CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO CEARÁ FACULDADES CEARENSES CURSO DE SERVIÇO SOCIAL MARIA MEIRIANE DOS SANTOS TORRES A PERCEPÇÃO DE ASSISTENTES SOCIAIS E PSICÓLOGOS SOBRE A MANUTENÇÃO DO VÍNCULO FAMILIAR E ADOÇÃO NO ABRIGO TIA JÚLIA FORTALEZA 2012 MARIA MEIRIANE DOS SANTOS TORRES A PERCEPÇÃO DE ASSISTENTES SOCIAIS E PSICÓLOGOS SOBRE A MANUTENÇÃO DO VÍNCULO FAMILIAR E ADOÇÃO NO ABRIGO TIA JÚLIA Monografia submetida à aprovação da Coordenação do Curso de Serviço Social do Centro Superior do Ceará, como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Serviço Social. FORTALEZA-CE 2012 T693p Torres, Maria Meiriane dos Santos. A percepção de assistentes sociais e psicólogos sobre a manutenção do vínculo familiar e adoção no abrigo Tia Júlia / Maria Meiriane dos Santos Torres. – 2012. 55 f. Orientador: Prof. Ms. Antônio Diogo Cals de Oliveira Filho. Trabalho de Conclusão de Curso (graduação) – Faculdades Cearenses, Curso de Serviço Social, 2012. 1. Abrigo Tia Júlia. 2. Adoção - Brasil. 3. Assistentes sociais - trabalho. I. Oliveira Filho, Antônio Diogo Cals de. II. Título. Bibliotecária Maria Albaniza de Oliveira CRB-3/867 CDU 364-782.44 MARIA MEIRIANE DOS SANTOS TORRES A PERCEPÇÃO DE ASSISTENTES SOCIAIS E PSICÓLOGOS SOBRE A MANUTENÇÃO DO VÍNCULO FAMILIAR E ADOÇÃO NO ABRIGO TIA JÚLIA Monografia como pré-requisito para obtenção do título de Bacharelado em Serviço Social, outorgado pela Faculdades Cearenses – FaC, tendo sido aprovada pela banca examinadora composta pelos professores. Data de aprovação: ____/ ____/____ BANCA EXAMINADORA ______________________________________ Prof. Ms. Antonio Diogo Cals de Oliveira Filho Orientador _______________________________________ Profª. Esp. Priscila Nottingham de Lima Examinador ________________________________________ Profª. Ms. Maria de Fátima Farias de Lima Examinador Dedico este trabalho primeiramente a DEUS, por me conceder vida, saúde e sabedoria durante todo o percurso, e por me permitir o alcance deste objetivo tão esperado. À minha mãe que nos momentos mais difíceis sempre confiança, desistisse. nunca Nessa me passou permitindo hora me força, que eu faltam palavras. Dedico a ela tudo o que sou e o que desejo ser. Dedico também o estudo às incontáveis crianças acolhidas em abrigos por todo o país, em especial as que estão no Abrigo Tia Júlia, local onde foi realizada minha pesquisa. AGRADECIMENTOS A DEUS pelo dom da vida. O que seria de mim sem a fé que eu tenho Nele . Sem Ele não teria forças para caminhar e realizar essa jornada. Serei eternamente grata pelo seu amor, por minha vida, por permitir essa vitória que foi tão sonhada e por seus propósitos em minha vida. Ao Senhor devo todas as homenagens. À minha Mãe, pelo apoio incansável, por todas as preocupações e orientações, por escutar e sofrer comigo cada angústia, mas principalmente por acreditar no meu sonho e sonhar comigo, não permitindo que eu desistisse nunca. A quem devo tudo, todas as honras! Ao meu Pai, por acreditar que o meu sonho seria possível, e por todo o generoso apoio. Aos meus irmãos, Lidiane e Vandi, companheiros de sonhos e de muito amor. A nossa união é algo que fortalece a cada momento. Poder sentir a felicidade dos dois com a minha realização, me permite a felicidade e o orgulho de ter duas pessoas tão especiais ao meu lado. Às minhas sobrinhas Emanuelly e Emily, pelo carinho e alegria que me proporcionam, amenizando a dura jornada. Aos meus avós, em especial à minha avó Santa, que tanto orou por minha vida e por cada lágrima de saudade e de preocupação que derramou por mim. Aos meus tios Sebastião, Aldiro, Raimunda e em especial Ezetilde (in memorian), a quem amarei eternamente, pelo carinho e pela contribuição à minha formação. Meus agradecimentos a minha amiga Verônica Pontes e aos demais colegas, pelo apoio e colaboração no decorrer da elaboração deste trabalho. Para Sâmia Benevides, pelo apoio e compreensão nas minhas ausências e para Adriano Silva pela valiosa contribuição para que essa pesquisa fosse concretizada, o meu muito obrigada. Ao meu orientador, Diogo Cals, pois sem me conhecer aceitou o desafio. Por cada momento que dedicou à minha pesquisa, por sua paciência, conselhos e por sempre passar confiança. Sua calma e sabedoria foram essenciais para que essa pesquisa se tornasse possível. A todos aqueles que não foram nominalmente citados aqui como primos, amigos e professores, o meu muito obrigada. “Adotar é acreditar que a história é mais forte que a hereditariedade, e que o amor é mais forte que o destino”. Lidia Weber RESUMO Esta pesquisa tem como objetivo principal compreender a percepção de assistentes sociais e psicólogos que atuam no abrigo Tia Júlia sobre a manutenção do vínculo familiar e da adoção na vida das crianças em situação de acolhimento institucional. Tais crianças estão acolhidas por diversos motivos que não apenas o “abandono”, mas por diversos outras situações como drogadição de um dos pais, denúncias ligadas a tipos diversificados de violência, negligência, dentre outros. As falas dos profissionais são utilizadas para que tais entendimentos se façam necessários e considerando sua vivência na instituição, no que diz respeito a estas duas possibilidades. Este trabalho também apresenta um breve histórico da adoção num contexto geral, passando em seguida pelo Brasil. Em seguida é feita a abordagem sobre o acolhimento institucional de crianças no Brasil, em um determinado período histórico, no qual foram criadas casas para receber crianças e maquiar a realidade da sociedade de então (é o caso da “roda dos enjeitados”). Os achados elencados ao longo deste estudo permitem afirmar que todas as possibilidades para a manutenção do vínculo familiar devem ser exploradas, acreditando também que a adoção se faz necessária e importante. No entanto, a questão da manutenção do vínculo deve ser trabalhada, precisando ser repensada a forma com esta acontece, tendo em vista que o destino das crianças acolhidas, muitas vezes, é o de permanecer em outros abrigos específicos por já não mais se enquadrarem no perfil da adoção. Palavras-chave: Acolhimento Institucional, Adoção, Criança, Manutenção de Vínculo Familiar. ABSTRACT This study's main objective is to understand the perception of social workers and psychologists working in the shelter Aunt Julia, on the maintenance of family ties and the adoption, in the lives of children who are in situation of institutional care. Children are welcomed for many reasons; not just for "abandonment", but for many other reasons like drug addiction of a parent complaints linked to diverse types of violence, neglect among others. The speeches of professionals who are used to such understandings may be necessary and considering their experience in the institution, with regard to these two possibilities. This paper also presents a brief history of adoption in a general context, and after about Brazil. Subsequently it makes the approach on institutional care of children in Brazil, something that not exists only today but within a historical period in which several houses were built to accommodate children and make up the reality of society. The findings listed throughout this study allow us to affirm that all possibilities for maintaining the family bond must be explored, although believing that adoption is necessary and important. However, the question of maintenance must be worked in two ways, needing to be rethought and the way this happens in order that the fate of the children take in by shelters is being taken to other shelters for no longer fit the profile of adoption. Keywords: Institutional Shelter, Adoption, Child, Family Maintenance Bond. LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS CAPS AD Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Droga CNAS Conselho Nacional de Assistência Social CNJ Conselho Nacional de Justiça CONANDA Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente CRAS Centro de Referência da Assistência Social CREAS Centro de Referência Especializado de Assistência Social DPF Destituição do Poder Familiar ECA Estatuto da Criança e do Adolescente HABITAFOR Fundação de Desenvolvimento Habitacional de Fortaleza MDS Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome NLA Nova Lei da Adoção PNCFC Plano Nacional de Promoção, Proteção e Defesa do Direito de Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária SEDH Secretaria Estadual de Direitos Humanos UNICEF Fundo da Nações Unidas para a Infância SUMÁRIO INTRODUÇÃO.................................................................................................12 1 PROCESSOS METODOLÓGICOS..............................................................14 1.1 Aproximação com o Tema ........................................................................14 1.2 Metodologia................................................................................................18 1.3 Unidade de Abrigo Tia Júlia.......................................................................19 1.4 Caracterização dos Profissionais Entrevistados.......................................20 2 ADOÇÃO E ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL NO BRASIL.....................22 2.1 Percurso histórico da adoção....................................................................22 2.1.1 A adoção no Brasil..................................................................................25 2.2 Acolhimento Institucional de Crianças no Brasil .......................................28 2.3 Os Marcos Legais da Atualidade...............................................................32 2.3.1 Nova doutrina do ECA............................................................................32 2.3.2 Plano Nacional de Promoção, Proteção e Defesa do Direito de Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária - PNPD.........................34 2.3.3 A Nova Lei da Adoção e o Cadastro Nacional de Adoção.....................36 3 PERCEPÇÃO SOBRE MANUTENÇÃO DO VÍNCULO FAMILIAR E ADOÇÃO DOS PROFISSIONAIS DOS ABRIGO TIA JÚLIA.........................................38 3.1 Manutenção do Vínculo Familiar ..............................................................38 3.2 Adoção.......................................................................................................43 3.3 Manter ou Adotar ......................................................................................46 CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................49 APÊNDICE A - QUESTIONÁRIO....................................................................52 REFERÊNCIAS ..............................................................................................54 12 INTRODUÇÃO Este trabalho busca compreender e conhecer a percepção de assistentes sociais e psicólogos que atuam no Abrigo Tia Júlia, no que diz respeito à manutenção do vínculo familiar e a adoção, de crianças em situação de acolhimento no abrigo, entendendo, portanto, pelas falas desses profissionais, como estes percebem essas duas possibilidades diante da realidade ali vivenciada. No intuito de compreender a visão desses profissionais sobre os temas propostos, procurou-se analisar como se construiu, ao longo da historiografia nacional, toda uma política de acolhimento institucional de crianças, analisando como o público infanto-juvenil foi visto em cada época e como isso influenciou na formação do acolhimento institucional hoje. Os abrigos têm a função de acolher esses indivíduos, os quais sofrem, não só pelo “abandono”, que muito embora seja, no imaginário da sociedade, o principal fator pelo qual crianças se encontram em situação de acolhimento no Brasil, existem outros fatos que implicam no acolhimento, considerando que a questão social está constantemente presente na vida dessas crianças e de suas famílias, levando-as a entrar e até mesmo permanecer por vários anos nessas instituições. Ressalta-se que grande parcela de crianças acolhidas ainda mantêm vínculos com seus familiares, ou estão, por meio da equipe da instituição, em processo de manutenção dos vínculos, enquanto uma outra parcela bem menor aguarda a adoção. Embora considerando a adoção algo de suma importância e por ter se constituído uma possibilidade real no campo social e jurídico nacional, as leis ainda entendem que o primeiro trabalho a ser realizado com a criança deve ser em princípio o de tentar mantê-la no seio da família e da comunidade de origem e somente após todas as tentativas esgotadas seja eleito o caminho da adoção, considerando assim o que prevê o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), de 1990 e o Plano Nacional de Promoção, Proteção e Defesa do Direito de Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária (PNCFC), de 2006. Portanto, neste contexto, no qual a adoção é vista como última possibilidade, e apenas quando esgotadas todas as tentativas de realocação no seio familiar, torna-se imperativo compreender como essas duas possibilidades pesam 13 nas decisões dos profissionais que trabalham em instituições de acolhimento infantil. Diante do exposto, além da busca de tal compreensão outras indagações pertinentes a esses dois fatores surgem e são consideradas para fins da análise a que se propõe este estudo. Para tanto, este trabalho estrutura-se em três capítulos. O primeiro destaca o processo metodológico para a elaboração do estudo, iniciando com a familiaridade da pesquisadora com o tema; como se deu a escolha, a qual só foi possível pelo tempo e as vivências do processo de estágio obrigatório referindo-se ainda ao campo da escolha para a realização da pesquisa. Em seguida trata-se da metodologia. Como foi realizada a pesquisa, a fim de compreender os questionamentos, descrevendo de forma clara e expositiva passo a passo da metodologia utilizada na construção do trabalho. Após isso, foi feito um breve histórico sobre o Abrigo Tia Júlia, finalizando o capítulo com uma caracterização dos profissionais entrevistados. O segundo capítulo, cujo título é “Acolhimento institucional e adoção no Brasil”, faz primeiramente um resgate do contexto geral da adoção, até chegar à realidade nacional, para em seguida tratar do acolhimento institucional, também no caso do Brasil, ressaltando as formas de acolhimento, em conformidade com as casas existentes em cada época. Por fim, a abordagem se volta para as novas leis, no que se refere ao surgimento e objetivos, a exemplo da “Nova Lei da Adoção”; ECA e como marco regulatório, o PNCFC, que, em meio à contemporaneidade, propõe para a criança em situação de acolhimento institucional outras perspectivas de vida, a real efetivação de seus direitos, priorizando a sua vontade, em detrimento de todos os outros aspectos. O terceiro capítulo apresenta a análise dos dados colhidos na pesquisa, fazendo um link principalmente da percepção dos profissionais entrevistados, sobre a manutenção dos vínculos familiares e também sobre a adoção e outros fatores diretamente ligados às duas possibilidades. Nas considerações finais, por meio de análise crítica, compreende-se a percepção dos profissionais sobre o tempo de permanência de crianças na instituição de acolhimento e a questão da manutenção do vínculo, a qual deve ser trabalhada nas duas perspectivas. 