenos. É conhecida comumente como lobeira ou
fruta-de-lobo por ser amplamente utilizada na dieta
de Chrysocyon brachyurus Illiger (Canidae), o loboguará (Dietz 1984), que é o maior consumidor e
provavelmente seu principal dispersor, sendo comum
encontrar grande quantidade de sementes nas fezes.
Na Reserva Ecológica do IBGE (Brasília D.F.) é comum encontrar indivíduos de S.
lycocarpum associados à ninhos de formigas do
gênero Atta (sauveiros), tendo sido observado o
carregamento de sementes de fezes de lobo-guará por
essas formigas (R. P. B. Henriques, comunicação
pessoal).
O objetivo deste trabalho é determinar as
relações existentes entre S. lycocarpum e formigas
como possíveis pós-dispersores de suas sementes.
MATERIAL E MÉTODOS
A coleta de dados foi realizada na Reserva
Ecológica do IBGE (RECOR) (15˚ 56’ 41’’ S e 47˚
53’ 07’’ W) localizada no Distrito Federal à 35 km
ao Sul de Brasília. A RECOR faz parte da Área de
Proteção Ambiental Gama-Cabeça do Veado e possui
uma área de 1350 hectares com a predominância de
cerrados e campos. O estudo foi conduzido no
período de 11 a 14 de março de 1996.
Foi realizado um censo de indivíduos de S.
lycocarpum localizados ao longo de estrada de terra
65
(3km), que cerca uma área de cerrado sensu stricto
sujeito a queimada bienais.
Foram amostrados todos os indivíduos de
lobeira, bem como os sauveiros encontrados e
registrados a altura da planta, tamanho do sauveiro,
ocorrência de associação de um com o outro, e
espécies de formigas que possuíam formigueiro
localizado embaixo das plantas. Alguns exemplares
de cada morfotipo de formiga encontrado foram
coletados para posterior identificação.
Uma avaliação preliminar das espécies
vegetais existentes sobre os formigueiros foi
realizada. Um gradeado com dez amostras de fezes
frescas de Chrysocyon brachyurus contendo
sementes de lobeira foi montado dentro de uma área
de cerrado sensu stricto, e cinco ao longo da estrada
adjacente, sendo vistoriados a cada uma hora, para a
captura de formigas. Porções de fezes de lobo-guará
contendo sementes de lobeira também foram
oferecidas a Atta cf. goiana, assim como polpa de
fruto maduro com sementes a fim de determinar a
possibilidade de utilização das sementes nas duas
condições.
RESULTADOS
Censo de Solanum e Formigueiros
Foram registrados 65 indivíduos de lobeira e
23 ninhos de saúvas nos 3km de trilha percorridos. S.
lycocarpum apareceu 44,6% das vezes associado a
formigas. Ocorrendo 23,1% das vezes sobre
sauveiros e 21,5% sobre ninhos de outras espécies de
formiga não pertencentes ao gênero Atta (Apêndice
I), apenas 8,69% possuíam indícios de antigos
formigueiros. Em 65,2% dos 23 sauveiros
amostrados foram registrados um ou mais indivíduos
de lobeira.
A altura das lobeiras variou de 30 cm até 4
m, estando a maioria entre 1-2 m. Foram registradas
de 1 a 5 plantas nos formigueiros, tendo sido
encontrada correlação positiva entre o número de
2
plantas sobre o formigueiro e seu tamanho (r =0,82
p<0,05).
O tamanho dos formigueiros variou desde
pequenos buracos no chão até montes de terra de 5
m. Não foi encontrada correlação entre o tamanho
destes formigueiros e o tamanho das plantas sobre
eles.
Espécies de Plantas Encontradas Sobre
Formigueiros
Sete espécies de plantas foram encontradas
sobre os sauveiros, além da lobeira. A Tabela 1
mostra a relação das espécies encontradas, sua
porcentagem de ocorrência associado a sauveiros, e
seu modo de dispersão. S. lycocarpum foi oito vezes
mais frequente que a segunda espécie de maior
ocorrência. Quatro das espécies apresentaram
dispersão endozoocórica realizada por pássaros e/ou
mamíferos, duas apresentaram dispersão pelo vento
(anemocoria) e uma dispersão autocórica. Nenhuma
delas apresentou formigas como seu dispersor
principal segundo Gottsberger & SilbebauerGottsberger (1983).
Guilda de Formigas Associadas a Fezes
Duas subfamílias, quatro tribos, dez gêneros
e treze morfotipos de formigas foram observados
utilizando fezes de C. brachyurus durante as quatro
horas de observação (Apêndice II). Nenhuma espécie
de Atta foi coletada durante as observações. Também
não foi observado deslocamento das sementes
realizado pelas formigas.
Espécies de Formigas Associadas a S. lycocarpum
Três espécies de formigas foram encontradas
nos formigueiros sob S. lycocarpum (Apêndice I):
Atta cf. sexdens, Camponotus rufipes e
Megalomyrmex sp; tendo sido encontradas utilizando
fezes apenas as duas últimas.
Oferta de Frutos e Fezes a Atta goiana
Foram oferecidas, à Atta cf. goiana, no
campo, porções de frutos de lobeira e fezes de loboguará, ambas contendo sementes. As amostras foram
colocadas a aproximadamente um metro da entrada
do formigueiro. Nos dois casos A. cf. goiana foi
capaz de cortar pedaços de fruto e da polpa fibrosa
das fezes de C. brachyurus, e carregar as sementes
para dentro do formigueiro. Tanto a polpa do fruto,
sementes da polpa, massa das fezes quanto as
semente das fezes foram utilizados.
DISCUSSÃO
O censo realizado mostrou uma maior
ocorrência de S. lycocarpum sobre sauveiros em
comparação com outras plantas do cerrado, nessa
área de estudo. Acredita-se que esta relação ocorra
devido ao carregamento das sementes de lobeira por
estas formigas, entretanto não obtivemos dados
conclusivos a este respeito. Observações mostraram
que saúvas carregam sementes de S. lycocarpum
provenientes de fezes de lobo-guará, o principal
dispersor desta espécie e de frutos de Solanum para o
interior do ninho. Atta cf. goiana foi a espécie
observada carregando as sementes nestas duas
condições. Outras espécies do cerrado foram
observadas associadas a sauveiros mas nenhuma com
frequência comparável à da lobeira. Quais seriam as
vantagens para S. lycocarpum ter suas sementes
carregadas para um sauveiro?
Nutrientes e Mudanças Físicas do Solo
Segundo a hipótese do nutriente (Beattie
1985), o solo de ninhos de formigas é diferente
66
química e físicamente do solo à sua volta, podendo
diferir em temperatura, porosidade, umidade, pH,
conteúdo orgânico e mineral; representando assim,
local propício para a germinação e estabelecimento
de plântulas. Espécies de Atta e Acromyrmex são
conhecidas como promovedoras de acúmulo de
matéria orgânica e pelo aumento de nutrientes no
solo dos ninhos (Haines 1978; Alvaredo et al. 1981,
Brener & Silva 1995), indicando sua importância em
ambientes savânicos, uma vez que savanas tropicais
estão geralmente associadas a solos pobres
(Montgomery & Askewe 1983). Alguns trabalhos
tentaram relacionar esta riqueza no solo de
formigueiros à facilidade de estabelecimento de
espécies de plantas mirmecócoras (Westoby et al.
1991;Culver & Beattie. 1980, 1983; Horvitz &
Schemske 1986; Davidson & Morton 1981),
entretanto dados conclusivos sobre esta hipótese
ainda não foram obtidos.
Outra característica dos sauveiros é de
provocar mudança físicas além de químicas no solo,
o que facilitaria o crescimento de estruturas vegetais,
tendo sido observado um aumento na biomassa de
raízes encontradas nos ninhos destas formigas em
comparação com o solo adjacente (Moutinho 1995;
Nepstad et al. 1995; Brener and Silva 1995). Estas
mudanças físicas e químicas poderiam estar
influenciando a germinabilidade e o estabelecimento
de S. lycocarpum sobre formigueiros. Trabalhos
conduzidos por Lombardi & Motta Junior (1993)
mostram um aumento na porcentagem de sementes
germinadas em solo retirado de áreas perturbadas, em
comparação com solos do cerrado, entretanto as
características do solo destas áreas perturbadas não
são mencionadas no artigo.
