Mecânica Cinemática das Rotações Mecânica » Cinemática das Rotações 1 Introdução O movimento de rotação é bastante comum no nosso planeta, mas também ocorre quando consideramos as várias partes do Universo. As galáxias, por exemplo, exibem tal movimento, uma vez que se suas partes não o fizessem, cairiam sobre o centro da galáxia. As estrelas também, assim como outros corpos celestes. A Terra está em rotação em torno de um eixo imaginário no espaço. A consequência disso é uma sucessão de dias intercalados com noites. Todos os objetos podem exibir um movimento de rotação. O pião é aquele que utilizamos como protótipo no estudo desse movimento que, no entanto, pode ser bem mais complexo do que a simples rotação em torno de um eixo. Nesse caso, o eixo de rotação pode executar um movimento de precessão. A própria Terra exibe esse tipo de movimento, bem mais sutil, pois o tempo que o pião-Terra leva para dar uma volta completa é de 26.000 anos. Trata-se da precessão dos equinócios. Ou seja, o eixo em torno do qual a Terra gira está em movimento de rotação. Figura 1 Figura 2: Movimento de precessão da Terra. Mecânica » Cinemática das Rotações 2 As portas das casas são fixadas aos batentes utilizando-se duas ou três dobradiças, cujo efeito é permitir o movimento de rotação da porta em torno do batente. Para fazermos uma porta girar, devemos aplicar uma força sobre ela. Certamente, você já notou que é mais fácil abrir a porta empurrando-a a partir de pontos cada vez mais distantes das dobradiças. Nos próximos capítulos, estudaremos a dinâmica do movimento de rotação. Nesse capítulo, abordaremos a cinemática das rotações. Qualquer rotação pode ser caracterizada por até três ângulos. Assim, as variáveis relevantes no movimento de rotação são variáveis angulares. Outro problema relevante nesse tipo de movimento é determinar a velocidade angular (que é comum a todos os pontos). Esses são os dois temas centrais desse capítulo. O que caracteriza o movimento, em geral, é a variação do vetor de posição de um ponto arbi trário do corpo. Dizemos que houve movimento de rotação pura se o vetor de posição r mudou, depois de um intervalo de tempo, desse valor para outro, ainda vetor de posição r , isto é: r → r '. Figura 3: Exemplo trivial e corriqueiro de rotação em torno de um eixo. ( 1 ) E de tal forma que o módulo do vetor não se altere: r = r' . ( 2 ) Rotações Definimos uma transformação de um objeto como sendo uma rotação pura se a transformação for da forma x′ R11 y′ = R21 z′ R 31 R12 R22 R32 R13 x R23 y R33 z Uma rotação pura elimina cisalhamentos, mudanças de escala e translações. ( 3 ) Figura 4 Mecânica » Cinemática das Rotações 3 Com o intuito de buscar maior concisão, introduziremos a notação matricial. Definimos, primeiramente, as seguintes matrizes coluna e linha: x r ≡ y z e r ≡ ( x, y , z ) ( 4 ) A matriz transposta RT de uma matriz R é obtida a partir dela por meio de uma troca de linhas por colunas (observação de transposição). Dessa forma, escrevemos para os elementos de matriz (RT)ij da matriz transposta de uma matriz de R como sendo dados por: ( R ) = ( R) T ij ji ( 5 ) Nessa notação, e pela definição (000), observamos que r ≡ r T ( 6 ) Na notação matricial, uma rotação se escreve como: r′ ≡ R r ( 7 ) Em que R é a matriz denominada matriz de rotação. Por meio dessa matriz, podemos relacionar as coordenadas (x, y, z) e (x′, y′, z′). Analogamente, podemos escrever as relações inversas como: r ≡ R −1 r ′ ( 8 ) em que R−1 é a matriz de rotação inversa. Definimos uma rotação como uma transformação se ela mantém a distância de dois pontos iguais, depois da transformação, e se preserva ângulos. A exigência de que os tamanhos preservados numa rotação é equivalente à condição: r r = r′ r′ ( 9 ) Mecânica » Cinemática das Rotações 4 Ou seja, ( x) 2 + ( y ) 2 + ( z ) 2 = ( x′) 2 + ( y′) 2 + ( z ′) 2 ( r 2 2 = r′ ) ( 10 ) Nesse caso, r representa a distância do ponto até a origem. Enquanto que a condição para que o ângulo entre dois segmentos de reta unindo os pontos até a origem do sistema de coordenadas seja conservado em uma transformação é equivalente a r1 r2 = r1′ r2′ ( 11 ) Essa última condição equivale à preservação de ângulos, uma vez que podemos escrevê-la sob a forma: r1 r2 cos θ = r1′ r1′ cos θ′ ( 12 ) Tendo em vista a propriedade de se manter os tamanhos, a propriedade (000) é equivalente a preservar os ângulos (θ = θ′) Portanto, na linguagem matricial, escrevemos que uma rotação preserva comprimentos e ângulos se as seguintes propriedades forem satisfeitas: r r = r ′ r ′ ≡ r RT R r r1 r2 = r1′ r2′ ≡ r1 RT R r2 ( 13 ) As duas propriedades ficam asseguradas se a matriz de rotação for tal que RtR = 1 ( 14 ) em que Rt é a matriz transposta de R. Infere-se que uma matriz de rotação é tal que Rt =R−1 Uma matriz com essa propriedade é conhecida como matriz ortogonal. ( 15 ) Mecânica » Cinemática das Rotações 5 Matrizes ortogonais têm o determinante restrito à condição: det R t R = det 1 → ( det R ) = 1 2 ( 16 ) Assim, matrizes ortogonais só podem ter determinantes iguais a +1 ou −1. Consideramos rotações como aquelas para as quais detR = +1 ( 17 ) Assim, rotações são definidas como aquelas transformações da forma (000 para as quais a matriz R satisfaz as propriedades (000) e (000). A matriz mais geral de rotação pode ser parametrizada em termos de três ângulos, denominados ângulos de Euler. Escrevemos assim que a matriz de rotação mais geral possível é função de três variáveis (ψ, θ, φ), que são as variáveis dinâmicas das rotações: R =R(ψ, θ, φ) ( 18 ) Rotação em Torno de um Eixo A variável dinâmica da rotação é o ângulo de rotação em torno de um eixo. A matriz de rotação em torno de um eixo, tomado aqui como sendo o eixo z, é dada por: cos θ senθ 0 Rz (θ) = −senθ cos θ 0 0 0 1 ( 19 ) Infere-se que as coordenadas em um e outro sistema de referência se relacionam de acordo com: r ′ = Rz (θ) r Ou, mais explicitamente: x cos θ senθ 0 x′ ′ y = −senθ cos θ 0 y z 0 0 1 z ′ ( 20 ) ( 21 ) Mecânica » Cinemática das Rotações 6 Em termos de componentes, temos: x′ = cos θx + senθy y′ = −senθx + cos θy z′ = z ( 22 ) Uma rotação de um ângulo α em torno do eixo y se escreve como: r ′ = Ry (α ) r ( 23 ) Enquanto que uma rotação por um ângulo β em torno do eixo x se escreve: r ′ = Rx (β) r ( 24 ) As matrizes Ry (α) e Rx (β) são dadas, respectivamente, por: cos α 0 − sin α Ry ( α ) = 0 1 0 sin α 0 cos α 0 0 1 Rx ( β ) = 0 cos β sin β 0 − sin β cos β Figura 6: Ilustração de movimentos de rotação em torno de um eixo. ( 25 ) Figura 5: Numa rotação pura em torno de um eixo, o módulo do vetor posição se mantém constante. Mecânica » Cinemática das Rotações 7 Rotações mais Gerais: Ângulos de Euler Pode-se mostrar que, para efetuarmos uma rotação de um objeto, a