14 1 PROCESSOS METODOLÓGICOS 1.1 Aproximação com o Tema O interesse pelo tema se deu ao longo de todo o curso de Serviço Social, à medida em que se estudava as áreas de atuação do assistente social, pois até então não eram conhecidas. No decorrer do curso, aprofundava-se o conhecimento sobre as áreas de atuação do profissional, as quais são de grande importância para sua prática diária, proporcionando, assim, a reflexão sobre sua intervenção na sociedade, onde são crescentes as diferenças sociais. São nestas que o profissional, pelo seu processo investigativo e interventivo, atua. De Acordo com Yazbek (2004) estes fatos sociais ocorrem na contemporaneidade de forma agressiva e o assistente social tem papel fundamental nas transformações que permeiam estas desigualdades. Para uma análise do Serviço Social na atualidade, é necessário situá-lo no contexto de transformações societárias que caracterizam a sociedade brasileira dos últimos anos – em tempos de globalização. Tempos de em que a economia e o ideário neoliberal intensificam as desigualdades sociais, com suas múltiplas faces. Tempos em que crescem as massas descartáveis, “sobrantes” e à margem dos direitos e dos sistemas de proteção social (YAZBEK, 2004, p.18). A identificação com o tema pesquisado também se deve em razão do estágio obrigatório realizado, tendo em vista que em meio a diversas áreas de atuação, as questões que dizem respeito à criança sempre despertaram maior interesse, por ser a mesma um ser em construção, com direitos e deveres legitimados e que, portanto, deve ser alvo de maior atenção pela família, ou na falta dela, pelo Estado, por meio de políticas públicas efetivas e eficazes, para que aquele ser assuma o seu espaço na sociedade de forma digna. Dentre as áreas ofertadas, optou-se pelo estágio na área da saúde, campo que chamava atenção pela curiosidade em saber como se realizavam os encaminhamentos; se existia acompanhamento dos indivíduos que necessitavam dos serviços de saúde e como se dava a intersetorialidade com outras áreas de atuação do profissional de serviço social. Durante todo o processo de vivência do estágio eram diversas as indagações que surgiam, mas a que mais causava inquietação e indignação era sobre o recebimento de crianças vítimas de violência, sexual ou gerada por outros meios; muitos por “abandono” dos pais, dentre tantas outras. 15 Como exemplo de situação marcante no decorrer do estágio pode-se citar o primeiro caso, de um recém-nascido lançado à parede por sua mãe biológica. Outro caso marcante aconteceu com um menino de apenas 13 anos de idade, que cometia assaltos e foi abandonado pelos pais e ameaçado de morte e, por último, o de uma menina de 10 anos, violentada pelo pai desde os 7 anos, sendo que as outras filhas mais velhas já haviam saído de casa devido a mesma violência cometida pelo pai. Em meio a tantos problemas que ali surgidos, a questão da criança despertou maior interesse e comoção, o que causava indagações diversas em relação à criança e à sua família, percebendo aos poucos os dramas de tantos seres humanos que ali estavam, não apenas para uma consulta médica, mas pela necessidade de um maior apoio, em virtude de questões recorrentes, por conta da violação de direitos sofrida muitas vezes na própria família. Dentre todos os fatos que aconteceram no período de estágio, os que mais intrigavam eram aqueles ligados às crianças e suas famílias. Muitas vezes pensava-se que o que deveria acontecer era que aquela criança nunca mais voltasse para aquela lar, visto que o seu direito era constantemente violado no ambiente em que as pessoas de sua convivência deveriam lhe proteger. Neste sentido, cabe ressaltar o que institui o ECA: É dever da Família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde,à alimentação, à educação, ao esporte,ao lazer, à profissionalização,à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária (Art.4 ECA). As indagações eram muitas e ao mesmo tempo surgiam questionamentos diversos em torno daquelas crianças e de sua família. Apesar do sentimento de indignação por assistir ao sofrimento e à violação dos direitos a que a criança era submetida, pensava-se também na situação social dessas famílias. O caso da menina de 10 anos acima citado foi o que mais causou comoção, tanto profissional quanto pessoal, por nunca haver presenciado um fato de tal gravidade. Então, tal situação causou estranhamento, fazendo surgir alguns questionamentos, como: porque o pai dessa menina fez isso? Como entender os motivos que levaram o próprio pai a violentar a filha, a ponto de deixar daquela forma um ser gerado, criado e educado por ele? Logo após o atendimento, era necessário conseguir um abrigo para que a criança fosse encaminhada, pois o pai havia dito que se ela retornasse mataria 16 todos os outros que a trouxessem de volta. Nesse contexto, surgiu a pergunta sobre qual o trabalho que seria realizado com aquela criança. Para onde ela deveria ir naquele momento? Então, descobriu-se que ela seria levada para um abrigo, e a partir do momento em que fosse acolhida, seria realizado um trabalho para fazê-la retornar à família, na tentativa de manter seus vínculos familiares. Então, como não havia um prévio conhecimento nem aproximação do trabalho realizado em um Abrigo, iniciou-se a busca por autores que tratassem da temática relacionada à criança em situação de acolhimento. Durante o processo de leitura, com o despertar para as questões que envolviam o assunto, e em busca de conhecer na prática o trabalho realizado com a criança, através de contato com assistentes sociais conhecidos, descobriu-se que no abrigo o trabalho realizado com maior frequência é o da tentativa de manutenção do vínculo familiar e este, não sendo possível, após esgotadas todas as possibilidades, tanto com os pais quanto com a família ampliada, ocorre a destituição do poder familiar, tornando-se a criança assim apta para adoção. Após esta exposição de fatos, justifica-se aqui a identificação com a temática da criança e o início da busca por uma melhor compreensão da problemática, procurando compreender principalmente o olhar e a percepção do profissional que trabalha diretamente tanto com a criança abrigada quanto no que diz respeito à adoção e/ou manutenção do vínculo familiar. A ideia sobre o tema foi amadurecendo pela vivência e pelas histórias de vida de crianças violentadas por membro de suas famílias e o desejo de trabalhar somente a adoção, pois não havia como vislumbrar a possibilidade dessas crianças voltarem a viver naquele ambiente. Assim, inicialmente pensou-se em realizar a pesquisa no âmbito do fórum, mas em meio a um maior embasamento teórico, percebeu-se que autores e leis abordavam, antes mesmo da adoção, a tentativa dessas crianças continuarem no seio de suas famílias biológicas. Então, deveria também haver o entendimento de que a manutenção do vínculo com a família biológica era um dos primeiros passos do trabalho realizado pelos profissionais com a criança, até que a mesma passasse a fazer parte do cadastro das que poderiam ser adotadas, quando a família perdesse o poder sobre a mesma, por diversos motivos, ou até mesmo que a tentativa de retorno àquela família não obtivesse êxito. Embora veja na adoção algo de extrema relevância e de suma importância, esse é um dos meios pelo qual a criança volta a se integrar à família 17 que deve assumi-la. Era necessário entender também o trabalho de manter esse sujeito no seio de sua família biológica, pois todos os aspectos em uma família devem ser levados em conta. Portanto, esta outra possibilidade, que caminha lado a lado com a adoção, deveria também ser abordada na pesquisa. Assim, desenvolveu-se um processo de compreensão e análise em torno das duas perspectivas que estão diante da vida das crianças, e a mudança de local para a realização da pesquisa foi imediata. Entretanto, era necessário uma instituição capaz, através de seus profissionais, de proporcionar o entendimento acerca da percepção em torno dos diversos aspectos da vida de crianças em situação de acolhimento. Na busca pela instituição a ser pesquisada, decidiu-se por uma que estivesse sob a gestão do Estado, que possui apenas um abrigo para acolher crianças em espera da adoção, e que também trabalha com a manutenção do vínculo familiar com tantas outras que não foram destituídas do poder familiar. Assim sendo, a escolha recaiu sobre o Abrigo Tia Júlia, unidade destinada ao atendimento de crianças de ambos os sexos, na faixa etária de 0 a 7 anos, sendo que a maioria delas encontra-se na situação de manutenção de vínculo, e outra para adoção. Procurou-se ainda saber sobre o trabalho realizado pelo abrigo e descobriu-se o que e como a instituição realizava o trabalho de acolhimento, de como se dava sua interação com outros equipamentos e sua capacidade de atendimento. Diante disso, foram feitos contatos com os profissionais da instituição que atuavam diretamente com o trabalho objeto deste estudo. O primeiro contato foi com a assistente social, explicando o tema trabalhado e como tal, seria desenvolvido e como se daria a entrevista. Registre-se ainda que a técnica foi bastante receptiva àquela ocasião. As entrevistas com os profissionais eram imprescindíveis para concretizar a pesquisa, sendo suas falas de suma importância para a análise que desejava realizar. Posteriormente foi feito novo contato com a instituição, sendo encaminhado o projeto para análise e as perguntas do questionário para aprovação da entrevista, por parte do corpo técnico do abrigo. A partir de então, as assistentes sociais colocaram-se à disposição para informações, tendo aí o início do processo de entrevistas. 18 1.2 Metodologia No referido estudo busca-se compreender através das falas de profissionais que atuam no abrigo, a percepção do mesmos sobre a manutenção do vínculo familiar e da adoção de crianças acolhidas no abrigo Tia Júlia, local onde se realizou a pesquisa. A entrevista foi realizada com perguntas semi-estruturadas para que fosse possível obter através das respostas informações importantes, possibilitando a formação do trabalho. De acordo com os estudos de Macedo (2006) a entrevista permite um encontro ou diversos encontros que possibilitem ao pesquisador e atores envolvidos na pesquisa relatar, cara a cara, com sua própria linguagem e percepção, a forma como a mesma percebe sua vida, suas experiências profissionais ou não, e sobre as instituições das quais fazem parte. No entender de Gauthier (1998), a entrevista semi-estruturada é: [...] também estruturada a partir de uma ordem preestabelecida pelo entrevistador. A diferença é que esta entrevista além de contar questões fechadas e diretas inclui um número pequeno de perguntas abertas, nas quais o entrevistador se utiliza de certa liberdade (GAUTHIER, 1998, p. 31). O estudo desenvolveu-se por meio de pesquisa bibliográfica, documental e de campo, e assume a abordagem qualitativa, envolvendo o Abrigo Tia Júlia, unidade de análise que viabiliza investigar a percepção dos profissionais do Serviço Social e de Psicologia sobre a manutenção do vínculo familiar e da adoção. Para Martinelli (1996, p. 46): “a pesquisa qualitativa apresenta seu caráter inovador, como pesquisa que se insere na busca de significados atribuídos pelos sujeitos às suas experiências sociais [...]”. Para a efetivação das entrevistas, utilizou-se como instrumental um questionário destinado aos profissionais do abrigo, o qual envolveu três blocos, sendo o primeiro destinado a caracterizar os atores envolvidos na pesquisa. A escolha do instrumental se deu em virtude de suas vantagens, que, segundo Gil (2008): Pode ser definido como uma técnica de investigação social composta por um conjunto de questões que são submetidas a pessoas com propósito de obter informações sobre conhecimentos, crenças, sentimentos, valores, interesses, expectativas, aspirações, temores, comportamentos presentes e passados (GIL, 2008, p. 101). A pesquisa foi acontecendo de forma lenta, devido a disponibilidade dos profissionais em receber a pesquisadora. Iniciou-se com uma busca na Secretaria 19 do Trabalho e Desenvolvimento Social (STDS), órgão do Governo do Estado, responsável pela unidade de abrigo onde se deu a pesquisa, visando identificar os profissionais atuantes naquela instituição, e também se havia um histórico do Abrigo. No local foi concedido apenas um resumo da história da casa. Tal resumo refere-se à capacidade de atendimento, dentre outros aspectos importantes. Embora seja o assistente social um dos principais atores desta pesquisa, foram ainda envolvidos os profissionais de psicologia, pois estes também têm ligação direta com a criança, tanto na manutenção do vínculo familiar como também com adoção. Entretanto, no primeiro contato foi informado que na instituição só havia 1 profissional de psicologia e 3 assistentes sociais. Logo a seguir, e mediante a disponibilidade do profissional, a primeira entrevista foi realizada e depois a pesquisadora passou um dia no abrigo para acompanhar de perto o trabalho dos profissionais na instituição, para conhecer melhor sua rotina no recebimento, atendimento e acolhimento das crianças. 