Estratégias de dinamização da Terapia Comunitária: mobilizando o acervo cultural. Samilla Gonçalves de Moura1 Danielle Samara Tavares de Oliveira2 Mariana Albernaz Pinheiro de Carvalho3 Vagna Cristina Leite4 RESUMO A cultura é o complexo dos padrões de comportamento, das crenças, valores, normas, manifestações artística etc, que proporcionam aos indivíduos sentimentos de pertencimento e de identidade social. Em diversos contextos urbanos existem grupos populacionais, que carecem de valores capazes de recompor sentimentos de perda de identidade, desenraizamento e outros, que levam pessoas, famílias e comunidades a conviverem com a violência doméstica, desesperança, indiferença e abandono, entre outras conseqüências da decomposição dos laços vitais. Neste contexto a terapia comunitária tem se destacado como um trabalho de referência para essas pessoas excluídas socialmente e resgata também a participação dos valores culturais de um grupo social e dos vínculos inter-pessoais. Assim, esse trabalho objetiva identificar as estratégias culturais mais utilizadas pelos terapeutas nas rodas de terapia, e conhecer o acervo cultural dos terapeutas para dinamizar os encontros da TC. Trata-se de um estudo de natureza qualitativa, realizada no município de João Pessoa com amostra de dez terapeutas comunitários, cujo instrumento de coleta de dados foi um questionário previamente elaborado. Evidenciou-se que os principais recursos culturais utilizados são músicas, dinâmicas e orações e que os recursos culturais são utilizados em menor proporção nas fases de escolha do tema e problematização. Outros recursos citados na literatura como jogos, danças, participação de violeiros, sanfoneiros, catequistas, utilização de histórias, contos, fábulas, brincadeiras, são pouco ou não evidenciados e estes devem ser valorizados para que a terapia torne-se contextualizada e proporcione ao individuo, família e comunidade o resgate de seus valores culturais, das crenças e identidade pessoal e social. Palavras Chave: Terapia, Participação Comunitária, Cultura. ABSTRACT Culture is the complex patterns of behavior, the beliefs, values, norms, etc. art demonstrations, which give individuals a sense of belonging and social identity. In many urban contexts there are population groups in need of values able to revive feelings of lost identity, roots and others, leading people, families and communities to live with domestic violence, despair, indifference and neglect, among other consequences of the decomposition ties vital. In this context therapy Community stands out as a work of reference for these people socially excluded and also to recover from the cultural values of a social group and inter-personal relationships. Thus, this study aims to identify the cultural strategies used by most therapists in the wheels of therapy, and know the culture collection of therapists to promote the meetings of TC. This is a study of qualitative nature coatis-held city of João Pessoa in a sample of eight community therapists, whose data collection instrument was a questionnaire prepared in advance. Showed that the main cultural resources are used songs, prayers and dynamic and that the cultural resources are used in smaller proportion in the stages of choosing the theme and issues. Other features cited in literature as games, dances, attended by violist, musicians, catechists, use of stories, tales, fables, jokes, are little or no evidence and they should be valued for the therapy becomes contextualized and provide the individual , family and community redemption of their cultural values, beliefs and the personal and social identity. Keywords: Terapy, Involvement Community, Culture. CONSIDERAÇÕES INICIAIS De acordo com o dicionário Aurélio a palavra cultura é definida como o complexo dos padrões de comportamento, das crenças, das instituições, das manifestações artísticas e intelectuais etc, transmitidas coletivamente e típicas de uma sociedade. Na visão de Geertz (1989), o conceito de cultura parte da idéia de que o homem é enredado em uma teia de significados, por ele próprio tecida e analisada. Sendo assim segundo Barreto (2005) citado por Santos (2008) a cultura é um elemento de referência “fundamental para a construção de nossa identidade pessoal e grupal, interferindo de forma direta na definição do quem sou eu, quem somos nós”. Segundo Santos (2008) mesmo assumindo vários sentidos, a cultura é constituída de três elementos essenciais: Idéias, abstrações e comportamentos. Estes por sua vez vão gerar os cinco componentes básicos da cultura: conhecimento, crenças, valores, normas e símbolos. Diante destas concepções entendemos que a cultura é tudo aquilo que não é natural, ou seja, que não nasce com o homem e sim é de forma simbólica constituída e adquirida pelo inter-relacionamento humano e inclui aspectos tangíveis, como os símbolos, objetos, e aspectos intangíveis, as crenças, valores, idéias, e estes proporcionam aos indivíduos sentimentos de pertencimento e de identidade social que são repassados pelos povos de geração em geração. 1 Enfermeira da Atenção Básica do Distrito Sanitário II. Especialista em Auditoria em Serviços de Saúde pela CPBEX. Membro do Grupo de Pesquisa em Saúde Mental Comunitária do PPGENF da Universidade Federal da Paraíba. Membro do Comitê de Prevenção da Mortalidade Materna e Infantil de João Pessoa. 2 Enfermeira. Aluna Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal da ParaíbaUFPB. Membro do Grupo de Pesquisa em Saúde Mental Comunitária do PPGENF da Universidade Federal da Paraíba. E-mail: [email protected] 3 Enfermeira. Aluna Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal da ParaíbaUFPB. Membro do Grupo de Pesquisa em Saúde Mental Comunitária do PPGENF da Universidade Federal da Paraíba. E-mail: [email protected] 4 Enfermeira. Prof. de Enfermagem, pela Escola de Enfermagem Nova Esperança. Membro do Grupo de Pesquisa em Saúde Mental Comunitária do PPGENF da Universidade Federal da Paraíba. E-mail: [email protected] Segundo Ferreira (2008) atualmente evidencia-se a grande necessidade de se trabalhar com grupos populacionais que em contextos urbanos, de origem migratória, carecem de valores capazes de recompor sentimentos de perda de identidade desenraizamento e outros que levam pessoas, famílias e comunidades a conviverem com a violência doméstica, desesperança, indiferença e abandono, entre outras conseqüências da decomposição dos laços vitais que unem os indivíduos na trama cotidiana. Nesse sentido a Terapia Comunitária (TC) tem se destacado por ser um trabalho terapêutico de referência para os excluídos da sociedade e tem permitido agregar os “sem-rumo e perdidos”, tendo aberto um espaço de expressão para os que sofrem. (BARRETO, 2005). Na ideologia do mesmo autor citado a TC resgata também a participação dos valores culturais de um grupo social e dos vínculos inter-pessoais e sociais que unem, fortalecem e fazem o homem desse grupo descobrir o sentido de pertencimento à humanidade. A terapia comunitária é um espaço aberto a todas as pessoas, onde ocorre à troca de experiências de vida de forma horizontal e circular, visando o alivio do sofrimento humano, ou seja, na TC não há detenção de conhecimento por parte de um profissional especializado, e sim ocorre à partilha de experiências entre os participantes sobre as principais situações inquietantes pelas quais todos nos vivenciamos no nosso dia-dia, é a troca desses conhecimentos que permite a adoção de estratégias para superação dos desafios e dificuldades do cotidiano, valorizando assim o saber popular. A TC destaca-se como um instrumento que nos permite construir redes sociais solidárias de promoção da vida e mobiliza os recursos e as competências dos indivíduos, das famílias e das comunidades, sendo atualmente uma tecnologia de cuidados em saúde mental que vem se expandindo em todo o território nacional, com a finalidade de prevenção do adoecimento. Na TC procura-se