Fuga Contra Predação e Patógenos
Durante o censo de formigueiros foi comum
encontrar sementes localizadas na entrada dos
ninhos, entretanto nenhuma semente de S.
lycocarpum foi encontrada nesta condição. Sementes
nesta condição desprotegida estariam mais
suceptíveis ao ataque por predadores (O’Dowd &
Hay 1980, Heithaus 1981), e por fungos patógenos
(Augspurger 1990). Os frutos de S. lycocarpum
quando não consumidos são utilizados por uma série
de insetos que facilitam a entrada de patógenos,
sendo
bastante
comum
encontrar
frutos
completamente atacados por fungos. Testes de
viabilidade das sementes (teste de tetrazólio) de
frutos coletados no chão em alto grau de
decomposição mostraram que apenas 42% das
sementes se mostraram viáveis, enquanto que
sementes retiradas de fezes frescas de C. brachyurus
mostraram 82% de viabilidade. O mesmo teste
realizado com frutos maduros recém coletados
mostrou aproximadamente 100% de viabilidade das
sementes (F. Borghetti comunicação pessoal),
sugerindo que o ataque deste patógenos poderiam
estar afetando a viabilidade das sementes.
As observações de saúvas carregando
sementes de S. lycocarpum para o interior do ninho, a
ausência de sementes dessa planta na entrada dos
ninhos e o grande número de plantas sobre sauveiros
sugere que as sementes permaneçam protegidas e
podem germinar dentro ou sobre o monte de terra
sobre os sauveiros.
A ocorrência de sementes de espécies do
cerrado na abertura de formigueiros é bastante alta.
Durante o período de realização deste trabalho foi
comum encontrar várias sementes de Emmotun nitens
(Icacinaceae) na abertura de formigueiros localizados
próximo à planta, assim como de outras espécies não
identificadas.
Vantagens da Dispersão Secundária para S.
lycocarpum
A dispersão secundária de sementes de S.
lycocarpum por formigas traz uma série de vantagens
à espécie. Duas delas já foram citadas: a fuga contra
predadores e patógenos, e a deposição das sementes
em ambiente favorável à germinação e ao
estabelecimento das plântulas.
C. brachyurus, o principal dispersor de S.
lycocarpum, deposita suas fezes preferencialmente
sobre rochas, cupinzeiros e estradas ou trilhas
(34,7%, 27,8% e 27,3%, respectivamente, segundo
Dietz 1984). Depositando, portanto, as sementes
descartadas nas fezes sobre substratos pouco
propícios para a germinação. A dispersão secundária
por formigas possibilitaria o deslocamento dessas
sementes para ambientes mais seguros, além de
possibilitar o rearranjo das sementes, que são
depositadas em grupos nas fezes.
Algumas desvantagens poderiam surgir com
a associação de formigas com S. lycocarpum como,
por exemplo, herbivoria. As formigas do gênero Atta
são particularmente conhecidas como formigas
cortadeiras, representando uma ameaça ao
estabeleciemento de plantas sobre formigueiros.
Entretanto S. lycocarpum possue grande quantidade
de pêlos nas folhas, mesmo nas mais jovens, além da
presença de alcalóides nas folhas (Ribeiro &
Machado 1950), dificultando ou mesmo impedindo
sua utilização pelas formigas, o que poderia estar
explicando sua alta ocorrência sobre formigueiros.
Associações Benéficas Entre Attini e Plantas
A existência de relações frouxas entre
formigas e sementes começa a ser investigada para o
grupo Attini. Oliveira et al. (1995) apresenta um
exemplo de interação entre Micocepurus goeldii e
sementes de Hymenaea courbaril (Caesalpiniaceae),
no sudeste do Brasil, como coadjuvantes na
67
sobrevivência das sementes encontradas em mata de
galeria, onde estão sujeitas à infestação por fungos
dependendo da quantidade de polpa deixada pelos
dispersores primários. Os autores mostraram o
primeiro caso benéfico causado por este grupo como
facilitadora da germinação de sementes. Levantam
também a hipótese de que outras espécies do grupo
Attini promovam benefícios similares a outras
plantas.
Os resultados mostrados neste trabalho
sugerem uma relação benéfica entre Atta cf. goiana, e
provavelmente outras espécies do grupo Attine, sobre
o estabelecimento e possivelmente sobre a
germinabilidade de S. lycocarpum.
Seleção de Substratos Pelo Gênero Atta
Novas considerações surgiram com este
trabalho sobre a seleção de substratos para o
crescimento de fungos para o gênero Atta que é
considerado como utilizador exclusivo de flores e
folhas (Holldobler & Wilson 1990). Roberts &
Heithaus (1986) mostram a utilização de frutos por
Atta sexdens. Este trabalho é o primeiro a mostrar a
utilização de fezes por Atta sp e confirma a utilização
de frutos para este gênero.
AGRADECIMENTOS
Este trabalho foi realizado durante o curso
“Métodos em Ecologia de Campo” do Curso de Pósgraduação em Ecologia da Universidade de Brasília.
Meu muito obrigado ao Prof. Raimundo P. B.
Henriques pela organização do curso, e pela idéia
inicial que resultou neste trabalho. Ao Prof. Paulo S.
Oliveira pelo esclarecimento quanto à metodologia e
estímulo. À Profa. Helena C. de Moraes pelas aulas
sobre formigas e críticas ao manuscrito. Ao Prof.
Fabian Borghetti pelas aulas sobre sementes e apoio
aos meus “excessos” de criatividade. À Inara R. Leal
pela identificação de Atta cf. goiana. Ao Carlos A.
Bianchi pela ajuda no campo e sugestões
metodológicas. Ao Delano M. S. Silva e Fernanda P.
Pinheiro pelas críticas ao manuscrito.
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Tabela 1. Lista de espécies vegetais encontradas
sobre sauveiros, suas frequências de ocorrência em
23 sauveiros.
espécie
%
Calliandra dysantha
Stryphnodendron adstringens
Erythroxylum tortuosum
Qualea grandiflora
Vochysia sp.
Styrax ferrugineus
Rapanea guianense
Solanum lycocarpum
4
4
4
4
8
4
8
65
APÊNDICE I. Lista de espécies de formigas cujos
ninhos foram encontrados sob Solanum lycocarpum.
SUBFAMÍLIA FORMICINAE
Tribo Camponotini
Camponotus rufipes
SUBFAMÍLIA MYRMICINAE
Megalomyrmex sp 1.
Tribo Attini
Atta sexdens
APÊNDICE II. Lista de formigas encontradas
utilizando fezes de C. brachyurus.
SUBFAMÍLIA FORMICINAE
Tribo Camponotini
Camponotus rufipes
Camponotus sp.1
Camponotus sp.2
SUBFAMÍLIA MYRMICINAE
Allomerus sp.
Megalomyrmex sp.
69
Tribo Cephalotini
Cephalotes attratus
Tribo Attini
Acromyrmex sp.
Trachymyrmex sp.
Tribo Crematogastrini
Crematogaster sp.
Tribo Myrmicini
Pheidole sp.
Pheidole sp. 1.
Pheidole sp. 2.
70
PADRÃO DE ATIVIDADE DO MICOESTRELA (CALLITHRIX PENICILLATA) NO
CERRADO DENSO E CERRADÃO DA
RESERVA ECOLÓGICA DO IBGE, BRASÍLIA,
DF
Guilherme H. B. de Miranda
RESUMO
A família Callitrichidae de primatas
Platyrrhini possui adaptações (porte reduzido,
dentição especializada, presença de garras, etc.)
ligadas à ocupação pioneira de nichos, ocorrendo em
quase todos os hábitats arbóreos neotropicais. O
único primata encontrado no cerrado (excluindo-se as
matas ciliares) é o Callithrix penicillata (micoestrela). O objetivo deste trabalho foi comparar as
atividades desempenhadas por esta espécie singular
em diferentes feições de cerrado. Durante quatro
dias, na Reserva Ecológica do IBGE foram realizadas
observações (ecologia e comportamento) de dois
grupos naturais de C. penicillata (um grupo
composto por oito indivíduos habitando uma área de
cerrado denso e o outro, com quatro membros,
ocupando uma mancha de cerradão). Foram feitos
registros individuais por varredura a cada cinco
minutos e registros oportunísticos sempre que
possível. No cerrado denso, foi usado como alimento
pelos sagüis o exsudato proveniente de quatro
espécies: Vochysia thyrsoidea, Didymopanax
macrocarpum, Qualea grandiflora e Qualea
parviflora. No cerradão, foi observado apenas o uso
da goma de V. thyrsoidea. Em ambos os ambientes, a
maior parte da atividade registrada foi locomoção
(57% para o cerrado denso e 50% no cerradão). Os
animais passaram a maior parte do tempo no estrato
médio (altura entre 2 e 5 metros). A atividade de C.
penicillata não diferiu muito nos dois hábitats, exceto
pela maior porcentagem de locomoção na área de
cerrado denso.
INTRODUÇÃO
Os calitriquídeos dos gêneros Callithrix e
Cebuella possuem a dentição adaptada para a
exploração alimentar de exsudatos vegetais (seiva e
goma). Esses dois gêneros de calitriquídeos são os
únicos primatas que danificam ativamente árvores
gumíferas a fim de estimular a liberação dos
exsudatos (Lacher et al, 1984).
