IA LO G a U RtO r ane em p o LICA ÇÃO TRIM EST RAL c on PUB OC DA S IEDA www RA DE B .urol SILE ogiac IRA ontem RO DE U pora LOG nea.o IA V.18 N.3 JULH O SETE MBRO 2010 rg.br 5 editorial Simplificando o aprendizado urológico Ronaldo Damião SCIP MULTIDI TÉCNICAS AS CIRÚRGIC IA DE UROLOG ÓRIO CONSULT lastia Corporop rto com enxe gínea ca albu de túni crura da pia e tera DAEM sição de repo onal na horm stero com testo ) (TRT Eloísio Alexsandro da Silva LINIDAD Profilaxia bose da trom unda prof venosa ogia em Urol E ALIZAÇÃ O ATU os de tecid Tumoresda bexiga moles EM IMAGEM IA UROLOG ções do “J” Complica duplo cateter 08/10/10 09:33 d 1 10_CAPA A03de20 PORANE URO CONTEM e 2 CAPA.ind 6 atualização Tumores de tecidos moles da bexiga Wilson F S Busato Jr Gilberto L Almeida 20 multidisciplinaridade Profilaxia da trombose venosa profunda em Urologia José Germano Ferraz de Arruda Fernando Nestor Facio Júnior Germano J. F. de Arruda Pedro Francisco F. de Arruda 24 urologia de consultório daem e terapia de reposição hormonal com testosterona (trt) Daniel de Freitas G. Soares Ernani Luis Rhoden 42 Técnicas Cirúrgicas Corporoplastia com enxerto de túnica albugínea da crura Carlos Teodósio Da Ros Túlio Meyer Graziottin 48 Uro-Resumos Brasil Silva Neto Resultados sobre mortalidade do estudo randomizado de Gotemburgo para rastreamento populacional do câncer de próstata Eventos adversos associados com a reposição de testosterona Comparação de isquemia quente versus sem isquemia durante nefrectomia parcial em rins únicos Emanuel Burck dos Santos Impacto da segunda ressecçâo transuretral de rotina nos desfechos em longo prazo de pacientes com diagnóstico recente de carcinoma urotelial pT1 com relação a recorrência, taxa de progressão, e sobrevida doença- específica: um ensaio clinico randomizado prospectivo 56 ponto de vista Curvatura peniana por doença de Peyronie Fernando Gomes da Silva Eloísio Alexsandro da Silva 58 IMAGEM EM UROLOGIA Complicações do cateter duplo “J” JAYME DE SOUZA TOLEDO FILHO U R O L O G I A V.18 N.3 JULHO C O N TE M P O R Â N E A SETEMBRO 2010 3 EDItorIal Simplificando o aprendizado urológico O O GI A U ROmLpor anea JULH ÇÃO TRIM EST RAL O DA S c on t PUB LICA DE OGIA UROL TÓRIO UL CONS ia e terap DAEM osição de rep al hormon ona toster com tes T) (TR AD CIED e www A E BR .urol S TÉCNICA GICAS CIRÚR SILE ogiac tia roplas Corpo xerto com en ugínea ica alb de tún crura da IRA ontem RO DE U pora LOG nea.o MULTI O SETE MBRO 2010 IA rg.br DISCIPL INIDAD ia Profilax e mbos da tro funda pro venosa ologia em Ur E ATUA LIZAÇ ÃO ido de tec Tumoresda bexiga moles EM EM IMAG OGIA UROL do licações Comp duplo “J” r catete s formato tradicional das revistas científicas e médicas, com uma literatura formal, truncada, e em um formato que exige dos olhos uma atenção intensa, vem sendo objeto de questionamentos e alvo de mudanças por parte das editoras. O resultado deste movimento já pode ser visto nas revistas internacionais com grande fator de impacto que evoluíram para artigos curtos, coloridos e com destaques de trechos das conclusões, usando toda a ciência dos designers gráficos. Obviamente sem afetar o conteúdo e a seriedade do processo de avaliação editorial. O resultado é imediato e extremamente positivo e até mesmo dentro das instituições acadêmicas mais tradicionais vêem com bons olhos este fenômeno. Juntamente com o formato moderno, a navegação pelo sitio www.urologiacontemporanea.org.br permitindo o acesso gratuito a todo o conteúdo da revista é mais um facilitador. Tudo isso com o objetivo de ajudar aos colegas da área da saúde a se qualificarem melhor para oferecer melhores serviços para beneficiar o paciente urológico que representa a ponta final desta corrente. Essencial ainda, que esta revista seja entendida como um instrumento reflexivo e democrático, um fórum de atualização onde se possa enviar artigos, discutir abertamente seja por cartas ao editor ou pelo sistema de revisão por pares e até mesmo sugestões sobre assuntos de interesse urológico. Neste número apresentamos artigos que são de grande interesse da saúde masculina como a reposição hormonal e a curvatura peniana. Esperamos poder melhorar cada vez mais a qualidade desta revista, para que continue sendo um instrumento prático, útil ao profissional da área da saúde e não exclusivamente um instrumento de interesse acadêmico. Ronaldo damião Editor chefe Eloísio alExsandRo da silva Editor associado U R O L O G I A V.18 N.3 JULHO C O N TE M P O R Â N E A SETEMBRO 2010 5 atualIzaÇão WWW.urologIacontEmPoranEa.org.br Wilson F s Busato Jr Doutor em Urologia pela UFPR, Professor de Urologia e Cirurgia Experimental da UNIVALI (Universidade do Vale do Itajaí) GilBerto l almeida Professor convidado de Urologia da UNIVALI (Universidade do Vale do Itajaí) Tumores de tecidos moles da bexiga Introdução O câncer de bexiga é o mais frequente do trato urinário e o 9° câncer em frequência no mundo, respondendo por 2,1% das mortes por neoplasias.1 Apresenta o mais alto custo de tratamento por paciente de todos os cânceres.2 A incidência vem aumentando, possivelmente em decorrência do efeito latente do tabagismo dos anos 60 a 80.3 Cerca de 90% dos tumores de bexiga são carcinomas de células transicionais (CCT), de 3% a 8% são carcinoma de células escamosas e 1% a 2% são adenocarcinomas.4,5 Todos os outros tumores vesicais são raros, descritos em pequenas séries ou relatos isolados. Esses tumores podem ser benignos ou malignos e apresentam características peculiares que devem ser conhecidas pelos urologistas. O objetivo desta revisão é fornecer uma base de pesquisa agrupando os tumores de tecidos moles que podem atingir a bexiga nos seus aspectos de UROLOGI A 6 V.18 N.3 C O NT EMPO R Â NEA JULHO SETEMBRO 2010 apresentação, diagnósticos, prognósticos e tratamento. O quadro 1 mostra uma classificação destas lesões. Tumores benignos 1 Leiomioma É o tumor benigno mais frequente da bexiga, ocorrendo em 0,43%.5,6 Diferente dos CCT, 75% ocorrem em jovens, média de 44 anos, e em mulheres.7,8 Esse tumor mesenquimal inicia a partir da submucosa e tem crescimento submucoso (7%), intravesical (63%) ou extravesical (30%),9 preservando a mucosa (Figura 1). Apresenta-se com sintomas irritativos (LUTS) e em apenas 11% ocorre hematúria, cerca de 20% são assintomáticos. Massa palpável pelo exame bimanual ocorre em 57%.10 Macroscopicamente, são pequenos tumores, bem delimitados, esbranquiçados, denso, sem áreas de necrose ou hemorragia.11 O tamanho pode variar de 1,5 a 25 cm. Histologicamente é um atualIzaÇão tumorES DE tEcIDoS molES Da bExIga WIlSon F S buSato Jr gIlbErto l almEIDa figura 1 Aspecto cistoscópico de leiomioma (esquerda) Tomografia do mesmo caso (direita) tumor do músculo liso, não infiltrativo, sem atividade mitótica celular atípica e necrose celular. A imuno-histoquímica (IHQ) mostra forte reatividade difusa para actina de músculo liso, actina músculo-específica, desmin e vimentina. Podem ser positivos para CD34 (33%) e negativos para citoqueratina e proteína S-100.10-12 A cistoscopia é o exame de escolha para o diagnóstico. Um defeito de enchimento na bexiga em urografia excretora ou uretrocistografia ou uma massa vesical circunscrita na CT com margens externas à bexiga bem delimitadas