Ap.es - Antonio Santos Carvalho

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PN1 6897.03-5; Ap.: Tc. Porto, 9ª Vº, 2ª Sec ();
Ap.es:
Ap.a4: Câmara Municipal do Porto
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Em Conferência no Tribunal da Relação do Porto
I. Introdução:
(a) Os Ap .es não se conformam com o montante da indemnização que lhes foi
arbitrada, reclamando o valor de € 177 259,00 para o prédio ex propriado: urbano,
sito na Rua Monte de Judeus, 74, Porto.
(b) Da sentença recorrida:
(1) no caso dos autos, a DEUP foi publicada no DR 138/94, IS-B, 94.06.17,
pelo que é aplicável à expropriação em causa o DL 438/91, 09.11;
1 Vistos: Des.
2 Adv: Dr. J.
3 Advª: Drª
4 Adv. Dr.
1
(2) sendo inquestionável a natureza urbana do prédio expropriado e, assim, a
sua classificação de solo apto para a construção, art. 24/1a.2, tem de ser tido
presente o teor do art. 25, disposição legal que determina justamente o valor do
solo apto para construção calculado através do vector do preço do edifício nele
existente ou, quando for caso disso, do valor provável da construção que nele
seja possível levantar de acordo com as leis e r egulamentos em vigor, e sob um
aproveitamento economicamente normal, à data da DEUP, tida em conta a
localização e a qualidade ambiental;
(3) no seguimento da corrente jurisprudencial que prescreve o apuramento
do quantum indemnizatório com base nos valores adiantados no laudos dos
peritos escolhidos pelo tribunal5, acaso haja disparidade entre uns e outros, não
só pelas gar antia de imparcialidade que dão,
como pela experiência e
competência neles reconhecida pelo julgador, havendo aqui laudo uniforme de
4 peritos, incluindo aqueles mesmos, e um laudo isolado do perito indicado por
uma das partes, tem-se como correcto o valor pelo qual se entendeu, no
relatório em questão, avaliar o prédio expropriado, qual seja € 177 259,00;
(4) todavia, e como ficou patente na vistoria aprm, à data da DEUP, o
edifício existente no prédio era ocupado por cinco famílias independentes, que
não pagavam qualquer renda aos senhorios, com excepção de um inquilino:
Pte. 100$00/mês;
(5) ora, estes factos foram totalmente ignorados pelo laudo maioritário em
referência: por via disso, não ponderou o eventual alcance da ocupação no
determinar do justo valor do prédio expropriado;
(6) e enquanto o perito indicado pela expropriante fez repercutir o
arrendamento no valor a achar, diminuindo-o, os peritos do laudo maioritário,
ignoram-no como se disse;
(7) contudo a ocupação clandestina do prédio a expropriar constitui um facto
negativo: impõe-se ponderá-lo para determinação do preço de mercado; assim,
deduzir no valor
encontrado o montante razoável necessário ao r ealojamento
dos habitantes6;
5 Citou em abono Ac RP, 76.10.13, CJ, I, p. 644; Ac RE, 78.10.06, CJ, II, p. 1428; Ac RC, 91.05.21, CJ,
III, p. 74; Ac RP, 99.04.15, CJ, II, p. 102.
6 Citou neste sentido Ac RL, 01.0 1.23, CJ, Ano XXVI, I, p p. 9 4ss.
2
(8) no caso vertente estimou o perito da expropriante que os custos com esse
realojamento importariam, à data da DEUP, em € 25 000,00 por cada uma das
4 famílias que ocupavam o prédio: este montante afigura-se ajustado, nada
havendo nos autos que inculque ter sido obtido com base em critérios
abstractos; será aceite;
(9) como assim, ao valor inicialmente encontrado de € 177 259,00, será
deduzido o custo com o realojamento das aludidas famílias de € 100 000,00: é
devida aos expropriados a indemnização de € 77 259,00, montante actualizado
anualmente desde 94.06.17, DEUP, até ao mês do trânsito em julgado, de
acordo com a evolução do índice de preços n o consumidor, (INE - com
exclusão da habitação) relativamente ao local da situação do bem.
II. Matéria assente:
(1) O prédio objecto da presente expropriação é o prédio urbano sito na Rua Monte de
Judeus, 74, Porto, desc. C.Reg.P. competente sob o nº 2734, insc. mat. p. urb.
Mira Gaia, sob o art. 743, inserido na área crítica de recup eração e conversão do
centro histórico do Porto.
(2) A CMP, com vista à reno vação do centro histórico da Cidade, deliberou, 98.12.09,
aprovar o processo de expropriação litigiosa do referido prédio, ex propriação essa
cuja DEUP fora publicada no DR 138/94 IS-B, 94.06.17, através do DR 14/94,
17.06, que a aprovou.
