URBANIZAÇÃO E DEGRADAÇÃO AMBIENTAL: CONTRIBUIÇÃO AO ESTUDO DAS APP’S DOS RIOS SERIDÓ E BARRA NOVA, EM CAICÓ/RN Resumo expandido - Avaliação e Estudos de Impactos Ambientais Manoel Cirício Pereira Neto ¹ ([email protected]), Ubirajara Dantas da Silva¹, Neusiene Medeiros da Silva¹, Jane Azevedo de Araújo², Luíza Mirian Gonçalves Vieira³ 1 - Graduando do Curso de Geografia/Universidade Federal do Rio Grande do Norte 2 - Mestranda do Programa de Desenvolvimento e Meio Ambiente (PRODEMA)/UFRN 3 - Graduando em Engenharia Florestal/Universidade Federal de Viçosa RESUMO A questão da água no Semiárido nordestino tem se evidenciado cada vez mais como um sério assunto a ser discutido. Como a maioria das cidades na região, o município de Caicó/RN, que possui uma população aproximada de 63 mil habitantes, teve todo o seu processo de urbanização construído às margens de seus rios (Seridó e Barra Nova). A pesquisa teve como objetivo caracterizar a degradação ambiental frente ao processo da urbanização nas margens ribeirinhas dos rios Seridó e Barra Nova, na zona urbana de Caicó. O desenvolvimento deste trabalho foi baseado em pesquisa bibliográfica e posteriormente a produção de material cartográfico digital, junto ao Sistema de Informações Geográficas (SIG) com o software ArcGIS 9.2, além do levantamento de dados em campo com a realização de visitas mensais in loco e registro fotográfico das atividades desenvolvidas além de elementos significativos de degradação da bacia. Apesar das margens ribeirinhas serem consideradas Áreas de Proteção Permanente, atualmente o processo de urbanização de Caicó tem se evidenciado como um dos maiores fatores impactantes no processo de degradação da sub-bacia hidrográfica do Seridó; quer seja na utilização de suas margens para o plantio de capim, quer seja na urbanização desenfreada nos bairros periféricos, ou na construção de áreas de lazer. A derrubada da mata ciliar, a eutrofização dos recursos hídricos, o aparecimento de graves assoreamentos e o processo erosivo das margens, além do descarte de esgotos in natura às margens do rio, aparece como elementos indicadores da degradação do ecossistema. Palavras chave: crescimento urbano; recursos hídricos; impactos ambientais INTRODUÇÃO A água é um dos mais importantes recursos naturais do planeta, de grande necessidade à manutenção da vida e das atividades humanas como abastecimento, irrigação, lazer, aqüicultura, geração de energia, entre outros; além de fundamental importância à vida aquática e a biodiversidade do planeta. É crescente a preocupação com a conservação e utilização racional dos cursos d’água, considerando o fato que a saúde e o bem-estar humano, bem como o equilíbrio ecológico dos ecossistemas, não devem ser afetados por conseqüência da deterioração da qualidade das águas em função de seus usos pelo homem (CONAMA n°. 20/86). No que diz respeito à região Semiárida nordestina, a problemática referente à escassez e irregularidade dos recursos hídricos se evidencia e se contextualiza como um sério assunto a ser debatido e tratado, em todos os campos da sociedade. A escassez de água juntamente ao prejuízo de sua qualidade torna-se um fator que limita o desenvolvimento sustentável uma vez que a vida animal e vegetal não se desenvolve na sua ausência e/ou não atendem as necessidades básicas de todos (SALATI, 2002; REBOLSAS, 2002) Neste contexto, o problema da escassez de água potável torna-se uma verdadeira ameaça à sobrevivência das populações, que na maioria das vezes, tem origem no crescimento desordenado das demandas e, sobretudo, pelos processos de degradação da sua qualidade atingindo níveis nunca imaginados a partir da década de 50. O desenvolvimento urbano tem, portanto envolvido ao longo da história duas atividades conflitantes: a) aumento na demanda de água, com qualidade, e b) a degradação dos mananciais urbanos por contaminação dos resíduos urbanos e industriais. Apesar da fragilidade destes ecossistemas observa-se, porém atualmente grande concentração das atividades humanas em seu entorno, tornando as áreas