56 OCORRÊNCIA DA ORQUIDÁCEA SOPHRONITIS CAULESCENS (LINDLEY) NA TRILHA DA ÁREA DE CANGA DO PARQUE ESTADUAL DA SERRA DO ROLA MOÇA – MG Camila Sales Nascimento ([email protected]) 1 Juciléia Aparecida dos Santos Gomes ([email protected]) 1 Nathália Gonçalves da Silva Lima ([email protected]) 1 Priscilla Guimarães Zanella ([email protected]) 1 Sara Gonçalves Santos ([email protected]) 1 Zuleima dos Santos Miranda ([email protected]) 1 1 - Estudante do Curso de Ciências Biológicas da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Resumo O presente trabalho teve como objetivo verificar a ocorrência da orquidácea Sophronitis caulescens (Lindley) ao longo da trilha de canga do Parque Estadual da Serra do Rola Moça - MG, uma vez que esta foi escolhida como planta símbolo do parque por um grupo de alunos do 3o período do curso de Ciências Biológicas da PUC – Minas Coração Eucarístico. A trilha foi totalmente percorrida pelo grupo; Foram feitas anotações, registro fotográfico e os pontos onde foram encontradas as orquídeas foram marcados com o auxilio de um GPS. Obtivemos como resultado, a presença da S. caulescens ao longo de toda trilha de canga, mostrando ser uma planta muita bem adaptada a esse tipo de vegetação. Palavras-chave: Orquídea; Sophronitis caulescens (Lindley); Mata de Canga; Parque Estadual da Serra do Rola Moça. Abstract This work intends to verify the occurrence of the orchid Sophronitis caulescens along the trail of Canga in the Parque Estadual da Serra do Rola Moça, once this orchid was chose as symbol-plant of the park by a student’s group from the 3° period of the Biology course in PUC – Minas/ Coração Eucarístico. The group walked by all the trail, making notes, tacking pictures and marking some points where was found the orchid with the relief of one GPS. We obtained as result, the presence of S. caulescens along all the trail of Canga, proving that this plant is very much adapted in this kind of vegetation. Key words: Orchid; Sophronitis caulescens (Lindley); Mata de Canga; Parque Estadual da Serra do rola Moça. Sinapse Ambiental edição especial – Abril de 2008. 57 INTRODUÇÃO Os campos rupestres sobre canga constituem um ambiente caracteristicamente singular ao estabelecimento de plantas, pois devido as suas características são necessárias certas adaptações dos organismos que neles habitam. Alguns fatores limitantes, como alta incidência solar, pouca matéria orgânica disponível e solo com altas concentrações de metais pesados, podem ser considerados relevantes na biologia e no processo evolutivo de espécies que ocorrem neste local (VIANA e LOMBARDI, 2006). A região da canga é caracterizada por vegetação de campo rupestre sobre rocha ferruginosa cenozóica composta por fragmentos de hematita cimentados por limonita (GARCIA, BARROS e FILHO, 2006). Existem basicamente dois tipos de vegetação de canga. Quando esta se apresenta fragmentada, com matéria orgânica e com umidade, favorece o desenvolvimento das espécies de maior porte, como as velloziaceae arbustivas, popularmente conhecidas como canelas-de-ema. Por outro lado nas cangas couraçada, com grande área de rocha exposta e poucas fendas, ocorre a quase ausência de gramíneas. Nelas ocorrem Arnica sp. , leguminosas, espécies ornamentais, como as orquídeas, dentre outras. Grandes extensões deste ambiente já foram completamente eliminadas por atividades mineradoras e quase a totalidade dos remanescentes pertence a empresas de mineração ou são áreas fortemente afetadas pela expansão imobiliária. Apenas uma unidade de conservação em Minas Gerais, o Parque Estadual da Serra do Rola Moça (PESRM), possui pequenas porções de campos rupestres sobre canga. (VIANA e LOMBARDI, 2006). A Serra da Calçada se situa no extremo norte da Serra da Moeda (limite oeste do PESRM), município de Brumadinho e segue aproximadamente 8 Km em direção Sul, a partir do ponto 20º05’35’’S, 43º59’01’’ W, onde se localiza o condomínio residencial Sinapse Ambiental edição especial – Abril de 2008. 