suscitar a dimensão terapêutica do próprio grupo valorizando a herança cultural dos nossos antepassados indígenas, africanos, orientais, europeus, bem como o saber produzido pela experiência de cada um. (BARRETO, 2005) Dentre os objetivos da TC podemos destacar a ênfase em reforçar a dinâmica interna de cada individuo, para que este possa descobrir seus valores, suas potencialidades e tornar-se mais autônomo e menos dependente, o reforço da autoestima individual e coletiva, a valorização do papel da família e da rede de relações que ela estabelece com o seu meio, a suscitação em cada pessoa, família e grupo social, de seus sentimentos de união e identificação com seus valores culturais, a promoção e valorização das instituições e práticas culturais tradicionais guardiãs da identidade cultural etc. (BARRETO, 2005). As rodas de terapia são conduzidas por terapeutas comunitários, onde em cada sessão há um terapeuta e um co-terapeuta que auxilia o primeiro no decorrer da mesma. Segundo Barreto (2005) o terapeuta comunitário não deve assumir papel de especialista, e sim trabalhar o sofrimento das pessoas, estimular a partilha, resgatar e valorizar o saber produzido pela experiência de vida de cada um, e possibilitar a construções de redes de apoio. Na visão de Grandesso, (2008) o respeito do terapeuta pela diversidade cultural e pela multiplicidade de contextos com seus saberes locais implica numa terapia construída a partir da aceitação da responsabilidade social do terapeuta, legitimando os direitos humanos de bem estar e de exercício da livre escolha. Para a autora acima citada essa postura coloca-se como imperativa, considerando-se as diversidades territoriais, a miscigenação cultural, étnica, religiosa e social de nosso país. Contextos como este, exigem práticas locais, como a terapia comunitária, trabalhando com camadas de populações econômica e culturalmente carentes. De acordo com Waldergrave (1989) apud Grandesso (2008), o terapeuta e as práticas de terapia que não tratam das redes de significado cultural de maneiras informadas são racistas, mesmo que não intencionalmente. Isto porque segundo o autor tendem a predominar os valores das classes que controlam as instituições. Barreto (2005) enfatiza que o terapeuta comunitário deve entender que nem toda cultura, nem todo saber tem sido valorizados como deveriam. O autor diz que o terapeuta só será bom se este conseguir lidar com a diferença, sem querer “coloniza-la”. É preciso admitir que a riqueza está na diferença e que cada um é rico naquilo que o outro é pobre. Na concepção de Barreto (2005) para que haja a transformação de comunidades de excluídos e para proporcionar que estes se integrem, e descubram seus valores como pessoas, os valores que a cultura oferece como recursos que foram destruídos pelo colonizador e continuam sendo por outras formas de colonização, temos que ajudá-las nesta descoberta, temos que ajudá-las a verbalizar suas sensações e emoções, transformando-as em pensamento transformador. A partir daí, os excluídos poderão ser sujeitos da história e, não mais meras vítimas e expectadores. A TC apóia-se em algumas bases teóricas, entre elas a antropologia cultural, que chama a atenção para a importância da cultura como referencial a partir do qual cada membro de um grupo se baseia, retira sua habilidade para pensar, avaliar e discernir valores, e fazer suas opções no cotidiano; (SILVA, 2008). Segundo Santos (2008) na antropologia, o estudo da cultura se confunde com a própria Antropologia e vai explicar os significantes dos atos simbólicos, ou o conjunto destes, através da análise do discurso social, construindo uma estrutura conceitual e elucidativa do papel da cultura na vida humana. A antropologia cultural é colocada como eixo epistemológico da TC, por ser uma terapia sistêmica, de construção social e ainda pela valorização no discorrer das rodas de TC das manifestações culturais de cada povo, e para que se tenha um conhecimento das