1.3 Unidade de Abrigo Tia Júlia A Unidade está sob a responsabilidade do Estado do Ceará e foi fundada em 6 de fevereiro de 1957, pelo então governador César Cals, dando à instituição o nome de “Casa da Tia Júlia”, em homenagem a Júlia Giffone, por reconhecimento ao trabalho que esta realizava junto à Assistência Social. Funcionou nesta mesma época em regime de semi-internato, oportunizando assim, às mães, ingressarem no mercado de trabalho. Em 1994 foi reformada e reinaugurada, em uma nova gestão, no governo de Francisco Paula Rocha Aguiar, passando a ser chamada, em decorrência dos princípios do ECA, Abrigo Tia Júlia, adotando o regime de internato. No mês de setembro de 2002 foi beneficiada pelo “Projeto Casa da Criança”, sofrendo uma nova reforma com o apoio da ONG, possibilitando a construção de uma nova estrutura física, com espaço físico adequado ao desenvolvimento das crianças atendidas. Atualmente o abrigo tem capacidade de atender 80 crianças de ambos os sexos, na faixa etária de 0 a 7 anos, oriundas da capital e do interior, que se encontrem em situação de ameaça ou violação de direitos, na condição de “abandono” ou temporariamente impossibilitadas de permanecer com a família. A maioria dessas crianças são encaminhadas para a unidade de abrigo através do 20 Conselho Tutelar e/ou do Juizado da Infância e da Juventude de Fortaleza. O principal objetivo da casa é proporcionar um atendimento de qualidade à criança durante seu período de permanência na instituição, buscando, acima de tudo a recuperação psicológica e a manutenção dos vínculos familiares e, quando esgotadas todas as possibilidades, encaminhá-la para uma família substituta através da guarda, tutela ou adoção. O abrigo Tia Júlia é mantido pelo Governo do Estado do Ceará, sendo sua gestão da competência da Secretaria do Trabalho e Desenvolvimento Social do Estado, estando inserido nas ações da Coordenadoria de Proteção Social Especial (PSE), precisamente na Célula de Alta Complexidade. Utiliza também recursos da comunidade, integrando ações de atendimento às crianças em hospitais, escolas, igrejas, centros comunitários e outros equipamentos. Internamente atende a crianças nas áreas de saúde preventiva e terapêutica, desenvolve atividades pedagógicas e recreativas, além de manter equipe técnica multidisciplinar, realizar acompanhamento sistemático à família, tendo como objetivo primeiro a recuperação e a manutenção do vínculo familiar. O abrigo ainda atende a um número significativo de crianças com deficiência, que apresentam problemas neurológicos e físicos, com diversas patologias associadas, que ao serem acolhidas passam a vivenciar uma situação de completo “abandono” por parte de suas famílias, ficando assim sem perspectivas de desligamento, uma vez que não existe interesse de adotantes por crianças com tal problemática. Acredita-se que a desinstitucionalização das crianças tem como objetivo principal favorecer o seu crescimento saudável, oportunizando-lhes novas relações afetivas, seja com o retorno à família ou em um novo ambiente familiar, abrindo-lhes possibilidades no contexto comunitário. 1.4 Caracterização dos Profissionais Entrevistados Aqui traça-se uma breve caracterização dos profissionais do Serviço Social e de Psicologia inseridos na equipe multiprofissional do Abrigo Tia Júlia, tendo estes uma maior ligação com as crianças acolhidas, suas famílias, ou com as famílias adotivas. Uma vez que é de suma importância conhecer o perfil dos atores envolvidos nesta pesquisa para a compreensão do tema em estudo, busca-se 21 fornecer apenas informações relevantes. De acordo com os princípios éticos, alterou-se o nome dos profissionais que contribuíram de forma voluntária com este trabalho, a fim de garantir seu anonimato, utilizou-se nome de flores para referenciar os profissionais envolvidos na pesquisa. O trabalho realizado na unidade de acolhimento é distribuído entre uma equipe multiprofissional, composta por médicos, enfermeiros, advogados, pedagogos, assistentes sociais e psicólogos, sendo estes dois últimos profissionais os que têm maior ligação com a problemática de manutenção de vínculo e/ou adoção. Embora com capacidade para atender 80 crianças, entre janeiro a novembro de 2012 encontravam-se acolhidas 93 crianças de ambos os sexos, ficando estas sob a responsabilidade dos profissionais de serviço social e psicologia. Hoje, o Abrigo tem 3 assistentes sociais e 1 psicólogo para realizar este trabalho específico. Cada assistente social trabalha por um período de 6 horas, sendo duas na parte da manhã e uma à tarde. A psicóloga trabalha durante toda semana, com uma carga horária de 8 horas/dia. Jasmim é casada e tem 1 filho. É assistente social, formada pela Universidade Estadual do Ceará há 5 anos. É pós-graduada, especialista na área da criança e do adolescente. Trabalha na unidade de abrigo há 6 anos e 6 meses, contando o tempo de estágio obrigatório, realizado também na instituição. Rosa é formada em psicologia há 3 anos. É solteira, pós-graduada, especialista na área de saúde mental. Atua na instituição há 3 anos e 5 meses, tendo realizado estágio no mesmo abrigo. Violeta é casada. Tem 2 filhos. É bacharel em Serviço Social há 25 anos, pela Universidade Estadual do Ceará, não possui pós-graduação. Atua na instituição há 3 (três) anos. Participa de órgãos de defesa e efetividade das leis que protegem a criança em situação de rua e de acolhimento institucional. Alfazema é solteira. Bacharel em Serviço Social, formada pela Universidade Estadual do Ceará há 30 anos. Seu tempo de serviço na instituição é de 14 anos. Possui especialização, MBA em saúde pública e saúde da família. As entrevistas realizadas foram de fundamental importância para o desenvolvimento da pesquisa, possibilitando assim uma maior compreensão sobre os questionamentos que envolveram o tema pesquisado. Feitas estas considerações, o estudo avança abordando no próximo capítulo o acolhimento institucional e a adoção no país. 22 2 ADOÇÃO E ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL NO BRASIL A adoção e seus critérios mudaram conforme as leis e o tempo, e no entender de Weber (2007, p.68) “a adoção é a criação jurídica de um laço de filiação entre duas pessoas”. O presente capítulo objetiva compreender a historicidade da adoção1 e uma vez que o acolhimento também não é uma possibilidade recente, percorre-se o seu trajeto. Por fim, o último item do capítulo aborda os marcos legais da atualidade. Tendo em vista que para entender o histórico da adoção no Brasil é importante que se faça inicialmente um breve histórico sobre o instituto da adoção em outras sociedades, tal enfoque se apresenta no primeiro item deste capítulo, a seguir. 2.1 Percurso Histórico da Adoção “[...] procriar é uma condição dada pela natureza; criar é uma responsabilidade no âmbito da ética entre os homens [...]. Procriar é fisiológico; criar é afetivo” (SCHETTINI FILHO, 1998, s/p). A adoção teve durante um longo período histórico diversas mudanças tanto no aspecto jurídico quanto no social, levando em conta a realidade do momento e a sociedade que a vivenciava, devendo-se assim entender como ela se construiu ao longo do tempo2. De acordo com Weber (2007, p.68) “a adoção foi disciplinada pelo código de Hamurabi (1728-1686 a. C). Tornou-se conhecida no Egito, Caldéia e Palestina, e conhecida pelos Romanos e pelos Gregos. Neste período os privilegiados eram apenas os adotantes e não os adotados”. Na antiguidade a adoção tinha ligação direta com a religião, pois as civilizações antigas acreditavam que os seres que estavam vivos dependiam da proteção total dos que já haviam morrido, “o pai transmitia a vida ao filho, e ao mesmo tempo, a sua crença, o seu culto, o direito de manter o lar, de oferecer o repasto fúnebre, de pronunciar as formulas da oração” (GRANATO, 2010, p.33). 1 A adoção se constitui instituto antigo, existente desde os povos Babilonenses, Hebreus, Gregos e Romanos, porém; atualmente, exerce função diversa,fundada na doutrina da ”proteção integral” da criança e do adolescente (MARTINS, Ricardo Ferreira. Evolução e atual significado da adoção. Disponível em: <http://www.urutagua.uem.br//02adocao.htm>. Acesso em: 02 de dez. 2012). 2 Autores como Paiva (2004) e Weber (1999), resgatando a adoção nas diferentes fases da história, afirmam que essa prática recebeu vários significados no decorrer dos tempos, desde religiosos até políticos, sendo valorizada ou não, conforme a cultura e o modo de pensar de determinada época (MAUX, Ana Andréa Barbosa e DUTRA, Elza. A adoção no Brasil: Algumas reflexões. Disponível em: <http://www.revispsi.uerj.br/v10n2/artigos/html/v10n2a05.html>. Acesso em: 15 de nov. 2012. 23 A adoção na antiguidade atendia aos anseios de ordem religiosa, pois as civilizações primitivas acreditavam que os vivos eram protegidos pelos mortos. A religião só podia propagar-se pela geração. O pai transmitia vida ao filho e, ao mesmo tempo, a sua crença, o seu culto, o direito de manter o lar, de oferecer o repasto fúnebre, de pronunciar as fórmulas da oração. Assim, adotar um filho era, portanto, garantir a perpetuidade da religião doméstica, era a salvação do lar pela continuação das oferendas fúnebres pelo repouso dos antepassados. Não havia sequer a preocupação com os laços afetivos entre adotante e adotado (WEBER, 2009. p 69). Conforme as imposições da religião “adotar um filho era, portanto garantir a perpetuidade da religião doméstica era a salvação do lar pela continuação das oferendas fúnebres pelo repouso dos antepassados“ (WEBER, 2007, p.54). Portanto, observa-se que nesse período a ênfase se voltava para o adotante, pelo interesse em atender além de seus interesses religiosos, a perpetuação do culto doméstico, conforme salienta Nakagaki (2004): Isto acontecia porque a preocupação fundamental da adoção na antigüidade era de cunho religioso. Acreditava-se, naquela época, que cabia aos vivos a função de assegurar o bem estar de seus antepassados através de preces, orações e ritos religiosos. Assim, quem não possuísse filhos, não teria quem realizasse as suas cerimônias fúnebres. Tendo um filho, mesmo que adotado, o culto doméstico era continuado e a família não sofria com a desgraça de sua extinção. O importante era nunca deixar a família sem uma representação de seu culto em vida (NAKAGAKI, 2004, p.14). Durante um determinado período da Idade Média a adoção caiu em desuso, o que acontece no Direito Canônico 3, como afirma Weber (2007, p.68), “nesta época a igreja manifestava uma série de cautela, os sacerdotes viam a adoção como uma forma de transgredir o casamento e a uma filiação ‘ilegítima’ além de ser uma possibilidade de reconhecer filhos adulterinos ou incestuosos o que era proibido”. Neste período,4 o índice de adoção foi mínimo, pois o sentimento dos adultos em relação às crianças era algo desconhecido. Conforme Áries (1978, p.186) “na idade média a criança era reconhecida como um grupo de segunda categoria, uma espécie de adulto em miniatura, um ser imperfeito, que precisava sair do estado infantil para merecer algum respeito”. Nessa época não existia um 3 Neste período histórico, registram os autores que a adoção caiu em desuso “até que desapareceu”, só resurgindo com o advento do Código de Napoleão (SILVA FILHO, Artur Marques da. Adoção. Regime jurídico, requisitos, efeitos, inexistência, anulação. 3 ed. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2011, p. 27). 4 A sociedade era estática (com pouca mobilidade social) e hierarquizada. A nobreza feudal era detentora de terras e arrecadava impostos dos camponeses. O clero tinha um grande poder, pois era responsável pela proteção espiritual da sociedade. A terceira camada da sociedade era formada pelos servos e pequenos artesãos. Os servos deviam pagar várias taxas e tributos aos senhores feudais, tais como: corvéia (trabalho de 3 a 4 dias nas terras do senhor feudal), talha (metade da produção), banalidades (taxas pagas pela utilização do moinho e forno do senhor feudal). Disponivel em: <http://www.suapesquisa.com/idademedia/>. Acesso em: 02 de dez. 2012. 24 “sentimento profundo entre pais e filhos. A família era uma realidade moral e social, mais do que sentimental” 5. Período da história que compreende os séculos XV até XVIII e marcado pela Revolução Francesa, a Idade Moderna foi de fundamental importância para o cenário mundial, pois grandes mudanças ocorridas no mundo estão contidas em seu contexto. Foi neste período que o instituto da adoção retorna e logo após esse período de declínio, tomou nova feição graças a Napoleão Bonaparte (cuja esposa havia se tornado estéril). De acordo com Weber (2007), apesar de vivas oposições a Napoleão Bonaparte, a adoção foi legitimada, passando a ser prevista no Código Civil, sendo a mesma bastante rígida. Segundo a autora, os critérios contidos no código civil tornavam a adoção mais complicada, pois ditava que era permitido a adoção de maiores de 23 anos. O adotado não pertencia à família do adotante, e somente garantia aos mesmos o efeitos de sucessão; o adotante deveria ter mais de 50 anos, ser estéril e ser pelo menos 15 anos mais velho do que o adotado; uma pessoa com menos de 23 anos não poderia ser adotada por testamento se o adotante tivesse criado por pelo menos seis anos antes de sua morte. [...] podemos dizer que graças ao código de Napoleão, a adoção começava a engatinhar para um novo rumo, no atendimento dos interesses do adotado, ou seja, das crianças que não têm uma família. Nas palavras de Napoleão, a adoção é, antes de tudo, uma instituição de beneficência, e o efeito mais feliz será dar crianças àqueles que não as têm, de dar um pai a crianças órfãs, de lugar, enfim, a infância à velhice e à idade viril. Para Napoleão, a adoção deveria imitar a natureza (WEBER, 2009, p. 69). Havia no Código Napoleônico (Código Civil Francês de 1792) 6 quatro tipos distintos de adoção, que eram empregados pela Lei. De acordo com Szanick (1993, p.23) os quatro tipos de adoção eram descritos como: “1. a ordinária, realizada através de contrato, sujeita à homologação por parte do magistrado, a qual concedia direitos hereditários ao adotado, era permitida somente a pessoas maiores de cinquenta anos que não tivessem filhos, exigindo-se uma diferença de idade mínima de quinze anos entre adotante e adotado; 2. a remuneratória, concedida a quem tivesse salvado a vida do adotante, caracterizando-se pela irrevogabilidade; 3. 