“Fatores intervenientes na cura de pacientes com tuberculose em Vitória, Brasil” por Paula Corrêa da Silva Dissertação apresentada com vistas à obtenção do título de Mestre em Ciências, na área de Epidemiologia em Saúde Pública. Orientador: Prof. Dr. José Fernando de Souza Verani Assistente do orientador: Prof.ª Taynãna César Simões Rio de Janeiro, fevereiro de 2013. Esta dissertação, intitulada “Fatores intervenientes na cura de pacientes com tuberculose em Vitória, Brasil” apresentada por Paula Corrêa da Silva foi avaliada pela Banca Examinadora composta pelos seguintes membros: Prof.ª Dr.ª Ethel Leonor Noia Maciel Prof. Dr. Luiz Antonio Bastos Camacho Prof. Dr. José Fernando de Souza Verani – Orientador Dissertação defendida e aprovada em 27 de fevereiro de 2013. Catalogação na fonte Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica Biblioteca de Saúde Pública S586 Silva, Paula Corrêa da Fatores intervenientes na cura de pacientes com tuberculose em Vitória, Brasil. / Paula Corrêa da Silva. -2013. 62 f. : tab. ; graf. ; mapas Orientador: Verani, José Fernando de Souza Simões, Taynãna César Dissertação (Mestrado) – Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Rio de Janeiro, 2013 1. Tuberculose - terapia. 2. Cooperação do Paciente. 3. Saúde Pública. I. Título. CDD - 22.ed. – 616.995098152 DEDICATÓRIA A Deus; pela vida, pela perseverança, pela sabedoria e por me permitir concluir mais uma etapa em minha vida. A Luzinete e Francisco, meus pais; pelo amor incondicional, pelo modelo de família que me proporcionaram o apoio e a força que sempre me impulsionaram, permitindo sempre caminhar em busca dos meus ideais com dignidade, solidariedade e responsabilidade. Ao Rafael, meu amor; pela paciência, companheirismo em todas as horas, pelo amor e amizade, por ter acreditado e contribuído para a realização deste estudo. A minha irmã, Marina e meu cunhado, Cláudio; pelo apoio, carinho, incentivo e por se fazerem presentes e acompanharem minha trajetória. Em especial, dedico este trabalho a todos os que sofrem ou sofreram acometidos por Tuberculose, uma doença estigmatizada, contribuindo indiretamente para a realização deste estudo. AGRADECIMENTO ESPECIAL Ao Prof. Dr. José Fernando de Souza Verani; pelo acolhimento apoio, ética, conhecimento transmitido e incentivo a buscarmos o melhor de nós. À Profa. Dra. Ethel Leonor Noia Maciel; pelo apoio, pelo modelo de vida e posição de referência no grupo Lab-Epi/ UFES, em Vitória/ES, e finalmente por contribuir na avaliação deste estudo juntamente com o Prof. Dr. Luiz Antonio Bastos Camacho. À Profa. Taynãna César Simões, pelo acolhimento e contribuições na assessoria dos testes estatísticos, que foram imprescindíveis para a realização deste estudo. AGRADECIMENTOS Aos colegas de turma do Programa de Pós-Graduação de Epidemiologia em Saúde Pública da Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz/ENSP/FIOCRUZ, ano/2011; pelo acolhimento, apoio, conversas, amizade e contribuições. À Secretaria de Saúde do Município de Vitória/ES, especialmente a todos que fazem parte da Vigilância Epidemiológica, à Coordenação do Programa de Controle da Tuberculose e à Coordenação da Atenção Básica em Saúde; pela contribuição para viabilização da coleta de dados deste estudo. Às Equipes da Estratégia Saúde da Família/ ESF do município de Vitória/ES, em especial ao Programa de Controle de Tuberculose das Unidades de Saúde de Vitória e Maruípe que contribuíram para a realização deste estudo. Aos professores do Programa de Epidemiologia em Saúde Pública da Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz; pelo acolhimento, conhecimento transmitido e auxílio imprescindível na conquista deste título. Ao CNPQ (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico); pelo apoio financeiro através da concessão da Bolsa de Mestrado. E a todos que colaboraram direta ou indiretamente para a realização deste trabalho cujos nomes não foram citados. “Talvez não tenha conseguido fazer o melhor, mas lutei para que o melhor fosse feito. Não sou o que deveria ser, mas Graças a Deus, não sou o que era antes”. Marthin Luther King RESUMO O estudo objetivou analisar os fatores intervenientes na cura de pacientes com tuberculose em Vitória-ES. Métodos: Trata-se de um estudo de coorte retrospectivo, abrangendo 207 pacientes adultos que foram diagnosticados com tuberculose (TB) nas formas pulmonar e pulmonar + extrapulmonar notificados e tratados pelas Unidades de Saúde da Família (USF) de Vitória nos anos de 2009 e 2010. Os dados foram obtidos no Sistema de Informação de Agravos de Notificação de Tuberculose (SINAN-TB) do Município de Vitória – ES e pela pesquisa de prontuários. As variáveis de exposição são os fatores intervenientes na cura da TB e desfecho a cura de pacientes com tuberculose. Foram realizados testes de hipóteses para proporções e medianas, bem como Modelos Lineares Generalizados a fim de quantificar as associações entre os fatores de interesse e o desfecho dicotômico (ter ou não cura). Resultados: Dos 207 pacientes com diagnóstico de tuberculose (nas formas pulmonar e pulmonar + extrapulmonar) 183 pacientes (88%) obtiveram cura, sendo que 67% dos casos notificados foram tratados por duas unidades de SF que também oferecem o programa de controle da tuberculose (PCT). Com base na modelagem estatística, os fatores significativamente mais associados à não cura da tuberculose foram o uso de drogas ilícitas (OR= 0,07; IC95%: 0,02 – 0,22), o tratamento ser supervisionado por outros profissionais (OR= 0,14; IC95%: 0,04 – 0,53), não ser indicado para o DOTS (Tratamento Diretamente Observado de Curta Duração) (OR= 3,52; IC95%: 1,18 – 10,46), ser HIV positivo (OR= 0,09; IC95%= 0,01 – 0,67) e apresentar a forma da tuberculose pulmonar + extrapulmonar (OR= 0,10; IC95%: 0,02 – 0,50). Conclusões: Identificaram-se fatores associados com a não cura de pacientes com tuberculose notificados e tratados pela atenção primária no município de Vitória. Dos fatores elencados, o presente estudo destacou comorbidades como o uso de drogas ilicitas e infecção pelo HIV, fatores associados a organização do serviço de APS (profissional da supervisão e indicação para tratamento supervisionado) e formas da doença. Os resultados desvelaram o descompasso entre a transferência de responsabilidades das ações de controle da TB para a atenção primária à saúde (APS) em Vitória constatado pela descentralização do tratamento e acompanhamento dos casos de tuberculose que vem sendo estabelecido pelas duas unidades de saúde com PCT implantados. Julga-se necessária uma efetiva organização dos serviços de saúde como a APS, ainda em construção no país, e em Vitória ao longo do tempo, principalmente com a ampliação da cobertura para os municípios mais populosos. Palavras-chave: Tuberculose; Cooperação do paciente; Tratamento; Saúde Pública. ABSTRACT The present study aimed at analyzing the factors that intervene in the cure of patients with tuberculosis in Vitória-ES. Methods: It is a retrospective study comprising 207 adult patients, which were diagnosed as having pulmonary and pulmonary + extrapulmonary tuberculosis (TB), notified and treated by Family Health Units (FHU) in Vitória during the years of 2009 and 2010. Data were obtained with the Tuberculosis Notification Aggravation Information System ( SINAN-TB) from Vitória-ES and also by researching promptuaries. The exposure variables are the factors that intervene in the cure of TB and the outcome of the cure of the tuberculosis patients. Hypothesis testing for a proportion and for a mean, as well as Generalized Linear Models were performed in order to quantify the associations between the interest factors and the dichotomous outcome(having or not the cure). Results: Out of 207 patients diagnosed with tuberculosis (pulmonary and pulmonary + extrapulmonary) 183 (88%) obtained cure, being 67% of the cases notified were treated by two FHUs which include in the service a Tuberculosis Control Program (TCP). According to the statistical modeling, the factors most significantly associated to the tuberculosis non-cure were the use of illicit drugs (OR= 0,07; IC95%: 0,02 – 0,22), the treatment supervision made by other professionals (OR= 0,14; IC95%: 0,04 – 0,53), not to be indicated for the DOTS (Directly Observed Therapy, Short-course) (OR= 3,52; IC95%: 1,18 – 10,46), be a positive HIV (OR= 0,09; IC95%= 0,01 – 0,67), and have a type of Pulmonary + extrapulmonary TB (OR= 0,10; IC95%: 0,02 – 0,50). Conclusions: Factors associated to the non-cure of tuberculosis patients notified and treated by the primary health care were such comorbidities as the use of illicit drugs and HIV, factors associated to PHC organization service (supervising professional and indication for the supervised treatment) and disease clinical forms. The results unveiled the discrepancy between the transfer of the TB control actions responsibilities to the primary health care (PHC) in Vitória confirmed by the treatment and the monitoring decentralization of the tuberculosis cases that has been implemented by the two Health units with TCP. It makes itself necessary to have an effective organization of the health services like the PHC, still under construction in the country, and in Vitória as time goes by, mainly along with the expansion of the covering for the most populous cities. Keywords: Tuberculosis; Patient Compliance; Treatment; Public Health. LISTA DE FIGURAS FIGURA 1 - Estimativas de casos novos por 100.000 habitantes por Tuberculose nos países em 2011.................................................................................................................23 