Cardeal Dom Odilo Pedro Scherer - PUC-SP

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Cardeal Dom Odilo Pedro Scherer
Arcebispo de São Paulo
São Paulo, 26.06.2015
À Prof.a Marilena Chauí
Departamento de Filosofia
da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP
Prezada Professora Marilena Chauí:
Com minha saudação, também lhe agradeço por ter dirigido a mim uma “carta aberta” sobre a
questão da pretendida Cátedra dedicada ao filósofo Michel Foucault na Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo (PUC-SP). Tendo recebido uma “carta aberta”, permito-me responder da
mesma forma.
Fico feliz em ver dirigidos tão largos elogios aos méritos da PUC-SP por uma ilustre docente de
filosofia da prestigiosa Universidade de São Paulo. A PUC-SP, de fato, foi abrigo para
renomados pensadores e intelectuais em tempos de censura ao pensamento livre na história
recente do Brasil. Não encontrando espaço para suas atividades acadêmicas e intelectuais em
Universidades do Estado, eles tiveram guarida e liberdade para fazê-lo na PUC-SP, que será
lembrada por ter promovido o pensamento sem censura e as liberdades democráticas em São
Paulo e no Brasil. Felizmente, a Democracia foi restabelecida e as Universidades do Estado,
bem como as demais, podem novamente desempenhar suas atividades de maneira desimpedida.
Mas desejo afirmar à ilustre Professora que a PUC-SP, também hoje, não deixou de ser espaço
de liberdade intelectual. Não pode ser mostrado sequer um fato de censura ou intolerância
contra atividades de pesquisa e ensino. Também no que se refere a Michel Foucault, professores
e estudantes continuam lendo, estudando e ensinando Michel Foucault, quanto quiserem, sem
que lhes tenha sido tolhida a liberdade para fazê-lo.
Para desfazer qualquer equívoco, esclareço que a decisão - quase unânime - dos membros do
Conselho Superior da Fundação São Paulo, Mantenedora da PUC-SP, não consistiu na
“proibição” de uma Cátedra dedicada a Michel Foucault, mas no indeferimento de um pedido de
criação da Cátedra, nos termos em que foi apresentado, “independentemente de se manterem os
trabalhos do Grupo de Pesquisa deste, ou de qualquer filósofo na Universidade” (Ata da reunião
do Conselho). A alguns pode parecer que indeferir e proibir sejam a mesma coisa, mas são duas
ações diversas.
Além do mais, diversamente do que tem sido divulgado, antes daquela decisão ainda não havia
uma Cátedra Foucault na PUC-SP. O que havia, e continua havendo, é um Grupo de Pesquisa
dedicado ao filósofo francês. E esse Grupo pode continuar em plena atividade, sem nenhum
impedimento. Digo mais: diversamente do que tem sido alegado, até em publicações na
imprensa, não havia, e não há até agora, um compromisso institucional da PUC-SP com uma
Instituição ou Entidade nacional ou estrangeira com o objetivo de criar uma Cátedra Michel
Foucault na PUC-SP.
Portanto, Foucault continua sendo estudado na PUC-SP, da mesma forma como tem sido até o
presente. Oxalá suas ideias também fossem avaliadas com discernimento crítico, como é próprio
de toda boa prática filosófica, para verificar a consistência de seus argumentos.
A informação correta sobre os fatos é absolutamente indispensável para não nos debatermos
num mundo de fantasias ou construções intelectuais arbitrárias, que também podem ser injustas.
Informações passadas à opinião pública sobre a decisão do Conselho Superior da Mantenedora
da PUC-SP a respeito de estudos sobre Michel Foucault, ou de uma Cátedra a ser dedicada ao
filósofo na PUC-SP, diversas das acima expostas, carecem de verdade, ou procedem de
interpretações forçadas.
Provavelmente, o próprio Foucault ficaria perplexo diante da celeuma criada em torno da
pretendida Cátedra em sua honra, na PUC-SP. Se é verdade que ele foi um baluarte na luta
contra “verdades cristalizadas”, por certo não se importaria se alguém discordasse também dele.
Será que ele negaria aos responsáveis pela decisão da Mantenedora da PUC-SP o direito de
terem um pensamento próprio e de serem coerentes, em suas decisões, com as convicções que
esposam? Provavelmente não. Mesmo não concordando com eles.
Reconheço e sei bem que é próprio da Universidade colocar tudo em discussão, no afã de
encontrar e de expressar a verdade. Também eu estudei e ensinei filosofia. Mas quando se trata
de tomar decisões, alguém precisa tomá-las, mesmo quando elas não agradam a todos. Assim
acontece na PUC-SP e também na USP.
É preciso considerar também que nem todas as Universidades são iguais; talvez isso pode
acontecer em países totalitários... Seria um empobrecimento cultural muito grande se assim
fosse. Com identidades próprias e linhas diferentes, as Universidades podem, assim, assegurar
melhor o diálogo entre os diferentes e a preservação do horizonte universal da cultura, tão
necessário à alma, quando o clima do politicamente correto tende a estreitar e sufocar também o
ambiente da intelectualidade. Em tempos de liberdade, é salutar que nem todas as Universidades
leiam pela mesma cartilha da liquefação e vaporização do pensamento, das verdades e das
referências no convívio humano. A PUC-SP, como todas as Universidades, tem o direito de
possuir a própria identidade.
Com meus respeitos:
Cardeal Odilo Pedro Scherer
Mestre em Filosofia e Doutor em Teologia
Arcebispo Metropolitano de São Paulo
Grão-Chanceler da PUC-SP
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