A origem desconhecida da carne

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INVESTIGAÇÃO
Rotulagem da carne
A origem desconhecida
Cerca de metade da carne de vaca vendida a granel e embalada nos talhos e supermercados não
EM DESTAQUE
Nascido
Inspecionámos o rótulo de 729 peças
de carne, 288 das quais
de vaca, em busca da indicação
da origem, obrigatória por lei
Visitámos 126 talhos
e supermercados em junho de 2015
Especialista comenta resultados
e alerta para mais fiscalização
O rótulo da carne de bovino é
obrigatório. Dele podem constar o nome
do Estado-membro ou do país terceiro
de nascimento do animal.
44 %
das amostras da carne de
vaca não indicam a origem
Criado
Menção que se refere
ao Estado-membro ou
ao país onde se criou
ou engordou
o animal.
Origem
Os rótulos da carne de bovino devem
identificar o animal, indicar onde
nasceu, engordou e foi abatido e
ainda o local da desmancha. Se a
carne provir de animais, nascidos,
criados e abatidos no mesmo país,
a indicação pode ser dada através da
origem, seguida do nome do país
e, facultativamente, do símbolo.
nacional.
Abatido
A menção “abatido em” refere
o país do matadouro onde
o animal foi morto.
O matadouro deverá estar
devidamente aprovado.
Desmanchado
A menção “desmancha em” faz
referência ao país do estabelecimento
de desmancha da carcaça ou do grupo
de carcaças. O local deve ter o número
de aprovação.
www.deco.proteste.pt
da carne
O PERITO
RESPONDE
o refere a origem, obrigatória por lei
E
m 2012, 45% dos portugueses que
inquirimos afirmavam querer saber
a origem do que consomem. Para
quase metade, o mais importante
no rótulo é mesmo a origem dos alimentos
que chegam ao prato. Já é obrigatório conhecer a origem da carne de vaca desde 2000,
altura em que surgiu o escândalo da BSE.
Desde abril de 2015, estas exigências foram
alargadas à carne de suíno (porco), ovino,
caprino (borrego e cabrito) e às aves de capoeira. Este nosso estudo sobre a rotulagem
da carne revela que ainda existem muitas
falhas. Damos especial enfoque à carne de
vaca, uma vez que o enquadramento legal
já tem 15 anos. Também incluímos carnes
de porco, frango, peru, pato, borrego e cabrito pré-embaladas, para as quais também
já existem regras relativas à determinação
da origem.
em conformidade com a lei e só em 8% faltavam informações.
Passados tantos anos (as regras foram delineadas aquando das “vacas loucas”, em
2000), o regime comunitário de rotulagem
obrigatória continua a não ser totalmente
cumprido. Os talhos, tanto de rua como de
hipermercado, têm de melhorar a rotulagem
da carne, indicando as menções obrigatórias, para se saber detalhadamente todo o
percurso.
Se faltam informações relevantes, o sistema de rastreabilidade cai por terra. Torna-se
impossível chegar à origem e atuar quando
surgem irregularidades que ponham em causa a segurança dos consumidores.
Vaca com orelhas de burro
Em 60% das peças de carne que observámos
durante a nossa investigação, a rotulagem
estava em conformidade com a legislação.
Em 28% dos casos, não encontrámos qualquer referência à origem ou a outras menções que permitam determinar a origem e,
em 12% das amostras, detetámos algumas
falhas na rotulagem.
As aves, os ovinos e os caprinos pecam,
sobretudo, por omitir o local do abate. Na
carne de vaca, não mencionar o local de
desmancha é a falha mais frequente. Aliás,
foi na carne de bovino (vaca e novilho a
granel) que detetámos mais problemas na
rotulagem, com dois terços da amostra em
incumprimento: 44% da carne nos talhos de
rua ou supermercado não tinham qualquer
referência à origem e, em 24% dos casos, a
rotulagem apresentava falhas ou omissões,
como o local de desmancha.
Na carne pré-embalada, embora haja um
maior cuidado com a rotulagem, ainda assim, 13% das amostras não permitem saber
a origem e 31% omitem alguns dados, nomeadamente o local de abate e desmancha.
Reforçar a rastreabilidade
Face a 2004, altura em que realizámos pela
primeira vez este estudo, a situação não só
não melhorou, como até piorou: em quase
todas as peças de carne de bovino pré-embaladas então observadas, a rotulagem estava
www.deco.proteste.pt
Um rótulo deverá permitir traçar todo o percurso
do animal. No talho, estas informações podem
ser colocadas num rótulo ou num letreiro junto
à carne correspondente
Bruno Santos
Relações institucionais
Os consumidores têm
o direito de saber mais
A legislação deveria
contemplar todas as carnes à
venda no talho, além da vaca?
A intervenção das autoridades
é decisiva para cumprir a
legislação. A visibilidade das
suas intervenções previne e
deteta potenciais infrações e
prova aos consumidores que
há uma autoridade atuante.
Todavia, não podemos exigir
que a ASAE esteja todos
os dias em cada talho.
A obrigação legal de os
talhantes prestarem mais
informação baseia-se no
reforço da segurança dos
alimentos, permitindo a
rastreabilidade (origem,
nascido, engordado, abatido
e desmanchado). Os
consumidores têm direito
a saber mais sem ter de
perguntar. Se não lhes
prestarem informação clara
sobre a origem da carne,
devem procurar outro talho
que cumpra a lei.
QUAL A ORIGEM DOS ALIMENTOS PROCESSADOS?
A Organização Europeia
dos Consumidores (BEUC),
da qual a DECO faz parte,
pretende tornar obrigatória
a informação da origem
da carne também nas
embalagens dos alimentos
processados. Apenas a carne
de bovino fresca deve indicar
os locais onde o animal
nasceu, foi criado e abatido,
ou seja, a sua origem. Por
isso, quando o consumidor
compra alimentos
processados, não sabe de
onde vem a matéria-prima,
mesmo que se trate de um
produto à base de carne de
vaca, como os hambúrgueres.
Mas os consumidores
querem ir mais longe, pedindo
que se coloque a proveniência
da carne também nos
alimentos processados.
A BEUC pretende que a
União Europeia contemple
alimentos como o fiambre, o
bacon, as salsichas,
as lasanhas, os raviólis e
os nuggets, entre outros.
Sem esta informação,
o consumidor não tem
como saber de onde vem a
matéria-prima, mesmo que
se trate de um produto à base
de carne de vaca (como
os hambúrgueres).
Alguns produtores
avançaram já por iniciativa
própria com estas medidas
e tal não implicou custos para
o consumidor.
janeiro 2016 • 375 Proteste 31
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