58 Retiro das Pedras. São encontrados, dentre os tipos vegetais da região, os campos rupestres sobre canga, que ocupam 500 ha aproximadamente. Identificar espécies nativas capazes de se desenvolver nestes locais é um importante passo para se manejar áreas degradadas pela atividade de mineração. Muitas espécies apresentam adaptações morfológicas e/ou fisiológicas a ambientes xerófiticos, tais como folhas coreácea ou suculentas, modificações de órgãos sem estruturas de reserva, presença de pilosidade densa nas folhas e ramos, etc. Em função dos altos teores de metais pesados no solo, as plantas podem apresentar ecótipos com nanismo ou gigantismo e alta capacidade de reter metais pesados em seus tecidos. Em contrapartida à baixa diversidade vegetal, os substratos metalíficos têm ocorrência freqüente de espécies endêmicas. (VIANA e LOMBARDI, 2006). O Parque Estadual da Serra do Rola Moça-MG possui uma flora muito rica e diferenciada, porém há poucos estudos e trabalhos publicados sobre o mesmo. Por se tratar de uma área de grande diversidade é necessário um conhecimento mais amplo das espécies que nele ocorrem. O presente estudo tem como objetivo observar, conhecer e delimitar a ocorrência de uma planta escolhida pela equipe do trabalho como símbolo do parque, na trilha da área de canga couraçada do Parque Estadual da Serra do Rola Moça, assim como conhecer as adaptações morfológicas que possibilitam a instalação desta espécie neste ambiente. METODOLOGIA Para a escolha da espécie símbolo para o projeto, o grupo fez uma investigação preliminar no campo, observando e fotografando as espécies da região. A identificação da espécie se deu por meio de correspondência com fotografia da flor, fruto e folha da planta, entre o laboratório de botânica da PUC Minas e o Doutor Eduardo Borba da Universidade Federal de Minas Gerais. Sinapse Ambiental edição especial – Abril de 2008. 59 Dados sobre o ambiente onde ocorre a espécie e o hábito foram baseados em observações de campo e/ou extraídos de pesquisa bibliográfica. Após a escolha da espécie e pesquisa bibliográfica foi feita a marcação dos exemplares na região do parque. Para esta etapa do trabalho foi necessária a utilização de GPS, da marca Garmin, e máquina fotográfica da marca Nikon, ambos cedidos pelo laboratório de Tratamento da Informação em Biologia da PUC Minas. A marcação teve o seguinte procedimento: 1) O grupo caminhou na trilha da mata de Canga do PESRM utilizando o GPS, para marcar essa rota. 2) Os exemplares da espécie escolhida encontrados nessa trilha foram fotografados e georreferenciados pelo GPS. Para a realização das fotos, foram utilizadas objetivas normal e tele objetivas, bem como tripé e pranchetas. 3) Os dados computados pelo aparelho GPS e as fotografias foram lançados no computador para a identificação, no mapa do Parque, dos pontos onde a espécie ocorre. Para a observação das características morfológicas e caracterização da espécie escolhida foi coletado um exemplar, com a licença para coleta concedida pelo Instituto Estadual de Florestas (IEF). A coleta e armazenagem foram feitas de acordo com as técnicas de herbário de Fidalgo e Bononi (1984). A exsicata produzida foi armazenada no laboratório do museu de Ciências Naturais da PUC-Minas. Foram produzidas também ilustrações da espécie. Sinapse Ambiental edição especial – Abril de 2008. 