mais geral possível, bastam 3 ângulos (usualmente os ângulos de Euler). Para definirmos os ângulos de Euler, vamos transformar o problema como se estivéssemos fazendo a rotação de um sistema de coordenadas fixas no objeto. Figura 7 Consideremos dois eixos rotacionados da forma mais geral possível. O plano x - y cruza com o plano x' - y' ao longo de um eixo, conhecido como a linha nodal. Note-se que o plano x' y' perfura o plano x y, determinando um segmento de reta (linha nodal). Os ângulos φ e ψ são definidos como o ângulo entre os eixos e y e x com essa reta (linha nodal). Podemos fazer os três eixos coincidir, fazendo uma rotação em torno do eixo z do ângulo ψ, em seguida uma rotação do ângulo θ em torno da linha nodal, e finalmente uma rotação de um ângulo φ em torno do eixo z'. Seja ψ o ângulo formado pela linha nodal e o eixo x. O ângulo ψ é o primeiro ângulo de Euler. O segundo ângulo de Euler é o ângulo entre os eixos z e z', designado pela letra grega θ. O ângulo entre a linha nodal e o eixo x' é o terceiro ângulo de Euler, designado pela letra φ. Temos portanto que as coordenadas desse sistema se relacionam com as anteriores, da seguinte forma: x cos ψ senψ 0 x′′ x′′ cos ψ −senψ 0 x ′′ ′′ y = −senψ cos ψ 0 y ⇒ y = senψ cos ψ 0 y z 0 0 1 z ′′ z ′′ 0 0 1 z ( 26 ) Figura 8 Mecânica » Cinemática das Rotações 8 Na nossa notação anterior, temos que r ′′ = Rx (θ ) r ′′′ ⇒ r ′′′ = Rx (−θ ) r ′′ ( 27 ) Fazemos agora uma rotação em torno da linha nodal de um ângulo θ. A linha nodal é o eixo x''. Para uma rotação em torno desse eixo, temos r ′′ = Rx (θ) r ′′′ ⇒ r ′′′ = Rx (−θ) r ′′ Em que Rx(θ) é dado por: 0 0 1 Rx ( θ ) = 0 cos θ sin θ 0 − sin θ cos θ ( 28 ) ( 29 ) Consequentemente, podemos escrever: r = Rz (ψ ) r ′′ = Rz (ψ ) Rx (θ) r ′′′ ( 30 ) Finalmente, fazemos uma rotação em torno do eixo z' de um ângulo φ. r ′′′ = Rz (ϕ) r ′ ⇒ r ′ = Rz (−ϕ) r ′′ ( 31 ) r = Rz (ψ ) Rx (θ) Rz (ϕ) r ′ ( 32 ) Obtemos finalmente que Portanto, a matriz de rotação mais geral é dada pelo produto R ( ψ, θ, ϕ ) = Rz (ψ ) Rx (θ) Rz (ϕ) ( 33 ) Mecânica » Cinemática das Rotações 9 Lembrando que a transposta de um produto de matrizes é igual ao produto das matrizes transpostas, mas na ordem inversa, isto é: RT ( ψ, θ, ϕ ) = Rz T (ϕ) RxT (θ) Rz T (ψ ) = Rz (−ϕ) Rx (−θ) Rz (−ψ ) ( 34 ) Pode-se facilmente verificar que a matriz transposta é a matriz inversa na rotação: RT ( ψ, θ, ϕ ) R ( ψ, θ, ϕ ) = R −1 ( ψ, θ, ϕ ) R ( ψ, θ, ϕ ) = 1 ( 35 ) O Vetor Deslocamento Angular Figura 9 Consideremos agora o caso em que fazemos uma rotação infinitesimal. Ou seja, consideramos um valor diminuto do ângulo de rotação. Faremos assim o ângulo φ muito pequeno e o representaremos pelo símbolo δφ. Para valores infinitesimais do ângulo de rotação, valem as aproximações: cos δϕ ≅ 1 senδϕ ≅ δϕ. ( 36 ) Nas circunstâncias acima, podemos escrever a relação (000) da seguinte forma: x ' = x + yδϕ ( 37 ) y ' = y − xδϕ z ' = z. Portanto, o vetor deslocamento associado a esse ponto, ∆r = r − r , tem coordenadas: ( ∆r ) x = yδϕ ( ∆r ) y = − xδϕ ( ∆r ) z = 0. ( 38 ) O fato é que, como se pode ver facilmente, podemos escrever o vetor deslocamento sob a forma δΩ como sendo dado por: de um produto vetorial. Para tal, definimos o vetor δΩ = δϕk. ( 39 ) Mecânica » Cinemática das Rotações 10 Com a definição acima, o vetor deslocamento associado ao ponto P será dado por: δr = δΩ × r . ( 40 ) O versor k tem o sentido do eixo z, que é , nesse caso, o eixo de rotação. Observe-se que o vetor deslocamento angular é apenas uma generalização, para grandezas vetoriais, da relação entre espaço percorrido e deslocamento angular, no caso do movimento circular. Lembramos que nessas circunstâncias vale a relação: ds = dφR. ( 41 ) O vetor δΩ introduzido em (000) é denominado vetor deslocamento angular. Sua expressão foi deduzida para uma rotação em torno do eixo z no sentido anti-horário. Veremos que o vetor deslocamento angular mais geral possível, aquele efetuado em torno de eixos z1, z2 e z3, e associado a ângulos bem pequenos cujos valores são, respectivamente, dφ, dψ e dθ, é dado pela expressão: d Ω = d ϕk1 + d ψk2 + d θk3 ( 42 ) O vetor deslocamento, no caso de uma rotação geral, será dado pelo produto vetorial do vetor deslocamento angular pelo vetor de posição do ponto P: δr = δΩ × r = d ϕk1 + d ψk2 + d θk3 × r . ( Figura 10: Resultado de rotações em torno de eixos distintos. ) ( 43 ) Mecânica » Cinemática das Rotações 11 Dessa expressão, segue que é necessário dar uma definição de vetor deslocamento angular para um eixo arbitrário. O vetor deslocamento angular é definido (como todo vetor) a partir do seu módulo, direção e sentido. A direção do vetor deslocamento angular é dada pelo eixo de rotação. Já seu sentido é dado pela regra da mão direita. Com a mão direita, leve r para a nova posição r'. O polegar indica o sentido. O módulo é igual à variação do ângulo de rotação, no caso qualquer um dos valores dφ, dψ e dθ. O Vetor Velocidade Angular A partir do vetor deslocamento angular, podemos definir o vetor velocidade angular por meio do processo limite: ∆Ω ω = lim . ∆t →0 ∆t ( 44 ) Esse processo limite define uma taxa de variação instantânea, a qual se relaciona com as taxas de variação instantânea dos ângulos de rotação. Assim, o vetor velocidade angular é definido pelas expressões: dΩ dϕ dψ dθ ω≡ = k1 + k1 + k1 , dt dt dt dt Figura 11: Ângulos de Euler associados a três rotações sucessivas: a primeira em torno do eixo z; a segunda em trono da linha dos nós; e, finalmente, uma rotação em torno do novo eixo, denominado z'. ( 45 ) Mecânica » Cinemática das Rotações 2 12 em que os versores k 1, k e k 3 são associados aos eixos de rotação, de acordo com as regras apresentadas anteriormente. Levando-se em conta que a velocidade de um ponto é a taxa com que o vetor posição muda com o tempo, escrevemos: dr d Ω V= = × r. dt dt ( 46 ) Portanto, a relação entre a velocidade com que um ponto se desloca sobre um corpo quando ele está em movimento de rotação é: V = ω× r. ( 47 ) Essa velocidade está associada estritamente a uma rotação pura, isto é, estamos admitindo que o corpo não exiba o movimento de translação. Essa é a velocidade percorrida por alguém que observa a partícula ou corpo em rotação em torno do eixo. Novamente aqui notamos a semelhança com o movimento circular, no qual escrevemos: v = ωR. ( 48 ) Portanto, a definição (000) é uma generalização necessária, visando a estabelecer relações entre grandezas vetoriais. Rotação em Torno de um Eixo A análise das rotações pode ser simplificada por meio do uso de matrizes. Lembramos que, como foi discutido no capítulo 10, numa rotação de um ângulo θ em torno do eixo z, as coordenadas do novo ponto, (x', y', z') se relacionam com as coordenadas do ponto antes da