São encontrados em quase todos os hábitats
arbóreos neotropicais. O gênero Callithrix é o único
encontrado tanto na Mata Atlântica quanto na
Amazônia, bem como no cerrado e caatinga, que
separam os dois grandes biomas florestais brasileiros.
A comunidade de primatas das matas do
cerrado do Planalto Central é constituída por três
espécies: Callithrix penicillata, Cebus apella e
Alouatta caraya. Destas espécies, somente C.
penicillata tem sua presença registrada em formas
fisionômicas mais abertas do cerrado (cerrado s.s. e
cerradão) o que foi atribuído a seu alto potencial
adaptativo resultante da gumivoria (Fonseca e
Lacher, 1984). O cerradão é a forma fisionômica
mais alta de cerrado, fisionomicamente florestal, com
dossel fechado de 7 m ou mais de altura e 30% ou
mais de cobertura, ou arvoredo, com dossel aberto da
mesma altura (Eiten, 1993). Na região dos cerrados,
o cerradão está presente em manchas com solos
mesotróficos, podendo ocorrer também em solos
distróficos caso seu estabelecimento tenha ocorrido
anteriormente ao empobrecimento do solo
(Haridasan, 1992) ou como sucessão arbórea (por
adensamento) a um cerrado sensu stricto sujeito a
longos períodos (vários anos) sem fogo.
Callithrix penicillata é uma espécie de
hábitos diurnos, que vive em grupos familiares de 5 a
15 membros, insetívoro/gumívoro, com alto índice de
sucesso ecológico, sendo considerado um
ectoparasita de árvores (Lacher et al, 1984). A dieta
de exsudatos, de baixo valor nutritivo, mas muito
abundantes, permite suprir a escassez local e/ou
sazonal de recursos de maior qualidade nutritiva
(insetos, outras presas animais e frutos).
MATERIAL E MÉTODOS
O presente estudo foi conduzido, entre os
dias 11 e 14/03/96, na Reserva Ecológica do IBGE RECOR (15˚56’41” S e 047˚53’07” W), que conta
com cerca de 1350 ha de área, situada no km 0 da
BR-251, que liga Brasília a Unaí, 35 km ao sul do
centro da capital federal. O relevo local é suave e a
altitude média é de 1100 metros. As observações de
campo restringiram-se a duas áreas: uma mancha de
cerradão distrófico (cerca de 10 ha) que ocorre no
extremo sudeste da reserva e parte ( 3 ha) de um
trecho de cerrado denso (protegido do fogo por mais
de 22 anos) ao sul das construções da sede da reserva
(Figura 1). Durante todo o período iluminado de cada
um dos quatro dias de observação, um grupo de C.
penicillata foi acompanhado em uma das áreas, desde
o momento em que foi avistado (a partir das 6 hs. e
22 min.) até o fim das atividades diárias (por volta de
18 hs.), sendo determinados o tamanho do grupo e o
número de membros em cada faixa etária (adulto,
juvenil e infantil). Foram também feitos registros
comportamentais por varredura de todos os
indivíduos do grupo, a cada 5 minutos e registros
oportunísticos sempre que possível (Altmann, 1974).
As categorias comportamentais consideradas nos
registros
de
varredura
foram:
locomoção
(deslocamento individual vertical ou horizontal),
descanso (qualquer posição em que o indivíduo
permaneça sem deslocamento), escarificação
71
(produzir ou ampliar ferida na casca/câmbio de
árvore gumífera, com o uso dos dentes, lamber e
ingerir o exsudato resultante) e alimentação (ingestão
de outros itens da dieta, como insetos, frutos, folhas,
etc.). A altura do animal observado em relação ao
solo foi estimada em um de três níveis pré-definidos
(baixo, até dois metros de altura; médio, de 2 a 5
metros e alto, mais de 5 metros de altura). Desta
forma, foram feitos 90 registros de varredura do nível
de altura dos micos-estrela. Os itens alimentares
consumidos foram anotados.
Considerando em conjunto os quatro dias de
observação e ambos os grupos observados, os
animais foram vistos durante 9 horas e 8 minutos,
totalizando 27% do tempo no campo (548/2029
minutos). O grupo do cerrado denso foi
acompanhado por mais tempo (6 h e 53 min),
correspondendo a 28% (413/1474 minutos) do
esforço de observação para este grupo. Já o grupo do
cerradão foi observado por apenas 2 h e 14 min, ou
seja, cerca de 24,3% do tempo de observação do
grupo (134/555 minutos).
Como os esforços de observação em cada
local foram bastante distintos (totalizando 1474
minutos para a área de cerrado denso e apenas 555
minutos para a área de cerradão), a fim de permitir
uma comparação equilibrada entre os resultados
obtidos, os registros do cerradão foram multiplicados
por um fator de equiparação de esforço amostral (f),
que consiste na razão entre os tempos de observação
em cada área de estudo (f= 1474/555= 2.656).
RESULTADOS
No cerrado denso, o grupo de C. penicillata
observado contava com oito indivíduos: cinco
adultos, dois juvenis e um infantil. Um dos machos
adultos possuía apenas metade da cauda.
No cerradão, apenas quatro indivíduos
compunham o grupo: um casal adulto, um filhote
juvenil macho e um infantil de sexo indeterminado.
Os sagüis utilizaram exsudatos de pelo
menos quatro espécies arbóreas de duas famílias
durante este estudo (Tabela 1). Na área de cerrado
denso, Didymopanax macrocarpum e Vochysia
thyrsoidea foram as espécies observadas com sinais
de escarificação dos troncos e ramos, ao passo que,
no cerradão, a escarificação e o consumo de goma
foram vistos apenas em V. thyrsoidea, espécie
bastante abundante nesta forma fisionômica.
Mesmo considerando a ponderação dos
valores obtidos para o cerradão de acordo com o
fator de equiparação de esforço amostral, nas quatro
categorias comportamentais observadas, o número de
registros do grupo do cerrado denso foi maior que o
do grupo do cerradão (Fig. 2).
Para o grupo do cerrado denso, o número de
registros de varredura obtidos na categoria
locomoção correspondeu a 57% (193 registros) do
total. No caso do cerradão, exatamente 50% (82) dos
registros foram locomoção, ou seja, de uma maneira
geral, em ambos os grupos, os sagüis locomoviam-se
a maior parte do tempo observado. É possível notar
ainda que a participação da categoria descanso no
grupo que habita o fragmento de cerradão (66
registros) foi maior (40% das atividades do grupo)
em relação ao grupo do cerrado denso (33% para
descanso).
Devido ao pequeno número obtido de
registros de altura, estes foram analisados em
conjunto, independentemente do hábitat. Na maior
parte das vezes (60,0%), os animais foram avistados
no nível médio, ou seja, numa altura entre 2 e 5
metros. O segundo nível mais freqüentado foi o nível
alto (altura igual ou superior a 5 metros),
correspondendo a 26,7% dos registros obtidos. Por
último, o nível baixo (menos de 2 metros de altura)
com apenas 13,3% dos registros. Esta tendência de
ocupação espacial ocorreu nas diversas categorias
comportamentais observadas. (Tabela 2).
DISCUSSÃO
Fonseca e Lacher (1984) indicaram para C.
penicillata no cerradão, que mais de 70% do tempo
total gasto com alimentação relacionou-se com
consumo de exsudato. No presente trabalho, o valor
encontrado foi 83% para o cerradão e 78% para o
cerrado denso.
O grupo que ocupa a área de cerradão parece
ser recente, o que é evidenciado pelo seu pequeno
tamanho (somente quatro indivíduos) e pela
composição (com apenas dois indivíduos adultos).
Esta possibilidade se encaixa com o fato do local ter
sido submetido à grande queimada do final de 1994.
O menor tamanho deste grupo explica a menor
quantidade de registros de varredura obtida mesmo
com a utilização do fator de equiparação.
Uma explicação para o maior deslocamento
do grupo do cerrado denso em relação aos animais do
cerradão é uma menor concentração espacial dos
recursos alimentares (goma/insetos) no primeiro
hábitat em relação ao segundo.
De acordo com a literatura (Queiroz, 1991;
Ferrari, 1995), C. penicillata é um primata que ocupa
preferencialmente o extrato inferior da vegetação,
onde há mais fontes alimentares (insetos, pequenos
frutos e árvores gumíferas) e onde estão mais
protegidos dos seus predadores mais comuns (aves de
rapina). Todavia, os resultados do presente estudo
não estão de acordo com os estudos prévios. A
ausência de outras espécies de primatas no local, o
que permitiria a ocupação de um nicho espacial mais
amplo; a não-habituação dos animais com a presença
do observador no estrato inferior, o que os levaria a
um “recuo” para os níveis mais altos e o menor porte
72
e maior espaçamento do estrato arbóreo do cerrado
em relação ao das matas mesofíticas seriam os
principais fatores responsáveis por esse resultado
aparentemente contraditório.