dimensões culturais e suas manifestações é necessário que o terapeuta utilize a pesquisa antropológica para construção de uma terapia estruturada e contextualizada com os valores culturais de cada grupo, para a garantia do sucesso de tal tecnologia de cuidados. As rodas de TC se desenvolvem em cinco etapas ou fases: Acolhimento, Escolha do tema, Contextualização, Problematização, Rituais de agregação. No acolhimento o terapeuta deve sempre lembrar aos participantes algumas regras necessárias para o bom andamento das rodas de terapia. Essas regras incluem fazer silêncio, não dá conselhos, não julgar, falar de si, propor músicas, poemas, contos, histórias, fábulas, paródia que tenham relação com o tema em questão durante a qualquer fase da roda de TC. De acordo com a regra referente às manifestações culturais, estas podem ser exaltadas em qualquer momento da sessão de TC, quer seja pelo terapeuta ou por qualquer participante da roda. Barreto (2005) ressalta a importância de o terapeuta identificar e convidar pessoas para formar uma equipe de animação, com violeiros, sanfoneiros, grupos musicais folclóricos, além de catequistas que podem enriquecer a terapia com música alegria e momentos de espiritualidade. Ele sugere também que durante o acolhimento é interessante incluir e adaptar elementos da cultura local. Nesse sentido a TC trabalha com o resgate de nossas raízes culturais, através de manifestações como a música, as histórias, os provérbios, os contos, as fábulas, orações entre outros, pois a cultura dentro da TC é vista como elemento indispensável para construção de nossa identidade pessoal e social e de sentimentos de pertencimento à humanidade, dessa forma tais recursos proporcionam a agregação de valores e possibilita ao cidadão o resgate de sua identidade . É dentro dessa perspectiva da grande importância dos recursos culturais como elemento indispensável para o alcance dos pressupostos da TC, que esse estudo tem por objetivo: identificar as estratégias culturais mais utilizadas pelos terapeutas nas rodas de terapia, e conhecer o acervo cultural dos terapeutas para dinamizar os encontros da TC. CONSIDERAÇÕES METODOLÓGICAS Trata-se de uma pesquisa de campo do tipo descritiva com abordagem predominantemente qualitativa. Foi realizada, no município de João Pessoa, o qual conta atualmente com 180 Unidades de Saúde da Família, das quais 43 realizam a terapia comunitária. O município foi escolhido porque nele existem 113 terapeutas comunitários que foram formados desde 2007 e que realizam a terapia comunitária. As terapias são realizadas em diversos locais, como: associação de moradores, escolas, igrejas e também nas próprias USF. Os locais freqüentados foram nas Unidades de Saúde da Família, CAP´S (Centro de Atenção Psicossocial), e associação de moradores de bairro. Fizeram parte do estudo, dez terapeutas comunitários do município de João Pessoa. Foram incluídos aqueles que ao serem informados sobre os objetivos da pesquisa, aceitaram ser indagados livremente sobre aspectos relevantes para este estudo. Utilizou-se a técnica de entrevista estruturada, a partir de um questionário com perguntas previamente elaboradas. O questionário estava composto por seis perguntas, objetivas e subjetivas visando maiores esclarecimentos sobre os recursos culturais que já vem sendo utilizados nas rodas de TC como forma de dinamizar os encontros. Foi utilizado ainda um diário de campo onde houve o registro de outras informações de interesse para aprofundamento do conhecimento acerca do objeto do estudo, quando as pesquisadoras tiveram a oportunidade de participar das rodas de TC. A análise dos dados foi desenvolvida durante toda a coleta de dados, através de teorizações progressivas com base na literatura pertinente. A intenção foi a de verificar a consistência das informações dadas e a confirmabilidade, conforme sugere Alves Mazzotti e Gewandsznajder (1999). Para tanto a pesquisadora esteve atenta as informações dada pelos