são sugestivos (Figura 1). A excisão endoscópica para pequenas lesões ou por cirurgia aberta para grandes tumores é curativa. Não são descritas recidivas ou metástases, de modo que não esta indicado o seguimento destas lesões.10 2 Neurofibroma É um tumor caracterizado pela proliferação de células de Schwann e semelhantes à perineuro, além de fibroblastos e células do tipo intermediário.13 Existe dúvida se é hiperplásico ou neoplásico, sendo essa última mais aceita atualmente.14 Menos de 75 casos foram descritos, a maioria relacionada à neurofibromatose tipo I (NF I) ou doença de Von Recklinghausen.10 Ocorre em média aos 17 anos de idade e sem preferência por sexo. A bexiga é o órgão mais frequente envolvido na NF I e geralmente o envolvimento é extenso e a cistectomia tem sido descrita em cerca de 30% dos casos, com 6% de transformação maligna.13,15,16 Clinicamente, aparecem com hematúria, LUTS ou massa pélvica com crescimento para fora da bexiga, que pode levar a obstrução urinária (Figura 2). O aspecto histológico é uma proliferação hipocelular de células fusiformes com núcleos ovóides ou alongados em um estroma mucinoso.13 O diagnóstico diferencial pode ser difícil com tumor maligno de bainha nervosa periférica de baixo grau (MPNST), leiomioma, leiomiosarcoma de baixo grau, rabdomiosarcoma e pesudo-tumor inflamatório, nestes casos a IHQ pode ser necessária.10,17 A IHQ é positiva para proteína S-100 e colágeno tipo-IV e negativa para antígeno de membrana epitelial, citoqueratinas CAM 5.2 e AE1/AE3, assim como p53.13 Devido ao extenso envolvimento vesical, acredita-se que estes tumores se originam no plexo autonômico pélvico adjacente que está em continuidade com os nervos do U R O L O G I A V.18 N.3 JULHO C O N TE M P O R Â N E A SETEMBRO 2010 7 atualIzaÇão tumorES DE tEcIDoS molES Da bExIga WIlSon F S buSato Jr gIlbErto l almEIDa figura 2 figura 3 RNM. A. com T1 (sem contraste) mostrando hiposinal; B. Lesão heterogênea com hipersinal em T2). Corte sagital (T1) com hiposinal de uma massa submucosa (seta) no interior da parede anterior da bexiga 3 Paraganglioma ureter, colo vesical e uretra.13 Isso explicaria o envolvimento concomitante de outras porções do TU. Seu tratamento ainda não está bem definido.18 Quando sintomáticos a exérese cirúrgica está indicada, por vezes extensa com cistectomia radical ou mesmo exenteração pélvica.13 Tratamento conservador (RTU ou cistectomia parcial) pode ser indicado em pacientes sem obstrução do trato urinário superior. Mesmo com baixo risco de malignização, é preciso manter um seguimento, até mesmo porque sequelas como atonia vesical, bexiga neurogênica e infecções de repetição podem ocorrer. UROLOGI A 8 V.18 N.3 C O NT EMPO R Â NEA JULHO SETEMBRO 2010 Originam-se no tecido paraganglionar extra-adrenal e não são produtores de hormônios.19,20 Paraganglioma vesical é uma neoplasia que pode iniciar a partir de restos embrionários de células cromafins no plexo simpático do detrusor.19-23 Tem comportamento pouco agressivo, mas de 5-19% podem ter uma evolução maligna,23 com identificação de gânglios ou metástases a distância, uma vez que não é possível somente pela análise histológica.20 A apresentação clínica clássica consiste na tríade de hipertensão paroxística, hematúria macroscópica indolor e “ataques urinários” com cefaléia, palpitações sudorese e visão borrada durante ou logo após a micção.22 Relata-se maior frequência em mulheres (3:1), entre 16 e 74 anos (média de 45 anos) e em 37% dos casos o tumor envolve os tecidos moles perivesicais ou órgãos adjacentes.23 É intramural e algumas vezes multifocal (Figura 3). Aproximadamente 50% são hereditários e podem estar associados com paraganglioma familiar, NF I e tríade de Carney.24 atualIzaÇão tumorES DE tEcIDoS molES Da bExIga WIlSon F S buSato Jr gIlbErto l almEIDa Histologicamente apresenta células epitelióides arredondadas ou poligonais dispostas em ninhos separados por uma rede sinusoidal proeminente. Não existem características histológicas seguras para diferenciar entre benignos e malignos,25 e a IHQ com reatividade aos marcadores neuroendócrinos, como cromogranina, sinaptofisina e enolase neurônio-específica (NSE).23 Quando há suspeita clínica, “crise urinária”, associada a exame de imagem sugestivo, a cistoscopia deve ser feita em ambiente cirúrgico após bloqueio adrenérgico, evitando-se biópsia e palpação bimanual.20 O tratamento consiste na RTU da lesão ou cistectomia (parcial ou total). Os cuidados pré-operatórios devem ser semelhantes àqueles para feocromocitomas de adrenal.26 Devido ao risco de recidiva local ou metacrônica, está indicado seguimento por toda a vida. 4 Hemangioma Tumor de origem mesenquimal, a partir de células angioblásticas embrionárias. O tipo mais frequente na bexiga é o cavernoso (78%), ainda há o capilar e o arteriovenoso.27 A maior série com 19 casos mostra um predomínio em homens (3,7:1), com idade média de 58 anos, tamanho médio de 0,7 cm.28 A presença de múltiplos hemangiomas pode estar associada com síndromes, incluindo síndrome de Klippel-Trenaunay-Weber e síndrome de Sturge-Weber.10,29 Ocorre hematúria macroscópica, mas também sintomas irritativos e dor abdominal. 28 Os exames de imagem mostram uma massa hipervascular, focal, lobular ou intramural com espessamento difuso da parede vesical (Figura 4).29 À cistoscopia vê-se uma lesão séssil, vermelho-azulada que pode gerar dúvida com endometriose, melanoma ou sarcoma.30 O diagnóstico é feito por biópsia, apesar do risco de sangramento. Histologicamente, são figura 4 Tomografia com hemangioma em parede vesical anterior29 compostos por pequenos vasos sanguíneos revestidos por células endoteliais achatadas ou cuboidais e separados por uma quantidade moderada de tecido fibroso.10 O tratamento pode incluir cauterização ou fulguração com laser e cistectomia parcial. A RTU da lesão traz consigo alto risco de sangramento e deve ser evitada em lesões de grandes dimensões.29 Com seguimento de sete anos nenhuma recidiva foi descrita.28 5 Schwanoma A maioria dos casos descritos estão associados a doença de Von Recklinghausen.31 Ocorre entre 30 e 50 anos de idade e se manifestam por sintomas de compressão vesical como dor supra-púbica, urgência miccional e polaciúria. Isto porque se iniciam na parede lateral da bexiga, abaixo de uma mucosa normal à cistoscopia, algumas vezes estendendo à gordura perivesical.32 Por esse motivo, a biópsia endoscópica pode ser difícil e o diagnóstico será estabelecido pela exerese total da lesão por cirurgia aberta ou laparoscópica.31 O diagnóstico U R O L O G I A V.18 N.3 JULHO C O N TE M P O R Â N E A SETEMBRO 2010 9 atualIzaÇão tumorES DE tEcIDoS molES Da bExIga WIlSon F S buSato Jr gIlbErto l almEIDa histológico diferencial com outras raras neoplasias de células fusiformes exige complementação com IHQ onde há positividade para proteína S-100, NSE e vimentina, sendo negativo para mioglobina, actina, desmina e fator VIII.10,31,32 Com poucos casos e seguimento de até 3 anos, não há relato de recidiva após a exérese. figura 5 Tomografia com massa de 12cm heterogênea 6 TTumor de células granulosas (TCG) Afeta principalmente a região da cabeça e pescoço, notadamente a língua. Pouco mais de dez casos de TCG vesical foram relatados.33 