FIGURA 2 - Incidência de casos de TB por estado: Brasil, 2006..................................25 FIGURA 3 - Localização das Gerências Regionais em Vitória/ ES..............................33 FIGURA 4 – Fluxograma da amostragem do estudo.....................................................34 LISTA DE GRÁFICOS GRÁFICO 1 - Taxa de incidência de Tuberculose em todas as formas por 100 mil habitantes no Espírito Santo, Região Sudeste, Brasil: 20012010.................................................................................................................................18 GRÁFICO 2 - Percentual de cura e abandono de casos novos de TB, Espírito Santo: 2001-2009........................................................................................................................19 LISTA DE TABELAS TABELA 1 - Sumário das variáveis do estudo e suas respectivas categorizações.........37 TABELA 2 – Distribuição da freqüência e proporção (%) de pacientes curados entre as categorias das variáveis de exposição ............................................................................38 TABELA 3 – Distribuição de freqüências, medianas (*) e medidas de associação entre a cura de pacientes com tuberculose e as variáveis de exposição (OR bruta e IC 95%).................................................................................................................................41 TABELA 4 – Associação entre a cura de pacientes com tuberculose e as variáveis de exposição (OR ajustadas e IC 95%)................................................................................43 LISTA DE SIGLAS ABS – ATENÇÃO BÁSICA À SAÚDE ACS – AGENTE COMUNITÁRIO DE SAÚDE AIC – AKAIKE INFORMATION CRITERION AIDS – SÍNDROME DA IMUNODEFICIÊNCIA ADQUIRIDA AIS – AÇÕES INTEGRADAS DE SAÚDE ANODEV – ANÁLISE DE DEVIANCE APS – ATENÇÃO PRIMÁRIA Á SAÚDE ATA – AMERICAN THORACIC ASSOCIATION BCG – BACILO DE CALMETTE E GUÉRIN CDC – CENTERS FOR DISEASE CONTROL CONEP – CONSELHO NACIONAL DE ÉTICA EM PESQUISA DM – DIABETES MELLITUS DOTS – TRATAMENTO DIRETAMENTE OBSERVADO DE CURTA DURAÇÃO ES – ESPÍRITO SANTO ESF – ESTRATÉGIA SAÚDE DA FAMÍLIA GLM – MODELO LINEAR GENERALIZADO HIV – VIRUS DA IMUNODEFICIÊNCIA HUMANA IBGE – INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA IUATLD – INTERNATIONAL UNION AGAINST TUBERCULOSIS AND LUNGDISEASE OMS – ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE OR – ODDS RATIO NOAS – NORMA OPERACIONAL DE ASSISTÊNCIA À SAÚDE PA – PRONTO ATENDIMENTO PACS – PROGRAMA DE AGENTES COMUNITÁRIOS DE SAÚDE PCT – PROGRAMA DE CONTROLE DA TUBERCULOSE PNCT – PROGRAMA NACIONAL DE CONTROLE DA TUBERCULOSE PSF – PROGRAMA SAÚDE DA FAMÍLIA RNTA – ROYAL NETHERLANDS TUBERCULOSIS ASSOCIATION SESA/ES – SECRETARIA DE ESTADO DA SAÚDE DO ESPÍRITO SANTO SF – SAÚDE DA FAMÍLIA SINAN – SISTEMA DE INFORMAÇÃO DE AGRAVOS DE NOTIFICAÇÃO SNC – SISTEMA NERVOSO CENTRAL SUDS – SISTEMAS UNIFICADOS E DESCENTRALIZADOS DE SAÚDE SUS – SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE TB – TUBERCULOSE TRC – CENTRO DE INVESTIGAÇÃO DA TUBERCULOSE TS – TRATAMENTO SUPERVISIONADO UBS – UNIDADE BÁSICA DE SAÚDE US – UNIDADE DE SAÚDE USF – UNIDADE DE SAÚDE DA FAMÍLIA WHO – WORLD HEALTH ORGANIZATION SUMÁRIO INTRODUÇÃO/ REVISÃO DE LITERATURA.......................................................16 Tuberculose: problema de saúde pública.........................................................................20 Epidemiologia da tuberculose.........................................................................................23 Tuberculose na atenção primária.....................................................................................27 Justificativa......................................................................................................................30 OBJETIVOS..................................................................................................................31 Geral................................................................................................................................31 Específicos.......................................................................................................................31 MATERIAL E MÉTODO............................................................................................32 Delineamento do estudo..................................................................................................32 População e Amostra.......................................................................................................32 Critérios de Inclusão e Exclusão.....................................................................................33 Fonte de Dados................................................................................................................35 Análise dos Dados...........................................................................................................35 Aspectos éticos................................................................................................................36 RESULTADOS..............................................................................................................38 DISCUSSÃO..................................................................................................................44 CONCLUSÕES..............................................................................................................50 REFERÊNCIAS.............................................................................................................51 ANEXOS.........................................................................................................................60 Anexo I............................................................................................................................60 Anexo II...........................................................................................................................61 Anexo III..........................................................................................................................63 INTRODUÇÃO/ REVISÃO DE LITERATURA A tuberculose, ainda neste milênio, é a doença infecciosa de maior letalidade no mundo nos pacientes com infecção pelo HIV. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a TB é uma das principais causas de morbimortalidade em todo o mundo. Estima-se que um terço da população mundial esteja infectada pelo bacilo, gerando aproximadamente oito milhões de novos casos e três milhões de mortes por ano (WHO, 2012). É surpreendente que sejam enormes as dificuldades mundiais para se diagnosticar e tratar corretamente a TB. A estratégia preconizada internacionalmente busca garantir: apoio político das autoridades; acesso aos meios diagnósticos e à medicação; sistema de informação que permita acompanhamento e avaliação e; o tratamento supervisionado (WHO, 2011). No Brasil, desde o início do século XIX, essas ações foram recomendadas e desenvolvidas de forma centralizada em dois estabelecimentos: o dispensário e o sanatório. A atuação dos sanatórios se estendeu até meados do século XX, sendo superado pela difusão do tratamento ambulatorial nos anos 60 e pelos programas de controle criados nos anos 70 (ANTUNES, WALDMAN, MORAES, 2000). O processo de descentralização das ações de controle da tuberculose no país teve início na década de 80. O mesmo se deu, em princípio, com a proposta de transferência da execução do controle da tuberculose para as Secretarias Estaduais de Saúde, através da implantação das Ações Integradas de Saúde (AIS) (1981), e posteriormente, com os Sistemas Unificados e Descentralizados de Saúde (SUDS) (1987), integrando os níveis federal, estadual e municipal e; atualmente com o Sistema Único de Saúde (SUS) (1988) (RUFFINO-NETTO, SOUZA, 1999). No início dos anos 90, foram criados os programas de ACS e de Saúde da Família, como reorientadores da APS no país. Naquele momento, as ações de controle da TB passaram a ser incorporadas às atividades desses programas. A importância dessa integração se mostrou através das estratégias definidas em âmbito federal, como o Plano Nacional de Controle da TB, em 1998, quando a tuberculose foi considerada prioridade entre as políticas públicas, sendo relacionada à efetividade do DOTS e à ampliação das equipes do PACS e PSF. As políticas de saúde vigentes declaram que esse controle é competência dos municípios brasileiros e reconhecem que as ações do Programa Nacional de Controle da Tuberculose (PNCT) são de responsabilidade da Atenção Básica à Saúde (ABS) para melhoria do acesso ao diagnóstico e tratamento da doença (APUD MONROE et al, 2007). A utilização do trabalho em equipe é o elemento-chave para a busca permanente de comunicação e troca de experiências e conhecimentos entre os integrantes das equipes e destes com as populações de territórios delimitados. Os agentes comunitários de saúde (ACS) e os profissionais de saúde assumem responsabilidade pelos respectivos territórios, em uma estratégia de formação de vínculo (BRASIL, 2009a). No Brasil, foram registrados, em 2007, 72.194 casos novos, correspondendo a um coeficiente de incidência de 38/100.000 habitantes. Destes, 41.117 foram bacilíferos, com um coeficiente de incidência de 41/ 100.000 habitantes. Esses indicadores colocam o Brasil em 17ª posição em relação ao número de casos e na 104ª posição com relação ao coeficiente de incidência (WHO, 2012). De acordo com a Secretaria de Estado da Saúde do Espírito Santo (SESA/ES), em 2010, foram notificados cerca de 1.291 casos novos de tuberculose no Estado, apresentando uma taxa de incidência de 36,7 casos