Foram feitos alguns registros oportunísticos
de deslocamento ao nível do solo, especialmente
quando o grupo passava por áreas mais abertas
(tendendo a cerrado s. s.) ou cruzava uma estrada.
Devido ao alto risco de exposição à predação (e à
presença do observador), estes deslocamentos foram
feitos com extrema atenção e rapidez, em geral, após
alguma hesitação.
Possivelmente,
existe
uma
certa
convergência fisionômica entre o cerradão e o
cerrado s.s. estudados, como conseqüência do
impacto do fogo (relativamente freqüente no primeiro
hábitat e ausente no segundo, nos últimos vinte e dois
anos). De maneira que, atualmente, localmente, o
cerrado apresenta um estrato arbóreo mais fechado
que o cerradão.
Em síntese, apesar de haver distinção de
tamanho e composição dos grupos estudados, não
foram constatadas grandes diferenças na atividade
comportamental desses grupos que pudessem ser
atribuídas ao tamanho do grupo ou hábitat.
HARIDASAN, M. 1992. Observations on soils, foliar
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Rylands & A. T. Bernardes (Eds.), A
Primatologia no Brasil - 3. Fundação
Biodiversitas, Belo Horizonte, pp.369-374.
AGRADECIMENTOS
O autor gostaria de agradecer ao Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) pela
permissão para usar a reserva e suas instalações. Ao
Raimundo P. B. Henriques e à Dóris S. de Faria,
pelas sugestões e esclarecimentos prestados em
diferentes etapas do trabalho. À Regina Macedo, pela
leitura crítica de uma versão preliminar do artigo. Ao
Departamento de Ecologia da Universidade de
Brasília pelo apoio logístico. À CAPES pelo apoio
financeiro, através da bolsa de mestrado.
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ALTMANN, J. 1974. Observational study of
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73
TABELA 1. Espécies arbóreas escarificadas por C. penicillata em duas fitofisionomias de cerrado da Reserva
Ecológica do IBGE
cerrado denso
cerradão
Espécie (Família)
Espécie (Família)
Vochysia thyrsoidea (Vochysiacea)
Vochysia thyrsoidea (Vochysiacea)
Didymopanax macrocarpum (Araliacea)
Qualea grandiflora (Vochysiacea)
Qualea parviflora (Vochysiacea)
TABELA 2. Distribuição vertical do mico-estrela, C. penicillata, no cerrado (cerradão e cerrado denso juntos) da
Reserva Ecológica do IBGE
Nível
Descanso
Locomoção
Escarificação
Total
baixo (menos de 2m de altura)
médio (entre 2 e 5m de altura)
alto (mais de 5m de altura)
Total
8(8,9%)
20(22,2%)
12(13,3%)
40(44,4%)
4(4,4%)
31(34,4%)
12(13,3%)
47(52,2%)
3(3,3%)
3(3,3%)
12(13,3%)
54(60,0%)
24(26,7%)
90(100,0%)
Reserva Ecológica do IBGE
1 km
Drenagens
Limites
Estradas
Sede da Reserva
Cerrado Denso
Cerradão
Fig. 1. Mapa da Reserva Ecológica do IBGE, mostrando as áreas de estudo utilizadas.
200
cerrado denso
180
cerradão (equiparado)
160
140
120
100
80
60
40
20
0
locomoção
descanso
escarificação
alimentação
Categoria comportamental
Fig. 2. Partição da atividade de C. penicillata na Reserva Ecológica do IBGE, de acordo com os registros
comportamentais obtidos pelo método de varredura.
74
ARQUITETURA E RIQUEZA DE
HERBÍVOROS EM Ouratea hexasperma Baill.
(OCHNACEAE), EM UM CERRADO DA
RESERVA ECOLÓGICA DO IBGE, BRASÍLIA,
DF
Rosane G. Collevatti
RESUMO
Foi testada a hipótese de que indivíduos de
Ouratea hexasperma com arquitetura mais complexa
têm maior riqueza de espécies de herbívoros, em uma
região de cerrado, na reserva do IBGE, Brasília, DF.
Foi investigado, também, se a herbivoria está
relacionada à arquitetura, dureza e área foliar; como a
área foliar está relacionada ao comprimento da
nervura principal e largura da folha; se a dureza foliar
aumenta com a área foliar; se os elementos de
arquitetura (diâmetro no eixo maior e menor da copa,
altura da planta e da copa, número de folhas e de
módulos e volume de copa) estão correlacionados.
Foram encontrados 29 morfoespécies de herbívoros.
A área foliar foi explicada pelo comprimento da
nervura e largura da folha (89,4%) e a dureza foliar
tendeu a diminuir com o aumento da área foliar. Os
elementos da arquitetura foram correlacionados entre
si, sendo que o número de folhas e de módulos foram
mais correlacionados com o diâmetro. Plantas
menores tiveram tendência a ter menor herbivoria, o
que pode estar correlacionado à menor dureza e
palatabilidade. Plantas com menor quantidade de
folhas e módulos apresentaram maior número de
espécies. Porém, o número de folhas foi relacionado
positivamente para os grupos taxonômicos,
separadamente. Os resultados indicam que a riqueza
de espécies de herbívoros em O. hexasperma, é
afetada pela diversidade de recursos, expressa pela
“densidade de folhas” na copa.
INTRODUÇÃO
A riqueza de espécies de herbívoros em um
determinado hospedeiro pode ser explicada por
diversos fatores. A nível regional, plantas com
distribuição geográfica mais ampla tendem a ter
maior diversidade de herbívoros que plantas com
distribuição mais restrita, uma relação existente em
espécies
taxonomicamente
distintas,
como
Zingiberales, Rosaceae, e outras (Lawton & Schröder
1977, Strong 1977, Strong et al. 1977, Strong &
Levin 1979, Leather 1986). A nível local, a riqueza
de espécies de herbívoros pode estar ligada à
abundância local, ao tempo de colonização, ao
isolamento taxonômico e à complexidade estrutural
do hospedeiro (Strong et al. 1977, Strong & Levin
1979, Neuvonen & Niemelä 1981, Southwood et al
1982, Lawton 1983, Leather 1986, Lewinsohn 1991,
Marquis 1991).
Em um gradiente de aumento de
complexidade estrutural desde plantas herbáceas até
árvores, espera-se encontrar um aumento de
diversidade de herbívoros no sentido ervas, arbustos
e árvores. Da mesma forma, dentro de uma mesma
espécie, haveria uma tendência a um aumento da
diversidade de herbívoros com o aumento da
complexidade estrutural da planta, ao longo do seu
desenvolvimento (plântula, jovem e adulto) e de
modificações sazonais (Strong & Levin 1979,
Lawton 1983). A arquitetura da planta está
relacionada aos componentes: (1) tamanho da planta;
(2) forma de crescimento; (3) desenvolvimento
sazonal (mudanças sazonais no tamanho e forma de
crescimento); (4) variedade e longevidade de
módulos (Lawton & Schröder 1977, Harper 1981,
Lawton 1983), que descrevem aspetos gerais do
tamanho da planta, forma de crescimento e
complexidade estrutural.
Basicamente duas hipóteses são utilizadas
para explicar essa relação na qual o número de
espécies aumenta com o aumento da complexidade
estrutural: (1) área per se, na qual plantas maiores
seriam mais “aparentes” (sensu Feeny 1976) e
portanto seriam mais facilmente “descobertas” por
herbívoros, além de suportarem populações maiores
que teriam taxas de extinção menor; (2) diversidade
de recursos, na qual plantas mais complexas teriam
uma maior diversidade de microhabitats (alimento,
local para nidificar, espaço livre de inimigos naturais)
e possibilidade de estratificação vertical ou horizontal
na ocupação hospedeiro, dando oportunidade para a
colonização por uma maior variedade de espécies,
com diferentes necessidades de recursos (Lawton &
Schöder 1977, Strong & Levin 1979, Neuvonen &
Niemelä 1981).
Essa tendência tem sido verificada,
principalmente em plantas de região temperada,
havendo uma carência de trabalhos que comprovem
essa relação em regiões tropicais, principalmente no
Cerrado (mas veja Cytrynowicz 1991). Esse trabalho
teve como objetivo testar a hipótese de que
indivíduos de Ouratea hexasperma com arquitetura
mais complexa têm maior riqueza de espécies de
herbívoros e relacionar herbivoria com arquitetura,
dureza e área foliar. Além disso, esse trabalho teve
como objetivos secundários verificar: (1) como a área
foliar pode ser explicada pelas variáveis
comprimento da nervura principal e largura da folha;
(2) se folhas maiores têm maior dureza; (3) se os
elementos da arquitetura estão correlacionados entre
si.