(3) O referido prédio, de acordo com a vistoria aprm, tinha a área total de 613m2,
coberta em parte por um edifício de 3 pisos de 110m2 e um piso elevado com
15m2; na parte restante do terreno existiam muitas barracas construídas com
material recuperado em muito mau estado de conservação.
(4) A parcela er a essencialmente construída pelo prédio de habitação implantado na
parte em que a mesma era delimitada pela Rua do Monte dos Judeus e por uma
área de cota bastante sup erior, aproveitada na implantação das referidas barracas,
mas que denunciava a existência de terreno com boa estrutura agrológica: antes de
ocupado destinou-se a jardim ou a quintal de apoio ao prédio.
(5) A Rua do Monte dos Judeus, limite parcial da parcela pelo lado Sul, e para onde o
prédio dispõe de uma frente de 6m, tem uma largura inconstante: junto da parcela
é de 6m.
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(6) Esta rua está pavimentada a granito e dispõe de redes de abastecimento de água,
drenagem de esgotos e águas pluviais, abastecimento de energia eléctrica.
(7) O edifício era uma construção com paredes exteriores em alvenaria de granito
rebocado; a fachad a principal foi rev estida a azulejos decorativos; as paredes
interiores de tabique de madeira, rebocad as; as ligações verticais eram feitas por
lanços de escadas em granito, quando exteriores, e em madeira, quando interiores:
todo este conjunto estava em estado de pré-ruína; a cobertura constituída por
telhado a duas águas já entrara em derrocada, não tendo telhado uma parte do
edifício.
(8) No logradouro existiam elementos decorativos em granito, nomeadamente uma
fonte, uma taça e uma concha.
(9) O pátio do prédio era lajeado a pedra de granito.
(10) O edifício era ocupado por cinco famílias independentes que não pagavam
qualquer renda aos senhorios, com excep ção de um inquilino que pagava Pte
100$00 mensais.
(11) Este conjunto de famílias ocuparam o prédio a alguns anos (reportando -nos à
data da vistoria aprm) já depois de o mesmo ter sido desocupado por outras
famílias que a CMP realojara.
III. Cls./Alegações:
(a) A expropriação do prédio em causa dá aos recor rentes e expropriados o
direito de receberem o pagamento contemporâneo de uma justa indemnização,
arts. 1, 22/1.2, DL 438/91, 09.11 e art. 62/2 CRP;
(b) Porém, a decisão recorrida decidiu e fixou aos expropriados apenas uma
indemnização de € 77 259,00, não obstante os peritos nomeados pelo tribunal,
numa avaliação objectiva, terem atribuído ao prédio, por unanimidade, o valor de
€ 177 259,00, quantia aceite e reconhecida, até, pela julgadora;
(c) Na decisão recorrida foi-lhe subtraída e retir ada a parcela de € 100
000,00, a pretexto de pretensas despesas in dicadas apenas pelo perito da
expropriante, as quais tinham importado quanto ao realojamento de 4 inquilinos
habitacionais do edifício;
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(d) Mas a verdade é que essas pretensas despesas não estão provadas, nem
tão pouco foram às alegações da recorrida expropriante;
(e) Por outro lado, as indemnizações devidas aos arrendatários, tal como as
despesas com o seu realojamento são consideradas encargos inteiramente
autónomos;
(f) Além disso, essas despesas que a ex propriante porventura tenha tido com
o realojamento de quem sem pagar renda ocupava o prédio expropriado não
podem nem devem ser deduzidas ao justo valor expropriativo;
(g) Não obstante, a sentença recorrida decidiu que deviam ser os
expropriados a suportar as despesas de realojamento da população clandestina;
(h) Ora, a lei não contempla, nem reconhece o direito a qualquer
indemnização ou ao seu realojamento, aqueles que clandestinamente e de forma
abusiva ocupem um prédio, quer este se encontre ou não arrendado;
(i) Portanto, deveria ter sido atribuído aos recorrentes expropriados a
indemnização correspondente ao justo valor do prédio, objectivamente calculado e
determinado pelos peritos judiciais, ou seja, a importância de € 177 259,00;
(j) Na decisão em recurso há, pois, manifesta violação do preceituado no
arts. 1 e 22, DL 438/91, 0911, art. 67/1 RAU, e ainda, art. 62/2 CRP.