por 100 mil habitantes, para TB em todas as formas. A capital do estado, Vitória, apresentou taxa de incidência de 52,5 por 100 mil habitantes. De acordo com publicação da Secretaria de Vigilância em Saúde, a incidência de casos de tuberculose de todas as formas no Estado entre os anos de 2001 e 2010 vem apresentando tendência de queda, o que também é observado com relação às médias nacionais (Gráfico 1) (BRASIL, 2011). Gráfico 1: Taxa de incidência de Tuberculose em todas as formas por 100 mil habitantes no Espírito Santo, Região Sudeste, Brasil, 2001-2010. Fonte: Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde, 2011. O Estado do Espírito Santo, que tem uma área de 46.098,6 km², 78 municípios e uma população estimada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2010 de 3.514.952 habitantes, apresenta níveis variados de implantação de Estratégia Saúde da Família (ESF), no que se refere o PACS (Programa de Agentes Comunitários de Saúde) e Saúde da Família (SF). A publicação do Ministério da Saúde (dezembro 2008), que visa a contribuir com o processo de institucionalização da avaliação em saúde nos serviços públicos, mostra que a cobertura (população acompanhada) pelo PSF no Espírito Santo é de 50% e a realizada pelos ACS é de 70,5% (BRASIL, 2009b). Esse diferencial na distribuição de PSF e de ACS no Estado pode ser justificado pela implantação a priori do PACS, quando comparado ao PSF, como evidenciado no município de Vitória que foi habilitado na Gestão Plena da Atenção Básica em Janeiro de 2008 (MACIEL et al. 2008). O Ministério da Saúde por meio do Programa Nacional de Controle da Tuberculose com o objetivo de intensificar as ações voltadas para o controle da Tuberculose pela esfera nacional, em 2009, estabeleceu novos critérios para priorização de municípios no controle da tuberculose no Brasil. Os critérios utilizados anteriormente foram revistos e atualizados, tendo como foco principal o, alcance das metas de desenvolvimento do milênio relacionadas à tuberculose. Os critérios atuais levam em consideração as seguintes características: ser capitais; municípios com população igual ou maior a 100.000 habitantes; taxa de incidência (todas as formas) superior a 80% da taxa nacional (32 casos novos por 100.000 habitantes) segundo dados do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN) em 2007; taxa de mortalidade por Tuberculose superior à taxa nacional (2,5 óbitos por 100.000 habitantes) segundo dados do Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM) em 2007 (BRASIL, 2011b). Atualmente 181 municípios estão incluídos na lista de prioritários para o PNCT, visto que atendem a um dos requisitos apresentados acima. Dados publicados pela Secretaria de Vigilância em Saúde informam que o Espírito Santo possui 9 municípios (Vitória, Vila Velha, Serra, Cariacica, Viana, Fundão, Guarapari, São Mateus e Cachoeiro de Itapemirim) prioritários no controle da TB, com uma cobertura de 25% das Unidades de Saúde com o Programa de Controle da Tuberculose (PCT) implantado. Em 2010, 52% dos casos novos de TB realizaram Tratamento Supervisionado (TS/ DOTS). Com relação ao encerramento dos casos, em 2009, o estado obteve 79,1% de cura e 7,3% de abandono entre os casos novos de TB (Gráfico 2) (BRASIL, 2009c; BRASIL, 2012). Gráfico 2: Percentual de cura e abandono de casos novos de TB, Espírito Santo, 20012009. Fonte: Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde, 2011. Tuberculose: problema de saúde pública A tuberculose representa um sério problema de saúde por atingir grande número de pessoas. Sua manifestação é antiga, dado o aumento do registro de casos verificado no final do século XVIII e início do século XIX. Historicamente a TB é nominada como Tísica, doença trazida pelos negros, peste branca, febre das almas sensíveis, dentre outras designações; uma doença que acompanha o homem há milênios (PORTO, 2007). A TB ainda é descrita como uma doença lenta, devido ao longo e variável período de latência e seu pequeno, mas relativamente rápido período infeccioso. Alguns autores chegam a alertar que a tuberculose é um problema reemergente, sendo esta afirmação válida apenas para alguns países europeus, não sendo válida para o Brasil, como afirma Ruffino-Netto (2002), onde essa doença é vista como um problema presente há longo tempo. Trata-se de uma doença infecciosa e contagiosa, cujo principal agente etiológico é o Mycobacterium tuberculosis, identificado em 1882 por Robert Koch, sendo por isso também conhecida como bacilo de Koch. Ela pode resultar da reativação de uma primo-infecção passada ou pode ser decorrente de uma infecção recentemente adquirida. A TB afeta basicamente o parênquima pulmonar, podendo ser transmitida para outras partes do corpo, ocorrendo mais frequentemente nos pulmões, rins, gânglios, pleura, cérebro e ossos (FERREIRA et al, 2005). O bacilo de Koch, responsável pela maioria dos casos de tuberculose, só se desenvolve quando se hospeda em um organismo.. O homem (principal reservatório) infectado pode ser considerado uma fonte de infecção, se a doença ativa ocorrer. A susceptibilidade do hospedeiro é universal, mas o risco de infecção é diretamente e principalmente relacionado com o grau de exposição. A maior probabilidade de progressão para a doença ativa ocorre num período de 12 a 24 meses após a infecção, especialmente entre crianças, adolescentes, idosos, ou indivíduos imunossuprimidos (ORCAU et al, 2011). A TB é transmitida de pessoa a pessoa, principalmente através do ar, por meio de gotículas contendo os bacilos expelidos por um doente com TB pulmonar ao tossir, espirrar ou falar em voz alta. As gotículas mais pesadas depositam-se rapidamente no solo, enquanto as mais leves podem permanecer em suspensão por diversas horas. Apenas os núcleos secos de gotículas (Núcleo de Wells) podem atingir os bronquíolos e os alvéolos e, então, iniciar a multiplicação. As gotículas médias, na grande maioria das vezes, são retidas pela mucosa do trato respiratório superior e removidas dos brônquios pelo mecanismo muco-ciliar. Esses bacilos removidos são deglutidos, inativados pelo suco gástrico e eliminados nas fezes. Após a infecção pelo bacilo de Koch, no decorrer de 4 a 12 semanas, é possível detectar as lesões primárias (HARRIES, DYE, 2006). A TB na forma pulmonar, além de ser mais frequente, é ainda a mais relevante para a saúde pública, por ser a responsável pela manutenção da cadeia de transmissão. A realização da busca ativa de sintomáticos respiratórios, conforme recomendações do Ministério da Saúde (2010), é a principal estratégia de controle capaz de permitir a detecção precoce das formas pulmonares. A TB pode ser diagnosticada por baciloscopia ou cultura, ou ainda com base nos dados clínicoepidemiológicos, por meio de resultado de exames complementares (radiografia de tórax, tomografia computadorizada ou ressonância magnética do SNC (Sistema Nervoso Central), prova tuberculínica e exames de imagens de estruturas ósseas) (BRASIL, 2010). A tuberculose pulmonar manifesta-se por: tosse persistente, inicialmente seca e depois, ás vezes, com eliminação de escarro mucóide e hemoptise por mais de quatro semanas. Sintomas sistêmicos são comuns, como febre (baixa e vespertina), suores noturnos e perda de peso. Nem todos os expostos ao bacilo da tuberculose se tornam infectados. Entre os indivíduos infectados, a probabilidade de adoecimento aumenta na presença de infecção pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV) e outras formas de imunodepressão, na presença de desnutrição, silicose, Diabetes Mellitus (DM), doenças renais crônicas, usuários de drogas endovenosas e crack (HINRICHSEN, 2009). Vários autores atribuem a alta propagação da tuberculose à pobreza e ao baixo desenvolvimento econômico. Populações mais pobres e marginalizadas são atingidas de forma intensa e desproporcional pelas doenças, dentre elas a tuberculose, que tem se estabelecido mais frequentemente em países subdesenvolvidos. A relação TB e pobreza é ambidirecional, pois tanto a pobreza pode estar relacionada às condições precárias de saúde, quanto essas condições podem produzir a pobreza, podendo limitar as oportunidades de trabalho e de subsistência. O crescimento populacional desordenado e a concentração de pessoas em periferias (aglomerados), o desemprego, o envelhecimento da população e os movimentos migratórios também podem estar associados ao desenvolvimento da tuberculose (BRASIL, 2002; SILVA et al, 2007; SANTOS et al, 2007). De acordo com Succi (2000), o principio básico para o controle da TB é impedir o contato entre indivíduos bacilíferos e susceptíveis, dependendo da detecção precoce e do tratamento dos doentes bacilíferos, bem como da aplicação de medidas profiláticas para os indivíduos susceptíveis. Entre essas medidas estão a quimioprofilaxia com isoniazida e a vacinação com BCG (bacilo de Calmette e Guérin). A aplicação precoce da vacina BCG após o nascimento é uma recomendação da OMS e é considerada medida eficaz na proteção de crianças que vivem em países de alta prevalência de TB, como é o caso do Brasil. A referida vacina é derivada de uma cepa atenuada do Mycobacterium bovis e exerce um importante papel na profilaxia das formas graves de tuberculose (SANT`ANNA, 2002). É discordante e controversa a real necessidade da revacinação com BCG, quanto a possíveis eventos adversos, o que poderia gerar reações locais ou sistêmicas indesejáveis de maior ou menor gravidade, bem como dúvidas relacionadas à eficácia da revacinação, não sendo preconizada pelo Ministério da Saúde, com exceção de contatos de doentes com hanseníase (HINRICHSEN, S. L, 