Penas salgadas O povo português é um povo marinheiro, que partilha uma íntima relação com o mar. Esta relação de longa data é refletida e, simultaneamente, impulsionadora da escrita lusitana. O mar é portanto um dos elementos mais preciosos de Portugal, como se pode notar pela sua geografia, história e cultura. Em primeira instância, toda a costa portuguesa se banha com as águas salgadas do Oceano Atlântico, tal como Camões nos apresenta, cantando “eis aqui, quase cume da cabeça / De Europa toda, o Reino Lusitano, / Onde a terra se acaba e o mar começa”, observando-se assim a importância do mar para o país na sua geografia. Historicamente, o destino de Portugal navegou sempre ao sabor da maré atlântica. Após ter andado nas mãos de diversos povos, chegaram a território peninsular os árabes, exímios navegadores, guiados por importantes conhecimentos e instrumentos de navegação, como o astrolábio e o quadrante. Este povo também teve um papel vital na construção da língua portuguesa, sendo uma grande parte do nosso vocabulário atual de origem árabe. Já aqui se observa a grande importância do mar na língua portuguesa. Posteriormente, destaca-se o rei D. Dinis, conhecido não só pela sua veia de poeta trovador, incentivando o culto das letras, nomeadamente através da implementação da primeira universidade portuguesa em Coimbra, mas também como um grande impulsionador do comércio marítimo. Todo este passado permitiu a bonança que se avistava: os descobrimentos marítimos portugueses. Este foi o apogeu de Portugal, dono de meio mundo quinhentista. Graças à sua ousadia, coragem e espírito de aventura, soltou amarras “por mares nunca de antes navegados”, ultrapassando os medos mais profundos da Humanidade: o vazio, o desconhecido, a saudade, a doença, a morte e as próprias forças da Natureza. Mas estes sofrimentos passados foram o orgulho do futuro, resultando destes uma das mais importantes obras portuguesas: Os Lusíadas de Luís de Camões, obra que glorificou toda a travessia do povo lusitano até à Índia. Camões, que trazia sempre “numa mão a espada, noutra a pena”, trata-se da autêntica personificação da intrínseca relação entre o mar e a escrita, o artista entre a matéria prima e a obra, como o areal de uma praia tanto beijada pela espuma do mar como abraçada pela luz terrena do Sol. Foi tal a importância deste momento histórico, onde Portugal se lançou numa caravela pelo mar fora, que outros se inspiraram nele para comporem as suas obras. Destaca-se aqui Fernando Pessoa, autor de Mensagem, esta um retrato do passado glorioso com traços do seu presente pessoano. O mar é um ponto sensível na sua obra, representando por um lado a origem da fama anterior e por outro a esperança de um futuro promissor, face ao presente decadente e apagado. Outros escritores mostraram a importância do mar na cultura portuguesa, como Sophia de Mello Breyner Andresen é exemplo. Através das suas obras, como Coral, Mar Novo, Ilhas, O Búzio de Cós, Mar, Histórias da Terra e do Mar ou A Menina do Mar, a autora mostra-nos o seu amor arrebatador e tempestuoso que nutre pelo mar. Cada palavra sua cheira a maresia, cada frase sabe a água salgada e cada obra revolta-nos os cabelos, qual tempestade em alto mar, elevando ondas até ao céu. Assim, Portugal encontra-se tão ligado ao mar que os seus rios já são salgados ao sair da nascente. Fervilha-nos água salgada nas veias, impulsionada por um coração de corais, e falamos e escrevemos a língua dos peixes, ensinada pelo mar. Vejo gaivotas nos galos de Barcelos e oiço cantos de sereias nas tabernas nas noites de desgarradas. Os escritores e os poetas lusitanos escrevem as velhas histórias que o vento andarilho lhes conta, os gritos gloriosos das ondas contra as falésias, os beijos do mar roubados aos grãos de areia e os sussurros apaixonados das gaivotas à beira-mar. Basta mergulhares nestes corais de palavras, escritos no areal desta costa portuguesa, para seres puxado pela maré. Boa sorte navegante, que bons ventos lusitanos te levem a alto-mar de leituras. Designação do concurso: Ler o mar Identificação do professor responsável: Cristina da Graça Carreira/962832392; 249540570 A. E. O. - EBSO Aluna: Beatriz Santos Martins, 12.º A