Descrito em 1926 por Abrikosoff, por isso também referido como tumor de Abrikosoff,34 afeta homens de meia idade. Os poucos casos descritos mostram lesões de até 9 cm, que podem ser multifocais ou múltiplas.10 Sua maior importância é diferenciar com tumores malignos, pois são sólidos, de margens mal-definidas e ulceradas. Podem ser assintomáticos ou apresentar hematúria macroscópica.35 O TCG da bexiga pode ser curado pela excisão cirúrgica da lesão ou cistectomia parcial, uma vez que apenas um caso descrito mostrou evolução maligna.33 Com poucas informações disponíveis, parece prudente manter seguimento destes pacientes.36 7 TTumor fibroso solitário Comumente apresenta comportamento benigno e deriva de células dendríticas intersticiais.37,38 Com menos de 10 casos descritos de TFS primário de bexiga, o tratamento segue o de outros órgãos.39 Podem variar de 3 a 20 cm e apresentam-se com sintomas irritativos, preferencialmente em homens com 42 a 67 anos. Aparecem como tumor arredondado, bem delimitado, amarelo-esbranquiçado que pode apresentar-se como lesão polipóide com mucosa intacta (Figura 5).10,38 Microscopicamente, caracterizam-se pela proliferação de células fusiformes regular UROLOGI A 10 V.18 N.3 C O NT EMPO R Â NEA JULHO SETEMBRO 2010 dentro de um fundo fibrocolagenoso, alternando áreas de hipoceluraridade e hipercelularidade.10 A histologia pode estabelecer o diagnóstico, mas a positividade difusa para CD34 é muito útil no diagnóstico diferencial com outras neoplasias de células fusiformes.39 O tratamento é a excisão da lesão, acompanhada ou não de cistectomia parcial. Achados de alta celularidade, moderada a alta atipia citológica, necrose, pleomorfismo celular e aumento da taxa mitótica podem indicar evolução clínica desfavorável, todavia, em curto seguimento (18 meses) não se tem noticiado recidiva.40,41 8 TTumor de células epitelióides perivasculares (PeComa) Pertencem a um raro grupo de neoplasias com potencial maligno imprevisível de origem mesenquimal. O termo PEComa foi utilizado originalmente por Zamboni et al e compreende tumores além do angiomiolipoma, tumor de células claras de “açúcar” de pulmão e linfangioleiomiomatose relacionados, mas com características clínicas distintas.42 PEComas já foram descritos na bexiga, rim e próstata, mas pouco se sabe de sua história natural,43,44 apenas três atualIzaÇão tumorES DE tEcIDoS molES Da bExIga WIlSon F S buSato Jr gIlbErto l almEIDa casos bem documentados de PEComa vesical foram descritos.10 PEComas em outros locais comportam-se tipicamente de forma benigna, ainda que recorrência local e metástases são ocasionalmente relatadas.43 Situam-se abaixo da mucosa e podem infiltrar estruturas adjacentes como intestino delgado,43 existe relato de uma lesão polipóide pediculada, irregular intra-vesical.45 Em 24 casos de PEComas de tecido mole ginecológicos, recorrência e metástase foram associadas com o tamanho tumoral > 5 cm, padrão de crescimento infiltrativo, alto grau nuclear, necrose e índice mitótico > 1/50.46,47 Ainda não está definido o tratamento, mas usualmente a excisão cirúrgica é curativa, dado a característica benigna destas lesões. Em lesões avançadas ou ressecções incompletas a adjuvância de quimioterapia (QT), radioterapia (RT) e imunoterapia (IT) têm sido sugeridas. Respostas parciais ou completas foram relatadas com dacarbazine, vincristina e mesilato de imatinib (inibidor da tirosina-kinase).48 Tumores malígnos Os tumores malignos de partes moles na bexiga podem conter estruturas presentes normalmente na parede vesical (leiomiosarcoma e angiomiosarcoma) ou tecidos que não fazem parte da parede vesical (rabdomiosarcoma, osteosarcoma, liposarcoma e condrosarcoma), Quadro 1.49 1 Leiomiosarcoma É o tumor mesenquimal maligno da bexiga mais frequente.50 Derivado do músculo liso, aparece entre 15-75 anos, com predomínio na sexta e sétima décadas, sendo duas mais frequentes em homens.51 Suspeita-se que possa ocorrer entre 5 e 20 anos pós-tratamento com figura 6 RNM com gadolinium em T1 mostrando reforço irregular da massa. A parede vesical adjacente (seta) esta anormalmente infiltrada pelo tumor ciclofosfamida52 e associação com a doença de Von Recklinghausen tem sido descrita. A história natural destes tumores primários da bexiga não é conhecida, com critérios de benignidade e malignidade mal definidos.50-52 Em 80% dos casos ocorre hematúria macroscópica e menos comumente LUTS ou efeito de massa. Exames de imagem da pelve podem demonstrar a lesão vesical (Figura 6), mas a histologia é quem estabelece o diagnóstico final. Salienta-se a importância de biópsias profundas e amplas. O diagnóstico diferencial é com os pseudosarcomas inflamatórios (nódulo de célula fusiforme pós-operatório e tumor miofibroblástico inflamatório) que ocorrem como consequência de cirurgias prévias, evitando a realização de grandes ressecções desnecessárias.53 A confirmação diagnóstica ocorre com a IHQ com positividade para desmina, vimentina e actina músculo-específica. Em tumores muito indiferenciados, a biologia U R O L O G I A V.18 N.3 JULHO C O N TE M P O R Â N E A SETEMBRO 2010 11 atualIzaÇão tumorES DE tEcIDoS molES Da bExIga WIlSon F S buSato Jr gIlbErto l almEIDa molecular permite diferenciar entre leiomioma e leiomiosarcoma. Isto através da medida do conteúdo de DNA no tumor, uma vez que os leiomiomas apresentam DNA diplóide enquanto os leiomiosarcomas tetraplóide ou aneuplóide. Outra técnica é a atividade proliferativa do MIB-1, sendo significativamente mais alta nos leiomiosarcomas.51 Martin et al revisaram 18 LMS de bexiga, verificando 60% dos casos de tumores agressivos com metástase ou óbito.51 Cerca de 80% são de alto grau,30 comparado ao baixo grau apresentam comportamento muito diferentes: com uma sobrevida média de 7 meses para o alto grau e de 65 meses no baixo grau.50 Metástases ocorrem para pulmão, fígado e intestinos. O tratamento não é consenso, descrito RTU com cauterização do leito com laser até cistectomia radical, complementados ou não com QT ou RT.49 Fato é que a cirurgia radical continua sendo o tratamento de escolha porque a excisão completa com margens cirúrgicas negativas relacionam-se ao melhor prognóstico. São muito pouco radiosensíveis, sendo opção para adjuvância em pequena doença residual.53 A QT com pobres resultados fica reservada para casos disseminados e o uso de RT+QT neoadjuvante para citorredução pré-operatório.54 2 rabdomiosarcoma (rmS) É o tumor maligno da bexiga mais frequente na criança e no adolescente, representando até 5% a 10%.17,56,57 A média de idade ao diagnóstico é de 4 anos. Pode ocorrer em qualquer tecido com exceção dos ossos, com aproximadamente 20% ocorrendo na bexiga.58 Apesar da denominação, ocorre tipicamente nos tecidos sem músculo estriado. Pode acometer outros órgão do TU.17,57 Crianças com neurofibromatose tipo I tem maior incidência, particularmente na bexiga e próstata.59 Histologicamente, são classificados como embrionário, alveolar, UROLOGI A 12 V.18 N.3 C O NT EMPO R Â NEA JULHO SETEMBRO 2010 pleomórfico e tipo misto.17,60 A forma embrionária é mais comum em crianças, enquanto RMS pleomórfico, tipo mais raro, ocorre principalmente em adultos e tem prognóstico reservado. Leuschner et al63 descreveram o padrão de