rotação, (x, y, z), de acordo com a expressão: x′ cos θ senθ 0 x y′ = −senθ cos θ 0 y . z′ 0 0 1 z ( 49 ) Figura 12: Uso da regra da mão direita para especificar a direção e o sentido do vetor deslocamento angular. Mecânica » Cinemática das Rotações 13 Utilizando a notação do capítulo 10, a taxa com que o vetor de posição varia com o tempo é dada, em geral, por dois termos: d r' d r dR2 ( θ ) = r + Rz ( θ ) . dt dt dt ( 50 ) O primeiro termo do lado direito da equação envolve a taxa com que a matriz de rotação varia com o tempo. Veremos que ela está relacionada com o conceito de velocidade angular. Notemos, primeiramente, que uma variação infinitesimal da matriz de rotação se escreve como: −senθ cos θ 0 dRz ( θ ) = d θ − cos θ −senθ 0 0 0 1 ( 51 ) Infere-se daí que: −senθ cos θ 0 x 0 1 0 dRz ( θ ) r = d θ − cos θ −senθ 0 Rz ( −θ ) Rz ( θ ) y = d θ −1 0 0 r ' . 0 z 0 0 0 0 0 ( 52 ) É fácil verificar que: 0 1 0 dR ( θ ) ' dRz ( θ ) r = d θ −1 0 0 r = d θ z ( 53 ) r . d θ θ=0 0 0 0 Definindo o vetor d Ω, o vetor deslocamento angular, como o produto do ângulo infinitesimal pelo versor indicando a direção e o sentido da rotação: d Ω = d θk . ( 54 ) Concluímos, mediante uma conta muito simples, que: dRz ( θ ) r = d Ω × r ' . ( 55 ) Mecânica » Cinemática das Rotações 14 A velocidade de uma partícula localizada sobre o corpo rígido será, portanto, dada por: dΩ d r v ≡ = ×r . dt dt ( 56 ) Tendo em vista a definição do vetor velocidade angular de rotação em torno de um eixo como sendo dada por: dΩ dθ ω≡ = k. dt dt ( 57 ) Concluímos que: v ≡ ω× r , ( 58 ) ou seja, utilizando matrizes, deduzimos o resultado expresso pela equação (000). Consideremos agora o caso mais geral. Ângulos de Euler Consideremos dois sistemas de eixos cartesianos que difiram entre si apenas por conta de uma rotação, considerada aqui como sendo a mais geral possível. Tais eixos podem ser pensados como fixos a um corpo rígido que gira. Assim, em princípio, eles podem ser pensados como associados a posições diferentes do mesmo ao longo do tempo. Os eixos cartesianos serão denotados por (x, y, z) e (x', y', z'). Uma rotação mais geral possível pode ser parametrizada em termos de três ângulos, denominados ângulos de Euler. Para entendê-los, chamamos a atenção para o fato de que o plano x – y perfura o plano x' – y', determinando assim um segmento de reta. Denominamos linha nodal a tal segmento (vide Figura 13). É sempre possível fazer os três eixos (x, y, z) coincidir com os três eixos (x', y', z') por meio de três rotações: uma rotação em torno do eixo z de um ângulo φ até o eixo x coincidir com a linha nodal; em seguida uma rotação do ângulo θ em torno da linha nodal; e finalmente uma rotação de um ângulo ψ em torno do eixo z'. Todas as rotações serão consideradas com sinal positivo dos ângulos, desde que elas ocorram contra o ponteiro dos relógios. Seja φ o ângulo formado pela linha nodal e o eixo x. Este ângulo é o primeiro dos ângulos de Euler. O segundo ângulo de Euler é o entre os eixos z e z'. Ele será designado pela letra grega θ. Mecânica » Cinemática das Rotações 15 O ângulo entre os eixos z' e a linha nodal é o terceiro ângulo de Euler, designado pela letra ψ. Figura 13: Ilustração dos ângulos de Euler ressaltando a linha nodal. Realizando rotações apropriadas envolvendo esses ângulos, podemos fazer os dois sistemas de referência coincidir por meio