entrevistados e fez a opção de participar das rodas de Terapia para confirmar tais informações. Os dados discursivos obtidos nas entrevistas são tratados a seguir, obedecendo-se a triangulação: visão dos entrevistados, dos autores da literatura estudada e da própria pesquisadora. Foi feita uma comparação entre o que diz o manual do terapeuta comunitário produzido pelo criador da Terapia Comunitária, Adalberto de Paula Barreto e a prática dos terapeutas. Este manual foi tomado como parâmetro, pois, ele é a literatura base dos terapeutas comunitários. Assim para cada passo da terapia foram feitas observações pertinentes àquele momento específico. Vale salientar que esta pesquisa obedeceu às normas e diretrizes previstas na Resolução 196/96 que regulamenta as pesquisas com seres humanos, sendo aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal da Paraíba com número de protocolo 0042. Cada sujeito assinou ao termo de consentimento livre e esclarecido, o qual informou sobre objetivos do estudo e direitos da pessoa que está sendo objeto da investigação. Sendo em número de duas cópias uma ficou com a pesquisadora e outra com o entrevistado. RESULTADOS E DISCUSSÃO Seguindo os passos da Terapia o primeiro momento a ser observado foi o acolhimento, onde se fala sobre o objetivo e as regras da TC. Foi observado e indagado ao terapeuta se o mesmo sempre lembra da regra referente aos aspectos culturais, ou seja: Entre uma fala e outra, qualquer participante do grupo pode interromper a reunião para sugerir uma música, seja de alguma religião ou popular, que tenha alguma ligação com o tema em discussão, ou lembrar um provérbio que ilustre a situação, ou até mesmo, contar uma piada que esteja no contexto. (BARRETO, 2005) Todos os entrevistados responderam que sempre é lembrada essa regra em todos os encontros na fase de acolhimento, demonstrando a significativa importância que os terapeutas dão aos recursos culturais, pois de acordo com Barreto (2005) na TC a cultura deve ser vista como um recurso que deve ser reconhecido, valorizado, mobilizado e articulado de forma complementar com outros conhecimentos, pois somente assim pode-se somar multiplicar nossos potenciais de crescimento e resolução de nossos problemas sociais. Todos os terapeutas participantes acham que esses recursos lúdicos contribuem para o sucesso da terapia, na medida em que atrai as pessoas para as rodas de terapia, faz com que os participantes se tornem mais desinibidos e assim expressem melhor o problema pessoal que está acontecendo no momento. Enfatizam que tais recursos trazem alegria e minimiza as tensões, gera a sensibilização das pessoas, promove integração interpessoal e dinamização da rodas quebrando a monotonia. Isso pode ser observado através dos seguintes justificativas dos terapeutas: “Os recursos lúdicos dinamizam os encontros, as pessoas vêm aos encontros e procuram pelas dinâmicas, ou sentem falta delas e pedem aos terapeutas que as realizem.” “Contribui para o retorno e aumenta o interesse pela roda de terapia” Observou-se que os principais recursos culturais utilizados na rodas de terapia como forma de dinamizar os encontros por ordem de suas fases são: a) Fase de acolhimento: Durante a fase de acolhimento as dinâmicas foram realizadas em todas as terapias freqüentadas pelo estudo. Esse recurso é utilizado pelos terapeutas com vários objetivos, entre os quais foram citados: 1. promover a atenção dos participantes, para que eles façam uma melhor escuta em relação às experiências trocadas durante as rodas; 2. Para promover uma melhor forma de expressão entre os participantes; 3. Para proporcionar uma melhor integração e aquecimento grupal. Segundo Barreto (2005) o co-terapeuta deverá propor uma dinâmica interativa. É sempre aconselhável finalizar o acolhimento propondo uma atividade recreativa com música, gestos, movimentos que possibilitem as pessoas se falarem, se abraçarem, sendo importante incluir e adaptar elementos da cultura local. Segundo