MATERIAL E MÉTODOS
75
Ouratea hexasperma (St.Hil.) Baill.
(Ochnaceae) é uma espécie arbustiva, muito comum
nos cerrados do Brasil Central. Sua arquitetura é
bastante variável, podendo atingir mais de 2 m de
altura (Ratter 1986), apresentando rebrotas
aparentemente induzidas após queimadas. A planta é
perenifólia, apresentando folhas velhas e novas o ano
todo, não ocorrendo queda acentuada e sincrônica de
folhas (Morais et al. 1995). Apresenta nectários
extraflorais nas estípulas e base do pedicelo do botão
floral, visitados principalmente por Camponotus
crassus e Zacryptoceus pusillus (Oliveira & OliveiraFilho 1991, Oliveira et al. 1995).
O trabalho foi desenvolvido entre os dias 10
e 14 de março de 1996, na Reserva Ecológica do
IBGE (15˚55’58’’S, 47˚51’02’’W), situada na Área
de Preservação Ambiental (APA) Cabeça de Veado,
Brasília, DF, em uma área de cerrado sensu stricto
(Eiten 1990) que é submetida a queimada anual.
2
Foi delimitada uma parcela de 2500 m
(50x50) onde foram registrados 93 indivíduos de O.
hexasperma. Desses, 50 foram sorteados e marcados
para o estudo.
Foram medidos os seguintes componentes
da arquitetura: diâmeto da copa no maior eixo
(DMA) e no menor eixo (DME) perpendicular à
“DMA”; altura da planta (APL); altura da copa
(ACP); número total de folhas (NFL) e número total
de módulos (NMD). O volume da copa foi estimado
segundo
um
semi-elipsóide,
onde
VCP=(π*DMA*DME*ACP)/6.
Além disso, foram coletadas folhas, ao
acaso, para medir a dureza, área foliar, área foliar
danificada, comprimento da nervura principal e
largura maior da folha. O número de folhas coletada
dependeu do número total de folhas do indivíduo (3
folhas, para indivíduos com até 60 folhas; 6 folhas
para indíviduos com até 200 folhas; 9 folhas para
indivíduos com mais de 200 folhas). A dureza foi
medida em folhas frescas com um penetrômetro, que
mede a força necessária (g*m-2) para perfurar um
círculo de 0.5mm de diâmetro (Coley 1983). A área
foliar foi determinada utilizando uma transparência
2
na qual foram desenhados quadrados de 1 cm de
área. A herbivoria foi calculada como % área foliar
danificada/área total da folha. Foi estimada, também,
a área foliar total da planta (área foliar
média*número total de folhas) e densidade foliar
(área foliar total da planta/DMA).
Em todas as plantas foram coletados ou
registrados, durante quatro dias, todos os herbívoros
avistados nas plantas. As plantas foram observadas
durante o período da manhã e tarde, sequencialmente,
permanecendo no máximo 5 minutos em cada planta.
Para relacionar a área foliar ao comprimento
da nervura e largura da folha foi realizada uma
regressão linear, segundo o modelo Y=a+bx1+cx2,
onde Y é a área foliar, x1 é o comprimento da
nervura principal e x2 é a largura maior da folha.
A relação entre dureza foliar (DFL) e área
foliar (AFL) foi analisada, também, com uma
regressão linear.
Para verificar a existência de correlacão
entre os elementos de arquitetura, foi utilizado o
coeficiente de correlação de Pearson.
As variáveis herbivoria e número de
espécies foram transformadas em arcoseno e
logarítmo, respectivamente (Zar 1974). A relação
entre herbivoria e riqueza total de espécies e por
grupos taxônomicos (ordem), com os elementos
arquitetônicos, dureza foliar e área foliar foi
analisada por regressão múltipla por passos (Stepwise
multiple regression).
As análises estatísticas foram feitas com o
software Statistix 4.1.
RESULTADOS
Foram encontradas 29 morfoespécies de
herbívoros (Tabela 1), sendo Homoptera, Orthoptera
e Lepidoptera os grupos com maior número de
morfoespécies. A nervura principal e largura da folha
explicaram 89,36% da variação na área foliar
2
(r =0,8936, F=79,77, p<0,001, N=248, Y=50,024+2,845x1+12,5286x2, onde “x1” é o
comprimento da nervura principal e “x2” a largura
maior da folha).
A dureza foliar tendeu a aumentar com o
aumento da área foliar, embora a porcentagem de
variação explicada por essa variável tenha sido muito
2
baixa (r =0,069, F=17,638, p<0,001, N=239,
Y=5,202+0,0031*AFL).
Os elementos de arquitetura foram
positivamente correlacionados entre si (Tabela 2). O
número de folhas (NFL) foi mais correlacionado com
o número de módulos (NMD), diâmetro no menor
eixo (DME) e volume da copa (VCP). Uma baixa
porcentagem de variação da herbivoria foi explicada
pelo diâmetro no maior eixo e área foliar (Tabelas 3 e
4). O número de folhas explicou a maior parte da
variação da riqueza de espécies, mas com uma
relação negativa (Tabelas 3 e 4). O número de folhas
e a altura da planta foram as variáveis responsáveis
pelas maiores porcentagens de explicação da variação
de riqueza de espécies de Lepidoptera, isoladamente,
com uma relação positiva (Tabelas 3 e 4).
Para Orthoptera, somente o volume de copa
foi significativo, porém, a variação explicada pelo
modelo foi muito baixa (Tabelas 3 e 4). Para
Coleoptera, a altura de copa explicou a maior parte
da variação na riqueza de espécies, mas com uma
relação negativa (Tabelas 3 e 4). Para Homoptera, o
76
número de folhas, que explicou a maior parte da
variação, apresentou uma relação positiva, mas o
volume de copa apresentou relação negativa (Tabelas
3 e 4). Para Hemiptera, o resultado foi similar,
embora somente o número de folhas e o volume de
copa tenha sido significativo (Tabelas 3 e 4).
DISCUSSÃO
O comprimento e a largura explicaram a
área foliar, assim, essa pode ser determinada a priori,
medindo-se somente essas variáveis.
A dureza aumentou com ao aumento da área
foliar. Folhas mais velhas acumulam mais fibras
(Coley 1983, 1988, Coley et al. 1985,), sendo
portanto mais duras. O. hexasperma apresentava, em
um mesmo indivíduo, poucos botões foliares e
indivíduos maiores e mais velhos apresentavam
menor quantidade de folhas jovens que indivíduos
mais jovens (observação pessoal). Entretanto, a
porcentagem da variação na dureza foliar explicada
pela variação na área foliar foi baixa. O. hexasperma
apresenta botões foliares durante todo o ano,
principalmente na estação chuvosa (Morais et al
1995). Assim, os indivíduos apresentavam folhas
mais velhas e mais novas e como não houve
diferenciação de estágios de desenvolvimento para
coleta e medição da dureza isso se refletiu nessa
variação.
Plantas menores, com menor área foliar
apresentaram maior herbivoria. Isso pode ter ocorrido
por: (1) efeito amostral; (2) as folhas jovens são
atacadas por espécies de Coleoptera que perfuram a
folha antes da sua expansão, à medida que a folha
esclerifica-se e expande-se lateralmente essas
perfurações são cicatrizadas, provocando uma
subestimativa da porcentagem de área foliar comida;
(3) folhas jovens e menores têm menor dureza, sendo
portanto mais palatáveis e mais comidas (Coley &
Aide 1991, Loyola, Jr. & Fernandes 1993, mas veja
Cooke et al. 1984). Além disso, a porcentagem de
área foliar comida foi maior em plantas menores
(diâmetro menor) que eram as plantas com maior
frequência de folhas mais novas. Seyffarth et al.
(1996) observaram que a porcentagem de ataque de
folhas de O. hexasperma por lagartas de Lepidoptera
não é afetada pelo comprimento foliar (que prevê a
área foliar). Entretanto, áreas queimadas apresentam
maior porcentagem de ataque que áreas não
queimadas (17,5% contra 9,5%), indicando que o
estresse causado pelo fogo pode resultar em um
aumento do número de folhas jovens, mais
susceptíveis ao ataque.
O número de indivíduos de herbívoros por
planta foi igual a um, praticamente para todas as
espécies. Entretanto, algumas espécies foram mais
freqüentes na área (encontrados em um maior número
de plantas) que outras (Tabela 1). Embora o presente
trabalho não tenha sido realizado com o objetivo de
determinar a abundância, aparentemente o padrão de
alta riqueza e baixa abundância encontrado parece ser
comum para o cerrado. Esse resultado é semelhante
ao encontrado por Price et al. (1995) para lagartas de
Lepidoptera em Erythroxilum em um cerrado de
Brasília, próximo à área do presente estudo. A
riqueza e composição de espécies de herbívoros deve
variar entre as estações (Cytrynowicz, 1991), mas a
abundância de insetos no verão (estação chuvosa),
quando foi realizado esse trabalho, pode ser mais que
o dobro que no inverno (Morais & Diniz, não
publicado).