crescimento como a única característica com influência significativa na sobrevida. Apresenta-se por hematúria macroscópica, mas pode ocorrer massa abdominal palpável ou sintomas urinários obstrutivos (Figura 7).62 Macroscopicamente, apresentam-se como lesão polipóide projetando-se para o lúmem vesical de forma lobulada. Por baixo de um epitélio de revestimento há um aspecto mixóide e gelatinoso com hemorragia e necrose variáveis.58 Critérios microscópicos para o diagnóstico exigem a presença de rabdomioblastos pleomórficos, que variam em tamanho e forma, arredondados, fusiformes, girino e em raquete, e mostram citoplasma eosinofílico abundante com aspecto granulado.61 A análise IHQ confirma a natureza miogênica destes tumores, com positividade para desmina, MYOD1 e mioglobina e estriação muscular. O diagnóstico diferencial deve incluir liposarcoma indiferenciado. Mais recentemente, em casos difíceis, o diagnóstico por hibridização genômica cromossomal (CGH) e hibridização fluorescente in situ (FISH) pode demonstrar ganhos ou perdas de cromossomos ou regiões, a mais frequentemente descrita foi do 1p35-36.3.63 A maioria dos pacientes é tratada com ressecção vesical conservadora, QxT e RxT.64 Mas ocorre morbidade pós-tratamento, com apenas 40% dos pacientes mantendo função vesical normal e algumas sequelas actínicas. A sobrevida em 6 anos é de 82%.64 3 TTumor neuroectodérmico primitivo (PN eT) Existem apenas nove casos primário da bexiga relatados na literatura.65-72 Descritos inicialmente em 1918, os PNETs compreendem um atualIzaÇão tumorES DE tEcIDoS molES Da bExIga WIlSon F S buSato Jr gIlbErto l almEIDa figura 7 RNM axial em T1 com contraste mostrando grande rabdomiosarcoma extravesical invasivo grupo de neoplasias malignas de pequenas células redondas que podem ocorrer em qualquer parte do corpo. Lesões raras, agressivas e que se originam nas células neuroectodérmicas com características colinérgicas e estão relacionados com o sarcoma de Ewing.69,70 Com tão poucos casos relatados não é possível estabelecer uma diretriz de abordagem destes tumores.66 Não sabemos se a RTU do tumor, nos moldes do CCT, é suficiente ou se a cistectomia deve ser considerada precocemente. A análise do comportamento em outros órgãos do TU também é incerta.73 Mais casos descritos são necessários para definir protocolos de tratamento. Com os avanços da IHQ o relato de novos casos deverá aumentar.67 Os fatores de risco não estão definidos, mas imunodeficiência tem sido relacionada com outros tumores da família Ewing.58,73 Quatro casos apresentavam história de imunosupressão, mas os outros cinco casos não. Os PNET vesicais tendem a ter boa evolução, enquanto os metastáticos uma sobrevida muito curta. Além disso, a doença se dissemina principalmente na pelve para os tecidos perivesicais, incluindo reto, próstata, vesículas seminais e peritônio. Dois casos de doença disseminada mostraram metástase pulmonar66 e para linfonodos para-aórticos.70 A USG, CT ou RNM mostram uma lesão exofítica no interior da bexiga. Na cistoscopia vê-se um tumor sem vilosidades, não-vegetante, polipóide com superfície lisa com áreas extensas de necrose. O diagnóstico é estabelecido pelos achados histológicos e de IHQ. Histologicamente, é uma neoplasia formada por células pequenas, ricas em glicogênio, mostrando inúmeras figuras mitóticas, estruturas do tipo roseta e áreas de necrose. As células tumorais são monótonas, com escasso citoplasma basófílo, arranjando-se em lençóis lobulares e rodeados por estroma fibrovascular. Os nucléolos são imperceptíveis ou estão ausentes. Na IHQ o perfil de imunorreatividade mostra forte positividade para o CD-99, vimentina e CD-117(Figura 3). A positividade focal para a citoqueratina (AE1 ou AE3) ocasionalmente está presente. Estas neoplasias não reagem com os anticorpos actina músculo liso, cromogranina, antígeno da membrana epitelial, desmina e antígeno leucocitário comum.71 A IHQ auxilia no diagnóstico diferencial de outras neoplasias com morfologia semelhante, tais como o carcinoma neuroendócrino, as neoplasias linfóides e o melanoma.58 Como o CD99 não é específico, deve-se realizar outros anticorpos para excluir linfomas linfoblásticos, sarcomas, carcinomas neuroendodérmicos e, eventualmente, rabdomiosarcoma.17 A detecção pelo teste de FISH ou com RT-PCR da translocação tanto de t(11;22)(q24;q12) como de t(21;22)(q12;q12), é considerada diagnóstica de PNET/ES.17,71 A translocação t(11;22) (q24,q12) produz a fusão do gene EWS U R O L O G I A V.18 N.3 JULHO C O N TE M P O R Â N E A SETEMBRO 2010 13 atualIzaÇão tumorES DE tEcIDoS molES Da bExIga WIlSon F S buSato Jr gIlbErto l almEIDa (Sarcoma de Ewing), localizado em 22q12, com o gene FLI-1 (situado em 11q24). A translocação do gene t(21;22)(q12;q12) gera a fusão dos genes EWS e ERG (Ets related gene).74 Ambas as translocações são detectadas em 90-95% dos casos.18 Mais recentemente, uma terceira translocação, t(7;22) –, foi descrita, estando associada a um pior prognóstico, denotando uma doença mais agresiva.75 O tratamento baseia-se no utilizado em Sarcoma de Ewing.58 Sendo assim, consiste de tratamento local (exerese ou RxT) e QxT.74 Desde que o Grupo de Estudos do Sarcoma de Ewing demonstrou melhora na evolução com QxT baseada na doxorubicina, todos os protocolos se baseam nas seguintes drogas: doxorubicina, ciclofosfamida, vincristina e ifosfamida com etoposide. 76 Mais recentemente, uma combinação de gencitabine e docetaxel mostrou bons resultados e maiores taxas de sobrevida.74 No entanto, como nos outros tumores da família Ewing, a QT apresenta bons resultados na doença localizada, mas não melhora a sobrevida na doença avançada. A RT não está bem estabelecida em PNET de bexiga. O prognóstico parece estar relacionado com a presença de metástases nos poucos casos relatados e fazendo uma analogia ao SW também podem representar pior prognóstico quando maior idade, ressecção incompleta e resposta inadequada a quimioterapia.74 4 angiosarcoma (aSm) Somente 10 casos foram descritos na literatura. Tem inicio no endotélio vascular.77 Ocorre na meia-idade (média de 64 anos), tipicamente em homens (8:1) e tem mau prognóstico, com uma sobrevida em 5 anos de apenas 24%. Metade dos pacientes morrem nos primeiros 11 meses.78 História de radioterapia prévia está presente em 20% dos casos. UROLOGI A 14 V.18 N.3 C O NT EMPO R Â NEA JULHO SETEMBRO 2010 A apresentação pode ser com hematúria (100%), também disúria(33%), dor em flanco ou virilha (22%), obstrução (11%) e emagrecimento (11%).77 Assim como em sítios, na bexiga se apresentam como grandes massas hemorrágicas difíceis de ressecar com margem adequada.79 O diagnóstico é feito pelo estudo patológico e IHQ que mostra positividade para vimentina, CD31 e CD34 com imunoreatividade variável para antígeno fator VIII-relacionado.58,80 5 TTumor malígno da bainha neural periférica (mPNST) É o tumor maligno relacionado aos tumores benignos de partes moles como neurofibromas e schwanomas. Anteriormente foram denominados de neurofibromas ou schwanomas malignos. Ocorrem mais frequentemente nas proximidades de um tronco nervoso, como nervo ciático, plexo braquial ou sacral.81 Pessoas com neurofibromas plexiformes internos apresentam 20X mais risco de MPNST. Atingem