2009). Epidemiologia da tuberculose De acordo com estimativas da Organização Mundial da Saúde (OMS), um terço da população mundial está infectada pelo Mycobacterium tuberculosis, dos quais 5 a 10% desenvolvem a doença em algum momento da sua vida. Em 2011, foram estimados quase 9 milhões de casos novos e 1,4 milhões de mortes por tuberculose no mundo. O maior número de casos estimados em 2011 ocorreu na Ásia (59%) e na África (26%). As menores proporções de casos ocorreram na Região do Mediterrâneo Oriental (7,7%), Europa (4,3%) e Américas (3%). Os 22 países que foram listados como maiores prioridades no controle da doença em 2000 contam com aproximadamente 82% dos casos estimados mundialmente no ano de 2011 (Figura 1) (WHO, 2012). Os cinco países com maior incidência de casos em 2011 foram a Índia (2.0 2.5 milhões), China (0.9 - 1.1 milhões), África do Sul (0.4 - 0.6 milhões), Indonésia (0.4 - 0.5 milhões) e Paquistão (0.3 – 0.5 milhões). Somente a Índia e a China, responderam por 26% e 12% dos casos de TB no mundo, respectivamente (WHO, 2011; WHO, 2012). Figura 1: Estimativas de casos novos por 100.000 habitantes por Tuberculose (todas as formas), nos países, em 2011. Fonte: WHO, 2012. A interação da TB com a AIDS e a emergência de bacilos multirresistentes, aliados à desorganização dos serviços de saúde, são os desafios atuais para o controle da tuberculose (WHO, 2012). A tendência da taxa de incidência mundial, nos últimos anos, manteve-se estável. No entanto, onde a incidência de portadores de HIV foi alta e ocorreram problemas importantes nos aspectos políticos e socioeconômicos, houve tendência de aumento (WHO, 2012). De acordo com estimativas da OMS (2012), a proporção de casos de tuberculose co-infectados com HIV foi mais alta nos países da África. No geral, 39% dos casos de tuberculose foram estimados para ser co-infectados com HIV na região, responsável por 79% dos casos de TB entre pessoas que vivem com HIV em todo o mundo. No ano de 2009, a TB estava entre uma das quatro causas de morte entre pessoas HIV positivas (WHO, 2010). Em um estudo realizado na África do Sul, a prevalência estimada de infecção HIV aumentou de 6% para 22%. No ano de 2004, entre pessoas com idade maior que 15 anos, 98 (59%) de 166 pessoas que tinham notificado TB eram HIV soropositivas, enquanto que 30% eram HIV soronegativas e 11% não tinham sido testadas (LAWN et al, 2006). Segundo Jamal e Moherdaui (2007), as altas taxas de co-infecção pelo HIV e pela TB no mundo impedem a redução da taxa de incidência de ambas as infecções. Eles ainda afirmam que o aumento da prevalência do HIV, principalmente em países com alta prevalência dessa doença, impacta nas ações de controle da TB. Na rede pública de saúde, alguns aspectos merecem consideração, como o atendimento e o tratamento em lugares distintos, encarecendo o acesso à atenção, levando a menor adesão ao tratamento e, consequentemente, ao aumento no abandono ou uso irregular dos medicamentos, sendo de extrema importância que as ações direcionadas para o controle da TB influenciem na efetividade das ações programáticas do HIV. Como forma de auxiliar no controle da tuberculose, a OMS definiu 22 países que apresentam o maior número de casos da doença (80%) para priorizar suas ações: Afeganistão, Bangladesh, Brasil, Cambodja, China, República Democrática do Congo, Etiópia, Índia, Indonésia, Quênia, Moçambique, Mianmar, Nigéria, Paquistão, Filipinas, Rússia, África do Sul, Tailândia, Uganda, Vietnã, Zimbábue e Tanzânia (WHO, 2010; WHO, 2012). No Brasil, a TB é a 4ª causa de mortalidade por doenças infecciosas e, apesar do seu tratamento ser ambulatorial, apresenta-se como a 9ª causa de internações por doenças infecciosas e como o 7º lugar em gastos com as internações (SÃO PAULO, 2006). Ao analisar a distribuição da incidência da tuberculose por Unidades Federadas, os estados que mais notificaram casos foram: São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Pernambuco, o que corresponde a 63% dos casos do Brasil. Por sua vez, os coeficientes de incidência no Brasil, em 2001, foram de 42,8 casos para cada grupo de 100 mil habitantes, caindo para 36,0 no ano de 2011, significando uma queda de 15,9 pontos percentuais na última década (BRASIL, 2012). Embora a região Sudeste concentre o maior número de casos de tuberculose, a região Norte apresentou as maiores taxas de incidência em todos os anos analisados. Em 2011, os estados do Amazonas (62,6) e Rio de Janeiro (57,6) apresentaram as maiores taxas de incidência do país, enquanto Goiás (13,6) e Distrito Federal (11,1) as menores (Figura 2) (BRASIL, 2009d; BRASIL, 2012; HIIJAR et al, 2005). Figura 2: Incidência de casos de TB por estado. Brasil, 2006. O Espírito Santo aparece em 18º lugar no cenário nacional de incidência de tuberculose. Em recente publicação da Secretaria de Vigilância em Saúde, entre 1993 e 2007, a taxa de incidência de tuberculose no Estado apresentou variação negativa de 17,2%. Neste mesmo período, as taxas do Estado foram inferiores àquelas da Região Sudeste e do Brasil. Segundo a Secretaria Estadual de Saúde, em 2007, 1254 casos novos de tuberculose foram registrados no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN). As incidências foram de 36 casos por 100 mil habitantes, para tuberculose em todas as formas, e de 20 por 100 mil, para casos bacilíferos (BRASIL, 2011). Com relação à coorte de tratamento, levando em consideração os casos diagnosticados em 2007 em todo o Estado, apresentou-se uma taxa de cura de 75%, sendo esta inferior à meta de 85%. Entre os pacientes tratados, houve 5% de abandono, 5% de óbitos, 7% de transferências e 5% de encerramentos no SINAN. Tuberculose na atenção primária Nas décadas de 70 e 80, foram verificadas altas taxas de cura com o tratamento da TB com Isoniazida e Rifampicina, nos ensaios clínicos explanatórios fase III (eficácia). Esse acontecimento resultou na ilusão de que a TB estava controlada, reduzindo o interesse da sociedade civil e acadêmica acerca da tuberculose Observou-se ainda um impacto mundial na queda do compromisso político dos gestores e na qualidade das ações de controle da TB acompanhadas de altas taxas de abandono, por sua vez associado a cepas multirresistentes, empobrecimento, urbanização e a pandemia da infecção pelo HIV em grandes metrópoles, mesmo em países desenvolvidos onde havia evidências de controle da doença (KRISTKI et al, 2007). Esses dados representam um grande desafio para o Brasil, no que tange às metas pactuadas junto à Organização Mundial de Saúde (OMS). Em 1993 a TB é declarada emergência mundial, propiciando a criação do programa STOP TB, que reúne instituições de alto nível científico e/ou poder econômico, como a Organização Mundial De Saúde (OMS), Banco Mundial, Centers for Disease Control (CDC) – Atlanta, International Union Against Tuberculosis and Lung-Disease (IUATLD), Royal Netherlands Tuberculosis Association (RNTA) e American Thoracic Association (ATA) (RUFFINO-NETTO, 2002). Neste mesmo período, foi proposta pela OMS a estratégia de tratamento de curta duração diretamente observado (Directly Observed Treatment Short Course – DOTS) para aumentar as taxas de detecção e de cura cujas principais metas são o alcance de 85% de sucesso no tratamento, 70% de detecção de casos e a redução do abandono em 5% (WHO, 2005). No Brasil, o Plano Nacional de Controle de Tuberculose (PNCT) surgiu de uma decisão do Conselho Nacional de Saúde, lançado no Seminário de Brasília em outubro de 1998. O referido Plano destacou a tuberculose como um problema de saúde prioritário no Brasil, por meio de uma série de medidas pertinentes (BRASIL, 1996): Implementar a cobertura do Programa de Controle da Tuberculose (PCT) para 100% dos municípios; Em três anos (2001) serão diagnosticados pelo menos 92% dos casos esperados e tratados, com sucesso, pelo menos 85% dos casos diagnosticados; Em nove anos (2001) a incidência terá sido reduzida, no mínimo, a 50% e a mortalidade em dois terços. A estratégia DOTS é constituída por cinco pilares: compromisso do governo colocando o controle da tuberculose como prioridade entre as políticas de saúde; detecção de casos bacilíferos; tratamento padronizado de curta duração, diretamente observável e monitorado em sua evolução; fornecimento regular de tuberculostáticos de primeira linha e implementação de um sistema de notificação e de acompanhamento dos casos (ORGANIZAÇÃO PANA-AMERICANA, 1997). Além de modificar o perfil epidemiológico da TB, o emprego dessa estratégia apresenta outras vantagens: eficiência sem a hospitalização, tornando o tratamento disponível e de baixo custo, diminuição do risco de abandono e, consequentemente, o desenvolvimento de resistência às drogas convencionais evitando-se o uso oneroso de outras drogas de eficácia questionável (TEIXEIRA, 1998). Para garantia do sucesso terapêutico, a estratégia DOTS prevê a implantação do tratamento supervisionado (TS), o qual consiste em uma mudança na forma de se administrar os medicamentos, sem mudança no esquema terapêutico: o profissional de saúde entrega, observa e registra a ingestão de cada dose da medicação do início ao fim do tratamento até a cura. Esse procedimento pode ser realizado na unidade de saúde ou no domicílio do paciente, de acordo com as conveniências do mesmo e do serviço de saúde (FERRACIO, CRUZ, BIAGOLINI, 2007; MUNIZ, VILLA, PEDERSOLLI, 1999). A estratégia DOTS propõe a integração da atenção primária à saúde (APS) e a adaptação contínua de reformas dentro do setor saúde. Em 1998, a proposta DOTS é inserida ao Plano Nacional de Controle da Tuberculose, e então implantada gradativamente