A relação entre complexidade estrutural e
riqueza de espécies de herbívoros não apresentou um
padrão marcado e esperado pela teoria. Por um lado,
plantas com maior diâmetro e altura de copa
apresentaram maior número de herbívoros. Por outro
lado, plantas com maior número de folhas,
responsável por 15,1% da variação do número total
de espécies, tenderam a ter menor número de
espécies. Esse resultado pode ter ocorrido por efeito
de amostragem. Como as plantas eram observadas
durante um mesmo tempo, plantas com maior número
de folhas podem ter tido menor esforço amostral,
relativamente a plantas menores. Além disso, O.
hexasperma apresenta arquitetura tortuosa e bastante
ramificada. Plantas maiores, com maior diâmetro e
altura apresentavam maior número de folhas, mas
também um maior espaço “aberto” no interior da
copa. Plantas menores, com menor quantidade de
folhas eram mais compactas, tendo uma maior
“densidade” foliar, podendo proporcionar melhor
refúgio, microclima e diversidade de recursos para os
herbívoros. Para testar essa hipótese, a posteriori, foi
feita uma análise de regressão linear múltipla por
passos (stepwise) considerando os elementos de
arquitetura, dureza foliar e a variável densidade
foliar. O modelo foi ajustado após um passo, somente
com a entrada da variável “densidade foliar”, e
explicou 36,5% da variação da riqueza de espécies
2
(N=50,
F=29,542,
p<0,001,
r =0,368,
Y=1,154+0,001*DFL). Resultados diferentes podem
ser encontrados quando a riqueza de espécies de
herbívoros é estudada a nível de comunidade de
plantas. Considerando 260 espécies de plantas em
uma região de cerrado no Sudeste do Brasil,
Cytrynowicz (1991) encontrou 36% de explicação da
variação do número de espécies de herbívoros devido
ao número de folhas.
Os resultados de riqueza de espécies
separados por ordem apresentaram a mesma
tendência, sendo maior em plantas com maior
densidade de folhas, mas com uma relação positiva
com o número de folhas e negativa com o volume de
copa.
77
A altura da planta pode ser uma variável
arquitetônica importante para Lepidoptera (Neuvonen
& Niemelä 1981) e explicou 71% da variação na
riqueza de espécies de macrolepidopteras em árvores
e arbustos na Finlândia. A riqueza de Lepidoptera foi
maior em plantas mais altas, com maior número de
folhas, porém, com menor volume de copa.
Novamente aqui, a associação entre número de folhas
e volume mostra a preferência por plantas mais
“compactas”, mas, nesse caso, em plantas maiores.
Isso pode estar relacionado ao volume de recurso
utilizado por lagartas. Em plantas maiores com maior
quantidade de folhas, a lagarta pode permanecer mais
tempo em um mesmo indivíduo, sem necessidade de
deslocamentos.
Orthoptera foi mais diverso em plantas
menores (volume de copa). Plantas menores
apresentavam maior freqüência de folhas jovens, que
são menos duras e, portanto, mais palatáveis, o que
poderia estar influenciando na escolha de plantas por
espécies de Orthoptera que são raspadores. Isso pode
explicar, também, os resultados encontrados para
Coleoptera, que fazem furos em folhas novas.
Riqueza de espécies de homoptera foi maior
em plantas com maior número de folhas, porém, com
menor volume de copa, ou seja, em plantas com
maior “densidade” de folhas. Murdoch et al. (1972)
explicou 71% da variação do número de espécies de
Homoptera, em uma comunidade de árvores, devido
à altura da folhagem
A relação entre riqueza de espécies de
herbívoros e complexidade estrutural em O.
hexasperma mostrou-se complexa. Os elementos da
arquitetura, como a altura da planta, altura e diâmetro
de copa, não explicaram, isoladamente, a riqueza de
espécies. Isso pode estar relacionado ao desenho
arquitetônico dessa planta: plantas maiores, apesar de
possuírem maior número de folhas e módulos,
apresentaram copas mais abertas, com maior espaço
interno. Assim, a riqueza de herbívoros,
aparentemente, foi melhor explicada pela “densidade
de folhas” na copa.
Nesse trabalho, a dureza foliar não explicou
a variação na riqueza de espécies de herbívoros, ou
na herbivoria. Folhas novas e velhas não foram
separadas para a medição de dureza e o efeito da alta
freqüência de folhas novas em plantas mais novas foi
representado pelo efeito do tamanho da planta na
herbivoria.
AGRADECIMENTOS
Ao IBGE, pela apoio logístico, ao Prof Dr.
Raimundo P.B. Henriques, Delano Moody e Profa
Helena C. Morais pelas valiosas sugestões. Ao
Departamento de Ecologia, UnB, pela oportunidade
de realizar este trabalho durante o curso de
Doutorado. Ao Prof. Dr. John DuVall Hay e Prof. Dr.
Guarino Colli pelas sugestões e leitura criteriosa do
manuscrito.
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79
Tabela 1. Morfoespécies de herbívoros encontradas
em Ouratea hexasperma e número de plantas em que
foram encontradas, em um cerrado do IBGE.
Ordem/Família Espécie
Plantas
Lepidoptera
Megalopygidae Megalopyge albicollis
07
Geometridae
Cyclomia ocana
01
Arctiidae
Fregela semiluna
08
Indeterminado Lepidoptera sp1
05
Lepidoptera sp2
07
Lepidoptera sp3
07
Orthoptera
Acrididae
Acridinae sp1
15
Acridinae sp2
18
Acridinae sp3
04
Cyrtacanthacridina sp1
13
Cyrtacanthacridinae sp2 06
Cyrtacanthacridinae sp3 05
Tetigonidae
Copiphorinae sp1
12
Phaneropterinae sp1
08
Coleoptera
Buprestidae
Buprestidae sp1
01
Cantharidae
Cantharidae sp1
01
Bruchidae
Bruchidae sp1
10
Scarabaeidae
Melolonthinae sp1
01
Hemiptera
Coriscidae
Coriscidae sp1
05
Corizidae
Corizidae sp1
11
Homoptera
Cicadellidae
Cicadellidae sp1
10
Cicadellidae sp2
10
Cicadellidae sp3
10
Cicadellidae sp4
12
Cicadellidae sp5
07
Cicadellidae sp6
01
Cicadellidae sp7
01
Membracidae
Membracidae sp1
09
Fulgoroidae
Fulgoroidae
01
80
Tabela 2. Correlação de Pearson para os elementos de arquitetura. (DMA) diâmetro do maior eixo da copa; (DME)
diâmetro do menor eixo da copa; (APL) altura da planta; (ACP) altura da copa; (NFL) número de folhas; (NMD)
número de módulos; (VCP) volume da copa. N=50, p<0,001 para todos os pares.
DMA
DME
APL
ACP
NFL
NMD
DMA
1,00
DME
0,97
1,00
APL
0,87
0,87
1,00
ACP
0,74
0,78
0,80
1,00
NFL
0,87
0,92
0,78
0,79
1,00
NMD
0,94
0,95
0,83
0,77
0,94
1,00
VCP
0,86
0,90
0,75
0,83
0,89
0,91
2
Tabela 3. Coeficiente de regressão parcial (r ) para as variáveis independentes das análises de regressão múltipla
por passos (stepwise multiple regressions). (DMA) diâmetro no eixo maior, (DME) diâmetro no eixo menor, (APL)
altura da planta; (ACP) altura da copa, (NFL) número de folhas, (NMD) número de módulos, (VCP) volume da
copa, (AFL) área foliar. A variável dureza foliar não foi significativa em nenhuma regressão.
Variável Dependente
2
Variáveis Independentes - r
DMA
DME
APL
ACP
NFL
NMD
VCP
AFL
Herbivoria
0.016
-
-
-
-
-
-
0.020
Riqueza total
0.020
-
-
0.015
0.151
0.056
0.079
-
Lepidoptera
Orthoptera
Coleoptera
Homoptera
Hemiptera
-
0.070
0.047
-
0.189
0.005
-
0.018
0.147
0.015
-
0.128
0.303
0.085
0.030
-
0.028
0.091
0.038
0.272
0.034
-
Tabela 4. Equações de regressão múltipla entre herbivoria, riqueza total de herbívoros e por grupos taxonômicos
(variáveis dependentes) e elementos arquitetônicos, dureza e área foliar (variáveis independentes ) para Ouratea
hexasperma. (a-h) coeficientes da regressão; N=50, para todas as regressões. A variável dureza foliar não foi
significativa em nenhuma regressão.