o mesmo autor esta atividade é para deixar o grupo bem à vontade, descontraído. As músicas foram utilizadas todos dos encontros na referida fase, e incluem aquelas já existentes no CD da terapia, ou qualquer outra música regional ou nacional, e também as religiosas (cristãs). Evidenciou-se que em algumas terapias esse recurso é escolhido de acordo com a época do ano, a exemplo do Natal onde são utilizadas as músicas de reflexão, São João onde se utiliza músicas juninas etc. Segundo Leite, et al (2008) A música é uma ferramenta na TC, podendo ter algumas funções: Acolher o grupo, aquecimento (colocar em situação de fala), acolher a dor, celebrar a alegria, catalisar as falas do grupo, estimular a capacidade de resiliência, resignificação, propiciar a sensação de pertencimento e inclusão (no grupo ou sociedade). As principais músicas utilizadas nessa fase foram: Seja bem vindo ô lê, lê , vem dançar vem, vou lançar, Eu agora vou, A alegria, Que bom encontrar você, Eu preciso de você etc. “Seja bem-vindo, ô lê lê Seja bem-vinda ola lá / Paz e bem pra você Que veio participar” Tais músicas têm o objetivo de promover a integração do grupo, dá as boas vindas, e acolher aos participantes, nesse sentido, as músicas eram apropriadas para fase de acolhimento. Ao mesmo tempo a música serve nesta fase como instrumento para desinibi-los, através do cantar e do dançar , onde todas as pessoas participam, deixando o ambiente mais descontraído e alegre. Outros recursos utilizados foram os jogos populares folclóricos, jogos educativos e orações que foram citados como recursos utilizados por dois terapeutas entrevistados, porém não foram presenciados. Para Monteiro (1994) citado por Arvati et al (2008) a essência dos Jogos reside na capacidade de estimular a espontaneidade. No momento do jogo surge o sentido de liberdade a qual permite ao homem viajar pelo mundo da imaginação e, através dele, recriar, descobrir novas formas de atuação. Nas atividades de jogo se luta se representa, se imagina, liberta-se das armaduras sociais e se sensibiliza a autora ainda ressalta que o jogo é desprovido de censura ou crítica, oferece, ao mesmo tempo, tensão e alegria. De acordo com um relato de experiência de Arvati et al (2008) sobre a inserção de jogos e brincadeiras na TC, estes facilitaram a comunicação grupal e a interação entre o sentir, o pensar e o agir, a dimensão lúdica possibilitou o relaxamento e o gripo criou um clima de respeito, liberdade e segurança e podem ser inseridos em qualquer etapa da TC. b) Fase de Escolha do Tema: Nessa fase foram evidenciados poucos recursos culturais, em duas das terapias freqüentadas utilizaram dinâmicas com desenhos, onde cada participante desenhava as situações da vida cotidiana que lhe estavam incomodando, e em uma das terapias foi citado a utilização de provérbios “ditados populares” para estimular as pessoas se expressarem, porém não foi presenciado. Segundo Leite, et al (2005) Os provérbios são representantes da cultura de um povo, das suas histórias, da sua memória, é o resultado de uma longa experiência de vida, representando a sabedoria de um povo. c) Fase de contextualização: Na referida fase evidenciamos que em quatro das rodas de TC freqüentadas nenhum recurso cultural foi utilizado, e a música foi utilizada nos outros quatro dos encontros visitados. As músicas são geralmente cantadas pelos participantes nessa fase, quando alguma pessoa se emociona, ou quando alguém lembra de uma música relacionada com o tema em questão. Nesse sentido a música tem variadas finalidades como, oferecer apoio e consolo nos momentos em que as pessoas se emocionam e choram, ou até trazer uma mudança no ângulo de visão daquela pessoa que está dando seu depoimento etc. Na visão de Leite et al (2008) a música associada à fala do individuo pode ajudar a organizar o mundo da fala e da auto-imagem de quem está falando do seu sofrimento. Já de acordo com Petrini (2008) Na TC, a “cura” ocorre pela palavra partilhada