adultos jovens, na quarta década de vida e o diagnóstico é feito a partir de casos de hematúria de forma esporádica em 40%, associada à neurofibromatose tipo I em 50% e induzido por radioterapia em 10%.82 Esse é um tumor altamente agressivo de rápida evolução.58 À cistoscopia vê-se placas ou nódulos múltiplos, grandes, com superfície ulcerada e áreas de necrose e os exames de imagem falha de enchimento (Figura 8).81 Microscopicamente, o apresenta arranjo de células indiferenciadas dispostos em fascículos entrelaçados de células fusiformes malignas. Na IHQ apresentam positividade para proteína S-100 e vimentina e são focalmente positivos para enolase neurônio-específica. O prognóstico é pobre com recidiva local ou metástase à distância precocemente nos 2 meses seguintes a ressecção do tumor. atualIzaÇão tumorES DE tEcIDoS molES Da bExIga WIlSon F S buSato Jr gIlbErto l almEIDa figura 8 Urografia mostrando grande falha de enchimento e a direita tomografia com grande histiocitoma fibroso maligno heterogêneo 6 Histiocitoma fibroso malígno (mFH) Descrito por O’Brien e Stout em 1964, é o sarcoma mais comum de tecidos moles em adultos e o segundo no TU. Mas menos de 30 casos de MFH primário da bexiga foram descritos.84 Atinge homens na sexta década de vida e se manifesta com hematúria, LUTS ou massa palpável.85 Crescimento pouco sintomático, apresentando-se como grandes massas envolvendo toda a parede vesical (Figura 8), podendo o urotélio estar intacto ou ulcerado.86 Quatro variantes morfológicas são descritos: mixóide, inflamatório, estoriforme-fascicular e pleomórfico. Análise IHQ é necessária para se estabelecer o diagnóstico diferencial, com o carcinoma sarcomatóide, tumor miofibroblástico inflamatório e o leiomiosarcoma.58,84 São tumores bastante agressivos com altas taxas de recidiva local e metástases, ocorrendo em até 42% dos pacientes submetidos a cistectomia radical. O tratamento com cistectomia radical com linfadenectomia seguido de RT adjuvante é recomendado.87-89 A taxa de recidiva local e de metástase à distância reduz de 50% para 0% e de 25% para 20%, respectivamente, 83 quando se compara cistectomia isolada ou combinada com RT ou QT.89 Em caso de recidiva local, a indicação é a exerese cirúrgica seguida por RT local e nos casos de metástases indica-se a associação sinérgica de RT mais QT. A QT baseada em adriamicina é reservada, juntamente com RT, para os casos de doença disseminada. A sobrevida descrita é de 40% em 3 anos. 7 Hemangiopericitomas (HPC) São neoplasias vasculares originadas dos pericitos, células presentes na parede vascular, embebidas na membrana basal, onde entram em contato focal com o endotélio vascular. Ocorrem nas extremidades inferiores, pelve e retroperitônio, cursando com lento crescimento e diagnóstico já com grandes massas (Figura 9).91 Geralmente com diagnóstico tardio, por obstrução ou sintomas irritativos de bexiga, com metástase em cerca de 50% dos casos.58,92 Macroscopicamente, o HPC é bem circunscrito e coberto por uma fina pseudocápsula, ricamente vascularizada. Devido à liberação de fator de crescimento insulina-like, U R O L O G I A V.18 N.3 JULHO C O N TE M P O R Â N E A SETEMBRO 2010 15 atualIzaÇão tumorES DE tEcIDoS molES Da bExIga WIlSon F S buSato Jr gIlbErto l almEIDa pla do tumor, enquanto a RxT e a QxT são reservadas para os casos de tumores metastáticos ou irressecáveis.91 figura 9 Tomografia de grande hemangiopericitoma vesical 8 Carcinoma sarcomatóide (Carcinosarcoma) síndromes paraneoplásicas tais como hipoglicemia, estão associadas e ocorrem em até 50% dos casos e hipertensão arterial secundária à produção ectópica de renina também é relatada.93 O diagnóstico diferencial na bexiga é feito pela IHQ com o tumor fibroso solitário. O tratamento é a ablação cirúrgica am- Carcinosarcoma de bexiga é um tumor raro caracterizado por uma mistura de elementos epiteliais malignos (carcinoma) e elementos de tecidos moles malignos (sarcoma). O componente epitelial, facilmente identificável ou não, pode ser invasivo ou carcinoma in situ.88,93,94 Representam cerca de 0,31% dos cânceres de bexiga. Sua ocorrência pode estar associada com radioterapia ou quimioterapia.94,95 O termo mais correto parece ser carcinoma sarcomatóide. Estes tumores são agressivos, de alto grau e com pobre prognóstico.96 Ocorrem na sexta década de vida mais em homens (4:1) e o tabagismo e o tratamento com ciclofosfamida também são fatores etiológicos.97 O componente epitelial mais frequentemente encontrado é o carcinoma transicional de alto grau (80%), seguido do carcinoma de figura 10 A) Urografia com falha de enchimento na bexiga B) Tomografia axial da lesão mostrou massa polipóide UROLOGI A 16 V.18 N.3 C O NT EMPO R Â NEA JULHO SETEMBRO 2010 Atualização Tumores de tecidos moles da bexiga Wilson F S Busato Jr Gilberto L Almeida células escamosas (32%), do adenocarcinoma (26%), do carcinoma de células pequenas (5%) e em 33% misto. Quanto ao componente mesenquimatoso, o mais frequente é o osteossarcoma (37%), seguido do condrossarcoma (20-47%), do rabdomiossarcoma (20%), do sarcoma de células fusiformes indiferenciado (17%) e do leiomiossarcoma (7%).98 Apresenta-se com hematúria, LUTS ou por achado inicial em exame de imagem de rotina (Figura 10). O diagnóstico é feito pelo exame histológico e análise IHQ,58,96 em alguns casos o componente epitelial não pode ser reconhecido à microscopia óptica, necessitando de IHQ para sua evidenciação. O diagnóstico diferencial deve ser feito com sarcomas primários, carcinomas primários com metaplasia estromal, carcinomas com estroma pseudosarcomatoso, sarcomas associados a hiperplasia pseudoepiteliomatosa, teratomas e carcinomas da próstata com extensão para a bexiga.97,98 Devido á raridade dos sarcomas da bexiga no adulto, na presença de um tumor maligno de células fusiformes, a hipótese de carcinoma sarcomatóide deve ser considerada até comprovação IHQ.97 A microscopia eletrônica também pode auxiliar no diagnóstico.99 O tratamento e estadiamento deve ser o mesmo do CCT usual de bexiga. Referências 1. Parkin M, Bray F, Ferlay J, Pisani P. Global cancer statistics, 2002. CA Cancer J Clin. 2005; 55(2):74-108. 2. Miller BA, Kolonel LN, Bernstein L, et al. Racial/ethnic patterns of cancer in the United States 1988-1992, National Cancer Institute. NIH Pub. 1996; 96:4104. 3. Weir HK, Thun MJ, Hankey BF, Ries LAG, Howe HL, Wingo PA, Jemal A, Ward E, Anderson RN, Edwards BK. 