alagadas invariavelmente expostas a distúrbios artificiais e a destruição. O uso e a ocupação dos ambientes ribeirinhos, por exemplo, realizados de maneira desordenada ao longo da colonização da região do Seridó potiguar fizeram com que estes ecossistemas fossem um dos primeiros ambientes a sofrer degradação pelo estabelecimento do homem. Outro fator agravante com o processo de urbanização diz respeito à retirada da vegetação nativa, uma vez que as florestas localizadas junto aos corpos d’água (as matas ciliares) desempenham importantes funções hidrológicas, que compreendem: a) proteção da zona ripária com a filtragem de sedimentos e nutrientes; b) aumento na capacidade de infiltração de água no solo; c) controle do aporte de nutrientes e de produtos químicos aos cursos de água; d) controle da erosão a exemplo daquelas que ocorrem nas ribanceiras dos canais; e) manutenção da perenidade das nascentes e fontes e regularização da vazão dos cursos de água e, f) controle da alteração de temperatura do ecossistema aquático. Desta maneira, a função da mata ciliar é reconhecidamente uma das mais significativas, sendo por vezes uma determinante também das características físicas, químicas e biológicas dos corpos de água. (DELITI, 1989; LIMA, 1989). O uso e a cobertura do solo nestes ecossistemas têm, portanto um papel fundamental no deliamento do ambiente em escalas global, regional e local. Mudanças no uso e na cobertura do solo podem assim influenciar a diversidade biológica, o clima e os ciclos biogeoquímicos e da água. A retirada da Mata Ciliar, por sua vez, pode resultar em um aumento da temperatura do solo e da erosão juntamente ao assoreamento dos mananciais e em modificações do balanço hídrico e na disponibilidade de nutrientes (TUCCI, 2002; TUNDISI, 2008). Um significativo transporte de nitrogênio e fósforo do meio terrestre para o aquático a partir do processo de desmatamento e erosão do solo, por exemplo, dá início ao processo de fertilização das águas originando no conhecido processo de eutrofização. A eutrofizacão cultural produz mudanças na qualidade da água, incluindo redução de oxigênio dissolvido, redução das qualidades cênicas, morte extensiva de peixes e aumento de incidências de florações de microalgas e cianobactérias (AZEVEDO, 1998; TUNDISI & STRASKRABA, 2004; UNEP-IETC, 2001). Desta maneira, o uso do solo está então intimamente relacionado à degradação do ambiente pelas ações antrópicas, tanto diretas quanto indiretas. Desta maneira, CHRISTOFOLETTI (1999) ressalta: “ O conceito de recursos naturais é sensível ao contexto no qual é utilizado. Os componentes existentes na superfície terrestre não surgem como recursos naturais apenas porque se encontram no sistema da natureza. Passam a essa categoria quando ganham relevância em função da intervenção humana, pelo conhecimento de sua existência, pelo conhecimento de como pode ser tecnicamente utilizado e pela sua integração a determinadas necessidades da sociedade.” Apesar das margens ribeirinhas serem consideradas Áreas de Proteção Permanente (CONAMA, 2002), o processo de crescimento dos centros urbanos e sua proximidade com estes ecossistemas tem se evidenciado como um dos maiores fatores impactantes no processo de degradação das bacias hidrográficas. Neste contexto, igualmente a maioria das cidades na região do Semiárido, o município de Caicó, localizado na região do Seridó potiguar, e que possui uma população aproximada de 63 mil habitantes (IBGE, 2009), teve todo o seu processo de urbanização construído às margens de seus rios (Seridó e Barra Nova). Representando tais ecossistemas, na época do povoamento deste território, um elemento fundamental para a fixação das primeiras fazendas de gado e desenvolvimento da agropecuária de subsistência, fonte de recursos naturais para a sobrevivência e para as atividades dos primeiros moradores da região. Os rios Seridó e Barra Nova apresentam-se, por sua vez, como importantes afluentes da Bacia Piranhas-Assu, principal bacia hidrográfica potiguar, uma vez que disponibilizam importantes recursos