nos municípios como estratégia incorporada ao Sistema Único de Saúde (SUS) (FUNDAÇÃO NACIONAL DE SAÚDE, 1999). O Plano Nacional de Controle da Tuberculose inseriu novas possibilidades de intervenção em sua proposta de trabalho, assegurando que a inserção das ações de controle da TB no âmbito da Estratégia Saúde da Família (ESF) poderia integrar os serviços, expandindo as atividades de controle da TB. Nesse sentido, vem sendo proposto que os serviços de saúde se organizem para que a ESF incorpore em suas atividades a responsabilidade pelo desenvolvimento das ações de controle da tuberculose. A ESF foi criada e implementada nos anos de 1993 e 1994, respectivamente. Trata-se de uma estratégia de reorganização do sistema de atenção à saúde para o SUS, considerada uma ferramenta de promoção da equidade na oferta de serviços. A ESF foi difundida em âmbito nacional, a partir de 1996, quando também ocorre a fusão da mesma com o PACS (Programa Agente Comunitário de Saúde) (SARTI et al, 2011; GOLDBAUM et al, 2005). A ESF é uma estratégia que prioriza as ações de promoção, proteção e recuperação da saúde dos indivíduos e da família, de forma integral e contínua. Essa estratégia não se baseia unicamente na cura da doença do indivíduo, pelo contrário: dáse ênfase às ações de promoção de saúde e prevenção de riscos e doenças. As referidas ações não se centram exclusivamente no serviço de atenção primária, mas estendem-se ao meio social familiar (BUFFON, RODRIGUES, 2005; STARFIELD, 2002). A estratégia em questão é operacionalizada mediante a formação de equipes multiprofissionais atuantes nas unidades básicas de saúde. Essas equipes são responsáveis pelo acompanhamento das famílias em áreas geográficas delimitadas. As equipes atuam nas ações de promoção, prevenção, recuperação e reabilitação de doenças e agravos mais frequentes da comunidade. O programa é composto por médicos, enfermeiros, auxiliares de enfermagem, agentes comunitários de saúde e, a partir de 2000, dentistas (BRASIL, 2009a). A ação da ESF é resultado do trabalho em equipe interdisciplinar, com ênfase na promoção e prevenção da saúde, no estabelecimento do vínculo e na responsabilização com a população, adscrição de clientela e a vigilância da saúde. O vínculo entre o profissional de saúde e o usuário pode ser estreito e duradouro, permitindo, com o passar do tempo, que se estreitem os laços em favor de um conhecimento mútuo qualitativo, em favor da continuidade do tratamento. Neste sentido, a segurança que o usuário adquire pode auxiliar no processo de adesão terapêutica, uma vez que ele passa a entender a importância do seu tratamento e a confiar nas recomendações do profissional (SARTI et al, 2011; BRUNELLO et al, 2010). O sucesso da ESF incorporada ao DOTS já pode ser visto, como em estudo realizado por Marcolino et al (2009) no município de Bayeux, pertencente à região metropolitana de Pernambuco, que alcançou êxito na implantação das ações de controle da TB, registrando índices desejáveis de desfecho terapêutico, com discreta redução na taxa de abandono e aumento da taxa de cura, bem como menor incidência de TB por todas as formas. Justificativa A tuberculose é uma doença antiga e, ainda negligenciada pela falta de avanços científicos e de compromisso político, o que é evidenciado pela persistência na transmissão e pela detecção tardia. Desde 2003, a OMS vem demonstrando preocupação em assumir a responsabilidade com as ações de controle da tuberculose, questão que emerge com a descentralização e integração da doença aos serviços de Estratégia Saúde da Família e que representa um dos desafios para a viabilização da estratégia DOTS (Tratamento Diretamente Observado de Curta Duração) para o alcance das metas de detecção e cura da tuberculose. O processo de descentralização que passa pelo setor saúde sem o devido planejamento e suporte técnico resulta em dificuldades para a incorporação das responsabilidades transferidas aos níveis locais. Evidencia-se a dificuldade de integração do DOTS ao serviço de APS devido à desmotivação das equipes, baixa competência e debilidade da infraestrutura limitando o acesso dos doentes ao serviço (SCATENA et al, 2009). No Brasil, o Ministério da Saúde juntamente com as instâncias estaduais e municipais está trabalhando para o fortalecimento do controle da TB. Vários estudos revelam que comorbidades como HIV, etilismo, tabagismo e uso de drogas ilícitas também podem interferir no sucesso do tratamento. Nesse sentido, é relevante analisar os fatores intervenientes na cura de pacientes com TB no município de Vitória-ES. Privilegiou-se o município de Vitória por este apresentar uma proporção de cura inferior à preconizada pela OMS e estar entre os municípios prioritários no controle da TB no Espírito Santo. OBJETIVOS GERAL Analisar os fatores intervenientes na cura de pacientes com tuberculose em Vitória-ES. ESPECÍFICOS Descrever a freqüência e distribuição de tuberculose entre curados e não curados no município de Vitória-ES por faixa etária e sexo; Identificar e quantificar os efeitos de fatores associados com a cura da tuberculose no município de Vitória-ES; Descrever as estratégias de controle da tuberculose efetivamente utilizadas no município de Vitória-ES. MATERIAIS E MÉTODOS Delineamento do estudo Trata-se de um estudo de coorte retrospectivo, tendo como variáveis de exposição os fatores intervenientes na cura da tuberculose, sendo composto pelas seguintes variáveis: sexo, idade, encaminhamento do caso, entrada do caso, uso de álcool, uso de tabaco e drogas ilícitas, outros agravos, forma da tuberculose, variáveis associadas ao critério clínico, RX e outros exames diagnósticos, história de infecção pelo HIV, indicação para DOTS, DOTS no tratamento, profissional responsável pela supervisão e freqüência da supervisão (tabela 1). O desfecho do estudo foi a cura de pacientes com TB utilizando a variável tempo de tratamento (tratamento sem interrupção durante 6 meses) para a definição do desfecho do tratamento. População e Amostra A população estudada foi constituída por 207 pacientes adultos que foram diagnosticados com tuberculose nas formas pulmonar e pulmonar + extrapulmonar notificados no período de 01 de janeiro do ano de 2009 a 31 de dezembro do ano de 2010 e, tratados pelas Unidades de Saúde da Família (USF) em Vitória no período de 01 de janeiro do ano de 2009 a 31 de dezembro do ano de 2011 devido o acompanhamento dos casos iniciados no final do ano de 2010 encerrarem no ano de 2011 e em outros momentos pelo lançamento do encerramento do caso no sistema ser feito passados mais de 6 meses. Vitória, capital do Espírito Santo, está situada na região sudeste do Brasil (20º19'09'S, 40°20'50'W). Com uma população de 327.801 habitantes, segundo estimativas do IBGE (2010), Vitória é subdividida em oito partes em termos, chamadas de regiões administrativas, que são coordenadas pelas gerências regionais (Figura 3) pelo decreto nº 12758/2006. Figura 3: Localização das Gerências Regionais em Vitória/ ES Fonte: Prefeitura de Vitória, 2006. Critérios de Inclusão e Exclusão Foram incluídos no estudo apenas pacientes que residiam no município de Vitória-ES, com notificação proveniente de Unidades de Atenção Básica e de Saúde da Família apresentando diagnóstico clínico de tuberculose pulmonar, baseado na avaliação radiológica, no resultado da baciloscopia e/ou cultura positiva para Mycobacterium Tuberculosis. Foram excluídos do estudo pacientes com idade inferior a dezoito anos, os casos multirresistentes, com duas ou mais entradas no sistema devido o reingresso após abandono e com óbito por outras causas. Figura 4 – Fluxograma da amostragem do estudo 316 casos notificados no SINAN-TB nos anos de 2009 e 2010. 92 casos notificados em Hospitais e Pronto Atendimentos 224 casos notificados por Unidades de Saúde da Família (EXCLUÍDOS) 07 casos óbitos por outras causas (EXCLUÍDOS) 02 casos multirresistentes (EXCLUÍDOS) 07 casos com duas ou mais entradas no sistema (EXCLUÍDOS) 207 casos incluídos no estudo 183 curados 17 abandonos 07 transferências 01 caso com idade < 18 anos (EXCLUÍDO) Fonte de Dados Os dados foram obtidos no Sistema de Informação de Agravos de Notificação de Tuberculose (SINAN-TB) do Município de Vitória – ES e pela busca ativa e análise de todos os prontuários dos pacientes selecionados para compor o estudo, com a utilização de uma ficha padronizada para a consulta dos mesmos (Anexo I). A tabela 1 apresenta um sumário das variáveis do estudo e a forma como foram categorizadas. Análise dos Dados Os dados foram dispostos em uma planilha eletrônica do programa Microsoft Office Excel 2007 e, em seguida, foram transferidos para o programa R 2.15.2. Os mesmos foram digitados por uma única pessoa que realizou a coleta de dados com dupla digitação e conferência posterior. A principio foi quantificada a freqüência e a distribuição de TB por faixa etária e sexo. Para as variáveis categóricas foram computadas as proporções de pacientes curados entre as categorias das variáveis de exposição e as mesmas comparadas por meio de teste de hipóteses. Para as variáveis explicativas contínuas fez-se o teste de medianas comparando os grupos de pacientes curados e não curados, através do teste de Postos de Wilcoxon (TRIOLA, 2008). Posteriormente foi verificada a associação entre as variáveis explicativas e o desfecho binário (ter ou não cura), utilizando Modelos Lineares Generalizados (Generalized Linear Models – GLM) com distribuição binomial e função de ligação logit, a fim de obter estimativas da chance do paciente obter cura (DOBSON, 2001).As estimativas pontuais não ajustadas das