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[email protected] U R O L O G I A V.18 N.3 JULHO C O N TE M P O R Â N E A SETEMBRO 2010 17 multIDIScIPlInarIDaDE José Germano Ferraz de WWW.urologIacontEmPoranEa.org.br arruda Professor Doutor da Disciplina de Urologia e Chefe do Departamento de Especialidades Cirúrgicas da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto (FAMERP) Fernando nestor Facio Júnior Professor Doutor da Disciplina de Urologia do Departamento de Especialidades Cirúrgicas da FAMERP e Responsável pelo Ambulatório de Andrologia do Hospital de Base de São José do Rio Preto Germano José Ferraz de arruda Graduando do 4º ano do curso de Medicina da FAMERP Pedro Francisco Ferraz de arruda Professor Convidado da Disciplina de Urologia do Departamento de Especialidades Cirúrgicas da FAMERP e Responsável pela Cirurgia do Transplante Renal do Hospital de Base de São José do Rio Preto Profilaxia da trombose venosa profunda em Urologia Introdução A trombose venosa profunda (TVP) é uma doença caracterizada pela formação de trombos de forma oclusiva total ou parcial, em veias do sistema venoso profundo, principalmente nos membros inferiores. O quadro clínico depende da extensão da trombose e das veias atingidas, sendo caracterizado principalmente por dor e edema no membro afetado. Essa enfermidade afeta anualmente 1 a 2 pessoas em cada 1.000 habitantes,1 estando presente como complicação da internação hospitalar em praticamente todas as especialidades clínicas ou ci- UROLOGI A 20 V.18 N.3 C O NT EMPO R Â NEA JULHO SETEMBRO 2010 rúrgicas. Nos Estados Unidos é a terceira causa de morte por doença cardiovascular, principalmente entre os idosos. 2 Nas últimas décadas a incidência dessa doença diminuiu, no entanto, o tromboembolismo pulmonar e a TVP ainda representam problema de saúde pública. 3 Estudos mostram incidência de 10 a 40% de TVP em pacientes submetidos à cirurgias abdominais. 4 Em cirurgias urológicas como a prostatectomia radical, a incidência de TVP após esse procedimento cirúrgico varia de 1 a 3%.5 O uso de anticoagulante no pós-operatório imediato aumenta a incidência de linfocele ou da drenagem linfática. 6 multidisciplinaridade Profilaxia da Trombose Venosa Profunda em Urologia José Germano F. de Arruda Fisiopatologia O retorno venoso que ocorre a partir dos membros inferiores tem que enfrentar a gravidade e pressão intra-abdominal. Nessa dinâmica, como sugerido inicialmente por Rudolf Virchow em 1856, é possível reconhecer três fatores responsáveis pela gênese de um trombo venoso: 1) anormalidades do fluxo sanguíneo (estase venosa), 2) anormalidades do sangue (hipercoagulabilidade) e 3) integridade do endotélio (lesão da íntima). 7 Fatores de risco A TVP frequentemente está relacionada a fatores de risco que podem promover seu aparecimento súbito em pacientes hígidos ou como complicação clínica e ou cirúrgica.1-3 Em cirurgias urológicas de grande porte a prevalência de TVP é de 15-40%.8 Esses pacientes hospitalizados apresentam geralmente mais de dois fatores de risco para TVP. Em pacientes urológicos, os principais fatores de risco incluem:9 • • • • idade avançada doença maligna posição de litotomia cirurgia pélvica (com ou sem dissecção linfonodal) • procedimento de longa duração • terapia hormonal para câncer Profilaxia A profilaxia da TVP tem importância comprovada e baseia-se na avaliação do risco em que se encontra o paciente. As cirurgias urológicas são referidas especificamente em consensos devido à sua importância e prevalência. 8 De acordo com o American College of Chest Physicians as principais recomendações incluem:8 Fernando Nestor Facio Júnior Germano J. F. de Arruda Pedro F. F. de Arruda • em pacientes submetidos a cirurgias transuretrais ou outros procedimentos de baixo risco não é necessária profilaxia específica senão a deambulação e movimentação precoce e contínua; • em pacientes submetidos a procedimentos de grande porte ou cirurgias abertas é recomendado heparina não-fracionada de baixa dose (duas a três vezes ao dia) ou de baixo peso molecular (uma vez ao dia) e dispositivos de compressão pneumática; • em pacientes com sangramento ou com alto risco de sangramento é recomendado o uso de compressão pneumática intermitente e/ou meias de compressão moderada; • em pacientes com múltiplos fatores de risco é recomendada compressão pneumática intermitente e/ou meias de compressão moderada associada à heparina não-fracionada de baixa dose ou heparina de baixo peso molecular. Diagnóstico O diagnóstico baseia-se inicialmente na avaliação de preditores clínicos validados como a regra de Wells específica para TVP. A partir do risco obtido pode-se associar a dosagem do dímero-D ultra-sensível em pacientes de baixo risco. Pacientes de risco intermediário e alto devem ser submetidos à ultra-sonografia com Doppler. Em caso de dúvida, a venografia contrastada é o método mais eficaz. Pacientes com suspeita de tromboembolismo pulmonar devem ser submetidos à avaliação por imagem, incluindo scan de ventilação/perfusão, tomografia computadorizada helicoidal de tórax e angiografia pulmonar.9 Tratamento Uma vez diagnosticada a TVP, o tratamento é direcionado ao não aumento do trombo, isto é, a anticoagulação.10 De acordo com Büller et al.,11 existem três opções para o tratamento inicial da U R O L O G I A V.18 N.3 JULHO C O N TE M P O R Â N E A SETEMBRO 2010 21 multidisciplinaridade Profilaxia da Trombose Venosa Profunda em Urologia José Germano F. de Arruda TVP:1) heparina de baixo peso molecular ajustada conforme peso corpóreo e administrada por via subcutânea sem monitoração; 2) heparina não-fracionada IV, ou 3) heparina não fracionada IV administrada por via subcutânea com monitoração e subsequentes ajustes de dosagem. Quaisquer terapias invasivas de retirada ativa do coágulo ou filtro de veia cava inferior não encontram fundamentação em trabalhos científicos não sendo, portanto, recomendadas. O tratamento a longo prazo deve ser dirigido à causa e contexto em que se iniciou o quadro. Fernando Nestor Facio Júnior Germano J. F. de Arruda Pedro F. F. de Arruda Considerações Finais Os cuidados inerentes à profilaxia da TVP, o diagnóstico precoce e o tratamento correto e imediato merecem maior atenção dos urologistas. A utilização de profilaxia em pacientes com risco potencial de desenvolver trombose venosa profunda pode reduzir as taxas de morbidade e mortalidade associada a uma embolia pulmonar muitas vezes fatal. Apesar da eficiência da profilaxia da TVP, comprovada em vários estudos, a mesma continua sendo pouco utilizada em nosso meio. Referências 1. Silva MC. Epidemiologia do tromboembolismo venoso. J Vasc Br 2002; 1:83-4. da trombose venosa profunda aguda. In: Rutherford RB, editor. 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Chest. 2004 Sep; 126(3 Suppl):401S-428S. urologIa DE conSultórIo daniel de WWW.urologIacontEmPoranEa.org.br Freitas G. soares Médico Residente em Urologia da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA) e Serviço de Urologia da Santa Casa de Porto Alegre ernani luis rhoden Professor Livre-Docente em Urologia da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA) e Serviço de Urologia da Santa Casa de Porto Alegre Médico do Corpo Clínico do Hospital Moinhos de Vento de Porto Alegre Pós-Doutorado em Urologia, Harvard University, Boston, EUA deficiência androgênica do envelhecimento masculino (daem) e terapia de reposição hormonal com testosterona (trt) Introdução A expectativa de vida da população brasileira tem aumentado nas últimas décadas, estimando-se que no ano de 2045 o número de pessoas com 65 anos ou mais irá suplantar o número de crianças. Com isso, cresce o interesse nas doenças que acometem a população idosa e os efeitos do envelhecimento na saúde e na qualidade de vida. Diversos estudos têm demonstrado uma prevalência progressivamente aumentada do hipogonadismo masculino relacionado a idade. Está bem descrito que a testosterona desempenha papel fundamental no desenvolvimento mas- UROLOGI A 24 V.18 N.3 C O NT EMPO R Â NEA JULHO SETEMBRO 2010 culino