crescer | Capa BI Nome Arlindo Ngueva Narciso das Chagas Rangel, 37 anos, é CEO do Banco Keve desde Maio de 2015 Experiência profissional Iniciou a carreira em 2002, na Direcção Financeira do então BESA, onde passou ainda pelas Direcções Comercial e de Empresas, além de ter sido, em 2003, coordenador do AIS (Aprovisionamento e Expansão). Entre 2006 e Maio de 2013 esteve no Banco de Poupança e Crédito, onde desempenhou os cargos de subdirector da Direcção Financeira, director da Direcção Internacional, bem como director da Direcção de Tesouraria e Mercado. Em 2013 regressa ao BESA Banco Económico (então BESA) como administrador executivo, com o pelouro das Direcções Private, Top Corporate e PME. Em Setembro de 2014 passou também a responder pelas Direcções de Imobiliário, Segurança, Compliance, Transportes e Leasing 2 Março 2016 | R É preciso diversificar e melhorar a qualidade do crédito” O CEO do Banco Keve revela a estratégia do banco para 2016 e faz a análise detalhada dos resultados e dos desafios que tem pela frente Texto de César Silveira | Fotos de Walter Fernandes Analisando dados de 2012, 2013 e 2014 quanto a activos totais, depósitos totais, crédito total e resultados líquidos, todos eles cresceram no Banco Keve. Já a rubrica rentabilidade dos capitais próprios desceu, sobretudo em 2013 (14,79% em 2014, 13,10% em 2013 e 15,42% em 2012). Como prevê melhorar este indicador na sua instituição e ao qual os accionistas estão sempre particularmente atentos? Os indicadores de rentabilidade do sistema bancário angolano, na generalidade, tendem a estar mais alinhados com os níveis das economias mais maduras, e esta tendência é explicada por muitos factores, dos quais destaco o aumento exponencial da concorrência, o emagrecimento das margens financeiras, a menor contribuição das margens comple- mentares, sobretudo no que toca aos ganhos em operações cambiais, e o aumento da cobertura de provisões face ao crédito vencido. Para contrariar esta tendência decrescente é fundamental diversificar, com a devida ponderação dos vários riscos, as áreas de negócio do banco, optimizar o custo de funding, melhorar a eficiência, com maior incidência na racionalização dos custos de estrutura, e, sobretudo, melhorar a qualidade da carteira de crédito, quer por via da renovação do crédito, quer por via da elevação dos níveis de recuperação. Apesar de pressionarem, os accionistas não deixam de relevar a forma como o banco tem actuado, as estratégias encontradas para superar as diferentes situações que se prendem com o ambiente de negócios envolvente. R | Março 2016 3 crescer | Capa Os números que caracterizam actualmente o banco vão ao encontro dos perspectivados aquando da criação do mesmo, em 2003? No meu entender, o banco já superou a expectativa inicial dos seus fundadores, uma vez que de instituição de orientação regional passou a ser uma marca de âmbito nacional, com implantação em quase todo o território nacional. Por outro lado, do ponto de vista dos resultados financeiros, o banco tem gerado, consistentemente, lucros e o seu valor tem crescido desde então, originando ganhos para os accionistas e para os restantes stakeholders. Qual a previsão do banco sobre a concessão de novos créditos nos próximos tempos? A actual conjuntura sugere-nos adoptar uma postura mais conservadora no que toca à aplicação dos recursos que nos foram confiados. Queremos assegurar, em primeira instância, níveis de liquidez suficientes para fazer face aos nossos compromissos. Neste sentido, iremos manter os rácios de transformação aos níveis actuais, ficando a concessão de novo crédito condicionada ao aumento dos recursos captados e ao reembolso de financiamentos em curso. Importa referir aqui que, face a uma tendência de deterioração do crédito, os requisitos para a concessão de crédito naturalmente têm vindo a aumentar. Qual o nível de crédito malparado do Banco Keve? O nível de crédito malparado do Banco Keve está em linha com a média do mercado. Apesar da conjuntura económica desfavorável, em 2015 fizemos um esforço, com medidas claras, entre as quais a autonomização e reforço das competências do Gabinete de Monitorização e Recuperação de Crédito, com a missão de recuperar o crédito inadimplente e acompanhar o crédito concedido, de modo que esperamos fechá-lo com um número muito abaixo do ano anterior. “A crise traz a oportunidade de os bancos olharem para dentro, perceberem o que têm de melhorar, para depois se virarem para o mercado internacional e voltarem a ser atractivos.” Concorda com esta análise feita pela KPMG, recentemente em entrevista à revista Rumo? Eu, pessoalmente, encaro as crises como uma oportunidade de reorganização e crescimento, pois é em momentos de crise que o engenho humano é aguçado. O actual momento particularmente adverso tem