5 Contudo, um sentimento superficial da criança. Se ela morresse então, como muitas vezes aconteciam, alguns podiam ficar desolados, mas a regra geral era não fazer muito caso, pois uma outra criança logo a substituiria. A criança não chegava a sair de uma espécie de anonimato. Quando ela conseguia superar os primeiros perigos e sobreviver ao tempo da “paparicação”, era comum que passasse a viver em outra casa que não a de sua família (ÁRIES, 1981). 6 O Código Napoleônico possuía fortes propósitos políticos ao restaurar a adoção na França, uma vez que Napoleão necessitava de um sucessor (ALVIM, Eduardo Freitas. A evolução histórica do instituto da adoção (Mimeo). 25 a testamentária, feita através de declaração de última vontade, permitida ao tutor somente após cinco anos de tutela; e 4. a tutela oficiosa ou a adoção provisória, criada em favorecimento a menores, regulando questões de tutela da criança”. Com o decorrer dos anos as leis que antes eram baseadas no Código Romano e Napoleônico, assim chamado entre eles, o mesmo começa a perder suas forças. Diante desse fato Weber (2007) mostra que “a lei americana não foi derivada destas leis já existente suas raízes estão ligadas às leis inglesas que não previam a adoção”. O que emperrava para que a adoção fizesse parte da lei, eram as questões ligadas a herança. Foi então que a partir de 1926 a adoção nasce e passa a ser inserida nos trâmites legais da lei inglesa, e logo em seguida, em 1969, através de um estatuto, esse problema com herança acaba. O que se percebe é que ao longo da história a adoção assumiu diversos aspectos, e para cada momento, se fez importante, seja por meios políticos, psicológicos, jurídicos ou até mesmo religiosos. Na maioria das vezes era utilizada a favor dos adotantes, como foi o caso de Napoleão Bonaparte, citado anteriormente, que por necessidade de um sucessor para assumir seu trono se colocou a favor da adoção criando mecanismos para que tal pudesse acontecer. 2.1.1 A adoção no Brasil No Brasil a adoção esteve presente a partir do período da colonização. Neste momento era ligada a um processo caritativo, no qual os que detinham um poder aquisitivo maior passavam a prestar assistência aos mais pobres e aos seus filhos, sendo que nessa mesma situação as crianças passavam a ser criadas por estas pessoas e assim seriam em meio aos filhos biológicos chamados de “filhos de criação”. Percebe-se que nesse período o que na verdade existia era uma intenção de conseguir mão de obra barata e, em troca, prestar algum tipo de assistência fundamentada nos preceitos da igreja. Segundo Paiva (2004, s/p) “foi através da possibilidade de trabalhadores baratos e da caridade cristã, que a prática da adoção foi construída no país”. Neste contexto não existia um cuidado com a criança, fosse ela necessitada ou “abandonada”. Diversas heranças culturais vieram embutidas na lei para o nosso país, quando em meio ao Código Civil, os que tinham maiores privilégios eram casais impossibilitados de terem filhos. De acordo com Paiva (2004) 26 [...] a primeira vez que a adoção apareceu em nossa legislação foi em 1828, e tinha como função solucionar os problemas de casais sem filhos. Esses processos ocorriam de forma simples, sendo os registros feitos em cartórios e conhecidos como ‘adoção a brasileira. (PAIVA, 2004, s/p). Eiterer (2011) coloca que no Brasil durante o século XVIII, “a religião predominava, e que a agregação da criança a família era um ato caritativo, a criança era percebida como fonte de força capaz de realizar um trabalho”. Sendo que nesta mesma época o Estado volta um olhar para as crianças e por medidas de higienização, busca mudanças de hábitos para que padrões tidos como corretos na época fosse adotados. Nessa fase o Brasil traz consigo uma cultura repressiva com relação às famílias pobres e suas crianças. Segundo Eiterer (2011) "aqueles entendidos na época, como 'abandonados' eram recolhidos em abrigos orfanato, prisões e internatos rurais”. Para a autora as famílias pobres eram estigmatizadas por sua condição, em um período marcado por um viés político no país, que se dizia ser para proteção da infância e dos adolescentes. Posteriormente a adoção foi disciplinada pelo Código Civil brasileiro (Lei 3.071, de 01.01.1916), nos artigos 368 a 378, o qual situava o assunto na esfera das relações privadas e familiares. Em 1920, quando o Brasil passava por uma urbanização européia, tendo como modelo a França, instituiu-se o primeiro Código de Menores (Decreto nº. 17.943-A, de 12 de outubro de 1927), o qual foi elaborado no intuito de recolher e atender aos menores pobres e excluídos socialmente, tendo em vista que retratavam a pobreza da cidade, o que era desagradável aos olhos da elite 7. Fator relevante tratado pelo Código de Menores de 1927 foi a extinção do sistema de “roda dos expostos”, que determinava em seu artigo 15: “A admissão dos expostos á assistência se fará por consignação direta, excluindo o sistema das rodas”. Portanto, o Código inaugurou a proteção legal dos menores abandonados que passaram à tutela do Estado (FALEIROS, 1995, p. 63) 8. Segundo Eiterer (2011) no Brasil “a adoção teve três fases dirigidas à infância em situação de risco, sendo elas, assistência caritativa, filantropia cientifica 7 MORAIS, Edson. Contexto Histórico do Código de Menores ao Estatuto da Criança e do Adolescente. Mudanças Necessárias. Disponível em: <http://www.webartigos.com/artigos/contextohistorico-do-codigo-de-menores-ao-estatuto-da-crianca-e-do-adolescente-mudancas-necessarias/ 19148/#ixzz2E7cyRoaA>. 8 SILVA, Chris Giselle Pegas Pereira da. Código Mello Mattos: um olhar sobre a assistência e a proteção aos “menores”. Artigo disponível em: <http://www.maxwell.lambda.ele.pucrio.br/14406/14406.PDFXXvmi>. Acesso em: 04 de dez. 2012. 27 e assistência a infância”. Num contexto de políticas de bem-estar, segundo Rizzini (2000, p. 66), reacendem, nos anos 1970, os debates em torno da criação de outro Código de Menores e, em 10 de outubro de 1979, foi sancionada a Lei nº. 6.697. Para a autora, uma vez que a nova legislação foi contemporânea ao início da distensão política, o caráter do novo Código era repressivo e retrógrado, corroborando com o pensamento de Vieira (2004), de que o mencionado código visava a punição de menores infratores. De acordo com Maux e Dutra (2010) nesta fase a adoção se dividia em duas formas: a adoção simples e a adoção plena. A primeira tratava de crianças maiores de sete anos até adolescentes menores de 18 anos e que estivessem em situação irregular, já na adoção plena as crianças até os sete anos de idade passavam à condição de filho, sendo o ato irrevogável. O Código de Menores de 1979 não durou muito tempo em virtude das mudanças ocorridas pela abertura política após a era das ditaduras 9. Em meio às intensas articulações políticas e sociais, foi promulgada a Constituição Federal de 1988, trazendo a garantia dos direitos da criança, em seu artigo 227, baseado na Declaração Universal dos Direitos da Criança, posteriormente ordenados pelo ECA (Lei nº. 8.069/90), o qual revoga o Código de 1979 10. O ECA surgiu trazendo diversas mudanças na vida de crianças e adolescentes, e principalmente no que diz respeito à vida de adotantes e adotados. Conforme Vieira (2004) “o ECA será considerado uma verdadeira revolução na forma de conceber e tratar a infância, alargando assim o universo na vida dos que estão para adotar e serem adotados”. No entender de Cabral e Sousa (2004) o ECA nasce: [...] em meio a intensas movimentações e transformações sociais que ocorrem no processo de redemocratização do Brasil e representa, de certa forma, um ícone, um símbolo que traduz um grande passo da sociedade brasileira na luta por direitos humanos e dignidade (CABRAL; SOUSA, 2004). Vale ressaltar ainda que com o surgimento do ECA a institucionalização de crianças e adolescentes passou a ser vista apenas como algo provisório. 2.2 Acolhimento Institucional de Crianças no Brasil 9 “Novos ares inaugurariam os anos 1980, trazendo transformações significativas no campo políticosocial brasileiro, com importantes conseqüências para a legislação relativa à infância” (Rizzini, 2000). 10 CABRAL e SOUSA, 2004 28 Segundo Weber (2007), existem no Brasil milhares de crianças vivendo em instituições e recém-nascidos abandonados em lugares públicos 11. Afirma ainda que é num contexto de pobreza de parte do país que se encontra a maioria dos casos de “abandono” de criança, quais sejam: o “abandono” pela negligência, ou o “abandono” nas ruas, nos lixos, nas maternidades e em instituições (WEBER, 2007, p. 56 - 57). As diferentes definições (psicológica, social, jurídica, dentre outras) acerca do “abandono” de crianças, que ainda é uma realidade no mundo contemporâneo, comungam da preocupação em tornar visível a necessidade da criança, conforme os estudiosos sobre o tema, a exemplo de Miller (1977); Nosella (1992) e Rodrigues (1993). Como observa Ferreira (2007): A partir do século XVII, o abandono recebeu novas formas por meio das instituições que limpavam as ruas muito mais do que protegiam as crianças. No século XIX, na tentativa de resolver o problema do abandono infantil, surgiu a roda dos enjeitados que existiu no Brasil até 1950, sendo o nosso o último país a extingui-la (FERREIRA, 2007, p.56). Durante o século XIX era inaceitável o nascimento de uma criança ilegítima, o que levava a um grande número de abortos, infanticídio ou nascimento clandestino, contribuindo assim para o aumento significativo de crianças abandonadas, constituindo esse fato num escândalo para a sociedade da época. A solução se deu através da criação da “Roda dos Expostos” ou “Roda dos Enjeitados”. Conforme Marcílio (1997): O nome da roda provém do dispositivo onde se colocavam os bebês que se queriam abandonar. Sua forma cilíndrica, dividida ao meio por uma divisória, era fixada no muro ou na janela da instituição. No tabuleiro inferior e em sua abertura externa, o expositor depositava a criancinha que enjeitava. A seguir, ele girava a roda e a criança já estava do outro lado do muro. Puxava uma cordinha com uma sineta, para avisar a vigilante ou rodeira que um bebê acabava de ser abandonado e o expositor furtivamente retirava-se do local, sem ser identificado (MARCILIO apud WEBER, 1997, p. 24) No Brasil as rodas começaram a surgir a partir do século XVIII. A primeira foi instalada na Bahia, em 1726, a segunda no Rio de Janeiro, em 1738; depois em São Paulo, em 1825. Em todas elas, fossem no Brasil, França ou Itália, o índice de 11 Em todo o Brasil 30.546 crianças e adolescentes vivem em abrigos ou estabelecimentos mantidos por Organizações não Governamentais. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/14360:brasil-tem-mais-de-30-mil-criancas-e-adolescentes-vivendoem-abrigos>. Dados de 16/05/2011. Acesso em: 15 de dez. 2012. 29 mortalidade infantil era alarmante, pois não possuíam condições sanitárias adequadas. A esse respeito, Molin (1983) destaca: As instituições criadas para acolher e assistir os abandonados se constituíam em agências para eliminação da infância indesejada (...) a mortalidade nestas instituições era apavorante. Falta ainda ser feita uma pesquisa sobre as suas causas, podendo destacar entre elas a carência qualitativa e quantitativa de alimentação; as condições familiares; as doenças, tanto agudas como crônicas, sobretudo as oftálmicas, gastroenterites, sífilis e infecções gerais. As condições de vida, durante o século XVIII, mas também depois, eram precárias tanto nos grandes como nos pequenos asilos (MOLIN, 1983, p. 115). Manter os filhos naquela época era um desafio constante para as mães, as quais viam na maioria das vezes a roda como única saída, assim como as mães escravas que a consideravam uma solução para livrar seus filhos da escravidão. A roda estimulou também o “abandono”, sobretudo no Brasil Colônia. Entretanto, sua finalidade sofreu distorções, em razão de ser utilizada para mascarar atos sexuais, ao invés de proteger a honra da família e a vida da criança 12. Segundo Iamamoto (1999) a questão social define-se como o [...] conjunto das expressões das desigualdades da sociedade capitalista madura, que tem uma raiz comum: a produção social é cada vez mais coletiva, o trabalho torna-se mais amplamente social, enquanto a apropriação de seus frutos torna-se privada, monopolizada por uma parte da sociedade (IAMAMOTO, 1999, P.27). A proliferação das indústrias no século XX ocasionou o fenômeno chamado de êxodo rural, ou seja, a saída de milhares de famílias brasileiras do campo (zona rural) para as cidades, em busca de trabalho nessas indústrias, com o objetivo de melhoria nas condições de vida. Consequentemente, houve um crescimento das cidades em razão do aumento populacional, ocasionando também o aumento dos problemas urbanos como desemprego, falta de moradia, alimentação, esgoto e água tratada. A jornada de trabalho nas fábricas para quem nelas conseguia ingressar era de 12 horas diárias, e os filhos desses pais e mães trabalhadores passaram a ficar sozinhos em casa e posteriormente passaram a ocupar as ruas. Assim, observa-se que a questão da exclusão social se fez presente nesse contexto do crescimento industrial no país, onde as camadas mais 12 Fundada para proteger a honra da família colonial e a vida da infância, a Casa dos Expostos terminou por obter um efeito oposto ao inicialmente previsto. Dispondo da roda, homens e mulheres passaram a contar com um apoio seguro para suas transgressões sexuais. Estavam certos de que podiam esconder os filhos ilegítimos em local onde seriam bem tratados. De protetora da honra, a Casa tornou-se incentivo à libertinagem (COSTA, 1989, pp. 164/165). 