Os benefícios do câmbio desvalorizado para o saldo da Balança Comercial O superávit na balança comercial brasileira deveu-se mais à diminuição de importações do que ao aumento das exportações No decorrer do primeiro mandato do governo Fernando Henrique Cardoso, houve uma deterioração do saldo da balança comercial devido ao regime de política de bandas cambiais, iniciado em março de 1995. Com o real sobrevalorizado, ficou mais barato para o Brasil importar produtos no mercado internacional. Esse aumento das importações fez com que o setor produtivo se tornasse mais competitivo devido às aquisições de bens de capitais e tecnologia de ponta, aumentando a vantagem competitiva de tais setores. Para completar o impacto negativo no saldo comercial, as exportações apresentaram resultados de crescimento aquém do aumento das importações, pois os produtos brasileiros se tornaram mais caros no mercado externo com a moeda brasileira sobrevalorizada. Para a manutenção do controle de bandas cambiais, o Banco Central do Brasil despendeu enormes somas de suas reservas internacionais, mas esta discussão foge ao escopo deste artigo. Ambiente Econômico Marcelo de Ávila É necessário atentar para a evolução da taxa de câmbio para melhor analisar os movimentos de exportações e importações do Brasil com o mundo e entender o movimento da balança comercial (gráfico 1). A taxa de câmbio foi controlada e mantida sobrevalorizada até janeiro de 1999, quando ocorreu a primeira maxidesvalorização do real. Com a manutenção do controle do câmbio, o déficit da balança comercial elevou-se para US$ 8,6 bilhões (janeiro de 1998), sendo o maior déficit do saldo comercial do governo FHC. O início do processo de ajuste do saldo da balança comercial se intensificou com o abandono do sistema de 8 r e v i s t a F A E B U S I N E S S , n . 5, abr. 2 0 03 bandas cambiais em janeiro de 1999. Porém, um ano antes da maxidesvalorização do real o nível de importações já mostrava queda relativamente maior do que a queda do nível de exportações (gráfico 2). A reversão do quadro de sucessivos déficits na balança comercial ocorre a partir de outubro de 2001. Desse período em diante inicia-se o ajuste das contas externas. Tal ajuste é o resultado positivo da moeda desvalorizada. No entanto, a desvalorização do real fez com que a economia nacional sentisse pressão inflacionária, pois muitos produtos, como as commodities, são apreçados no mercado internacional, sofrendo, conseqüentemente, a pressão do câmbio desvalorizado. ... 9 r e v i s t a F A E B U S I N E S S , n. 5, abr. 200 3 A diminuição do déficit em conta corrente é importante para que o Brasil reduza a dependência de capital externo, ficando menos vulnerável a crises internacionais como as da Ásia e da Rússia Ambiente Econômico O processo de desvalorização do real, reiniciado em 2001 e prolongado em 2002, fez com que o quadro no saldo da balança comercial mudasse, sendo possível apreciar um superávit no saldo comercial na magnitude de US$ 13,131 bilhões para o ano de 2002, provenientes de US$ 60,361 bilhões em exportações e US$ 47,230 bilhões em importações. Tal superávit no saldo comercial representou um aumento de 396% em relação ao resultado do ano de 2001. A média diária de exportações em 2002 foi de US$ 240 milhões, enquanto a de importações chegou a US$ 187 milhões. O superávit de 2002 é o maior desde outubro de 1994, quando o acumulado em 12 meses foi de US$ 13,671 bilhões. A melhora na trajetória do saldo da balança comercial, iniciada a partir de janeiro de 1998, levou à redução posterior do déficit de transações em conta corrente do governo (gráfico 3). Movimento esse que é notado a partir de outubro de 1998. A diminuição do déficit em conta corrente é 10 r e v i s t a F A E B U S I N E S S , n . 