ou pela emoção vivida. Muitas vezes essa partilha é cantada, pois brota de um sentimento, ou tenta nomeá-lo, fato que nem sempre é possível, devido à impossibilidade da palavra em explicar tudo. Por sua vez, a Arte e a Música encontram formas de diálogo quando a palavra é incapaz de traduzir. As principais músicas utilizadas foram: Encosta tua cabecinha no meu ombro e chora “Encosta tua cabecinha no meu ombro e chora, E conta logo tuas magoas todas para mim, Quem chora no meu ombro eu juro que não vai embora Que não vai embora “Porque gosta de mim”... (Paulo Borges) Segura na mão de Deus: “ Segura na mão de Deus, segura na mão de Deus, pois ela, ela te sustentará não temas segue adiante E não olhes para trás Segura na mão de Deus e vai...” A Paródia foi utilizada em um dos encontros, sendo esse recurso sugerido pelos participantes de acordo com o tema em questão. A parodia citada foi de superação e criada pela participante em cima da música “Pra não dizer que não falei das flores”. (Geraldo Vandré) d) Fase de Problematização: Nessa fase em seis das TC visitadas não foi utilizado nenhum recurso cultural pelos terapeutas como forma de dinamizar o encontro. Em uma das rodas de TC houve sugestões de músicas pelos participantes, e em uma os terapeutas disseram utilizar provérbios, contos de superação e fábulas, porém não foram presenciados. e) Rituais de agregação: As músicas foram utilizadas em todas as rodas de TC visitadas na fase de agregação, dentre essas músicas as mais utilizadas são as religiosas e músicas do CD da TC. As orações foram realizadas em quatro das rodas visitadas. Músicas religiosas e orações são utilizadas para a abençoar a pessoa que teve seu tema escolhido assim como também todos os participantes da roda. Segundo Barreto (2005) é neste momento final da TC que a dimensão espiritual se manifesta de maneira significativa, onde muitos expressam seus valores, suas crenças, recorrem a Deus, seja em forma de orações ou cânticos. Assim o autor supracitado enfatiza que estes são valores espirituais e que reforçam a identidade de cada um. As Orações mais utilizadas foram: 0ração de são Francisco: “ Senhor,fazei-me instrumento de vossa paz; Onde houver ódio, que eu leve o amor; ... Ó Mestre, Fazei que eu procure mais, Consolar que ser consolado, Compreender que ser compreendido, Amar que ser amado, Pois é dando que se recebe, È perdoando que se é perdoado, E é morrendo que se vive, Para a vida eterna.” Oração da Serenidade: “Concedei-me, Senhor, a serenidade necessária para aceitar as coisas que não posso modificar, coragem para modificar aquelas que posso e sabedoria para distinguir umas das outras". Pai Nosso: “Pai Nosso que estas no Céu Santificado seja o vosso nome Venha a nós o vosso reino Seja feita a vossa vontade Assim na terra como no céu ....” Além de todos esses recursos culturais utilizados na TC, são ainda utilizadas outras estratégias para dinamizá-la como alongamento, exercício para relaxamento, Histórias, realização de terapias temáticas, composição de paródias e realização das rodas de TC na própria comunidade quando o número de participantes diminuem nos encontros, tais recursos foram citados pelos terapeutas entrevistados. Outro importante dado de grande relevância para o estudo refere-se ao fato de que todos os terapeutas comunitários entrevistados acreditam na importância de se conhecer a cultura da comunidade onde são desenvolvidas as sessões de TC, para melhor realizar as fases de contextualização, a construção da palavra-chave e a problematização. Segundo Santos (2008) em seus estudos sobre a Antropologia cultural na TC analisa que é clara a necessidade de o terapeuta comunitário conhecer a cultura da comunidade onde desenvolve as sessões de TC, pois possibilita ao terapeuta comunitário obter as ferramentas possíveis de permitir e colocar em prática as sessões, fazendo uma terapia contextualizada e significativa para todos os participantes. CONSIDERAÇÕES FINAIS Com esse estudo