60 RESULTADOS Após análise das fotografias e levando em conta a frequência de aparecimento na trilha, a espécie escolhida foi uma representante da família orchidaceae, a espécie Sophronitis caulescens (Lindley). Na família Orchidaceae, os três carpelos são fundidos e o ovário é ínfero, e cada ovário contém milhares de óvulos diminutos. Conseqüentemente cada evento de polinização pode resultar na produção de muitas sementes. Usualmente, apenas um estame está presente, sendo fundido com o estilete e o estigma numa única estrutura complexa, a coluna. Todo o conteúdo da antera é mantido unido e dispersado como uma unidade, a polínia. As três pétalas da família Orchidaceae são modificadas de maneira que as duas laterais formam alas e a terceira, que geralmente é maior e vistosa, forma o labelo. A família Orchidaceae possui também três sépalas, que são comumente coloridas e semelhantes às pétalas (RAVEN, EVERT e CURTIS, 2001). (Ver figura 1) Figura 1: Orquídea Fonte: http://www.jbrj.gov.br/saibamais/orquideas Sinapse Ambiental edição especial – Abril de 2008. 61 Dados fornecidos pelo site do Jardim Botânico do Rio de Janeiro (2002), dizem que a Família Orchidaceae possui mais de vinte mil espécies distribuídas em quase todas as partes do planeta, porém a maioria das espécies é encontrada nas áreas tropicais. O Brasil é um dos países mais rico em orquídeas, comparável somente à Colômbia e ao Equador. O gênero Sophronitis está distribuído pelo sudeste do Brasil em áreas montanhosas e úmidas, são epífitas ou ocasionalmente rupícolas. Este gênero também pode ser encontrado no Paraguai e nordeste da Argentina. Tem como característica pseudobulbos ovóides e achatados contra o substrato, de coloração verde escuro ou acinzentados, são densamente agrupados, crescendo de modo a formar uma linha, com uma única folha carnuda, côncava, achatada sobre a planta. Do ápice do pseudobulbo nasce a inflorescência, com cinco a sete flores, cuja coloração pode variar na coloração entre amarela, cor-de-rosa, lavanda, arroxeada, lilás ou vermelha, com pétalas e sépalas similares (BAPTSTA, 2002). O labelo, neste gênero, pode ser inteiro, ligeiramente lobado, a distintamente trilobado. A coluna é geralmente um tanto curvada, e sua antera carrega oito políneas (BRITO e CRIBB, 2000). Jonhn Lindley descreveu este gênero como Sophronia, em 1928, baseando-se em Sophronia cernua (Lindley), mas o nome genérico já havia sido aplicado para um gênero de fungos em 1827, então Lindley o substituiu por Sophronitis que é diminutivo de Sophronia, o qual em grego significa “modesto” se referindo ao pequeno porte da planta estudada (BRITO e CRIBB, 2005). A espécie Sophronitis caulescens (Lindl.) Van den Berg & M.W.Chase, (Lindleyana 15: 116; 2000), foi descrita primeiramente por John Lindley como Laelia caulescens Lindl.,( Edwards's Bot. Reg. 27: sub t. 1. 1841) a partir de material que lhe foi enviado do Herbário de Martius. Todas as descrições do Lindley são baseadas somente em Sinapse Ambiental edição especial – Abril de 2008. 62 material de herbário não têm tábuas e são sempre sumárias, que eram feitas como anotações de rodapé abaixo de alguma outra espécie, razão pela qual recebe o sufixo "sub" no basônimo. No caso da Sophronitis caulescens a descrição foi feita no periódico Edwards's Botanical Register 27 em 1841 no rodapé (sub) de uma Crassulaceae: Echeveria lurida (NETO, 2007). A ilustração botânica que se aceita para esta espécie é aquela contida no Flora Brasiliensis, Martius (NETO, 2007). Análises recentes feitas por BERG et al. (2000), do DNA, demonstraram que as espécies brasileiras do gênero Laelia Lindl. são mais relacionadas com as do gênero Sophronitis do que com as laelias meso – americanas, com isso , BERG e CHACE (2000) transferiram todas as laelias brasileiras para o gênero Sophronitis, e decidiram interpretá-lo sob um conceito mais amplo (BRITO e CRIBB, 2005). A espécie Sophronitis caulescens foi encontrada com abundância em muitos pontos ao longo de toda trilha (mapa 1) da área de Canga do PESRM, porém em todos os casos os exemplares estavam com o fruto verde ou maduro, não apresentando nenhuma flor, como foi encontrada na primeira ida ao campo (para reconhecimento do local e escolha da espécie objeto de trabalho). Sinapse Ambiental edição especial – Abril de 2008. 