Variável
Dependente
Const Variáveis Independentes - Elementos Arquitetônicos
Herbivoria
Riqueza Total
Lepidoptera
Orthoptera
Coleoptera
Homoptera
Hemiptera
14,84
0,00
-0,70
1,38
0,00
0,75
0,00
a*DMA b*DME
c*APL
d*ACP
e*NFL
f*NMD
g*VCP
h*AFL
2
r
F
P
-0,11
2,72
-
0,98
-0,65
-
3,76
1,99
0,73
1,56
-
-0,02
0,01
0,01
0,01
-0,05
-0,02
-
-0,62
-0,15
-0,09
-0,090
-0,26
-0,09
-2,76
-
0,04
0,45
0,40
0,09
0,17
0,67
0,14
5,05
33,27
26,52
12,24
11,66
82,14
9,72
<0,01
<0,01
<0,01
<0,01
<0,01
<0,01
<0,01
0,44
3,12
-
81
EFEITOS DE DIFERENTES REGIMES DE
QUEIMA SOBRE A VEGETAÇÃO LENHOSA
DE CERRADO SENSU STRICTO: TAXAS
DIFERENCIAIS DE REBROTAS
Saulo Marques de Abreu Andrade
RESUMO
As rebrotas são eficientes mecanismos de
sobrevivência das plantas adaptadas ao fogo. Em
duas áreas de 10 ha de cerrado sensu stricto,
submetidas a diferentes regimes de queimas, uma
queimada bianualmente e outra vinte anos sem
queima, foram amostrados todos os indivíduos, a
uma distância de 1 metro de quatro transectos de 50
metros cada, com diâmetro de 5 centímetros a 30 cm
do solo. Todas as rebrotas foram contadas e
classificadas em aéreas, basais e subterrâneas. A
porcentagem de rebrotas aéreas foi de 30 e 8 %
respectivamente, de 51 e 67 % de rebrotas basais e,
19 e 25 % de rebrotas subterrâneas. Estes valores
comparados com o do controle mostram que ocorre
uma mudança temporária na arquitetura da
vegetação.
INTRODUÇÃO
O fogo seleciona aquelas espécies de
cerrado que apresentam estratégias de resistência a
queimada (Guedes 1993). Cada espécie possui
capacidade de recuperar-se frente um distúrbio
conforme suas reservas de energia para rebrota,
existência de bancos de semente no solo, capacidade
de recolonização e habilidade de estabelecimento em
condições extremas (Frost et al. 1986). Na
comunidade lenhosa as estratégias frente ao fogo são
distintas das do estrato rasteiro, visto que estes dois
componentes do Cerrado possuem formas de vidas
diferentes e se localizam diferentemente com respeito
às zonas de maior impacto de calor.
Sambuichi (1991), afirma que o fogo além
de ralear a camada lenhosa, diminui sua diversidade.
Segundo Ramos (1990), áreas protegidas contra
queima, apresentam densidade arbórea, área basal
viva e cobertura arbórea aproximadamente o dobro
daquelas submetidas a queimas bienais. Proteção
contra fogo em savanas aumenta a densidade de
árvores, diminuindo a camada de gramíneas (Frost et
al. 1986). Com relação às plantas lenhosas já
estabelecidas, a mortalidade devida ao fogo é muito
baixa, sendo a destruição parcial da copa o dano
principal, exceto para plântulas. Este dano varia com
a intensidade e regime das queimadas, podendo levar
à
exclusão
de
espécies
sensíveis,
e
consequentemente, a uma mudança na composição
florística (Ramos 1990).
Ramos (1990), cita o dano estrutural nulo,
isto é, aquele em que os indivíduos, principalmente
arbóreos, com altura superior a três metros,
apresentam apenas murchamento e queda das folhas.
Este seria o menor efeito do fogo sobre as lenhosas.
O que ocorre é que após a queima as folhas murcham
e caem devido ao calor. Após esta queda, aquelas
gemas que conseguiram resistir ao calor emitem
novos brotos.
Armando (1994), mediu o efeito do fogo na
sobrevivência e no crescimento de espécies arbóreas
nas fases iniciais de crescimento (até 30 cm de altura
e 5 cm de circunferência), em cerrado. Seus
resultados evidenciam aumento de mortalidade e
diminuição da altura atingida por rebrota. O intervalo
de um ano não foi suficiente para a recuperação da
altura existente antes do fogo, em juvenis e plântulas.
Deste modo, queimas anuais poderão levar à redução
e eliminação das populações de certas espécies.
Segundo Guedes (1993), temperaturas acima
0
de 60 C (inclusive), causam morte do câmbio
vascular. Um incêndio que apresente 380 0C por 0,7
min. de duração (situação próxima à que ocorre no
cerrado) alcança tal temperatura em árvores que
apresentam casca de espessura menor que 6 mm.
A capacidade de rebrota está relacionada ao
tamanho da plântula (Armando 1994), ocorrendo
com grande rapidez na época seca e chuvosa (Souza
& Soares 1983; Warming 1973). A reserva em suas
estruturas faz com que estas espécies mesmo após o
fogo possam retomar seu crescimento, ultrapassando
a altura crítica onde o fogo causa danos diretos. O
início, a duração e o pico de brotamento variam
conforme as adaptações de cada espécie e também
com a disponibilidade de recursos. Água e nutrientes
estão disponíveis no sistema subterrâneo da planta
(xilopódios) ou no solo, permitindo o brotamento na
estação seca (Souza & Soares 1983).
O estrato rasteiro ganha grande importância
na intensidade do fogo, pois quanto maior o acúmulo
de combustível mais intenso será o fogo (Ramos e
Rosa 1992), afetando, então o tipo de rebrota.
Dependendo do dano ocorrido, as plantas poderão
simplesmente repor suas folhas, regenerar a partir de
gemas aéreas protegidas pela casca, ou a partir de
gemas situadas abaixo do solo, quando todo o caule
for destruído (Chandler et al. 1983). Quanto maior o
tamanho da parte morta, maior o entouceiramento
(Ramos 1990).
Existem diversas vantagens ecológicas
associadas com a persistência por brotamentos após
distúrbios como o fogo, principalmente em ambientes
quentes e com um estresse hídrico, uma vez que estas
condições são desfavoráveis para o estabelecimento
de sementes. Desta forma, a utilização de estruturas
de armazenamento, que possuem água e nutrientes, é
82
extremamente benéfica ao indivíduo mesmo em
épocas secas (Souza & Soares 1983).
O objetivo deste estudo é documentar e
quantificar o número de rebrotas basais (i.e. rebrotas
logo na base do indivíduo), subterrâneas (rebrotas de
estruturas vegetativas a uma distância máxima de 25
cm, para serem consideradas do mesmo indivíduo) e
aéreas (rebrotas que saem de debaixo da casca do
próprio caule) e, verificar se em diferentes regimes
de queima há uma taxa diferencial entre esses dois
tipos de rebrotas, isto é, como a frequência e a
intensidade do fogo afetam o número e o crescimento
das rebrotas.
MATERIAL E MÉTODOS
O experimento foi realizado na Reserva
Ecológica do IBGE (RECOR) localizada a 35 km ao
sul de Brasília. Foram marcados 4 transectos de 50 m
cada, em três áreas de 10 ha de cerrado sensu stricto
do Projeto Fogo submetidas a diferentes regimes de
queima.
1.Controle- vinte anos sem queima;
2.Bianual modal- com queima de 2 em 2 dois anos e
que foi queimada pela primeira vez em 1992 após 20
anos sem queima e depois em 1994;
3.Cerrado de 1994- que era uma área de cerrado
controle 20 anos sem queima mas, que durante um
incêndio em outubro de 1994 foi queimado,
simulando uma queimada 20 anos sem queima
porém, não prescrita. Tomada neste trabalho como
exemplo de um incêndio natural, onde pelo grande
acúmulo de combustível espera-se uma maior
intensidade do fogo.
Todos os indivíduos à distância de um metro ao
longo dos transectos e com diâmetro mínimo de 5 cm
a 30 cm acima do solo foram anotados, contando-se o
número de rebrotas e diferenciando-as em basais,
subterrâneas e áreas (contando-se o indivíduo todo
como uma rebrota já que continua vivo).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Utilizando-se o teste estatístico ANOVA,
para comparar a diferença entre os valores médios de
espécies e indivíduos entre as áreas, verificou-se que
o número de espécies nas áreas controle e cerrado
1994
(Tabela
1)
não
se
apresentaram
significativamente diferentes (P<0,05), mesmo após
uma queimada de 20 anos sem queima na área do
cerrado 1994, sugerindo que apenas uma queimada
em uma área de cerrado sensu stricto protegida, ainda
que por 20 anos, não é tão prejudicial. Porém o
número de espécies e de indivíduos na bienal modal é
significativamente diferente (P<0,05) e menor que
das áreas controle e cerrado 1994 (Tabela 1),
indicando um raleamento da vegetação em
conseqüência da freqüência de queima.