Razões de Chance ou Odds Ratio (OR), bem como os intervalos de confiança de 95% foram computados através da análise univariada. Finalmente foram ajustados modelos múltiplos, em que as variáveis foram selecionadas através de métodos automáticos de seleção como stepwise, forward e backward (KLEINBAUM et al, 2008) e o procedimento de seleção das variáveis não automáticos ou manual, como o proposto por Hosmer e Lemeshow (2000). Foram estimados os valores das OR ajustadas e seus respectivos intervalos de confiança de 95%. Termos de interações plausíveis do ponto de vista biológico foram testados entre as variáveis explicativas mantidas no modelo final. As variáveis foram consideradas significativas ao nível de 10%. A comparação de modelos foi feita através da análise de deviance (ANODEV) e AIC e a qualidade do ajuste foi verificada através da deviance residual comparativamente aos seus graus de liberdade, além da análise de resíduos. A análise gráfica dos resíduos do modelo ajustado permite verificar possíveis desvios das suposições de normalidade, heterocedasticidade e independência (DOBSON, 2001; McCULLAGH, NELDER, 1989). Na descrição das estratégias de controle da tuberculose, efetivamente utilizadas no município de Vitória-ES, foram utilizados na análise as seguintes variáveis explicativas: Indicação para DOTS (Tratamento Diretamente Observado de Curta Duração) (Sim ou Não); DOTS no tratamento (Sim ou Não); Profissional da supervisão (Equipe do Programa de Controle de Tuberculose ou Outros profissionais) e Frequência da supervisão (até uma vez por semana ou mais de uma vez por semana). Aspectos Éticos A presente pesquisa foi aprovada em 08 de março de 2012 pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Escola Nacional de Saúde Pública com número 6530 (Anexo II) e pela Secretaria Municipal de Saúde da Prefeitura de Vitória/ ES em 21 de março de 2012 autorizando o acesso aos dados do SINAN-TB do município de Vitória/ ES e a revisão dos prontuários dos pacientes com TB. Encontra-se em consonância com as determinações éticas previstas na Resolução 196/96 do CONEP (Conselho Nacional de Ética em Pesquisa). Tabela 1: Sumário das variáveis do estudo e suas respectivas categorizações. Variável Descrição Código USNot Unidade de Saúde da notificação __ Idade Idade Sexo Tempodiagtrat Sexo Tempo entre o diagnóstico e o tratamento EncamCaso Encaminhamento do caso para US Entradacaso Entrada do caso __ 1.Masculino 2. Feminino __ 1. PA (Pronto Atendimento) /Hospitais / ACS 2. Espontânea 1. Caso novo 2. Outros (transferência, reingresso, recidiva) Álcool Uso de álcool Tabaco Uso de tabaco Drogas Uso de drogas ilícitas Outrosagrav Outros agravos associados FormaTB Forma de TB 1. Sim 0. Não 1. Sim 0. Não 1. Sim 0. Não 1. Sim 0. Não 1. Pulmonar 2. Pulmonar + Extrapulmonar CritClin Critério clinico 1. Sim 2. Não RX_Outro RX ou outro exame diagnóstico 1. Sim 2. Não BAAR1 1ª amostra de BAAR 1. Positivo 2. Outros (negativo ou não realizado) BAAR2 2ª amostra de BAAR 1. Positivo 2. Outros (negativo ou não realizado) BAARoutro BAAR de outro material 1. Positivo 2. Outros (negativo ou não realizado) CulturaBAAR Cultura da BAAR 1. Positivo 2. Outros (negativo ou não realizado) HIV HIV 1. Positivo 2. Outros (negativo ou não realizado) Ustrat Unidade de Saúde do tratamento IndDOTS Indicação para DOTS DOTStrat DOTS no tratamento ProfSup Profissional da supervisão FreqSup Frequência da supervisão __ 1. Sim 2. Não 1. Sim 2. Não 1. Equipe PCT (Programa de Controle de TB) 2. Outros profissionais (equipe SF, ACS e técnicos de enfermagem de abrigos) 1. Até uma vez por semana 2. Mais de uma vez por semana Tempotrat Tempo de tratamento 1. Menos de 6 meses 2. 6 meses ou mais Desf Desfecho do caso 1. Cura 2. Outros (abandono ou transferência) RESULTADOS Observou-se que dos 207 pacientes com diagnóstico de tuberculose (nas formas pulmonar e pulmonar + extrapulmonar), 183 pacientes (88%) obtiveram cura. Dentre os 207 pacientes analisados, a maioria foi correspondente ao gênero masculino (65%) (tabela 2) e na faixa etária de 27-49 anos (51%). Dentre as 16 Unidades de Saúde da Família que notificaram casos de tuberculose nos anos de 2009 e 2010, a US Maruipe (43%) e a US Vitória (24%) foram as unidades que notificaram e trataram com maior frequência por ambas também oferecerem no serviço o Programa de Controle de Tuberculose (PCT). Para as variáveis tempo entre o diagnóstico e o inicio do tratamento (tempodiagtrat) e idade (anos), que são variáveis de natureza contínua, foram computadas as medianas entre os pacientes curados e não curados. Dois pacientes apresentaram valores atípicos para o tempo entre o diagnóstico e tratamento (90 e 330 dias), sendo excluídos das análises. Não houve diferença estatisticamente significativa entre esses tempos medianos no grupo de curados (0 dias) e não curados (12 dias) (pvalor= 0.757). Tabela 2: Distribuição da freqüência e proporção (%) de pacientes curados entre as categorias das variáveis de exposição. Exposição Sexo Masculino Feminino Faixa etária (anos) 18 – 26 27 – 49 50 e mais Encaminhamento do caso PA/ Hospitais/ ACS Espontânea Entrada do caso Caso novo Outros Álcool Não Cura (%) Total p-valor 115 (85%) 68 (94%) 135 72 0,0794 44 (85%) 96 (91%) 49 (98%) 52 105 50 0,0057 122 (85%) 61 (95%) 143 64 0,0655 167 (89%) 16 (80%) 187 20 0,3854 137 (91%) 150 0,0586 Sim 46 (81%) Tabaco Não 148 (91%) Sim 35 (80%) Drogas ilícitas Não 167 (92%) Sim 16 (64%) Outros agravos Não 157 (88%) Sim 26 (87%) Forma da TB Pulmonar 175 (89%) Pulmonar + Extrapulmonar 8 (73%) Critério clínico Sim 182 (88%) Não 1 (100%) RX ou outro exame diagnóstico RX 178 (88%) Outro 5 (100%) BAAR 1ª amostra Positiva 151 (88%) Outra 32 (91%) BAAR 2ª amostra Positiva 125 (89%) Outra 58 (88%) BAAR de outro material Positiva 5 (100%) Outra 178 (88%) Cultura da BAAR Positiva 115 (87%) Outra 68 (91%) Cultura de outro material Positiva 4 (80%) Outra 179 (89%) HIV Outro 180 (89%) Positivo 3 (60%) Indicação para DOTS Sim 92 (84%) Não 91 (94%) DOTS no tratamento Sim 68 (83%) Não 115 (92%) Profissional da supervisão Equipe PCT 165 (90%) Outros profissionais 18 (78%) 57 44 163 0,0713 25 182 0,0001 30 177 0,9893 196 11 0,2359 206 1 1 202 5 0,9103 172 35 0,7466 141 66 1 5 202 0,9103 132 75 0,5892 5 202 1 202 5 0,1931 110 97 0,0389 82 125 0,0763 184 23 0,2053 Frequência da supervisão Mais de 1 vez por semana Até uma vez por semana 161 (90%) 22 (76%) 178 29 0,0497 De acordo com os dados demonstrados na tabela 2, pode-se observar que a maioria das variáveis não foram significativamente associadas ao desfecho individualmente, ao nível de significância de 10%. Sendo apenas significativas as variáveis sexo, encaminhamento do caso, faixa etária, álcool, tabaco, drogas ilícitas, indicação para DOTS, DOTS no tratamento e frequência da supervisão. Outro aspecto a considerar é que dos 110 casos acompanhados com DOTS, 68 (83%) fizeram efetivamente e obtiveram a cura. Embora essa estratégia seja recomendada pela OMS, no município de Vitória ela foi realizada por uma pequena parcela dos serviços. Na tabela 3 também é observado que não há diferença entre a proporção de curados, quer o paciente seja atendido pela equipe de PCT, quer seja atendido por outros profissionais. De forma geral, pode-se dizer que a 10% de significância, a proporção de curados é maior em mulheres, entre indivíduos cujo encaminhamento foi espontâneo, entre não usuários de tabaco, álcool e drogas ilícitas. Além disso, a proporção de curados foi maior entre pacientes que não foram indicados para DOTS e que não tiveram DOTS no tratamento. Esses efeitos devem ser analisados com cautela, por não estarem ajustados por possíveis confundidores. A tabela 3 complementa a análise feita na tabela 2, mostrando a distribuição de frequências das variáveis de exposição e medianas das variáveis contínuas, nas categorias do desfecho, e quantificando os efeitos de associação, através das Razões de Chances de cura não ajustadas e respectivos intervalos de confiança de 95% (análise GLM univariada). Tabela 3: Distribuição de freqüências, medianas (*) e medidas de associação entre a cura de pacientes com tuberculose e as variáveis de exposição (OR bruta e IC 95%). Exposição (Categoria base na modelagem) Sexo (Masculino) Feminino Encaminhamento do caso (PA/ Hospitais/ ACS) Espontânea Idade **Idade Tempo entre o diagnóstico e o inicio do tratamento **Tempo entre o diagnóstico e o inicio do tratamento Entrada do caso (Caso novo) Outros Álcool (Não) Sim Tabaco (Não) Sim Uso de drogas ilícitas (Não) Sim Outros agravos (Não) Sim Forma da Tuberculose (Pulmonar) Pulmonar + Extrapulmonar BAAR 1ª amostra (Positiva) Outra BAAR 2ª amostra (Positiva) Outra Cultura da BAAR (Positiva) Outra Cultura de outro material (Positivo) Desfecho Cura Outros Total (%) OR Bruta (IC(95%)) 115 68 20 4 135 (65%) 72 (35%) 2,94 (0,03 – 2,19) 122 61 21 3 143 (69%) 64 (31%) 3,39 (0,97 – 11,80) 27 (*) 49(*) __ 1,05 (1,01 – 1,09) 1(*) 2(*) __ 1,02 (0,94 – 1,10) 167 16 20 4 187 (90%) 20 (10%) 0,48 (0,15 – 1,59) 137 46 13 11 150 (72%) 57 (28%) 0,39 (0,16 – 0,93) 148 35 15 9 163 (79%) 44 (21%) 0,40 (0,16 – 0,99) 167 16 15 9 182 (88%) 25 (12%) 0,16 (0,06 – 0,43) 157 26 20 4 177 (86%) 30 (14%) 0,84 (0,27 – 2,65) 175 8 21 3 196 (95%) 11 (5%) 0,32 (0,08 – 1,32) 151 32 21 3 172 (83%) 35 (17%) 1,5 (0,42 – 5,35) 125 58 16 8 141 (68%) 66 (32%) 0,9 (0,36 – 2,22) 115 68 17 7 132 (64%) 75 (36%) 1,43 (0,56 – 3,62) 4 1 5 (2%) 1,92 (0,21 – 17,96) Outro HIV (Outro – negativo ou não realizado) Positivo Indicação para DOTS (Sim) Não DOTS no tratamento (Sim) Não Profissional da supervisão (Equipe PCT) Outros profissionais Frequência