IV. Contra-alegações:
(a) O julgador fixa o montante indemnizatório segundo o seu prudente
critério, não estando vinculado aos valores apurados pelos peritos maioritários;
(b) E não ofer ece grandes dú vidas que o valor real e corrente de um bem, ou
seja, o seu justo v alor de mercado, deve ter em conta as cir cunstâncias e condições
de facto existentes à data da publicação da DEUP;
(c) Ora, estando o p rédio expropriado, naquela data, ocupado
clandestinamente por 4 famílias, e por circunstâncias apenas imputáveis aos
respectivos proprietários, qualquer comprador razoável do imóvel imputaria um
valor negativo à situação, no processo de formular o preço da aquisição;
(d) O julgador entendeu assim, e bem, que a quantia de € 100 000,00 se
ajustava ao factor de diminuição do preço do prédio e que naturalmente a entidade
expropriante não tem que cobrir;
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(e) Deve ser negado provimento ao recurso, mantida a sentença de 1ª
instância.
V. Recurso: pronto para julgamento.
VI. Sequência:
(a) Não está em causa, como já vimos, o montante em geral d a avaliação do
prédio: os recorrentes aceitam o veredicto da maioria dos peritos, que o tribunal
diz ex pressamente dever ser seguido, em princípio.
(b) Conquanto não nos convençam as razões de uma automaticidade na
crença da melhor isenção e competência dos peritos nomeados pelo tribunal (o
que verdadeiramente vale não são as pessoas, por mais competentes que sejam,
mas os argumentos em que baseiam as conclusões que exprimem), também é
certo que neste caso a linha de demonstração d a estimativa do valor do prédio,
apresentada pelos peritos maioritários, para além de ser clara, afirma-se prudente e
sábia, sem dúvida.
(c) Mas a sentença recorrida trouxe à colação o tema da desvalorização no
mercado de um prédio ocupado clandestina e gratuitamente: nestas circunstâncias
nenhum comprador avisado deix aria de considerar um abatimento incontornável.
(d) Sem pôr de parte a valia desta abordagem, também é certo ter ficado
provado que o prédio, em si mesmo, estava já fora do mercado, posto tratar-se de
ruína; assim, a determinação do valor foi assegurada, na esteira do que a lei
determina para o caso, através do cálculo do potencial edificativo, cujo adere no
entanto aos parâmetros do edifício antigo, pois se trata de zona histórica em
restauro.
(e) E nestas circunstâncias, na verdade, a ocupação do prédio não tem
qualquer influência na determinação do justo valor constitucional expropriativo:
trata-se de circunstância que não influi no mercado, de oferta e procuras rígidas e
que naturalmente pressupõem uma firme actuação dos poderes públicos na
exacção de um motivo em si próprio perturbador de um olhar, digamos assim,
museológico sobre o núcleo de interesse histórico da cidade.
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(f) Têm portanto razão os recorrentes, e na linha de demonstração
constitucional tão bem trazida ao debate na parte inicial da fundamentação de
direito da sentença recorrida7.
(g) Por conseguinte, vistos os arts. 1 e 22, DL 438/91, 0911 e 62/2 CRP,
decidem alterar a sentença recorrida, fixando a indemnização em favor dos
expropriados no montante de € 177 259,00 actualizado anualmente desde
94.06.17, DEUP, até ao mês do trânsito em julgado, de acordo com a evolução do
índice de preços no consumidor (INE - com exclusão da habitação) relativamente
à cidade do Porto.
VII. Custas: sem custas por não serem devidas.
7 Sentença recorrida:
......................
Assim, sendo certo o reconhecimento da função social da propriedade, que pode originar uma cedência
dos direitos privatísticos do proprietário perante superiores interesses de ordem pública, o ressarcimento
justo dos danos derivados da expropriação constituem um pressuposto fundamental para a legitimidade
do acto de declaração da utilidade pública, que deve ser respeitado pelo legislador ordinário e servir de
orientaçã o pa ra quem exerce poder de decid ir; [mas] atendendo à especificidade da matéria, o conceito
de justa indemnização não vem expresso no texto constitucional:...não passa de uma expressão particula r
do princípio geral, ínsito no princíp io do Estado de d ireito democrático, de indemnização pelos acto s
lesivos do direito de outrém...,[então] os critérios definidos por lei têm de resp eitar os princípios
materiais da constitucionalidade (igualdade, proporcionalidade), não podendo conduzir a indemnizações
irrisórias ou manifestamente despropo rcionadas à perda do bem expropriado.
......................
...[a indemnização] deve representar uma reconstituição, em termos de valor, do q ue o expropriado
detinha...para que seja plenamente recompensado o sacrifício especia l a ele infligid o, de tal modo que a
perda patrimonial imposta seja equitativamen te repartida entre os cidadãos (cfr...Ac TC 39/8 8, 09.02; Ac
TC 210/93, 16.03).
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