para grande parte do território sertanejo. Sofrendo, porém em função do processo de urbanização desordenada das cidades da região, e em especial do município de Caicó grandes alterações em suas margens ribeirinhas. A pesquisa teve, portanto como objetivo caracterizar as principais atividades humanas de pressão e/ou impacto sobre os elementos naturais frente ao processo da urbanização nas margens ribeirinhas dos rios Seridó e Barra Nova, na zona urbana de Caicó/RN; retratando e caracterizando à possível degradação atualmente observada e suas possíveis conseqüências à qualidade de vida humana. Oferecendo por sua vez os possíveis subsídios que contemplem as necessidades de prevenção, contenção e mitigação aos diferentes impactos ambientais. METODOLOGIA Para o desenvolvimento deste trabalho houve a priori uma pesquisa bibliográfica, e posteriormente o levantamento de dados em campo com a realização de visitas mensais in loco e registro fotográfico das atividades desenvolvidas além de elementos significativos de degradação da bacia. Para a delimitação da área de preservação permanente (APP) e a produção de material cartográfico digital, utilizou a metodologia de COSTA&CESTARO (2010) junto ao Sistema de Informações Geográficas (SIG) com o software ArcGIS 9.2. A produção do material cartográfico teve como base as imagens do satélite Landsat 5 e CBERS 2B (coletadas no ano de 2008). Para atingir a precisão desejada, as imagens foram georreferenciadas na grade de coordenadas UTM (Universal Transversa de Mercator), em escala de 1:36.000, a partir do Datum SAD 69. Durante a fase de interpretação das imagens de satélite, procedeu-se a identificação das áreas antropizadas e/ou conservadas, através da análise espectral das imagens com base nas tonalidades e texturas das mesmas, em complementaridade às informações obtidas em campo. RESULTADOS E DISCUSSÃO Pode-se observar que o processo de degradação das margens ribeirinhas dos rios Seridó e Barra Nova encontram-se atreladas a expansão dos bairros periféricos no processo de expansão urbana, integrados à falta de planejamento e gestão do poder público municipal. No que se refere ao estado atual das margens ribeirinhas, pode-se concluir que: O avanço da urbanização no Rio Seridó encontra-se ligado a apropriação do solo para áreas de lazer e moradia, caracterizadas pelas áreas de solo exposto, como à fixação de fazendas para a criação do gado bovino e cultivo de vazante, caracterizadas por Caatinga rala, corresponde a 55% da área pesquisada; e que o trecho de vegetação de Caatinga densa corresponde a 25% da área total, caracterizando-se como verdadeiras manchas de conservação e refúgio da biodiversidade local, sujeitos a intensa especulação imobiliária. Tais elementos corroboram a idéia de TUNDISI (2008) acerca da degradação enfrentada pelos sistemas lóticos, seja referente à irrigação ou abastecimento humano, seja com a alteração das várzeas associadas à urbanização. E, no que se refere ao Rio Barra Nova pode-se observar que a vegetação nativa intacta (densa) de Caatinga compreende apenas 9% da área; já a área antropizada atinge 71% com a preocupante cifra de 37% de solo exposto. Os demais 36% corresponde a uma vegetação secundária, rala composta, sobretudo de gramíneas e herbáceas, com pouco ou nenhum exemplar arbóreo. Essa destruição da mata ciliar está associada ao uso das margens por parte dos moradores para a prática de várias atividades que contribuem com a sua sobrevivência financeira, dentre as quais merece destaque a atividade de monocultura do capim e a criação de gado e de suínos. Este processo de ocupação e degradação torna-se, portanto evidente nas margens do Rio Barra Nova, refletindo por sua vez no aumento da planície de inundação do rio, trazendo problemas em períodos de cheia para a população ribeirinha. Além disso, outro problema evidenciado nesta pesquisa se diz respeito à observação de uma excessiva carga de dejetos residenciais in natura lançados dentro do mesmo rio, favorecendo a proliferação de algas e o aumento da eutrofização natural