30 desfavorecidas social e economicamente não dispunham das condições mínimas para uma vida digna. Tais acontecimentos, como parte do processo de industrialização, ocasionaram tensões sociais, o que resultou num aumento desordenado da população, marcado pela condição de miséria e consequentemente causou o surgimento de doenças e epidemias, tendo em vista o grande número de prostitutas, mendigos, doentes, marginais, camponeses e crianças que vagavam pelas ruas (SANTOS, 2010). Portanto, a grande maioria das crianças abandonadas no início do século XX vivia nas ruas, tanto pelos motivos expostos quanto para exercer atividades que complementassem a renda da família. Hoje ainda é possível observar várias crianças vendendo balas, doces e outros produtos nas ruas para ajudar na renda familiar. Nos semáforos das ruas, milhares de crianças são também usadas por adultos para pedir dinheiro, tornando-se muitas vezes moradores de rua. Muito embora todo o aparato legal vigente no país e todos os esforços empreendidos no sentido de assegurar garantias às crianças, ainda hoje milhares sofrem diversas formas de privação, “abandono”, sendo que uma grande parcela encontra-se em abrigos, à espera da adoção ou até mesmo do retorno às suas famílias de origem. Do que foi exposto, a compreensão que se tem diante da questão social relativa à pobreza, que gera o “abandono” de crianças, é que as instituições acolhedoras surgem fazendo parte de um processo histórico. Foram criadas para suprir as necessidades da sociedade e não para atribuir uma melhor qualidade de vida e efetivar de fato seus direitos. Pilotti e Rizzini (2011) afirmam que o primeiro órgão federal responsável pelo controle da assistência social, oficial e privada no Brasil, surgiu com a criação do SAM (Sistema de Assistência a Menores), em 1941, subordinado ao Ministério da Justiça, sem qualquer autonomia financeira e independente do Juizado de Menores. O sistema visava ao atendimento de “menores abandonados” e “desvalidos”, por meio de encaminhamento às instituições oficiais e particulares conveniadas com o governo. Através da Lei 4.513, de 01/12/1964, cria-se a Fundação Nacional do Bem Estar do Menor (FUNABEM), em substituição ao SAM, com o objetivo de formular e implantar a Política Nacional do Bem Estar do Menor em todo o território 31 nacional13. A criação da FUNABEM e das FEBEMs estaduais contribuiu para a intensificação da prática da institucionalização, pois sob o argumento de que nos grandes internatos os infantes carentes estariam mais bem assistidos do que nas respectivas famílias, as internações ampliaram-se significativamente (FERREIRA; BITTENCOURT, 2009, p. 140). Segundo Ferreira (2007, p. 56), “o Brasil foi o primeiro país a estabelecer leis próprias para crianças, mas diversas crianças ainda continuam nessas instituições, sem saber o que é ter uma família, pois a maioria ainda permanece ao poder familiar”, sendo essa uma das causas de crianças permanecerem por muito tempo nos abrigos sem poderem ser adotadas. Pela legislação que vigorou no Brasil de 1927 a 1990, o Código de Menores, particularmente em sua segunda versão, todas as crianças e jovens tidos como em perigo ou perigosos (por exemplo: abandonado, carente, infrator, apresentando conduta dita anti-social, deficiência ou doente, ocioso, perambulante) eram passíveis, em um momento ou outro, de serem enviados às instituições de recolhimento. Na prática isto significa que o Estado podia, através do Juiz de Menor, destituir determinados pais do pátrio poder através da decretação de sentença de “situação irregular do menor”. Sendo a “carência” uma das hipóteses de “situação irregular”, podemos ter uma idéia do que isto podia representar em um país, onde já se estimou em 36 milhões o número de crianças pobres (ARANTES, 1999, p.257). As instituições que abrigam crianças, independentes de estarem para adoção ou não, devem seguir preceitos contidos nas leis que protegem crianças e adolescentes, devendo preservar os vínculos familiares e reintegrá-las em uma família substituta, caso todas as possibilidades de manutenção do vínculo tenham sido esgotadas. De acordo com a Nova Lei da Adoção (Lei 12.010, de 03/08/2009), em seu artigo 19, “toda criança ou adolescente inserido em programas de acolhimento familiar ou institucional terá sua situação reavaliada no máximo, a cada 6 meses, devendo a autoridade judiciária competente, com base em relatório elaborado por equipe interprofissional ou multidisciplinar, decidir de forma fundamentada pela possibilidade de reintegração familiar ou colocação em família substituta, devendo nesta ferramenta analisar a situação dos indivíduos que se encontram em situação de acolhimento”. Segundo Ferreira (2007, p. 57) todos têm direito à convivência familiar e apesar da adoção não constituir solução para diversas problemáticas, tem-se 13 A FUNABEM tinha como missão cuidar para que a massa crescente de “menores abandonados” não se transformasse em alvo fácil do comunismo e das drogas (PILOTTI; RIZZINI, 2011). 32 “tornado um caminho possível e de sucesso”. Adotar hoje não é mais uma caridade, é na verdade a luta pelo direito da criança e do adolescente de ter um lar, pois embora a adoção não seja de fato o remédio especifico para a cura do “abandono” ou de outros problemas, vem se tornando para a vida dessas crianças paliativos necessários capazes de solucionar diversos problemas agregados ao “abandono” e à institucionalização. 2.3 Os Marcos Legais da Atualidade A história do abrigamento e da adoção tem percurso extenso no Brasil e se faz presente desde a colonização. O objetivo deste item consiste na abordagem dos marcos legais vigentes e inicia-se pelo ECA e sua nova doutrina, passando em seguida para as considerações sobre o PNCFC. Tais dispositivos legais proporcionaram mudanças significativas no que se refere à forma de perceber tanto a criança quanto sua família. 2.3.1 Nova doutrina do ECA De acordo com art. 5º do ECA, “[...] nenhuma criança será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punindo na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais”. Baseado no fundamento de que o atendimento básico para o desenvolvimento saudável da criança e do adolescente devem ser assegurados pelo Estado (artigo 54, incisos I ao VII), o ECA rege-se por diversos princípios orientadores, previstos em seus próprios artigos. Dentre eles o da prevenção geral (artigo 70); o da prevenção especial (artigo 74); o de atendimento integral (arts. 3º, 4º e 7º); o da garantia prioritária (art. 4º, a, b, c, d); o da proteção estatal (art. 101); o da prevalência dos interesses da criança e do adolescente (artigo 6º); o da sigilosidade (artigo 143); o da gratuidade (artigo 141, §1º e §2º); o da reeducação e reintegração (artigo 119); o da garantia prioritária (artigo 4º); o da indisponibilidade dos interesses da criança e do adolescente (artigo 27) 14 . Com o surgimento do ECA, a adoção tomou novas proporções e novos critérios, leis foram criadas e até mesmo modificadas. Durante um extenso período 14 Disponível em: <http://www.fontedosaber.com/direito/estudos-sobre-o-estatuto-da-crianca-e-doadolescente.html>. Acesso em: 26 de nov. 2012. 33 histórico percebe-se que a adoção passou por diversas mudanças, mas o que na verdade foi de grande valia em torno deste instituto foi a construção de leis que favorecem e protegem especificamente a criança, vítima ao longo das décadas de julgamento e exclusão. É preciso entender que a adoção não vai acabar com as diversas causas que fazem com que crianças estejam em situação de acolhimento ou até mesmo de “abandono”, mas proporcionar-lhes uma nova família. O maior passo que o Brasil deu foi referente à criação de uma política pública, que defendesse e valorizasse a criança. Criado em julho de 1990, através da promulgação da Lei nº. 8069/90, o ECA trouxe uma nova roupagem à vida e aos direitos ligados a criança e adolescentes, instituindo que é dever da família, da sociedade e do poder publico assegurar a convivência familiar e comunitária para a criança e o adolescente. É dever da família, da comunidade,da sociedade em geral e do poder público assegurar com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referente à vida,à saúde,à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização à cultura,à dignidade, ao respeito, “libertação” e à convivência familiar e comunitária (Art 4, 1990). De acordo com o ECA (Art.23, 1990) “a falta ou a carência de recursos materiais não constitui motivo suficiente para a perda ou suspensão do poder familiar.” isso implica que por meio desta lei a mudança acontecesse de forma imediata, não mais se evidenciando o que era tão banal e comum em períodos passados Com essa nova lei o que se compreende é que não é mais porque a família é pobre que seus filhos são retirados das mesmas e colocadas em abrigos para serem adotados. O que deve acontecer nesses casos é de uma maior participação do Estado que vise a garantia, por meio de auxilio e por outros programas, capazes de suprir as necessidades diversas da vida desta família e de sua prole. A aprovação do Estatuto trouxe novos moldes para adoção. Nesta lei aboliu-se a adoção simples como era o caso do Código Civil. Agora existe apenas a adoção plena. Isso torna a criança um filho legitimado e com todos os direitos e deveres que um filho biológico possui. Segundo ECA (Art 41, 1990) “a adoção atribui a condição de filho ao adotado, com os mesmos direitos e deveres, inclusive sucessórios, desligando-o de qualquer vinculo com país e parentes, salvo os impedimentos matrimoniais”. Cabe ressaltar que. Segundo Weber essa lei proporcionou uma nova forma de pensar no que diz respeito a adoção, trazendo assim mudanças relevantes e expressivas. 34 O interesse maior deve ser sempre o da criança e, nesse sentido, procurase dar um tom moderno à adoção: não apenas encontrar bebês para casais que não podem gerar filhos biológicos, mas também encontrar pais para crianças destituídas de convivência familiar. Tenta-se resgatar o verdadeiro sentido de proteção para a criança e rever o conceito de ‘criança adotável’. Nesta nossa era atual, conhecida como ‘pós-moderna’, a ‘criança adotável’ deve deixar de significar um bebê recém nascido, de pele clara e saudável. Criança adotável deve ser toda criança que não tem possibilidade de ser criada pela sua família de origem e passa, portanto, a estar potencialmente pronta para integrar-se á uma família substituta (WEBER, 2009). 2.3.2 Plano Nacional de Promoção, Proteção e Defesa do Direito de Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária - PNCFC Marco nas políticas públicas no Brasil, o PNCFC foi instituído em 2006, resultado de um processo participativo que envolveu representantes do governo e da sociedade civil organizada por meio do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA); Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS); Secretaria Especial dos Direitos Humanos (SEDH) e Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), com apoio do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF). Tal Plano veio promover a ruptura da institucionalização das crianças e adolescentes, fortalecendo o paradigma da proteção integral e da preservação dos vínculos familiares e comunitários preconizados pelo ECA. Preconiza, em seus objetivos e diretrizes, a prevenção ao rompimento dos vínculos familiares, na qualificação do atendimento dos serviços de acolhimento e no investimento para o retorno ao convívio com a família de origem. Daí, com todas as possibilidades esgotadas para que essa criança retorne à família ou parentes próximos, ela passará a fazer parte das crianças disponíveis para a adoção. A perspectiva do plano gira em torno do total restabelecimento da criança a sua família biológica e sua convivência comunitária de origem por meio de políticas sociais que possibilite vínculos fortalecidos. De acordo com o plano, a adoção deve estar apenas como última instância na vida da criança. Diante deste fato, a posição defendida pelo Plano em relação a adoção é a de que: [...] 1) todos os esforços devem perseverar no objetivo de garantir que a adoção constitua medida aplicável apenas quando esgotadas as possibilidades de manutenção da criança ou do adolescente na família de 35 origem; 2) que, nestes casos, a adoção deve ser priorizada em relação a outras alternativas de Longo Prazo, uma vez que possibilita a integração, como filho, a uma família definitiva, garantindo plenamente a convivência familiar e comunitária; 3) que a adoção seja um encontro entre prioridades e desejos de adotados e adotantes; e 4) que a criança e o adolescente permaneçam sob a proteção do Estado apenas até que seja possível a integração a uma família definitiva, na qual possam encontrar um ambiente favorável à continuidade de seu desenvolvimento e, que a adoção seja realizada sempre mediante os procedimentos previstos no ECA (PNCFC, 2006). Conhecendo a forma pela qual o Plano trata da adoção a percepção que se tem é de que, embora a adoção tenha papel importante na sociedade, não pode ser vista como solução única para as questões abandonantes no Brasil. De acordo com a obra “Adoção-fertilidade afetiva”, tal afirma que: A adoção não é um remédio para a pobreza; devemos exigir do Estado a promoção de políticas públicas de proteção integral para a família e a infância para assegurar o exercício dos direitos ao trabalho, à saúde, à educação e à justiça. Assistimos a uma inédita situação de exclusão social. Cabe recordar que, quando os sistemas legais não funcionam, os pobres são os maiores prejudicados. A adoção tem como objetivo assegurar o direito da criança a crescer e desenvolver-se no seio de uma família e em seu prioritário interesse que devem encaminhar-se todas as ações (SOUZA, 2008). De acordo com Weber (2007), independente dessa família ser biológica ou adotiva, as mesma precisa construir vínculos de amor, respeito e principalmente de uma nova história. Afirma ainda que “a adoção e o apadrinhamento afetivo 15 não constituem a solução, mas com certeza representa um dos caminhos para proporcionar uma vida melhor ou garantir uma família para os desprovidos de uma vida com qualidade”. Cabe assim ressaltar que o mais importante nessa visão é que a criança não permaneça em abrigos sem a chance de ter uma família que lhe possibilite ser amada e de conviver plenamente na comunidade a qual está inserida. 