de três rotações sucessivas. Cada rotação será caracterizada por um ângulo de Euler. A primeira será em torno do eixo z, rotação de um ângulo φ. Essa rotação faz com que o eixo x coincida com a linha nodal. Sendo a primeira rotação em torno do eixo z, de um ângulo φ, de forma que o eixo x coincida com a linha nodal, isto nos leva a um segundo referencial, aqui denotado por (x'', y'', z'') (vide Figura 14). As coordenadas desse referencial se relacionam com as coordenadas (x, y, z) da seguinte forma: x" cos ϕ senϕ 0 x " y = −senϕ cos ϕ 0 y . z" 0 0 1 z ( 59 ) Portanto, o versor perpendicular ao plano de rotação será perpendicular ao plano x – y, dado por: k = ∇ z. ( 60 ) Assim, nessa primeira rotação, somos levados a um segundo conjunto de eixos, os quais designamos por duas linhas. Na nossa notação anterior, temos que: r " = Rz ( ϕ ) r . ( 61 ) Figura 14: Ângulos de Euler associados à rotação de um corpo rígido. Mecânica » Cinemática das Rotações 16 Em seguida, fazemos uma rotação em torno da linha nodal de um ângulo φ, de tal sorte que os eixos z e z' coincidam. Isso é sempre possível, uma vez que ambos os eixos são perpendiculares à linha nodal, representada, nessa notação, pelo eixo x''. Para uma rotação em torno desse eixo, lembramos que o versor ortogonal ao plano de rotação será dado por: i " = ∇x " ( x , y , z ) . ( 62 ) De acordo com (000), esse versor é dado por: i " = cos ϕi − senϕj . ( 63 ) Essa segunda rotação posiciona o referencial cartesiano de tal forma que as novas coordenadas, representadas agora por (x''', y''', z''') se relacionam com as coordenadas anteriores (x'', y'', z''), de acordo com: r ''' = Rx ( θ ) r " , ( 64 ) A matriz de rotação Rx(θ) é dada por: 0 0 1 Rx ( θ ) = 0 cos θ senθ . 0 −senθ cos θ ( 65 ) Consequentemente, podemos escrever: r ′′′ = Rz (ϕ) Rx (θ) r . ( 66 ) As coordenadas se relacionam assim: 0 0 cos ϕ senϕ 0 x x′′′ 1 ′′′ y = 0 cos θ senθ −senϕ cos ϕ 0 y z ′′′ 0 −senθ cos θ 0 0 1 z ( 67 ) Mecânica » Cinemática das Rotações 17 Observe-se que o versor ortogonal ao plano de rotação será dado, nesse caso, por: k ′ = ∇z ′ ( x , y , z ) . ( 68 ) De (000) e (000), segue que o versor ortogonal ao plano de rotação em torno desse novo eixo será dado por: k ' = senθsenϕi + senθ cos ψ j + cos θk . ( 69 ) Finalmente, por meio de uma terceira rotação, fazemos com que a linha nodal se superponha ao eixo x'. Isso pode ser conseguido a partir de uma rotação em torno do eixo z' de um ângulo ψ. Temos assim que: r ' = Rz ( ϕ ) r ''' . ( 70 ) r ' = Rz ( ψ ) Rx ( θ ) Rz ( ϕ ) r . ( 71 ) Obtemos, finalmente, que: Portanto, a matriz de rotação mais geral é dada pelo produto: R ( ψ, θ, ϕ ) = Rz ( ψ ) Rx ( θ ) Rz ( ϕ ) . ( 72 ) Lembrando que a transposta de um produto de matrizes é igual ao produto das matrizes transpostas, mas na ordem inversa, isto é: RT ( ψ, θ, ϕ ) = Rz T ( ϕ ) RxT ( θ ) Rz T ( ψ ) = Rz ( −ϕ ) Rx ( −θ ) Rz ( −ψ ) . ( 73 ) Pode-se facilmente verificar que a matriz transposta é a matriz inversa na rotação: RT ( ψ, θ, ϕ ) R ( ψ, θ, ϕ ) = R −1 ( ψ, θ, ϕ ) R ( ψ, θ, ϕ ) = 1. ( 74 ) Mecânica » Cinemática das Rotações 18 Velocidade Angular em Termos dos Ângulos de Euler Temos duas alternativas, inteiramente equivalentes, para encontrar a expressão para a velocidade angular em termos dos ângulos de Euler e suas derivadas (com respeito ao tempo). Na primeira delas, escrevemos uma expressão