do curso de água. Todas estas práticas de ocupação têm o tornado um ambiente altamente degradado, o que afeta diretamente a sobrevivência das comunidades biológicas existes no local e depleção da qualidade de vida humana. A ocupação antrópica inadequada sobre as Áreas de Preservação Permanente (APP) na zona urbana de Caicó/RN tem, portanto ocasionado uma cadeia de impactos ambientais; entre os quais está a impermeabilização do solo, alterações na topografia, erosão das margens e assoreamento dos cursos d’água, perda das matas ciliares, diminuição da biodiversidade, aumento do escoamento superficial, entre outros. A derrubada da mata ciliar, a eutrofização dos recursos hídricos, o aparecimento de graves assoreamentos e o processo erosivo das margens, além do descarte de esgotos in natura às margens do rio, aparece como elementos indicadores da degradação do ecossistema. São eles, portanto os principais fatores de depleção da qualidade dos recursos hídricos em conseqüência, sobretudo do mau gerenciamento urbano e de suas bacias hidrográficas (TUCCI, 2002; TUNDISI, 2008). CONCLUSÃO O processo de ocupação desordenada das bacias hidrográficas no Semiárido brasileiro, ligado ao avanço dos centros urbanos sobre as áreas de preservação permanente (APP) vem acarretando atualmente graves problemas ambientais aos mananciais da região. O desaparecimento das matas ciliares, o assoreamento de sistemas lóticos e o processo de eutrofização são algumas das graves conseqüências da degradação atual. É, portanto, ambientalmente insustentável a exploração das margens dos rios Seridó e Barra Nova na área urbana de Caicó/RN. A identificação e o monitoramento das alterações do solo e dos recursos hídricos em uma região Semiárida tornam-se, portanto de fundamental importância à reflexão com a própria lógica do planejamento, configuração e gestão das cidades e de sua função ecológica, frente à melhoria da qualidade de vida. O contexto de irregularidade e depleção da qualidade ambiental existente poderia então dar lugar a um planejamento direcionado ao correto uso e ocupação do solo, relacionados ao controle de perdas e desperdícios dos recursos hídricos. A conservação das manchas de mata ciliar ainda existente torna-se, portanto elemento fundamental de refúgio para a biodiversidade local e ferramenta significativa para a qualidade ambiental deste ecossistema. REFERÊNCIAS AZEVEDO, S. M. F. O. Toxinas de cianobactérias: causas e conseqüências para a saúde pública. Revista virtual de Medicina – Medicine on line, 1998. CONAMA (Conselho Nacional do Meio Ambiente). Resolução n° 001 (Impacto Ambiental), de 23/01/1986. Diário Oficial da União de 17/02/1986. COSTA. D. F. S.; CESTARO, L. A. Análise fitoecológica do manguezal e ocupação das margens do estuário hipersalino Apodi/Mossoró (RN – Brasil), PRODEMA, 2010 DELITI, W. B. C. Ciclagem de nutrientes minerais em matas ciliares in LACERDA, A. V., BARBOSA, F. M. Matas Ciliares no domínio das Caatingas, Editora Universitário/UFPB, 2006. IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e http://www.ibge.gov.br/home - acesso em 20/08/2010. Estatísticas). Disponível em: LACERDA, A. V., BARBOSA, F. M. Matas Ciliares no domínio das Caatingas, Editora Universitário/UFPB, 2006. LIMA, W. P. Função hidrológica da mata ciliar. In: Simpósio sobre Mata Ciliar. Anais. Campinas: Fundação Cargill, p 25-42, 1989. REBOUÇAS, A. C. (org). Águas Doces no Brasil: capital ecológico, uso e conservação. 2 ed. São Paulo: Escrituras Editora, 2002. SALATI, E. et al. Água e o desenvolvimento sustentável. In: REBOUÇAS, A.C. et al. Águas Doces no Brasil: capital ecológico, uso e conservação. 2 ed. São Paulo: Escrituras Editora, 2002. TUCCI, C. Água no meio urbano. in - TUNDIZI, J. G.; BRAGA, B. Águas Doces no Brasil: capital ecológico, uso e conservação. 2 ed. São Paulo: Escrituras Editora, 2002. TUNDISI. J. G. et al. Limnologia. Ed. Oficina de textos, São Paulo/SP, 2008. UNEP-IECT. Planejamento e gerenciamento de lagos e represa: uma abordagem integrada do problema da eutrofização. São Carlos: RIMA, 2001.