e no funcionamento de diversos sistemas. Tanto a testosterona quanto seus principais metabólitos, a diidrotestosterona (DHT) e o estradiol, atuam diretamente sobre órgãos-alvo, tais como órgãos sexuais, ossos, músculos, medula óssea, pele e fâneros e tecido adiposo, bem como em diversos centros do sistema nervoso central (Tabela 1).1,2 Com o aumento da idade, as concentrações séricas de testosterona e, por consequência, de testosterona livre, diminuem. Em homens com mais de 40 anos, a deficiência androgênica é, na maioria dos casos, consequência de defeitos neuro-regulatórios hipotalâmico-hipofisários, da diminuição do tamanho da urologIa DE conSultórIo DaEm E tEraPIa DE rEPoSIÇão hormonal com tEStoStErona (trt) DanIEl DE FrEItaS g. SoarES ErnanI luIS rhoDEn Tabela 1 Efeitos biológicos dos androgênios no homem2 TECIDO-ALVO EFEITO Órgãos sexuais Estímulo da diferenciação pré-natal e desenvolvimento até a puberdade dos testículos, pênis, epidídimo, vesículas seminais e próstata. Nos adultos, manutenção desses tecidos e início e manutenção da espermatogênese. Função sexual e comportamento Estímulo e manutenção da função sexual do homem. Modulação central e periférica da função erétil.1 Melhora da libido quando administrada a homens hipogonádicos, bem como do humor, memória, energia e sensação de bem-estar.3 Ossos Crescimento linear, fechamento das epífises, aumento da densidade mineral óssea. Os androgênios estimulam a proliferação de células ósseas in vitro. O hipogonadismo é fator de risco para osteoporose em homens.5 Músculo Efeito anabólico. Aumento do equilíbrio nitrogenado, da massa corporal magra e do peso corpóreo. Aumento do tamanho de todas as células musculares, com pouco efeito em seu número. Fígado Aumento da síntese de fatores de coagulação, lípase hepática de triglicerídeos, ácido siálico, alfa-1-antitripsina e haptoglobulina. Diminuição da síntese de SHBG, outras proteínas carreadoras de hormônios, transferrina e fibrinogênio. Rins Estímulo à produção de eritropoetina. Coração Vasodilatação coronariana. Lipídios Diminuição do tecido adiposo corporal e visceral. Meninos adolescentes com puberdade tardia e homens hipogonádicos possuem concentrações plasmáticas de HDL diminuídas. Medula óssea e sistema imune Efeitos supressores na resposta imune, tanto humoral quanto celular, e atuam como hormônios anti-inflamatórios naturais.6,7 Pele e fâneros Responsável pelo padrão masculino de crescimento de pêlos. Os folículos pilosos podem metabolizar a testosterona em DHT. Aumento da produção sebácea da pele, envolvida com o desenvolvimento de acne. hipófise com a idade, da diminuição das células de Leydig e de sua capacidade de produzir testosterona. A diminuição da secreção de testosterona com a idade pode tornar-se clini- camente relevante dependendo da capacidade endócrina dos testículos e da sensibilidade individual aos androgênios. A deficiência relativa de androgênios agrava-se pelo aumento U R O L O G I A V.18 N.3 JULHO C O N TE M P O R Â N E A SETEMBRO 2010 25 urologIa DE conSultórIo DaEm E tEraPIa DE rEPoSIÇão hormonal com tEStoStErona (trt) DanIEl DE FrEItaS g. SoarES da SHBG (sex hormone-binding globulin) com a idade, tendo em vista que a testosterona ligada a esta proteína não apresenta atividade biológica relevante, ao contrário do que acontece com as forma livres e ‘aquela ligada a albumina (testosterona biodisponível).3 Os sinais e sintomas clínicos são heterogêneos e de pouca especificidade e, portanto, nem sempre reconhecidos. O objetivo desta revisão é, portanto, sumarizar a compreensão atual a respeito da deficiência androgênica relacionada ao envelhecimento do homem (DAEM), com especial referência ao diagnóstico e ao tratamento. Uma consideração chave para o urologista está no significado clínico dos níveis subnormais de testosterona e de como o paciente hipogonádico pode se beneficiar com a terapia de reposição hormonal. Estar atento às contra-indicações e aos riscos potenciais associados ao tratamento é fundamental, assim como a apropriada monitorização da referida terapia. ErnanI luIS rhoDEn Quadro 1 Síndrome clínica de DAEM segundo a EAU a. Reconhecimento simples da diminuição do desejo sexual e qualidade da função erétil, particularmente das ereções noturnas. b. Alterações do humor com diminuição concomitante da atividade intelectual, orientação espacial, fadiga, humor depressivo e irritabilidade. c. Distúrbios do sono. d. Diminuição da massa magra com diminuição associada no volume e força muscular. e. Aumento da gordura visceral. f. Diminuição dos pêlos corporais e alterações da pele. g. Diminuição da densidade mineral óssea, originando osteopenia e osteoporose. definição e diagnóstico de daem Define-se DAEM como o conjunto de sinais e sintomas relacionados a presença de níveis subnormais de testosterona. O DAEM apresenta uma íntima relação com o envelhecimento masculino, sendo a sua prevalência mais comum em faixas etárias mais avançadas, mas não está relacionado a uma causa específica. 4 A Associação Européia de Urologia (European Association of Urology - EAU) relaciona clinicamente o DAEM com:5,6 (Veja quadro 1, ao lado) Os valores de testosterona total estabelecidos em diretrizes clínicas variam, sendo que a maioria dos especialistas estima um valor acima de 300 ng/ml como normal.7,8,9,10 Outros autores, citam a seguinte regra: homens com dosagem < 200 ng/ml são hipogonádicos. Aqueles com dosagem > 400 ng/ml dificilmenUROLOGI A 26 V.18 N.3 C O NT EMPO R Â NEA JULHO SETEMBRO 2010 te o são e os indivíduos com dosagem entre 200-400 ng/ml devem ser avaliados com base na apresentação clínica. Aspecto que deve ser enfatizado é a de que o DAEM não deve ser abordado como essencialmente uma síndrome bioquímica, e cujo diagnóstico esteja essencialmente vinculado com a determinação dos níveis séricos de testosterona. Talvez a abordagem mais apropriada seja a proposta por Morales e Lunenfeld (Investigation, treatment and monitoring of late-onset hypogonadism in males – Official recommendations of ISSAM 2002) na qual, embora sugerindo um ponto de corte de 346ng/dL para a testosterona total, enfatizam que a definição bioquímica é menos relevante do que a clínica, propondo que todo homem que apresente características clínicas de hipogona- urologIa DE conSultórIo DaEm E tEraPIa DE rEPoSIÇão hormonal com tEStoStErona (trt) DanIEl DE FrEItaS g. SoarES ErnanI luIS rhoDEn Quadro 2 Fórmula empregada para o cálculo da testosterona livre13 Testosterona livre calculada (mol/L) = ([T] – (N x [TLC]) (KT x [SHBG - T + N x TLC]) Onde: T = Concentração de testosterona total, em mol/L (ng/dl x 34,67 = pmol/L). KT = 1 x 109 L/mol, corresponde à constante de associação da testosterona à SHBG. N = Ka x Ca +1, onde Ka = 3,6 x 104 L/mol (constante de associação de testosterona à albumina). Ca = concentração de albumina (mol/L). SHBG = Sex Hormone Binding Globulin (mol/L). dismo associadas a evidência bioquímica de diminuição da produção de testosterona deva receber tratamento.5 A Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia, em suas Diretrizes publicadas em 2004, sugere a reposição quando a presença de sintomas sugestivos de deficiência androgênica for acompanhada de níveis séricos de testosterona total abaixo de 