da supervisão (Mais de uma vez por semana) Até 1 vez por semana 179 23 202 (98%) 180 3 22 2 202 (98%) 5 (2%) 0,19 (0,03 – 1,17) 92 91 18 6 110 (53%) 97 (47%) 2,90 (1,10 – 7,65) 68 115 14 10 82 (40%) 125 (60%) 2,33 (0,98 – 5,53) 165 18 19 5 184 (89%) 23 (11%) 0,39 (0,13 – 1,19) 161 22 17 7 178 (86%) 29 (14%) 0,34 (0,13 – 0,90) Para a variável idade, houve diferença estatisticamente significativa entre as idades medianas dos grupos de curados (27 anos) e não curados (49 anos) (p-valor= 0.00579), sendo o grupo de curados mais jovem. Vale a pena ressaltar que o encaminhamento do caso para unidade de tratamento foi feito na maior parte (31%) de forma espontânea pelo próprio usuário do serviço, ao detectar que os sintomas contrariavam o esperado, que é ser feito pelos serviços de pronto atendimento, hospitais ou pelo agente comunitário de saúde considerado por muitos autores o elo entre o serviço e a comunidade. As análises das variáveis critério clínico e RX ou outro exame diagnóstico não foram mostradas na tabela 4 e em análises posteriores devido a pouca variabilidade entre os pacientes quanto a essas variáveis. Com resultados já esperados para a confirmação diagnóstica, 99,5% tiveram o critério clinico e 98% pelo RX, porém esta variável não teve significância estatística. De acordo com os dados apresentados na tabela 4, pode-se observar que as variáveis idade, uso de álcool, uso de tabaco, uso de drogas ilícitas, não indicação para DOTS e frequência da supervisão até uma vez por semana mostraram-se significativamente associadas ao desfecho, ao nível de 10% de significância. Os efeitos verificados devem ser observados com cautela, uma vez que não estão ajustados por possíveis fatores de confundimento. Na próxima etapa foram analisados a associação entre a cura de pacientes com TB e as variáveis de exposição com suas respectivas razões de chances ajustadas e intervalos de 95% confiança (tabela 4). Os procedimentos automáticos (stepwise) e manuais de seleção levaram aos mesmos resultados. Tabela 4: Associação entre a cura de pacientes com tuberculose e as variáveis de exposição (OR ajustadas e IC 95%). Exposição Uso de drogas ilícitas Sim Profissional da supervisão Outros profissionais Indicação para DOTS Não HIV Positivo Forma da Tuberculose Pulmonar + Extrapulmonar OR (IC(95%)) 0,07 (0,02 – 0,22) 0,14 (0,04 – 0,53) 3,52 (1,18 – 10,46) 0,09 (0,01 – 0,67) 0,10 (0,02 – 0,50) Com base nos efeitos ajustados através do modelo múltiplo, verifica-se que o uso de drogas ilícitas (OR = 0,07; IC95%: 0,02 – 0,22), a presença de infecção pelo HIV (OR = 0,09; IC95%: 0,01 -0,67), o fato de ser supervisionado por outros profissionais (OR = 0,14; IC95%: 0,04 -0,53), não ser indicado para DOTS (OR= 3,52; IC95%: 1,18 – 10,46) e a TB nas formas pulmonar + extrapulmonar (OR = 0,10; IC95%: 0,02 – 0,50) mostraram-se como fatores intervenientes na cura de pacientes com TB (Tabela 4). Após o ajuste do modelo, é importante verificar a adequação do mesmo quanto aos pressupostos do método utilizado e a possível interferência de observações aberrantes nas estimativas. Na análise gráfica dos resíduos, aparentemente não há indícios de violação dos pressupostos, sendo o modelo considerado bem ajustado (Anexo III). DISCUSSÃO Estudo realizado em três estados do Sudão, na África, com pacientes internados em hospitais de referência e em unidades de APS, no período de janeiro de 1997 a janeiro de 2001, com diagnóstico de TB demonstrou uma maior taxa de sucesso no tratamento nas instalações da APS, com maior risco de abandono a pacientes tratados em hospitais de referência. A descentralização das ações de controle de tuberculose na APS, juntamente com as ações de educação em saúde, aumentou a adesão do tratamento (EL-SONY et al, 2003). Diferente do estudo anteriormente citado, a pesquisa realizada por Scatena et al. (2009), no ano de 2007, com pacientes com tuberculose atendidos na rede de atenção básica, nos municípios brasileiros de Ribeirão Preto (SP), São José do Rio Preto (SP), Itaboraí (RJ), Campina Grande (PB) e Feira de Santana (BA) revelou que a descentralização das ações de TB para o PSF não apresenta desempenho satisfatório para o acesso ao diagnóstico e que a maioria dos municípios encontra dificuldade para organizar uma rede de Atenção Básica. No município de Vitória (ES), a descentralização das ações de TB para a atenção primária apresenta desempenho satisfatório para o acesso ao diagnóstico e tratamento. A forma de organização da atenção à TB foi fator determinante para a garantia de acesso ao diagnóstico precoce da TB, evidenciada, nesta pesquisa, pelo percentual de casos (67%) que são notificados e tratados por duas unidades de SF em cujo serviço oferece o PCT. O primeiro plano diretor de regionalização de saúde do Estado do Espírito Santo foi apresentado em outubro de 2003, tendo sido elaborado conforme o estabelecido na Norma Operacional de Assistência à Saúde 01/2002 – NOAS/SUS 2002. O plano adotou os programas de ACS e Saúde da Família com o objetivo de ordenar a APS, seguindo a orientação nacional proposta pelo Ministério da Saúde (ESPIRITO SANTO, 2011). Resultados da pesquisa desenvolvida por Fregona (2007) demonstram que no Espírito Santo houve uma ampla adesão dos gestores municipais, a partir de 1998, à proposta do governo federal e estadual, com ampliação da cobertura da ESF, alcançando, em 2002, 100% dos municípios. Uma vez que as três instâncias governamentais encontram-se envolvidas na implantação destes programas, a decisão da implementação da ESF cabe exclusivamente à decisão política da administração municipal. O município de Vitória conta com 28 unidades de saúde, perfazendo 21 USF, 03 PACS e 04 UBS (ESPIRITO SANTO, 2012). Apesar da alta cobertura de ESF no município de Vitória, devido à descentralização do serviço de TB para o PCT, a tabela 4 sugere que não há envolvimento das equipes de SF no diagnóstico e tratamento da TB. Observou-se que os pacientes que são supervisionados por outros profissionais (equipes de SF, ACS e técnicos de enfermagem de abrigos) têm a chance de cura de OR=0,14 a chance dos pacientes que são supervisionados pela equipe do PCT. Podemos ainda ressaltar que apesar de ser pactuado nacional e internacionalmente a estratégia DOTS para 100% dos casos, apenas 53% dos pacientes foram indicados para DOTS (tabela 4) e 40% destes fizeram efetivamente o tratamento. Esses resultados demonstram que o DOTS foi incorporado pelos serviços de saúde, entretanto assumido apenas por uma pequena fração dos profissionais das equipes de SF como uma estratégia de tratamento. Com o baixo envolvimento das equipes de SF na estratégia DOTS em Vitória, a mesma é implementada, na grande maioria das vezes, apenas por profissionais das equipes de PCT, implicando na presença diária dos pacientes nas US de referência (PCT) que, muitas vezes, é dificultada pelo trabalho e/ou estudo. Com isso os doentes deixam de pegar a medicação pessoalmente, valendo-se do serviço de algum familiar ou amigo que se dirige à US. Em outros casos, o doente comparece à US uma única vez ao mês, perdendo-se a oportunidade de ser realizado o tratamento supervisionado. Resultado semelhante foi encontrado em pesquisa realizada por Figueiredo et al (2009) no município de Campina Grande – PB, no período de julho/2006 a agosto/2007, contando com 85 equipes de ESF, tendo 71% de cobertura com profissionais responsáveis pela execução das ações de TB. Observou-se, porém, nessa pesquisa, que apesar da incorporação do DOTS nos serviços de saúde o mesmo não é efetivo. No que se refere à adesão do tratamento da TB, alguns estudos têm mostrado a eficácia da estratégia DOTS. Em Ubatuba – SP, em estudo realizado com todos os pacientes notificados com TB, entre fevereiro de 1997 e janeiro de 2001, foi introduzida a estratégia retornos freqüentes, evidenciando uma redução importante nas taxas de abandono de tratamento de TB no município de Ubatuba (BERGEL, GOUVEIA, 2005). Em Cuiabá, a taxa de abandono também foi menor entre os casos de TB com tratamento supervisionado (FERREIRA, SILVA, BOTELHO, 2005). O mesmo foi observado em Bauru – SP, onde o acompanhamento do paciente é realizado duas vezes por semana (REIGOTA, CARANDINA, 2002). Assim, o tratamento supervisionado pressupõe um incremento na efetividade do programa, além de um maior envolvimento entre os profissionais de saúde, serviço e comunidade. Além dos fatores já discutidos, outras dificuldades podem ser encontradas na promoção da adesão ao tratamento dos casos de tuberculose, como o longo tempo necessário para o tratamento e a sua associação com outras morbidades, como a AIDS. A infecção por HIV exacerba a epidemia de TB por aumentar a suscetibilidade à infecção pelo Mycobacterium tuberculosis, ou ainda, por torná-la uma doença ativa (JAMAL, MOHERDAUI, 2007). De acordo com Coimbra et al. (2012) o atraso no início do tratamento para a tuberculose (TB) em indivíduos infectados pelo HIV pode levar ao desenvolvimento de uma forma mais grave da doença, com altas taxas de morbidade, mortalidade e de transmissibilidade. Estudo realizado na Nigéria evidenciou altas taxas de co-infecção TB/ HIV associadas com altas taxas de mortalidade e uma taxa de padrão alarmante, entre os casos tratados, mais elevados do que os relatados anteriormente no Norte da Nigéria. O autor ainda afirma que as notificações dos casos de TB só aumentam na Nigéria com uma taxa de co-infecção TB/HIV de 26%, sendo o HIV um importante fator que alimenta esta epidemia (IFEBUNANDU, UKWAJA, OBI, 2012). Na população analisada neste estudo em Vitória, na prevalência da coinfecção TB/ HIV, apesar de