5, abr. 2 0 03 extremamente importante para que o Brasil reduza sua dependência de capital externo, ficando menos vulnerável a problemas de economias internacionais, como os que aconteceram na Ásia e na Rússia. Com a alteração do regime cambial controlado para flutuante, em janeiro de 1999, observa-se claramente a mudança na tendência das importações (tabela 1). A categoria de bens de consumo duráveis apresentou um aumento médio anual entre 1995 e 1998 de 18,26%. Mas no segundo mandato de FHC, tal variação anual passou a decrescer e chegou a -14,39%. Para a categoria de bens de consumo não-duráveis, houve crescimento médio de 24,19% no primeiro mandato e redução de -11,05% no segundo. Outras duas categorias que seguiram a tendência da maioria foram as matériasprimas e produtos intermediários (aumento de 19,85% no primeiro e redução de -2,49% no segundo) e os bens de capital, que cresceram 26,15% para depois cair -7,07%. Todas as categorias seguem essa tendência, com exceção de combustíveis e lubrificantes, que continuaram a crescer ainda mais no segundo mandato (de 2,48% no primeiro para 12,94% no segundo). Esse aumento pode ser explicado pela necessidade de tais produtos, que estão muito presentes no dia-a-dia não só dos consumidores como também do setor produtivo (na categoria insumo de transportes para intermediação do comércio, entre outras). Tal “necessidade” da categoria na vida dos brasileiros tende à menor elasticidade de preço desses produtos. Assim, aumentos de preços iriam surtir relativamente menor impacto na quantidade demandada. Nas exportações, a categoria de produtos básicos apresentou um pequeno aumento entre as médias do primeiro e segundo mandatos: 5,37% e 7,49%, respectivamente. Para a categoria de produtos semimanufaturados, nota-se uma desaceleração no crescimento, passando de 4,89% no primeiro mandato para 2,63% no segundo, mas tal movimento continua a ser positivo. A categoria de produtos manufaturados também reduziu suas exportações de 4,19% para 2,37%, na comparação dos dois mandatos de FHC. Mas é importante observar que manteve um número positivo de crescimento, não mudando, assim, de tendência (tabela 2). ... 11 r e v i s t a F A E B U S I N E S S , n. 5, abr. 200 3 A falta de oxigênio para um aumento de exportações se mostra na escassez de crédito e no custo do financiamento. As altas taxas de juros também são barreiras para investimentos no setor produtivo, causando impacto direto nas exportações A surpresa aparece em operações especiais, cujo crescimento foi de mais de dez vezes, passando de 2,50% no primeiro mandato para nada menos que 25,94% no segundo. Essa categoria inclui produtos exportados que são consumidos antes de chegar a outros países. Um exemplo disso é o refrigerante servido a bordo de um avião ou produtos consumidos numa viagem de navio para fora do Brasil. pela diminuição das importações do que pelo aumento das exportações. Com o dólar em torno de R$ 3,40, é possível projetar um saldo da balança comercial para o ano de 2003 de US$ 17,1 bilhões e para 2004, com câmbio por volta dos R$ 3,50, de US$ 17,4 bilhões. É importante perceber que a falta de oxigênio para um aumento de exportações se mostra na escassez de crédito e no custo do financiamento. As altas taxas de juros também são barreiras para o incentivo de investimentos no setor produtivo, causando impactos diretos nas exportações. Assim, faz-se premente a diminuição das taxas de juros estabelecidas pelo Banco Central, pois, com taxas menores, será mais fácil conseguir crédito para poder aumentar o potencial exportador.ν Mais crédito, menos juros Ambiente Econômico Com a desvalorização do real ocorrida durante os oito anos do governo FHC, o Brasil saiu de sucessivos déficits para superávit no saldo da balança comercial. Analisandose a evolução das exportações do Brasil e comparando-a com o resultado das importações, percebe-se, porém, que esse ajuste do saldo da balança comercial se deu mais 12 r e v i s t a F A E B U S I N E S S , n . 5, abr. 2 0 03 Marcelo de Ávila é economista-chefe da Global Invest e tem MBA nos Estados Unidos com concentração dupla em Finanças e Gerenciamento de Sistemas de Informação. E-mail: [email protected]