obrigado os bancos a reanalisarem os seus planos estratégicos e de negócios, bem como a sua organização interna. A busca de novas fontes de receitas internas e externas, a racionalização de custos, a optimização da gestão dos recursos, com principal ênfase no capital humano, a busca incessante da excelência operacional para melhor servir os clientes, a adequação dos bancos às boas práticas bancárias e a gestão eficiente dos riscos associados à actividade bancária terão de ser cada vez mais factores de preocupação na agenda dos gestores bancários, e será nesta senda que o Banco Keve irá desenvolver a sua actividade, por forma a garantir a sustentabilidade da instituição, afirmando-se cada vez mais no apoio à economia nacional. É intenção do KEVE internacionalizar-se. Começará pela Europa ou pela África Subsariana, e porquê? O processo de internacionalização do Banco Keve está ainda numa fase muito embrionária. Entretanto, a nossa prioridade actual está no mercado local. Como falar de internacionalização da banca quando há debilidades para resolver dentro de portas? Não estará a banca, no geral, a dar um passo maior que a perna? O processo de internacionalização do Banco Keve está ainda numa fase muito embrionária. A nossa prioridade é o mercado local ” chagas rangel, banco keve 4 Março 2016 | R Antes de mais, é preciso esclarecer que, pela sua própria natureza, a actividade bancária está exposta a mercados e jurisdições internacionais. Entretanto, se por internacionalização entendermos a constituição de estabelecimento comercial no exterior, então uma coisa não invalida a outra, aliás, até certo ponto se complementam, pois a nossa motivação para internacionalizar o banco não se limita apenas a aspectos económicos e financeiros, existem outras razões que fundamentam a nossa presença noutros mercados, entre as quais destaco a possibilidade de ampliação da reputação da nossa marca, a possibilidade de beneficiar de novas sinergias em termos de parcerias e novos canais e, por último, a possibilidade de beneficiar de know-how, por termos uma unidade a actuar numa praça financeira mais evoluída. Recentemente circularam informações levantando a hipóteses de o Banco Keve vir a ter dificuldades nas relações com instituições financeiras internacionais R | Março 2016 5 crescer | Capa devido ao facto de no seu corpo de accionistas contar com PEP (Pessoas Politicamente Expostas). Que opinião tem acerca dessa análise? Em primeiro lugar, o Banco Keve não tem nenhum accionista PEP com participação qualificada, mas, mesmo que tal fosse o caso, nada impediria que o banco pudesse realizar normalmente a sua actividade; aliás, os PEP não estão proibidos de ter participação em negócios. De todos os modos, mesmo não havendo as tais supostas dificuldades nas relações com instituições financeiras internacionais, a administração do Banco Keve, com o apoio do seu corpo accionista, tem vindo a implementar todas as normas e boas práticas nacionais e internacionais em matéria de combate ao branqueamento de capitais e financiamento ao terrorismo, entre outras, procurando garantir a sua conformidade com aquelas disposições que regulam os sistemas financeiros internacionais. As novas exigências regulatórias e desafiantes regras de governance e de combate ao branqueamento de capitais são vitais para a continuidade das instituições financeiras. O que está a fazer o Keve nesse sentido? No Banco Keve temos perfeita consciência da necessidade de nos conformarmos a todas as exigências regulatórias em matéria de compliance. Neste sentido, temos implementado as diferentes políticas que constituem o sistema de prevenção e combate ao branqueamento de capitais e financiamento ao terrorismo, o qual abrange a política de escrutínio e aceitação de clientes, gestão de riscos, monitorização de entidades de risco elevado e análise de transacções. Este processo está a ser acompanhado de formação dos nossos colaboradores, sem os quais não é possível materializar este objectivo. Como resultado destes esforços, fomos distinguidos pela OPIC e pelo World Business Capital – reputadas instituições que privilegiam o rigor e a transparência –, sendo neste preciso momento o único banco angolano que mereceu tal distinção. Segundo a Unidade de Informação Financeira, o sector bancário é o que mais presta informações sobre operações suspeitas. Qual o nível de registo de operações suspeitas feito pelo Banco Keve? Nos bancos angolanos, temos vindo a fazer um esforço significativo para proteger o nosso sistema financeiro e a nossa economia das actividades criminosas. No nosso caso, o esforço de prevenção redobrado começa na criteriosa selecção dos nossos clientes, que nos tem permitido ter um nível baixo de incidentes com operações suspeitas. Nos últimos anos foram feitos grandes investimentos