evidenciou-se que os principais recursos culturais como músicas e dinâmicas relatados na literatura estão sendo praticados nas rodas de terapia visitadas, porém observou-se que os recursos são utilizados em menor proporção nas fases de escolha do tema e problematização, sendo que outros recursos como jogos, danças, participação de violeiros, sanfoneiros, catequistas, utilização de histórias, contos, fábulas, brincadeiras que relatados na literatura são pouco ou não utilizados, e estes devem ser mais valorizados pelos terapeutas, para que a terapia torne-se mais contextualizada e adequada às raízes culturais de cada grupo, garantindo assim o sucesso da mesma. As músicas eram cantadas em momentos oportunos e contribuíram para a dinamização dos encontros, seja no acolhimento ou em um momento de grande emoção com o objetivo de consolo. As dinâmicas utilizadas também contribuíram para o sucesso das rodas de TC, pois estimulavam as pessoas a falarem, e se expressarem melhor diante das outras, possibilitando um melhor relação inter-grupal. Com esse estudo pode-se compreender a importância da cultura e dos recursos culturais como elemento indispensável para adquirirmos nossa identidade pessoal e social, o fortalecimento desta nos proporciona o resgate com nossas raízes e nos trás sentimentos de pertencimento a determinado povo. A inserção dos recursos culturais na TC só vem a contribuir para a consolidação e sucesso da mesma, no sentido de resgatar e fortalecer nossos valores, saberes, competências individuais e comunitárias, e nossa identidade pessoal e social. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ARVATI, F.Z; CURZIO, E.A.C.R.Di. Jogos e Brincadeiras na TC. Instrumentos para manutenção do aquecimento do grupo. Relato de experiência. Terapia Comunitária Tecendo Redes para a transformação social, saúde, educações e políticas públicas. Casa do Psicólogo 2008. BARRETO, A.P. Terapia comunitária: passo a passo. Fortaleza: Gráfica LCR, 2005 FERREIRA, Aurélio B. H. Minidicionário Aurélio da língua Portuguesa. 3ªedição. Nova Fronteira, Rio de Janeiro, 1993. FERREIRA FILHA. M.O. A terapia comunitária no contexto do SUS. Projeto de Iniciação Científica-PIBIC –UFPB, 2008. GRANDESSO, M. A. Terapia comunitária: Uma prática pós moderna críticaConsiderações teórico-epistemológicas. Terapia Comunitária Tecendo Redes para a transformação social, saúde, educações e políticas públicas. Casa do Psicólogo 2008. SANTOS, A.N.N.D. Antropologia Cultural: base epistemológica da Terapia Comunitária. Terapia Comunitária Tecendo Redes para a transformação social, saúde, educações e políticas públicas. Casa do Psicólogo 2008. GEERTZ, C. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1989. LEITE, M.S.V. et al. Algumas reflexões sobre a inserção de música nos encontros de TC no Centro de Assistência a Família (CEAF). Terapia Comunitária Tecendo Redes para a transformação social, saúde, educações e políticas públicas. Casa do Psicólogo 2008. O CONCEITO de saúde e do processo saúde e doença.Distritos sanitários: concepção e organização. Disponível em: < 0%2520Doen%25C3%25A7a.pdf+conceito+de+sa%C3%BAde+SUS+fatores+culturais&hl=ptBR&gl=BR> Acesso em: 10 ago. 2009 OLIVEIRA, Doralice. A Terapia Comunitária como política publica. 17 nov. 2008. Disponível em: < _content&view=article&id=165:a-terapia-comunitaria-como-politicapublica&catid=26:saude&Itemid=2> Acesso em: 11 ago. 2009. PETRINI, H.F. Cantar e Brincar para transformar- Canta que o bem espalha! Terapia Comunitária Tecendo Redes para a transformação social, saúde, educações e políticas públicas. Casa do Psicólogo 2008. SILVA; M. S. S. A vivência da TC inserida na unidade de saúde da família mangabeira IVAmbulantes. Disponível em: < http://74.125.113.132/search?q=cache:YZ2THiva_CgJ:www.epidemioufpel.org.br/proesf/cadglas/ne_glas2/experiencias%2520municipais/joao%2520pessoa%2520%2520terapia%2520comunitaria.ppt+terapia+comunitaria&hl=pt-BR&ct=clnk&cd=5&gl=br> Acesso em: 02.nov. 2008