2.3.3 A Nova Lei da Adoção e o Cadastro Nacional de Adoção No dia 3 de agosto de 2009 foi criada a Lei nº. 12.010, conhecida por todos como A Nova Lei da Adoção, sancionada pelo Presidente Lula. Com esta Lei o que se percebe é que o tempo de permanência de crianças nos abrigos diminuiu e a lentidão existente para o avanço dos processos começou a diminuir, pois conforme a 15 considera-se apadrinhamento afetivo (...) uma prática em que pessoas da comunidade contribuem para a criança e o adolescente abrigados, através de interação com sua família, atividades lúdicas e sociais, assistência médica etc. É importante deixar claro que o padrinho deve manter contato permanente com seu afilhado, buscando este nos finais-de-semana, feriados, épocas festivas, ferias escolares etc, ou seja, deve ser um encontro que tenha certa periodicidade, possibilitando uma relação afetiva" (Oliveira, 1999, p.1). 36 Lei: A permanência da criança e do adolescente em programa dede acolhimento Institucional não se prolongará por mais de 2 (dois) anos, salvo comprovada necessidade que atenda ao seu superior interesse,devidamente fundamentada pela autoridade judiciária (Art.19, 2009). O principal objetivo dessa Lei é que possa diminuir com a problemática do “abandono”, e com isso facilitar o processo de adoção. Diversas mudanças ocorreram. Com a promulgação dessa lei mudanças aconteceram, também com as nomenclaturas atribuídas ao processo de adoção, como é o caso da substituição de “pátrio poder” por “poder familiar”, como também o termo “abrigamento” foi substituído por “acolhimento institucional”. De acordo com a lei o abrigo deverá enviar semestralmente relatórios às autoridades máximas sobre as condições das crianças estejam elas em família substituta ou tendo já retornado ao seio da família. O abrigo terá o dever de executar e enviar tais relatórios. Mudanças significativas também aconteceram em relação aos pretendentes que buscam adotar essas crianças. Os principais foram que todas as pessoas maiores de 18 anos podem adotar, independentes do seu estado civil. É importante que exista uma afinidade entre pais e filho. Casais que pelo menos tenham uma união estável, que pretendentes estejam inseridos no Cadastro Nacional de Adoção16, extinguindo essa exigência apenas para familiares que tenham afinidade com a criança e pretendam ficar com ela. Pessoas ou casais inscritos no cadastro são obrigadas a passar por uma preparação psicossocial e jurídica, dentre outros aspectos importantes. Outro fator importante foi, segundo o art. 28 “sempre que possível, a criança ou adolescente, será previamente ouvido por equipe interprofissional, respeitando seu estágio e grau de compreensão sobre as implicações da medida, e terá sua opinião devidamente considerada”. Sendo a participação da criança relevante no processo de adoção, cabendo à equipe a tarefa de ouvir os desejos e angustias desses indivíduos. É importante ressaltar que a Lei também determina que equipamento e outros profissionais também possam contribuir para a proteção da infância como acompanhamento psicológico às mães no período da gestação e logo após, principalmente as que já deixam claro sua vontade pela adoção do filho, tendo 16 O Cadastro Nacional de Adoção (CNA) consiste em ferramenta criada para auxiliar juízes com competência em matéria de infância e juventude a dar agilidade aos processos de adoção, por meio do mapeamento de informações unificadas em todo país. Disponível em: <http://www.mp.rj.gov.br/portal/page/portal/MCA/Cadastro_Nacional_Adocao>. Acesso em: 01 de dez. 2012. 37 hospitais e médicos a obrigação de encaminhar estas parturientes ao juizado da infância e da juventude. Com isso o que se percebe é que além da equipe multiprofissional que já tua nas comunidades com essas mães e seus filhos, é importante também o engajamento de toda a sociedade civil para que criança e o adolescente tenham direitos efetivados, evitando que estes indivíduos passem a vida toda em abrigos ou até mesmo nas ruas, abandonados. 38 3 PERCEPÇÃO SOBRE A MANUTÊNÇÃO DO VÍNCULO FAMILIAR E ADOÇÃO DOS PROFISSIONAIS DO ABRIGO TIA JÚLIA 3.1 Manutenção do Vínculo Familiar Na busca pela compreensão sobre a manutenção do vínculo familiar, de como este é trabalhado e em que momento ele não é mais capaz de integrar a criança no seio de sua família biológica, é que se desenvolve este item do presente capítulo. No âmbito do Abrigo Tia Júlia observa-se uma dinâmica complexa, que envolve diversas tensões no que se refere às crianças acolhidas e suas famílias. Devido a isso, exige-se uma aproximação das falas dos profissionais que atuam diretamente na realização do trabalho, a fim de promover o retorno das crianças acolhidas às suas respectivas famílias, mantendo assim o vínculo familiar e comunitário. A família é uma instituição que vem sofrendo mudanças ao longo do tempo, tendo uma transformação e evolução bastante significativa na sociedade. Estas mudanças devem-se a todo um contexto tecnológico, científico, político, cultural e também ao contexto social, sendo este o que mais se evidenciou. Com todas essas mudanças e novos arranjos, essa instituição incorporou formas e adotou nomenclaturas diversas conforme suas especificidades durante seu processo histórico. Dentre as novas formas observa-se a da família nuclear, formada por pai, mãe e filhos; a monoparental, formada por qualquer um dos pais e sua prole; a família recomposta, que consiste na junção de integrantes de famílias distintas e já dissolvidas. A exemplo disso: mãe, filhos, enteados, padrasto e a família homoafetiva, formada por casais do mesmo sexo. Segundo Bruschini (1981, p.77), a família “ […] não é a soma de indivíduos, mas um conjunto vivo, contraditório e cambiante de pessoas com sua própria individualidade e personalidade”. Sendo assim, no contexto social o indivíduo na coletividade constrói suas relações e vínculos de afetividade, seja com a sua família, seja com os demais que compõem o ambiente em que vive. Contemporaneamente observa-se uma sociedade capitalista, onde a busca pelo ideal se tornou algo constante. É a era do consumismo, e das imposições de uma sociedade que cria casas de acolhimento para crianças e adolescentes, maquiando uma realidade cruel. 39 Com os efeitos gerados por esta mesma sociedade a criança tornou-se o segmento que mais sofreu por não ser percebida como sujeito de direito. O núcleo principal, onde a criança se aconchega desde o seu nascimento, é a família. Os primeiros anos de vida são marcados pelo convívio com os familiares, sendo neste período que ela vai depender totalmente deles. Segundo Osterne, a família é definida como: [...] algum lugar seja o ‘lar’, ‘a casa’, ‘o domicilio’, ‘ o ponto focal’, onde se possa desfrutar do sentido de pertencer, onde se possa experimentar a sensação de segurança afetiva e emocional, onde se possa ser alguém para o outro, apesar das condições adversas mesmo independentes da relações de parentesco e consanguinidade (OSTERNE, 2001, p- 92). Marques apud Eiterer e Silva (2011, p. 14) aborda a questão do vínculo familiar e considera que este não deve ocorrer apenas na adoção, mas que o mesmo se faz necessário em qualquer núcleo ou grupo familiar. Evidencia ainda que o “nascimento biológico não garante o nascimento psicológico, social, educativo, afetivo, econômico e cultural do sujeito”, tendo em vista a importância da manutenção dos vínculos familiares, devendo ser mantidos até que todas as possibilidades tenham se esgotado. Levando em conta a percepção dos profissionais do Abrigo Tia Júlia sobre o trabalho de manutenção de vínculos realizado com a maioria das crianças acolhidas na unidade e suas famílias, o que se observa é que estes profissionais entendem a situação de vulnerabilidade que estas famílias se encontram, mas com a efetividade do trabalho, são capazes de receber novamente os filhos e lhes prover uma vida melhor. São famílias em situação de extrema pobreza geralmente, é uma grande parte em situação de rua que não tem moradia própria, que estão desempregadas... Olha eu acho que é necessário, a gente não pode achar que porque a criança veio pro abrigo acabou a chance da família né, como a gente fala pra toda família que vem aqui, a nossa intenção, a intenção do Estado, a intenção do Judiciário não é tirar filho de ninguém, é muito pelo contrário, contribuir pra que aquela situação que fez com a criança viesse pro abrigo, mude, modifique, que ela possa retornar ao lar. Nossos esforços iniciais são todos direcionados a manutenção do vinculo, a ir em busca dessa família, fazer os encaminhamentos necessários pra que ela possa sair daquela condição (JASMIM) A manutenção do vínculo familiar foi ressaltado por todas as profissionais como algo de suma importância na vida dos envolvidos. Por isso todos devem ser apoiados e potencializados, para que as crianças possam ter uma nova chance, conforme citou a assistente social Violeta: 40 [...] como eu disse, a família ela tem o direito de ta regatando essa criança, ela tem o deito de uma mudança, ela pode ter uma segunda chance, não é porque aconteceu da criança vir pra cá, aconteceu um problema com essa família que a gente pronto vai punir ela eternamente. Não. Ela tem o direito de tentar, de buscar sair daquela condição e reaver o seu filho, então eu acho muito válido esse trabalho”.(violeta) Priorizar esta reinserção familiar consta nos imperativos do artigo 19, § 3º, do Estatuto da Criança e do Adolescente. Outra lei que também foi criada e ressalta essa possibilidade é a Nova Lei da Adoção, sendo que a mesma reforça a importância de tal pressuposto e diz que o Estado tem a obrigação de orientar e apoiar a família natural, sendo que a criança deve primeiramente permanecer no seio de sua família natural, ficando ressalvada apenas nos casos da absoluta impossibilidade da família não desejar, e se não for o suficiente para manter estes vínculos vivos. Então, tendo todas as possibilidades esgotadas, essa criança terá uma nova chance. Durante essas falas, o que se nota é que o profissional acredita ser a manutenção do vinculo familiar essencial, sem questionar em nenhum momento esta manutenção, devendo ser a primeira coisa a ser realizada com a chegada do indivíduo ao abrigo, se o mesmo vem sem noticias e/ou sem documentos que comprovem ter ou não uma família. É feita então uma investigação em busca de sua família, para que inicie o trabalho de manutenção de vínculo. Segundo o PNCFC, o trabalho de fortalecer o direito à convivência familiar e comunitária tem grande relevância e deve ser mantido até a última instância. O Plano reforça ainda que “[...] colabore na reestruturação do grupo familiar, potencialize a família para o exercício de suas funções de proteção e socialização e construa novos vínculos no caso da ruptura dos vínculos originais”. A convivência comunitária também foi colocada em meio às questões. agente trabalha a questão da convivência familiar e comunitária, então assim a família precisa ta envolvida, quando a gente trabalha a reinserção, então se faz todo um trabalho assim, e também a junto comunidade, a criança não pode ta dentro do abrigo achando que esse é o mundo dela,o mundo ta lá fora, então agente tem parcerias com instituições tem atividades fora, as escolas, tem parceiros que paga escolas particulares então quando estão aqui qualidade de vida agente tem que dar pra essa criança, outras fazem balé na fundação Raimundo Nobre aqui na Parangaba, outros natação em academia que é parceira do abrigo, então a sociedade também é responsável por essa situação, não é só o Estado é todo mundo, a família, a sociedade e o Estado, então a gente tem que fazer todo esse trabalho envolvendo todas essas pessoas responsáveis por essas crianças (VIOLETA). 41 Quando se pensa em acolhimento, o que a maioria das pessoas imagina é que essas crianças foram “abandonadas”, não existindo assim vínculo algum com sua família biológica, mas o que na verdade ocorre é que a maioria delas ainda estão sob o poder da família, e ainda mantém vínculos com ela, sendo diversas as causas que fazem com que o acolhimento aconteça. De acordo com a fala dos profissionais o que mais se evidencia é que as causas ocorrem por situações diversas, conforme o trecho abaixo demostrado: As situações são diversas, certo? Fazem com que a criança seja acolhida, atualmente a principal delas é a questão da família, o pai ou a mãe ser usuária de droga, de substâncias entorpecentes, viciadas em crack principalmente, faz com que aconteça a negligência, muitas vezes o “abandono”, e tudo isso desencadeia no acolhimento institucional, mais são diversos os motivos, vai desde o “abandono” em maternidades, ate a negligência de deixar em casa sozinhos, violência doméstica, são vários os motivos mais o principal foi esse que eu falei (JASMIM). Em meio a diversas problemáticas, nas quais estão inseridos os membros familiares da crianças acolhidas no Abrigo Tia Júlia, os profissionais buscam apoio nos equipamentos pertencentes à comunidade ou em locais parceiros da instituição, como é o caso das ONGs17. A maioria dos equipamentos estão ligados a tratamentos para dependentes químicos, tratamento para alcoolistas, alguns com necessidade de habitação, encaminhados para o “Habitafor”, dentre outros identificados na fala dos técnicos do serviço social e de psicologia. Foi ainda ressaltado que as dificuldades da parceria com a rede socioassistencial são grandes e muitas vezes acaba desestimulando o próprio usuário. [...] a gente nem sempre encontra abertura nas redes socioassistencial de saúde, pra ta realmente encaminhando, pra ta trabalhando em parceria e conseguindo um trabalho com sucesso, muitas vezes o CAPS não tem vaga pra atender agora, ou então a gente marca, encaminha, a família vai, a mãe vai chega lá, ai o psiquiatra só vai atender daqui a dois meses, e isso dificulta bastante o nosso trabalho, a questão da habitação, a gente fica tentando uma moradia durante seis meses e não consegue, e não é dado prioridade pra alguns casos, acaba dificultando o nosso trabalho, e acaba desestimulando não o profissional, mas sim a família, ela fica realmente desacreditada e desisti.