Na Tabela 2 observa-se que o número de
rebrotas basais na área do cerrado 1994 é
significativamente diferente (P<0,05) e maior que na
bienal controle assim como nesta o número de
rebrotas aéreas é bem maior que na do cerrado 1994,
estes valores são significativamente diferentes
(P<0,05).
É também nítido que no cerrado controle
não há rebrotas, de todos os 337 indivíduos
amostrados nenhum apresentou rebrotas.
Porém, o tipo de rebrota está ligado
diretamente à gravidade do dano ocorrido
(Chandler et al. 1983), quanto maior o dano menor a
capacidade de recuperação por gemas apicais debaixo
da casca (Kauffman 1991), isto é, menor número de
rebrotas aéreas.
Ramos (1990) mostra que quanto maior o
dano da parte aérea maior o entouceiramento. Isto
significa um maior número de rebrotas basais e
subterrâneas. Quando a parte aérea é toda destruída a
planta não tem a capacidade de formar rebrotas
aéreas, pois todas a gemas apicais foram destruídas.
O grande número de rebrotas aéreas
encontradas na bienal modal (Tabela 2) é
significativamente diferente (P<0,05), segundo teste
do X2, da área do cerrado 1994 sugerindo que a
intensidade do fogo foi menor, não danificando a
planta a ponto desta perder duas gemas apicais, isto
em decorrência de um menor acúmulo de biomassa já
que a área foi queimada em 1992. Entretanto, no
cerrado 1994 o acúmulo de biomassa era grande,
fazendo com que a intensidade do fogo fosse maior,
pois este acúmulo tem grande importância na
intensidade do fogo (Ramos e Rosa 1992).
Cada espécie possui capacidade de
recuperar-se frente um distúrbio conforme suas
reservas de energia para rebrota (Frost et al.1986).
Dessa forma pode-se especular que no cerrado 1994
estas reservas eram maiores uma vez que não era
queimado há vinte anos, mostrando assim um número
de rebrotas tanto basais quanto subterrâneas
significativamente diferente (P<0,05) e maior que a
da bienal modal, uma vez que esta já foi queimada
duas vezes, esgotando assim a reservas para rebrotas.
O número de fustes mortos indicam que a queimada
do cerrado 1994 foi mais prejudicial às plantas.
Diferentes regimes de queima afetam
diferencialmente as taxas de rebrotas, sendo que
quanto mais intenso, menor o número de rebrotas
aéreas, uma vez que as gemas apicais são mortas. Isto
determina um maior número de rebrotas basais e
subterrâneas já que estas gemas, por se encontrarem
protegidas abaixo do solo, não sofrem os efeitos das
altas temperaturas da queimadas.
As
plantas
que
se
reproduzem
vegetativamente, se restabelecem predominantemente
por rebrotas do tipo basal, após a queimadas.
83
O grande número de rebrotas, após as
queimadas, causam uma mudança temporária na
arquitetura
da
vegetação,
decorrente
do
entouceiramento. Uma vez que no cerrado protegido
do fogo por 20 anos, não se observam o grande
número de rebrotas encontrado nas áreas queimadas.
AGRADECIMENTOS
Ao professor Raimundo Paulo Henriques
pela organização do curso e grande ajuda na
identificação das espécies. A Reserva Ecológica do
IBGE pelo cessão do alojamento e toda a infraestrutura. A todos os professores que com o Rodiasol
de suas inteligências exterminaram os pernilongos de
nossas dúvidas. Aos queridos Fátima, Formigão e
colaboradores pelas deliciosas refeições sem a quais
não teríamos sobrevivido. A todos os meus queridos
amigos que comigo desfrutaram de um grande curso
e partilharam dias de muita alegria. Aos meus
queridos parceiros de grupo que me ensinaram muito
partilhando seus conhecimentos. E finalmente ao
grande e incomparável The King pela inspiração em
todos os momentos deste curso.
BIBLIOGRAFIA
ARMANDO, M. S. 1994. O impacto do fogo na
rebrota de algumas espécies de árvores do
cerrado. Dissertação de mestrado. Universidade
de Brasília. 75 pp
CHANDLER, C.; CHENEY, P.; THOMAS, P.;TRUSAND, L. & WILLIANS, S. 1983. Fire
effects on vegetation. In: Fire in forestry: forest
fire behavior and effects. John Willey and Sons.
1: 255-289.
FROST, P.; MEDINA, E.; MENAUT, J. C.;
SOLBRIG, O.; SWIFT. M & WALKER, B. H..
1986. Responses of savannas to stress and
disturbance: a proposal for a collaborative
programme of research. IUBS. Special Issue 10.
82 pp.
GUEDES, D. M. 1993. Resistência das árvores do
Cerrado ao fogo: Papel da casca como isolante
térmico. Dissertação de Mestrado. Universidade
de Brasília. 113 pp.
KAUFFMAN, J. B. 1991. Survival by sprouting
following fire in tropical forests of the Eastern
Amazon. Biotropica 23(3): 219-224.
RAMOS, A. E. & ROSA, C. M. M. 1992. Impacto
das queimadas. In: Alternativas de
desenvolvimento dos Cerrados manejo e
conservação dos recursos naturais renováveis.
Dias, B. F. S. (coord.). IBAMA/FUNATURA,
Brasília, 34-38.
RAMOS, A. E. 1990. Efeitos da queima na vegetação
lenhosa do cerrado. Dissertação de mestrado.
Universidade de Brasília. 142 pp.
ROSA, C. M. M. 1990. Recuperação pós-fogo do
estrato rasteiro de um campo sujo de cerrado.
Dissertação de mestrado. Universidade de
Brasília. 162 pp.
SAMBUICHI, R. H. R. 1991. Efeitos de longo prazo
do fogo periódico sobre a fitossociologia da
camada lenhosa de um cerrado em Brasília, DF.
Dissertação de mestrado. Universidade de
Brasília. 130 pp.
SOUZA, M. H. A. O. & SOARES, J. J. 1983.
Brotamento de espécies arbustivas e arbóreas,
posteriormente a uma queimada, num cerradão.
An. Sem. Reg. Ecol. III: 263-275.
WARMING, E. 1973. Lagoa Santa, contribuição
para a geographia phitobiológica. Livraria
Itatiaia, Belo Horizonte & EDUSP, São Paulo,
279 pp.
Tabela 1. Número médio de espécies e indivíduos por
transecto encontrados nas três áreas.
Área
espécies
indivíduos
x (s)
x (s)
Bianual modal 18 (2)
61 (3)
Cerrado 1994
23 (1)
73 (4)
Controle
26 (2)
84 (8)
Tabela 2. Porcentagem de rebrotas nas três áreas,
com o número absoluto entre parênteses, e número de
fustes mortos.
Rebrotas (%)
Área
basais
aéreas subterr. fustes
mortos
Bienal modal 51(244) 30(144) 19(89) 179
Cerrado 1994 67(506) 8(59)
25(185) 238
Controle
0
0
0
20
84
Apêndice: Listas das espécies inventariadas nas três áreas.
Bianual Modal
Acosmium dasycarpum
Aegiphila lhotzkiana
Aspidosperma dasycarpum
Aspidosperma macrocarpum
Banisteriopsis sp.
Bauhinia sp.
Blepharocalyx salicifolius
X
Brosimum gaudichaudii
X
Byrsonima coccolobifolia
X
Byrsonima crassa
X
Byrsonima verbascifolia
X
Caryocar brasiliense
X
Casearia sylvestris
Chamaecrista sp.
X
Connarus suberosus
X
Couepia grandiflora
Dalbergia violacea
X
Davilla elliptica
X
Didymopanax macrocarpum
Dimorphandra mollis
Eremanthus glomerulatus
X
Eremanthus goyazensis
X
Eriotheca pubescens
X
Erythroxylum suberosum
X
Erythroxylum tortuosum
X
Esenbeckia pumila
Guapira noxia
X
Hymenaea stignocarpa
X
Kielmeyera coriacea
X
Lafoensia pacari
X
Machaerium acutifolium
X
Miconia albicans
X
Miconia fallax
Miconia ferruginata
X
Myrsine guianensis
Neea theifera
Ouratea hexasperma
X
Palicourea rigida
X
Piptocarpha rotundifolia
Qualea grandiflora
X
Qualea multiflora
X
Qualea parviflora
X
Rapanea guianensis
X
Roupala montana
X
Rourea induta
X
Salacia crassifolia
X
Sclerolobium paniculatum
X
Sthrychnos pseudochina
Stryphnodendron adstringens
X
Styrax ferruginea
X
Tocoyena formosa
X
Vellozia flavicans
Vochysia elliptica
X
Whalteria indica
Total
36
Cerrado 1994
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
Controle
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
41
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
45
85
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