em plataformas e infra-estruturas tecnológicas na banca em geral. E no caso do Banco Keve? Para além de investir nas infra-estruturas tecnológicas que permitem hoje ao Banco Keve operar com a mesma quali- 6 Março 2016 | R dade de serviço em toda a extensão da sua rede, temos sido pioneiros em algumas soluções inovadoras que permitem aos clientes um acesso permanente aos nossos produtos e serviços e esperamos tornar-nos líderes da inovação da banca em Angola. Quer a nível da infra-estrutura de suporte, quer a nível de produtos e serviços. O banco tem um plano de expansão para as províncias e até mesmo em Luanda. Pode pormenorizar? O nosso plano de expansão para os próximos anos prevê a abertura de agências em localizações de grande relevância económica e social em Luanda, onde o banco ainda não se faz presente, e a abertura nas capitais das províncias e municípios onde ainda não marcamos a nossa posição. Certamente que o Banco Keve se irá tornar mais visível e acessível aos seus clientes e ao público em geral. Alguns especialistas do sector defendem ser desnecessário, contrariamente a um passado recente, o investimento em grandes agências, tendo em conta a evolução das tecnologias. Que opinião tem acerca disso? A experiência em mercados mais avançados tem mostrado que os balcões virtuais e as transacções na Internet não são substitutos perfeitos ao contacto pessoal; também, apesar dos grandes desenvolvimentos na área de utilização das tecnologias de informação registados no nosso país, ela ainda não é suficientemente abrangente, daí a razão da preocupação das nossas autoridades pela inclusão financeira (bancária). Estamos num momento de alteração de paradigma e o Banco Keve está preparado para oferecer soluções para a chamada “geração Facebook” e também para os utilizadores tradicionais da banca. O mercado angolano terá espaço para um tipo de banco essencialmente tecnológico, do género do português ActivoBank? Não faz parte dos planos imediatos do banco constituir uma instituição dessa natureza. Em 2014, a banca, no seu todo, atingiu 20 mil colaboradores. Nesse ano houve uma taxa de crescimento da rede de balcões de 6,7%, ou seja, inferior àquilo que se tinha verificado em anos anteriores, e ainda assim aumentou a população de bancários em cerca de 6,4%. Como se explica este facto face à crise já vivida no País? Eu acho que é uma boa notícia. Significa que os bancos continuam a acreditar no País, apesar das dificuldades conjunturais que se verificam. Seria bom que essa atitude fosse apoiada por todos os actores da nossa economia. O BNA impôs, em 2014, o AQA, que é a avaliação da qualidade de activos, em que os bancos foram sujeitos a uma análise aprofundada das carteiras de crédito. Como é que o Keve sobreviveu e está a sobreviver a estes testes? No nosso caso concreto, a palavra “sobreviver” não se aplica. Os fundamentos do nosso negócio são sólidos, os accionistas estão comprometidos e os nossos clientes confiam no banco. A recente imposição de os bancos fazerem a transição do actual plano de contas do sistema bancário, designado Contif, para as normas internacionais de contabilidade faz uma aproximação forte aos padrões internacionais. Quão difícil isso é para um banco como o Keve? Qualquer alteração às normas de registo contábeis de uma instituição bancária constitui um desafio aos gestores e colaboradores, mas o Banco Keve está preparado para a assunção plena das normas de IAS/IFRS e deverá passar a reportar as demonstrações financeiras nesse padrão no exercício de 2017. Existirá no País espaço para mais instituições bancárias? Ou já tem o número de bancos suficiente e as fusões e aquisições são uma saída para a sobrevivência de alguns? A banca é uma indústria extremamente competitiva e nos últimos anos temos observado crescimentos mais modestos da actividade bancária, o que poderá indiciar alguma saturação do mercado. A par disso, o ambiente regulatório cada vez mais exigente, com incidência no reforço de capitais dos bancos para fazer face aos vários riscos, e o dinamismo a que se assiste no mercado de capitais serão seguramente factores que irão precipitar os processos de fusões e aquisições na banca. Como analisa a recente fusão Millennium-Atlântico? Não dispomos de informação suficiente para analisar este processo, mas quero felicitar os seus accionistas pela iniciativa pioneira no mercado nacional e aproveito igualmente para desejar sucesso aos meus colegas que têm a missão de implementar esta fusão. Antevê que o Keve possa vir a entrar num movimento semelhante? Porquê e com quem faria sentido? Estamos atentos ao mercado e a todas as oportunidades de negócio que criem valor para os clientes e accionistas. Sem fusões ou aquisições, o Keve poderá vir a tornar-se menos relevante no mercado nacional? O Banco Keve está preparado para prosseguir a sua actividade mesmo que a solo, e para isso conta com o suporte inequívoco dos seus accionistas, que aprovaram recentemente um aumento do capital social para um valor equivalente a 200 milhões de dólares. Desta forma ficam garantidas as condições para que nos tornemos cada vez mais relevantes no mercado nacional. Num discurso recente, o Presidente José Eduardo dos Santos afirmou que o sector da banca é o que mais cresceu, mas, no entanto, tem margens para melhorar os serviços. Que melhorias e ou serviços inovadores o mercado bancário angolano reclama com alguma urgência? S. Ex.