(JASMIM) Os equipamentos utilizados com uma maior frequência são os CAPS AD18, CRAS19, CREAS20, Conselho Tutelar. Os enfrentamentos e as expressões da questão social permeiam todo esse contexto presente por toda a vida das crianças e 17 Organizações não Governamentais Centro de Atenção Psicosocial Álcool e Drogas 19 Centro de Referência de Assistência Social 20 Centro de Referência Especializado de Assistência Social 18 42 de suas famílias. Nota-se que embora o trabalho dos profissionais se volte para a reinserção familiar, em meio às falas eles colocam que em determinados casos essa possibilidade não mais existe e que não vale a pena insistir na manutenção do vínculo. [...] Tem casos que nem devem, e nem podem começar, quando começamos o trabalho e a gente percebe que a família não demonstra interesse, não vem visitar, às vezes passa de 6 meses 1 anos sem comparecer ao abrigo, a gente liga vai nas casas , e estas famílias não demonstra interesse, então quando a gente vê isso, e percebe que ela não tem interesse de reaver seu filho não é bom dar continuidade com este trabalho, não é bom insistir muito, a gente só insisti até um certo ponto, mas se vê que não vai dar resultado, ai para logo (JASMIM). Diante da resposta acima, surge o questionamento acerca de quem procura ter o vínculo mantido com mais frequência, se a mãe ou o pai, tendo a mesma profissional feito as seguintes considerações: [...] Depende muito do caso, temos pai, que as vezes a mãe ta ai fora usando droga e o pai ta aqui, vem todo dia, vem mesmo em busca dos filhos, quando não a família ampliada é quem tentar reaver essa criança. A gente tenta um trabalho inicial com os pais biológicos, não havendo possibilidade de retornar pra esses pais biológicos, ai a gente vai tentar com a família ampliada. E esses têm que ser os mais próximos dessa criança (VIOLETA). Nesse sentido, vale ressaltar que embora a criança esteja acolhida, o profissional consegue identificar a omissão da família para com a manutenção desses vínculos, surgindo assim uma nova possibilidade e a busca para que a destituição do poder familiar seja realizada e essa criança tenha uma nova chance em um novo seio familiar21. Embora saiba que a manutenção seja importante, os normativos legais colocam que ela deve ser a primeira alternativa trabalhada e que a adoção deve ser apenas utilizada em último recurso. O que se percebeu na fala dos profissionais é que os mesmos não questionam tais normas, seguindo o que as leis ditam e que deve ser obedecido. O próximo item deste capítulo se volta para a análise da fala dos 21 Alguns fatores que favorecem a perda de vínculos de crianças de seus pais biológicos, segundo Becker (1994, p. 64) estão ligados à situação de pobreza, entretanto não são suficientes paraque esta perda de vínculos venha a acontecer. Tal situação somente é possível quando o retorno à família torna-se inviável, em razão de risco pessoal da criança. 43 profissionais do Abrigo Tia Júlia no que se refere às situações de adoção vivenciadas no âmbito da instituição. 3.2 Adoção A adoção – última opção dentre os mecanismos de garantia do direito à convivência familiar de crianças – está prevista no art. 14 do ECA, que assim prevê: § 1º A adoção é medida excepcional e irrevogável, e “atribui a condição de filho ao adotado, com os mesmos direitos e deveres, inclusive os sucessórios, desligando-o de qualquer vínculo com pais e parentes salvo matrimoniais” (ECA, ARTI.14) Para Maldonado (2001) in Eitere (2011, p. 81) “[…] os laços de sangue não trazem a garantia do amor, sentimento esse que precisa ser construído no dia a dia”. Com isso, nota-se que os laços de sangue não garantem uma relação profunda entre pais e filhos. Neste sentido, a autora ressalta que “no caso da família adotiva, há consciência maior de que o vínculo singular entre seus membros deve ser conquistado”. Considerando o que foi exposto, vale acrescentar a visão do profissional do abrigo em relação à adoção: [...] Olha eu acho que é um ato bastante viável considerável, é um ato de amor com certeza, você precisar ter muito amor pra ta fazendo isso, tem que pensar não só em si, mas principalmente na criança, porque ela que tá precisando de amor, muitas vezes as famílias chegam ai, eu vou adotar porque eu perdi um filho, porque eu to de luto, mas não assim. O pensamento da adoção é ter uma criança ali que ta carente de afeto, de carinho de amor, e eu tenho isso pra dar aquela criança, então o pensamento tem que ser esse, é um ato de amor e principalmente querer doar aquilo aquela criança (JASMIM). É importante ressaltar que a adoção ainda é permeada por mitos e ideias pré-concebidas, ligados a diversos aspectos como medo, crenças, fantasias, insegurança, dentre outros que dificultam o processo para tantas crianças abrigadas. Segundo Eiterer (2011), profissionais que atuam na área da adoção chamam a atenção para a existência de uma visão distorcida na sociedade, que acarreta a associação da adoção a problemas e fracassos”. Devido a isso as imposições e preferências por crianças brancas e recém-nascidos com saúde perfeita, continuam a fazer parte das listas de preferência dos adotantes. Em meio a uma pesquisa realizada pela autora Weber (2007) entre pais e 44 filhos adotivos e com diversas outras pessoas que não faziam parte do contexto, o que se pode constatar é que embora hajam diversos avanços, a sociedade ainda é cheia de conceitos negativos, e inevitavelmente constrói barreiras para que muitas das vezes a adoção não se torne possível. Muito embora a questão do preconceito constitua um entrave para a adoção, a demora do Judiciário na resolução dos casos encaminhados é o principal obstáculo enfrentado pelos profissionais do Abrigo Tia Júlia, o que pode ser identificado por meio de suas falas. Eu acho que principalmente a burocracia no judiciário, o tempo pra uma destituição do poder familiar é muito longa, e assim a gente faz o trabalho faz a visita com a família, ai vai pro juizado eles fazem o mesmo trabalho, atende a família faz a visita, ai é que vai pro processo, quando vai pro processo de destituição, chama a família uma vez, chama duas vezes, chama três vezes, entendeu? Ai chama em audiência,a gente teve caso aqui que a audiência não pode acontecer no mês de julho foi acontecer em março do outro ano,então as vezes demora 9 meses pra remarcarem uma audiência, e nove meses na vida de uma criança é muito tempo (JASMIM) De acordo com o ECA, a criança em programas de acolhimento deverá ter sua situação reavaliada no máximo a cada 6 meses, devendo o profissional do abrigo encaminhar ao Poder Judiciário um relatório no qual, mediante seu conteúdo, o juiz decidirá o melhor para a vida da criança. No decorrer da pesquisa, os profissionais citaram suas atribuições no processo de adoção, e em todo o período em que essa criança permanece no abrigo, como consta nas falas: Adoção aqui é assim, a agente acompanha o estagio de convivência, o que é isso? A família vai se cadastra, ou a pessoas que quer adotar se cadastra ai quando a parece a criança no perfil que eles colocaram lá, e essa criança ta aqui no abrigo, o juizado entra em contato com a agente,então essas pessoas vem aqui a gente conversa com elas, e explica como é a situação daquela criança como ela é e tal, e mostra essa criança de longe em alguma atividade que ela esteja fazendo, então ele podem ver de longe, e ai dizem se querem ou não, porque muitas não há aquela empatia,em alguns caso só de verem já dizem que não querem. Enquanto outros chegam aqui e já dizem que não precisa nem mostra porque eles vieram pra conhecer seus filhos. Ai já vai acompanhar esses primeiros momento de vinculação dos pretendentes a adoção coma criança e viabilizando isso, a gente vai preparando a criança, dizendo que vem essas pessoas pra conhecer, preparando o casal sobre a criança, e ai eles passam a visitar elas aqui interage, depois vão passear fora daqui com um profissional acompanhando, ai vai pra um segundo passeio agora sozinho com a pessoas que quer adotar, num terceiro momento passa um fim de semana na casa da pessoas,e aos poucos vai saindo do abrigo. Então todos estes momentos é importante pra adaptação dessa criança, e o estagio de convivência depende dessa interação, agente da um prazo de 1 mês pra que aconteça essas visitar passeios, então tudo dura cerca de dois ou três meses (JASMIM). 45 De acordo com as novas regras da adoção, o prazo máximo em que uma criança deve ser atendida por programas de acolhimento, não excede a mais de 2 (dois) anos Quando foi questionado sobre este tempo para a criança o profissional se colocou dessa forma: [...] lei estabelece 2 anos mais na prática isso não acontece, nos temos crianças aqui que chegaram bebezinhas e que já tem hoje, seis sete anos, esse tempo acaba demorando, e pode ter vários motivos, por um processo demorar muito, por não colocar logo a guarda pros pais ou pro juiz não botar essa criança logo pra adoção, ao mesmo tempo a gente tem que vê que não é uma coisa que se resolve da noite pro dia pra noite, que tem que ser realmente cuidadosa, e saber se essa criança vai voltar pros pais, ou se não pode voltar pra esses pais e deve ir pra adoção, mas pra isso tem uma demora, porque não somos só nos que decidimos, tem todo um processo, vai pro juizado avaliar, vai pra uma equipe toda, mas tem o tempo pra criança, pra ela esse tempo é muito, pra quem sabe do desenvolvimento infantil, sabe que cada minuto é uma mudança muito grande, então assim uma criança de 0 a 6 meses e de 6ª 1 ano fala sente, o desenvolvimento de uma criança e diferente do desenvolvimento de um adulto, ela vai viver muito mais coisa me tempo pequenos, do que um adulto. Dois anos é muito tempo, realmente pra uma criança ficar institucionalizada é muito tempo (ROSA). A legitimação desse tempo foi se suma importância, mas o que se percebe é que embora ela tenha se efetivado dentro de uma lei, ainda há casos em que esse tempo não é suficiente, ou que não se cumpre, devido a demora de outros órgãos competentes, que deveriam agilizar com maior precisão esses casos, pois a infância passa depressa e a permanência por muito tempo em abrigo pode não trazer ganhos para a vida da criança. Com isso o profissional coloca que a vivência no abrigo não pode ser prolongada,o que sua fala deixa transparecer: No abrigo esse amor é muito superficial, tem muitos educadores que ficam em sistema de plantão, tem alguns que dão mais afetos, mais um cuida de 20 crianças, então como vai dar amor pra todos, e acaba que fica uma atividade mecânica, muitas ficam receosas de dar colo por que acha que a criança vai ficar mimada vai ficar cheia de querer, então tem essa percepção dos profissionais, então elas ficam totalmente ausentes de carinho, e por outro lado tem outros que se apega a uma criança e essa criança fica mais estimulada, e as outras sentem com isso (VIOLETA). Em meio a todo um processo, embora não seja a maioria, há casos de crianças reincidentes, ou seja, a adoção se efetiva mas a criança é devolvida ao abrigo, causando uma situação mais complexa em virtude da última possibilidade de integração da criança a uma nova família não ter obtido êxito. Questionada sobre essa situação, assim se pronunciou a assistente social do Abrigo Tia Júlia: Há casos de crianças que retornaram pro abrigo depois de serem adotadas, e ai o trabalho com eles é muito mais delicado, porque dependendo de como ela voltou, ela pode ter voltado por varias questões, por vários 46 problemas maiores, que agente chama isso de segundo “abandono” dependendo do motivo que fez ela voltar, eu não diria que existe um trabalho especifico com ela, mas é um trabalho que a gente tem que tomar um cuidado maior com essas crianças, é mais delicado, vem com mais questões na cabeça. Pra mim não existe pior ou melhor, independente de onde essa criança venha o “abandono” é muito triste pra criança, porque essa criança pode ter raiva ou não, ou ate mesmo nem lembrar, o pode ate virar um trauma pra essa criança, e quando é um retorno de uma família adotiva que a principio ir dar tudo certo isso pode trazer uma trauma enorme, então por isso é muito delicado (ROSA). Reforçando a sua fala no que consiste aos casos de devolução da criança ao abrigo, após o processo de adoção, o profissional considera: Acho que nem a família tava preparada e a criança também não, não aconteceu aquele namoro que acho que tem que acontecer, aquela construção não aconteceu, e o maior índice é dos pais que devolvem, são raras as crianças quererem voltar mais são os pais que devolve, casos de que a criança ta dando trabalho e elas dizem não são meus filhos e acaba devolvendo a criança, então muitas famílias ainda não estão preparadas pra isso. Então devolve e faz uma maldade extrema na vida dessa criança e o retorno pro abrigo é muito frustrante (ROSA). Durante a fala dos profissionais foi possível identificar, que as crianças que mais tem dificuldades para serem adotadas são as que sofrem por algum tipo de deficiência ou as que são mais “velhas” conhecida como as adoções difíceis ou necessárias o que consta na PNCFC 22, passando a viver um longo período na instituição sendo que este tempo só prejudica uma possível adoção e uma nova chance a essas crianças. [...] nos temos crianças que ainda estão com seis anos esperando finalizar o processo de adoção, e crianças aguardando a adoção, agente tem jovens aqui que chegam a ter 18 e 21 anos, mas isso são casos de jovens que não tem possibilidade de ser adotada por conta do perfil, porque são crianças que tem paralisia, algum tipo de deficiência, e que não é o perfil desejado pela da maioria das pessoas que querem adotar. Então eles ficam na instituição aguardando uma adoção. Olha hoje nos temos em torno de 15 casos de ambos os sexos e de varias idades (JASMIM). Por conta dessa demora, essas crianças permanecem durante um longo período nessas instituições, esses tempo acaba dificultando uma possível adoção, e alguns permanecem nessas instituições devido as deficiências e por não ser a preferencia no cadastro de adoção. Devido ao tempo e a deficiência muitas das crianças permanecem nas instituições de acolhimento por longos anos, sem ter uma convivência familiar e comunitária possível. 3.3 Manter ou Adotar 22 Plano Nacional de Promoção, Proteção e Defesa do Direito de Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária, 2006. 