63 Mapa 1. Trilha realizada na mata de Canga, demonstrando a distribuição da espécie Sophronitis caulescens. A ampla distribuição pela trilha da Sophronitis caulescens (Lindley) no PESRM (mapa 1) se deve, provavelmente, as adaptações morfológicas verificadas na espécie, tais como: estrutura foliar coreácea e raiz tipo velame (figura 2), que possui a epiderme estratificada, diminuindo assim a perda d’água.Outro fator que possivelmente auxilia na sua ampla distribuição no parque é a fácil dispersão da semente pelo vento por esta ser muito fina e em grandes quantidades e o fruto ser do tipo cápsula seca deiscente (figura 3). Sinapse Ambiental edição especial – Abril de 2008. 64 Figura 2: Desenho da espécie Sophronitis caulescens. Desenho de Juciléia Aparecida dos Santos Gomes, 2007 Figura3: Fruto da orquídea Sophronitis caulescens. Foto: Sara Gonçalves Santos A foto da flor da espécie obtida na primeira ida ao campo confirma as características descritas acima. (Figuras 4 e 5). Sinapse Ambiental edição especial – Abril de 2008. 65 Figura 4 e 5: Flor de Sophronitis caulescens. Fotos: Priscila Guimarães Zanella CONSIDERAÇÕES FINAIS Com este trabalho, percebemos que a vegetação de canga, apesar de suas características que a faz parecer um local onde a sobrevivência é difícil (devido ao solo com alta concentração de minerais, forte incidência solar e pouca umidade), possui uma grande diversidade de plantas, o que vem afirmar o cuidado que devemos tomar ao dizer que determinado ambiente é desfavorável ou hostil à ocorrência e sobrevivência de espécies. Estas, obviamente, possuem adaptações que as auxiliam neste hábitat. A orquidácea Sophronitis caulescens ainda é pouco estudada, não encontrando assim informações mais detalhadas na literatura a respeito da mesma, portanto o presente estudo pode subsidiar trabalhos futuros, uma vez que fornece dados sobre sua ocorrência na área de Canga do Parque Estadual da Serra do Rola Moça - MG. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BAPTSTA, Dalton Holland. Orquidadeae Brasiliensis: Sophronitis, 2002. Disponível em: <http://www.dalholl.hpg.ig.com.br/generos/Sophronitis/Sophronitis.html>. Acesso em: 23 set. 2007. Sinapse Ambiental edição especial – Abril de 2008. 66 BERG, V. D. ; CHACE, M. W. Nomenclatural notes on Laeliinae-I. Lindleyana, p. 115119, 2000. BERG, Van Den et al. A phylogentic analysis of Laeliinae (Orchidaceae) based on Sequence data from internal transcribed spacers (ITS) of nuclear ribosomal DNA. Lindleyana, p. 96-114, 2000. BRITO, Antonio Luiz Vieira Toscano e CRIBB, Phillip. Orquídeas da Chapada Diamantina. Nova Fronteira, 2005. FIDALGO e BONONI. Técnicas de Herbário. 1984. GARCIA, L.C; BARROS, F.V; FILHO, J.P.L. Comportamento germinativo de duas espécies de canga ferrífera: Baccharis retusa DC. (Asteraceae) e Tibouchina multiflora Cogn. (Melastomataceae), São Paulo, v.20, n.2, June/Apr. 2006. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php? pid=S0102-33062006000200019 &script=sci_arttext>. Acesso em: 25 set.2007. NETO, Américo Docha. Informações sobre a Orchidaceae: Laelia caulescens. [mensagem pessoal]. Mensagem recebida por: [email protected] em 28 set. 2007. RAVEN, Peter H.; EVERT, Ray Franklin; CURTIS, Helena et al. Biologia Vegetal, Rio de Janeiro, Editora Guanabara Koogan S.A., 2001. JARDIM BOTÂNICO DO RIO DE JANEIRO. “Saiba mais sobre as orquídeas”, 2002. <http://www.jbrj.gov.br/saibamais/orquideas/familiaedistribuicao.htm>. Acesso em 25 de set 2007. VIANA, P.L.; LOMBARDI, J.A. Florística e caracterização dos campos rupestres sobre canga na Serra da Calçada, Minas Gerais, Brasil, 2006. Disponível em:< http://welrbraga.cjb.net/publica/rodriguesia/rodrig58_1/012-13-06.pdf>. Acesso em 17 set. 2007. Sinapse Ambiental edição especial – Abril de 2008.