ª o Sr. Presidente da República, Eng. José Eduardo dos Santos, tem toda a razão e no Banco Keve já temos vindo a introduzir não só melhorias no atendimento (temos a deR | Março 2016 7 crescer | Capa correr um vasto plano de formação dos colaboradores) como a oferecer produtos inovadores, que atendem às necessidades dos nossos clientes, como é o caso do produto Keve Index, uma solução para transferir para o público parte da protecção do risco cambial conferido pelos Títulos do Tesouro indexados. agricultura e a indústria. Nós somos também um importante parceiro do governo na implementação prática do programa Angola Investe e outros programas da mesma natureza. Temos projectos financiados nos domínios da agricultura, piscicultura, pesca industrial, indústria dos plásticos e agro-indústria. O Keve tem em carteira o lançamento de produtos e ou serviços inovadores para o mercado nos próximos tempos? Como analisa hoje a diversificação realmente existente no País e o que pode ser feito para a melhorar? Voltaremos a surpreender positivamente o mercado com novos produtos e serviços, mas o segredo é a alma do negócio… O BNA tem facilitado ou dificultado a vida à banca, tendo em conta a falta de liquidez e a escassez de divisas? Como avalia o desempenho do BNA? Começo pelo final da sua pergunta: não nos compete avaliar o desempenho do regulador, mas o inverso. Quanto à falta de liquidez e à escassez de divisas, acredito que o BNA tem feito o melhor que pode para, num contexto de crise de balança de pagamentos, continuar a viabilizar a solvabilidade externa da economia. Compete a todos nós darmos também a nossa contribuição. Está o KEVE a apostar e a financiar negócios respeitantes à diversificação da economia? Pode dar alguns exemplos? O Banco Keve sempre esteve engajado no apoio à economia real, e nesse sentido uma parte importante da nossa carteira de crédito está ligada ao sector produtivo, incluindo a O processo de diversificação em Angola, apesar dos vários constrangimentos, tem dado passos assinaláveis, tanto no sector das infra-estruturas como no sector agrícola e no sector industrial. A designação “made in Angola” já se pode ver em variadíssimos produtos disponíveis no mercado, o que é de realçar. Todavia, apesar dos avanços, temos que reconhecer que ainda há muita coisa por fazer. Na minha área de actividade, temos procurado sempre atender às demandas que os sectores mais relevantes da diversificação nos têm feito, e esperamos continuar a introduzir produtos e serviços que ajudem a agricultura, a indústria e a formação de quadros necessários para este processo. Quais os três grandes desafios mais importantes e imediatos que o sector tem pela frente? Os três maiores desafios que identifico são: primeiro, implementação efectiva do compliance, garantindo a adequação às melhores práticas internacionais; segundo, capitalização das instituições para fazer face às novas exigências regulamentares e de negócios, e, terceiro, capacitação do capital humano com vista a responder às necessidades do sector. Quais as três grandes metas que o banco quer alcançar? No Banco Keve temos uma meta que resume bem a nossa ambição, que é a de nos tornarmos numa referência incontornável de excelência no sector bancário. Pode dizer-se que a banca é o melhor amigo da economia? Os bancos acreditam no País, apesar das dificuldades. Seria bom que essa atitude fosse apoiada por todos ” chagas rangel, banco keve 8 Março 2016 | R Os bancos são parte integrante da economia, não são amigos da economia, são parceiros, se preferir, são siameses – os seus destinos estão interligados. Não há bons bancos sem economia, nem economia sem bons bancos. O CEO do Banco Keve que marca quer deixar no sector quando, um dia, abraçar outros desafios? Neste momento todas as minhas energias estão centradas nas minhas obrigações para com o Banco Keve. O futuro a Deus pertence. No actual contexto económico do País, qual é o maior desafio para um CEO de um banco? O meu maior desafio é transmitir a confiança necessária à minha equipa, aos clientes do banco e aos accionistas, de modo que, em qualquer circunstância, encontremos nas dificuldades uma ponte para o sucesso.