análoga a (000), ou seja: d ϕ d θ " d ψ ' ω= k+ i + k, dt dt dt ( 75 ) em que os versores k , i′′ e k ′ são dados pelas expressões (000), (000) e (000). Eles podem ser escritos em termos de dois conjuntos das bases de vetores. Existem duas formas de escrever o vetor velocidade angular. Na primeira, escrevemos tal vetor em termos dos vetores da base do referencial associado aos eixos (x, y, z). Figura 15: Versores associados a cada uma das rotações. Escrevemos, nesse caso: ω = ωx i + ω y j + ωz k ( 76 ) Mecânica » Cinemática das Rotações 19 Utilizando as expressões (000) e (000) em (000), obtemos: dθ dψ + senθsenϕ dt dt dθ dψ − senθ cos ϕ ω′y = senϕ dt dt dψ dϕ + . ω′z = cos θ dt dt ωx = cos ϕ ( 77 ) Na segunda alternativa, escrevemos a velocidade angular em termos dos vetores da base do referencial ligado aos eixos (x', y', z'). Ou seja: ω = ωx′i′ + ω y′ j ′ + ωz′k ′. ( 78 ) Assim, em cada caso, devemos relacionar os versores k , i′′ e k ′ da expressão (000) aos versores de cada base. Nesse último caso, devemos lembrar que: k = ∇′z ( x′, y′, z ′ ) i′′ = ∇′x′′ ( x′, y′, z ′ ) . ( 79 ) A expressão da forma (000) é muito útil quando abordamos o movimento do corpo rígido. A partir de (000), (000) e (000), obtemos para as componentes da velocidade angular as seguintes expressões: dϕ dθ + cos ψ dt dt dϕ dθ ω ' y = senθ cos ψ + senψ dt dt dϕ dψ + . ω 'z = cos θ dt dt ω 'x = senθsenψ ( 80 ) A outra forma de fazê-lo é por meio da determinação da derivada do vetor de posição com respeito ao tempo. Escrevemos: d r ' d ( Rz ( ψ ) Rx ( θ ) Rz ( ϕ ) ) ' = r . dt dt ( 81 ) Mecânica » Cinemática das Rotações 20 Efetuando-se as derivadas, encontraremos três termos, os quais podem ser escritos como: d ( Rz (ψ ) ) d ( Rx (θ) ) d ( Rz (ϕ) ) dR r' = Rz −1 (ψ ) + Rz (ψ ) Rx (θ) Rx −1 (θ) Rz −1 (ψ ) r ' .( 82 ) + Rz (ψ ) dt dt dt dt ψ =0 θ=0 ϕ=0 Agrupando os termos, veremos que a expressão para a velocidade do ponto pode ser escrita sob a forma: Com ω dada pela expressão (000). d r' = ω× r ' . dt ( 83 ) Mecânica » Cinemática das Rotações 21 Como usar este ebook Orientações gerais Caro aluno, este ebook contém recursos interativos. Para prevenir problemas na utilização desses recursos, por favor acesse o arquivo utilizando o Adobe Reader (gratuito) versão 9.0 ou mais recente. Botões Indica pop-ups com mais informações. Ajuda (retorna a esta página). Sinaliza um recurso midiático (animação, áudio etc.) que pode estar incluído no ebook ou disponível online. Créditos de produção deste ebook. Indica que você acessará um outro trecho do material. Quando terminar a leitura, use o botão correspondente ( ) para retornar ao ponto de origem. Bons estudos! Mecânica » Cinemática das Rotações Créditos Este ebook foi produzido pelo Centro de Ensino e Pesquisa Aplicada (CEPA), Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP). Autoria: Gil da Costa Marques. Revisão Técnica e Exercícios Resolvidos: Paulo Yamamura. Coordenação de Produção: Beatriz Borges Casaro. Revisão de Texto: Marina Keiko Tokumaru. Projeto Gráfico e Editoração Eletrônica: Daniella de Romero Pecora, Leandro de Oliveira e Priscila Pesce Lopes de Oliveira. Ilustração: Alexandre Rocha, Aline Antunes, Benson Chin, Camila Torrano, Celso Roberto Lourenço, João Costa, Lidia Yoshino, Maurício Rheinlander Klein e Thiago A. M. S. Animações: Celso Roberto Lourenço e Maurício Rheinlander Klein. 22