baixa (2%), os pacientes HIV positivos têm uma chance de cura menor (OR= 0,09) (tabela 4) comparados aos pacientes HIV negativos. Resultado semelhante foi encontrado em estudo realizado em Porto Alegre em que pacientes HIV positivos têm a chance de abandono do tratamento de (OR= 5,1) em relação à chance dos pacientes HIV negativos, configurando um fator de risco para a não cura ou abandono do tratamento da TB (CAMPANI, MOREIRA, TIETBOHEL, 2011). Outro fator preditor do abandono do tratamento da TB é o uso de drogas lícitas e ilícitas. Um estudo de coorte realizado na Malásia comparando os desfechos de tratamento entre pacientes com TB fumantes e não fumantes revelou que os fumantes tiveram um aumento da probabilidade de falha no tratamento (OR= 7.48) e eram menos susceptíveis a cura (OR= 0.34) (DUJAILI et al, 2011). Além do cigarro, outra droga lícita que pode estar associada à não adesão do tratamento de TB é o álcool. Estudos do Centro de Investigação da Tuberculose (TRC) Chennai, na Índia, relataram que o alcoolismo tem sido uma das principais razões para o re-tratamento da TB e mortalidade no âmbito do programa DOTS no sul da Índia (SUHADEVI et al, 2011). No estudo realizado em Porto Alegre o alcoolismo na análise de regressão logística múltipla apresentou OR= 5.4 (CAMPANI, MOREIRA, TIETBOHEL, 2011). Como foi observado, o uso de drogas lícitas, como o álcool e o tabaco, são importantes fatores preditores da não cura no tratamento da TB. Não obstante neste estudo estas duas variáveis terem sido significativas na análise inicial (tabela 2) e univariada de GLM (tabela 3), no modelo final (tabela 4) as mesmas variáveis não foram correlacionadas com o desfecho, sendo significativo apenas o uso de drogas ilícitas para compor o modelo. Assim, os pacientes usuários de drogas ilícitas têm uma chance de cura menor (OR= 0,07) que a chance dos pacientes não usuários de drogas ilícitas ajustado pelas outras variáveis. Segundo Rhodes et al (1999) e Story et al (2007), o uso de drogas ilícitas e injetáveis é um fator importante na epidemiologia da TB em países desenvolvidos e em desenvolvimento. Embora a incidência da tuberculose tenha diminuído em países mais desenvolvidos ao longo da última década, o ônus da doença está sendo cada vez mais suportado por subpopulações urbanas, incluindo usuários de drogas. De acordo com Deiss, Rodwell e Garfein (2012), apesar de os estudos demonstrarem que os usuários de drogas com frequência atrasam o tratamento da TB, mesmo quando eles são sintomáticos, existem hipóteses de que os usuários podem ter ciência dos seus sintomas pela supressão do reflexo da tosse e pelo uso de opiáceos. Barreiras de tratamento, incluindo a baixa adesão e o acesso ilimitado aos cuidados, representam desafios únicos para o tratamento de usuários de drogas, mas servem como fatores de risco modificável. Esses fatores devem ser o foco das futuras intervenções, visto que a falha do tratamento é o fator de risco principal para o desenvolvimento de resistência aos medicamentos. A importância do controle da TB entre usuários de drogas é clara e exige a prestação de serviços orientados para sustentar resultados positivos. No município do Rio de Janeiro, uma das barreiras do tratamento da TB é a violência que se expressa através da ação do tráfico de drogas, ao impedir o deslocamento dos pacientes e profissionais de saúde para o tratamento da tuberculose e de policiais. Essas barreiras, levantadas neste estudo, evidenciam a dificuldade na realização do tratamento supervisionado abordado anteriormente e o insucesso do tratamento (SOUZA et al, 2007). Outra variável selecionada para compor o modelo final (tabela 4) foi a tuberculose na forma pulmonar + extrapulmonar, indicando que a chance de cura do paciente que tem as duas formas de TB é menor (OR=0,10) quando comparada à de pacientes que têm apenas a tuberculose na forma pulmonar. Segundo Gonzalez et al (2003), a TB na forma extrapulmonar ocorre fora dos pulmões e pode se espalhar através da disseminação linfática ou hematogénea. As bactérias da tuberculose podem permanecer dormentes por anos em um determinado site antes de causar a doença. Quase todos os órgãos do corpo podem ser infectados por TB na forma extrapulmonar. Ela também pode ter uma grande variedade de manifestações clínicas, levando à dificuldade e à demora no seu diagnóstico. Um estudo de coorte retrospectivo foi realizado com dois grupos de pacientes com tuberculose extrapulmonar para avaliar se apenas seis meses seriam necessários à realização do tratamento eficaz, como na TB pulmonar. Conclui-se que seis meses são suficientes para o tratamento da TB extrapulmonar com exceção da TB com localização neuromeningeal (BOUCHIKH et al, 2012). A variável tempo entre o diagnóstico e o início do tratamento, embora não tenha significância e não interfira no desfecho do tratamento (cura) enquanto o paciente não inicia o tratamento, é importante fonte de disseminação da doença para contatos. Assim, a atividade de controle de contatos deve ser considerada uma importante ferramenta de prevenção do adoecimento e diagnóstico precoce dos casos da doença ativa na população. A mesma deve ser realizada fundamentalmente pela atenção primária. Apesar de o estudo ter levantado os fatores que interferem na cura de pacientes com tuberculose no município de Vitória/ES, por tratar-se de um estudo de coorte retrospectiva e pela forma que a variável desfecho outros (abandono ou transferência) foi agrupada para ser realizada a análise estatística e epidemiológica pode ter ocorrido um viés de seleção representando uma limitação deste estudo. CONCLUSÕES Este estudo foi capaz de analisar, identificar e quantificar os efeitos dos fatores que concorrem para a cura de pacientes com tuberculose notificados e tratados pela atenção primária no município de Vitória, destacando-se comorbidades como o uso de drogas ilicitas e HIV, fatores associados à organização do serviço de APS (profissional da supervisão e indicação para tratamento supervisionado) e formas da doença. Os resultados elucidaram o descompasso entre a transferência de responsabilidades das ações de controle da TB para a APS em Vitória constatado pela descentralização do tratamento e acompanhamento dos casos de tuberculose que vêm sendo estabelecidos pelas duas unidades de saúde com PCT implantados. Outro aspecto observado é que na estratégia DOTS, não obstante ser recomendada pela OMS e ter sido incorporada pelos serviços de saúde, os doentes são apenas indicados para o tratamento supervisionado, sem, entretanto, ser realizado pelos profissionais da atenção básica por não haver envolvimento desses profissionais no controle da TB. Assim, fica evidente que a APS ainda não assumiu com afinco as ações de controle da tuberculose, como era previsto com a descentralização dessas ações. Julga-se necessária uma efetiva organização dos serviços de saúde como a APS, ainda em construção no país e em Vitória ao longo do tempo, principalmente com a ampliação da cobertura para os municípios mais populosos. É fundamental para a viabilização das ações de controle da TB na APS a conscientização, o envolvimento e vínculo com o doente, a integração e a articulação dos responsáveis pelo controle da doença nos diversos níveis do sistema de saúde em favor da viabilização de políticas como a ampliação do DOTS, planejamento, avaliação e a adequação em conjunto das estratégias e tecnologias adotadas principalmente no nível municipal. É nesse âmbito que, de fato, ocorre a implementação das políticas, concomitantemente ao treinamento adequado das equipes de saúde e incentivo ao envolvimento qualitativo da sociedade civil. REFERÊNCIAS 1. ANTUNES, J. L. F; WALDMAN, E. A; MORAES, M. A tuberculose através do século: ícones canônicos e signos do combate à enfermidade. Ciência e Saúde Coletiva 2000, 5(2):367-379. 2. BARRETO, M. L; PEREIRA, S. M; FERREIRA, A. A. Vacina BCG: eficácia e indicações da vacinação e da revacinação. Jornal de Pediatria 2006, 82(3):45-54. 3. BARRETO et al. 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Geneva, 2005. control: ANEXOS ANEXO I ROTEIRO DE CAMPO Dados SINAN 1. Município da Notificação: *Vitória 2. Unidade de Saúde (ou notificadora):______________________________ outra fonte 3. Tipo de entrada: ( ) Caso novo ( ) Recidiva ( ) Reingresso após abandono ( ) Não sabe ( ) Transferência 4. Forma: *Pulmonar 5. Agravos associados: ( ) AIDS ( ) Alcoolismo ( ) DM ( ) Doença mental ( ) Outras: _________________________________________________ 6. Baciloscopia de escarro (diagnóstico): 1ª Amostra – ( ) Positiva ( ) Negativa 2ª Amostra – ( ) Positiva ( ) Negativa 7. Cultura de outro material: ( ) Positiva ( ) Negativa ( ) Em andamento ( ) Não realizado ( ) Outros:________________________________ 8. HIV: ( ) Positiva ( ) Negativa ( ) Em andamento ( ) Não realizado 9. Data de Inicio do Tratamento atual: ___/___/___ 10. Indicado para Tratamento Supervisionado (TS/DOTS)? ___________________ Busca ativa nas Unidades (Prontuário) 1. Tempo de tratamento:_________________________________________ 2. Medicamentos utilizados no tratamento: ________________________________ 3. Profissional responsável pela supervisão:________________________________ 4. Desfecho: ( ) Curado ( ) Não curado ( ) Em tratamento ( ) Outro:_______ Observações:_______________________________________________________ ANEXO II ANEXO III Gráfico de resíduos padronizados versus valores preditos, normalidade aproximada dos resíduos, observações influentes (leverage) e medida de afastamento do vetor de estimativas provocado pela retirada da i-ésima observação (distância de cook).