47 Em torno da pesquisa, a fala dos envolvidos vai deixando de forma clara e precisa que a grande maioria das famílias de crianças acolhida no Abrigo Tia Júlia é usuária de drogas, sendo o crack a substância mais utilizada. Essas famílias estão em situação de vulnerabilidade social e se encontram em condições de extrema pobreza. Para o profissional do Abrigo a manutenção do vínculo é principio norteador, e deve ser realizado, até que todas as possibilidades torne-se esgotadas, segundo a fala destes profissionais a família deve merecer uma segunda chance, e se for o caso dos pais não aceitarem essa criança de volta, o trabalho deve ser realizado com o que elas chama de família extensa e/ou ampliada 23. Então neste sentido leva-se em conta a questão da afinidade que pode existir entre a criança e outros familiares. Esse trabalho é realizado quando os profissionais identificam que os pais não tem mais condições de receber essa criança, mas ainda assim os profissionais não visualizam a adoção de imediato. Embora a falta ou a carência de recursos não seja determinante para que pais percam o poder sobre seus filhos, ela se faz presente na vida dessas pessoas que vivem às margem da pobreza que assola e ameaça a vida de todos os integrantes da família. Então a vida das crianças em situação de acolhimento Institucional liga-se à pobreza, gerando assim tensões diversas. A classificação de (COSTA, 2007, p 27) sobre a pobreza é que ”[...] situação de privação resultante de falta de recursos. Esta definição tem duas partes que interessa sublinhar: privação e falta de recursos, termos entre os quais existe uma relação de causa e efeito”. Os desafios dentro destas duas possibilidades é notada no decorrer do processo tanto de manutenção do vínculo, como também da adoção, durante a pesquisa o que mais denota durante a fala de todos os profissionais que foram entrevistados, é que o vínculo familiar deve sim ser mantido, embora acreditando que a adoção se faz importante e necessária, mas o principal trabalho volta-se primeiro para que a criança retorne para sua família biológica, e somente depois de todas as possibilidades esgotadas é que a adoção começa a ser pensada. ´ Questionadas sobre a mudança de percepção em relação à adoção, foi colocado que tal mudou a partir do momento em que integrou a equipe do abrigo. 23 Art.25 ECA: “aquela que se estende para além da unidade país e filhos ou da unidade do casal, formada por parentes próximos com os quais a criança ou adolescente convive e mantém vínculos de afinidade e afetividade”. 48 [...] mudou bastante, bom, ate na questão da adoção tardia, antes eu tinha meus mitos meus preconceitos e agora eu vejo, que uma criança mais velha, não é porque ela tem uma idade mais avançada que pode ser uma adoção mais complicada, nós temos muitas adoções aqui que foi assim e deram certo, de crianças já com 5,com 6 anos e deu totalmente certo, e antes eu tinha preconceito. E a adoção com criança mais velha vai dar os problemas que dar com crianças mais novas, e que também nascida de você daria. Então isso daí foi quebrando meus preconceitos (ROSA). Então, a adoção deve acontecer, mas apenas em ultimo caso, segundo a fala das profissionais. Isso também denotou uma contradição, pois embora acreditem ser a reinserção familiar a mais importante “ ate quando a gente vê que tem condições daquela família ficar, querer mesmo aceitar a criança, a gente trabalha até a ultima consequência” (Alfazema). Mas logo em seguida diz que o tempo que a lei estabeleceu de 2 (dois) anos é muito longo para que a criança fique no abrigo, devendo logo ser adotada. [...] a gente sabe que a infância passa muito rápido né, e a infância dentro de uma instituição de acolhimento é muito cruel. São infelizmente regras muito rígidas, falta a questão do carinho falta a questão do afeto, principalmente em uma instituição como o abrigo Tia Júlia porque? Porque é uma instituição de grande porte, são muitas crianças, então a questão da individualidade fica precarizada, a criança não tem o individual, não coisas dela pra ela, é tudo dividido é tudo pra todo mundo, então isso prejudica com certeza o desenvolvimento da criança … No abrigo esse amor é muito superficial, tem muitos educadores que ficam em sistema de plantão, tem alguns que dão mais afetos, mais um cuida de 20 crianças, então como vai dar amor pra todos, e acaba que fica uma atividade mecânica, muitas ficam receosas de dar colo por que acha que a criança vai ficar mimada vai ficar cheia de querer, então tem essa percepção dos profissionais, então elas ficam totalmente ausentes de carinho, e por outro lado tem outros que se apega a uma criança e essa criança fica mais estimulada, e as outras sentem com isso (JASMIM). Portanto, percebe-se assim que todos os incentivos estão centralizados na família biológica. Mas o problema em torno desta reinserção é bem mais complexo, os profissionais seguem estritamente o que a lei determina persistindo, persistindo durante dois anos ou até mais tempo. No entanto nota-se que para alguns casos o retorno nem deveria ser buscado, pois a insistência para que estes laços sejam mantidos não poderão trazer mais ganhos para a vida da criança. 49 CONSIDERAÇÕES FINAIS Dos estudos empreendidos na construção da pesquisa, o que foi percebido é que em um processo histórico a criança era tida como um ser incapaz, que sofria pelas situações de “abandono”, de violência, de uma série de outros fatores como a caridade, que beneficiava apenas os que se propunham a prestar essa assistência e em alguns momentos objeto de reprodução de uma cultura familiar. A adoção, num contexto geral e também no Brasil, se fez por um processo onde a vontade do adotante era mais relevante do que a do adotado. O que se percebia no país era um alto índice de caridade que permeava as famílias menos favorecidas e seus filhos, ficando os mesmos à mercê dos senhores que detinham um alto poder aquisitivo. Com o decorrer dos anos, criaram-se casas para receber crianças que sofriam por diversos motivos. Uma delas era denominada "roda dos enjeitados", que em seu nome já estigmatizava e trazia a essas crianças traumas com a sua história. Entretanto, com o advento de novas leis, estas instituições foram se modificando e passaram a adotar novas posturas frente ao atendimento a esse segmento, pois tudo que se referenciava à criança e ao adolescente passou a ser legitimado. Nesse contexto a vontade da criança tornou-se a primeira coisa a ser avaliada, assim como todos os aspectos de sua vida, desde o convívio familiar até o comunitário. A adoção no mundo moderno busca uma família para uma criança e não mais uma criança para uma família, o que acontecia com frequência em períodos passados. As novas leis priorizam em primeiro lugar a reinserção da criança acolhida, novamente no convívio com sua família biológica e também na comunidade, mas com todas as possibilidades de reinserção esgotadas ela deverá ser colocada para adoção, para que possa ter uma nova família. Na sociedade capitalista atual acaba-se muitas vezes reproduzindo o que ela dita como correto, ou até mesmo engessando-se em meio às normas impostas nas leis, percebendo apenas um problema e o priorizando, acabando e esquecendo todos os outros que envolvem e que estão presentes na vida de cada criança em situação de acolhimento. É oportuno ressaltar que pelas falas das profissionais que atuam no Abrigo Tia Júlia e que participaram da pesquisa,o prazo máximo, previsto em lei para que essa criança permaneça no abrigo é de dois anos e neste período as duas 50 possibilidades devem ser trabalhadas, tanto a de manutenção do vínculo familiar como a da adoção. Entretanto, algumas conclusões podem ser elencadas, quais sejam: Muitas dessas crianças passam um tempo significativo, o que faz com que as que estão para adoção acabem perdendo a chance de sair mais cedo do abrigo, prolongando assim sua estadia na instituição e tendo sua infância vivenciada apenas dentro do Abrigo. E as que estão para manutenção do vínculo acabam acreditando em uma possibilidade que algumas vezes não tem êxito e que demanda um tempo bem maior, pois conforme a fala da profissional, esse tempo é muito para trabalhar com a criança, e para viver em uma instituição, mas para trabalhar com a família acaba sendo pouco, pois a família, na maioria das vezes, está permeada por questões que demandam tratamento, o que depende da ajuda de outros órgãos e parcerias. É importante ressaltar que muitas das crianças que estão no abrigo vêm de pais que também já foram deixados para trás pela sociedade, ou seja, já foram de alguma forma entregues, ou sofreram e sofrem pela ausência de políticas públicas ou por não estarem inseridos nelas. Percebeu-se ainda que embora a manutenção esteja sendo trabalhada, algumas famílias buscam reaver seus filhos, outras passam a se distanciar, deixando claro que não existe mais interesse em mantê-los ou reavê-los. Então, é de se questionar, até que ponto essa manutenção deve acontecer? Qual a importância deste trabalho para a vida da criança? Pois até que o juiz destitua o poder familiar, todas as possibilidades deverão ser esgotadas e somente depois de tudo isso é que o trabalho de destituição se inicia, não se dando de forma imediata. Portanto, a demora aumenta e as crianças entram na adolescência com pouquíssimas chances de serem adotadas, em razão do tempo e por não ser mais a prioridade no cadastro de adoção, tendo assim que ser transferidas para outra unidade de acolhimento destinada a adolescentes. Tanto o ECA quanto o PNCFC determinam que a família biológica deve ter prioridade para receber a criança novamente, devendo a mesma ser trabalhada e inserida em todos os programas que lhe possibilitem uma vida digna. Embora a manutenção figure como prioridade nas leis vigentes, no abrigo Tia Júlia as estatísticas mensais apontam que a reinserção de crianças ali acolhidas foi o que menos aconteceu no ano de 2012. A pesquisa mostra que entre janeiro a dezembro daquele ano 14 (catorze) crianças foram adotadas e que apenas 5 (cinco) retornaram às famílias de origem. 51 Embora este número de adoções seja pequeno em relação ao número de crianças que esperam pela adoção em instituições de acolhimento, ela tornou capaz de possibilitar uma nova chance e com estes resultados percebe-se que a manutenção deve acontecer nas duas possibilidades, mas constitui um problema em aberto, que deveria ser repensado conforme os problemas que envolvem e afligem a família e a criança, a fim de proporcionar uma maior agilidade nas decisões relativas à manutenção ou não, para que tantas tentativas não se tornem em vão, e para que a busca pela adoção se torne possível. Este trabalho faz-se necessário tanto na reinserção familiar como na adoção, pois os vínculos de amor, respeito e proteção à criança devem ser construídos independente de qual família ela possa estar inserida. Os profissionais colocaram que existem casos de reincidência de crianças tanto das famílias biológicas como de famílias adotivas. Isso mostra que a adoção também se dá sem manutenção, ou até mesmo sem a criação de vínculos, o que pode não ter êxito e prejudicar a criança, fazendo com que a mesma retorne ao abrigo com problemas mais complexos para serem resolvidos. Diante do exposto, justifica-se porque a manutenção do vínculo é importante para as duas possibilidades, tendo os profissionais que se voltar para a manutenção e perceber até que ponto ela deve ser mantida e quando não, devendo acontecer em uma perspectiva em que a criança seja sempre o foco principal em um contexto em que esteja inserida. 52 REFERÊNCIAS ARANTES, Esther Maria. De "criança infeliz" a "menor irregular" - vicissitudes na arte de governar a infância. Disponível em: <http://www.cliopsyche.uerj.br/livros/ clio1/decriancainfeliz.htm>. Acesso em: 12 de nov. 2009. ÀRIES, Philippe. 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I-IDENTIFICAÇÃO: Sexo: M ( ) F ( ) Estado Civil: Solteira ( ) Casada ( ) Outros: _________________________ Tem Filhos: Sim ( ) Não ( ) Quantos: __________ Formação: _______________________ Tempo de Formação: ________ Pós- Graduação: Especialização ( ) Em que área: ___________________________ Mestrado ( ) Doutorado ( ) Tempo na Instituição: _____________ II- ACOLHIMENTO E MANUTENÇÃO DE VÍNCULOS 1- Quais as principais situações que motivam o acolhimento da criança neste abrigo? 2- Qual o perfil das Famílias de crianças que estão acolhidas aqui no abrigo? 3- Qual a media de permanência das crianças nesta unidade de acolhimento? 4- Qual a sua percepção sobre a manutenção do vinculo familiar? E que ações são realizadas para a manutenção desse vínculo? 5-De acordo com a nova lei de adoção existe um prazo de 2 anos pra reinserção familiar, o que você acha desse prazo? 6- ate que ponto você acha que o trabalho de manutenção do vínculo familiar deve ser realizado? 7- E que aspectos devem ser levados em conta para que esse trabalho não seja mais realizado? 8- Há casos de crianças reincidentes das famílias de origem? E qual a sua percepção sobre esses casos? 9- Qual as principais dificuldades encontradas por você para o desenvolvimento do trabalho? 55 III- ADOÇÃO 1- Qual sua percepção sobre a adoção? Sua visão mudou, ou seja, antes da sua atuação aqui e depois que começou trabalhar na instituição? 2-Como você percebe a adoção para as crianças que permanecem na instituição? 3- Quais as principais dificuldades identificadas para que a adoção ocorra em maior tempo hábil? 4- Há casos de crianças reincidentes das famílias adotivas? E qual sua percepção sobre esses casos? 5- E como fica o trabalho com essas crianças que retornam ao abrigo? 6- Ainda sobre a lei, temos que a adoção é vista como uma ação a ser tomada em ultimo caso, apenas quando esgotada a possibilidade de manutenção do vinculo familiar. qual sua posição sobre isso e por que? 7- Como se coloca o profissional nos casos de adoção? quais as questões a serem analisadas para conferir um parecer positivo (e aquelas aos pareceres negativos) às adoções? 8- Em casos que a destituição do poder familiar foi o indicativo tomado, como vocês trabalham as crianças e adolescentes para adentrarem uma nova família adotiva?