300 ng/dl e níveis de testosterona livre abaixo de 6,5 ng/dl.11 A Sociedade Brasileira de Urologia (SBU) acompanha, no contexto global, as recomendações das principais Sociedades Internacionais, destacando que DAEM é uma síndrome fundamentalmente clínica, não dependente de valores bioquímicos rígidos. Salienta, ainda, a importância da participação do paciente na decisão terapêutica. É fundamental, portanto, que o médico exponha claramente ao paciente os riscos e benefícios da TRT antes de prescrevê-la.12 A abordagem laboratorial inicial na avaliação do homem com sintomas potencialmente relacionáveis ao DAEM se faz, portanto, pela dosagem de testosterona total. Embora questionada por alguns autores, a colheita sérica deve ser realizada, preferencialmente, no período da manhã, entre 8 e 10 horas, devido a variação circadiana da testosterona. Em homens com idades mais avançadas, diferentemente do que acontece em homens jo- vens, a ritmicidade do ritmo circadiano é menos relevante, e portanto, o horário de colheita sanguínea teria pouca influência sobre os níveis de testosterona. Além disso, outros exames eventualmente podem ser necessários para caracterizar o status androgênico do homem com suspeita de DAEM.4 Uma avaliação complementar deve incluir a dosagem da SHBG, prolactina e, eventualmente, a determinação da testosterona livre, exames que nem sempre estão acessíveis a todos os pacientes no nosso meio. Vários métodos laboratoriais são utilizados para dosar a testosterona livre, sendo o método dialítico o padrão-ouro. Este método, entretanto, é caro e pouco disponível e, as técnicas por radioimunoensaio não parecem ser fidedignas. Além disso, diversas condições clínicas estão relacionadas com alterações nos níveis de SHBG (Tabela 2), o que pode trazer confusão na interpretação de um nível normal-baixo ou sub-normal de testosterona total. Por isso, pode ser utilizada a fórmula de Vermeulen (Quadro 2) para estimar o valor da testosterona livre, com base nos valores de SHBG, albumina e testosterona total. Esta equação apresenta alto coeficiente de correlação (r=0,987) com o método dialítico. Consideram-se normais valores de testosterona livre entre 5 e 20 ng/dl.13 Em relação às alterações clínicas, diversos questionários foram desenvolvidos para avaliar U R O L O G I A V.18 N.3 JULHO C O N TE M P O R Â N E A SETEMBRO 2010 27 urologIa DE conSultórIo DaEm E tEraPIa DE rEPoSIÇão hormonal com tEStoStErona (trt) DanIEl DE FrEItaS g. SoarES ErnanI luIS rhoDEn Tabela 2 Tabela 3 Fatores que podem alterar as concentrações séricas de SHBG e de testosterona biologicamente ativa. Prevalência de DAEM em diferentes países. Elevação SHBG Hipertireoidismo Cirrose Anorexia Estrogênios Envelhecimento Diminuição SHBG Hipotireoidismo Obesidade Androgênios Síndrome de Cushing o homem com provável deficiência de testosterona, abordando de forma sistemática as funções sexual, psicológica e somática-vegetativa. Os mais utilizados na prática do urologista são: • Questionário ADAM (Androgen Deficiency in the Aging Male, Universidade de St. Louis, 1999): 10 perguntas; sensibilidade 88%, especificidade 60%.14,15 • Questionário MMAS (Massachusets Aging Male Study Study): 8 perguntas e um sub-questionário de 12 perguntas sobre atividade sexual; sensibilidade 76%, especificidade 49%.16,17 • Questionário AMS (Aging Male Symptoms, Alemanha, 1999): 17 perguntas; sensibilidade 83%, especificidade 39%.18 epidemiologia Estima-se a ocorrência de DAEM em aproximadamente 20% dos idosos, com variabilidade entre alguns países (Tabela 3). É interessante observar que as cifras de DAEM aumentam de forma substancial naqueles estudos onde é empregada a testosterona livre ou biodisponível como parâmetro definidor do status androgênico. Nos Estados Unidos, por exemplo, há uma prevalência aproximada de 4 a 5 milhões de indivíduos com DAEM, em uma população constituída de 40 milhões (13%) de idosos.19 UROLOGI A 28 V.18 N.3 C O NT EMPO R Â NEA JULHO SETEMBRO 2010 País Estados Unidos Alemanha Índia Taiwan Prevalência DAEM (%) 20 19,3 26,1 12 No Baltimore Longitudinal Study of Aging, estudo que avaliou 890 homens entre 22 e 91 anos (média de 56), a prevalência de níveis de testosterona considerados hipogonádicos, ou seja, abaixo do percentil 2,5 para homens entre 21 e 45 anos, aumentou com a idade (12%, 19%, 28% e 49% para homens entre 50-59, 60-69, 70-79 e acima de 80 anos, respectivamente), sendo que a testosterona sérica diminuiu a uma taxa constante, independente de outras variáveis clínicas.20 Quando se considerou o índice de testosterona livre, ou seja, a relação entre testosterona total e SHBG, esta variação foi de 9% para a faixa etária de 50-59 anos, para 34%, 68% e 91%, respectivamente, nas faixas etárias seguintes (Figura 1). Já o estudo HIM, Hypogonadism in Males,21 traz uma prevalência global de hipogonadismo ainda maior, atingindo 39% em homens com mais de 45 anos e 50% em homens com mais de 85 anos. Não há evidência de diferença na prevalência de hipogonadismo entre grupos étnicos e raciais.22 Estima-se, portanto, que o percentual de indivíduos com concentração sérica de testosterona total < 325 ng/dL seja de 20, 30 e 50% para homens de 60, 70 e 80 anos, respectivamente.21 Um declínio ainda maior é observado na presença de obesidade, de uma nova doença ou de sério estresse emocional. urologIa DE conSultórIo DaEm E tEraPIa DE rEPoSIÇão hormonal com tEStoStErona (trt) DanIEl DE FrEItaS g. SoarES ErnanI luIS rhoDEn figura 1 Prevalência de níveis subnormais de testosterona total e índice de testosterona livre como indicador de hipogonadismo masculino por década de vida.21 Contudo, medir níveis de testosterona em populações, embora útil, é diferente de medir sintomas de hipogonadismo, uma vez que a correlação entre ambos não é linear. Por outro lado, avaliar apenas os sintomas não é confiável, já que as manifestações de hipogonadismo são inespecíficas. O MMAS (Massachusetts Male Ageing Study) aferiu a combinação de níveis de testosterona e sintomas de hipogonadismo, e encontrou entre 6 e 12% de homens com deficiência androgênica sintomática.23 Em estudo de base populacional realizado em Boston, Estado Unidos, por Araujo e colaboradores, 22 a prevalência de hipogonadismo (definido neste estudo pela presença de sintomas associados a testosterona total e livre menores do que 300 e 5 ng/dL, respectivamente) foi de 3,1 a 7% em homens entre 30 e 69 anos, e de 18,4% em homens com mais de 70 anos. O European Male Aging Study24 que incluiu 3220 homens entre 40 e 79, demonstrou uma queda anual de 0,4% na testosterona total e de 1,3% na testosterona livre. Como resultado dessa queda, um maior número de idosos atinge níveis de testosterona suficientemente baixos para serem considerados hipogonádicos. Estima-se, todavia, que apenas 5 – 35% de todos os homens considerados hipogonádicos recebam tratamento para essa condição atualmente. 25 Fisiopatologia Um total de 7mg de testosterona é secretado diariamente no adulto. Cerca de 1 a 2 % desta testosterona circula livremente pelo plasma. Os 98 a 99% restantes estão ligados ou à albumina (40-50%), ou à SHBG (50-60%). A testosterona se liga à SHBG com alta afinidade, razão pela qual apenas a testosterona livre e a ligada à albumina estão disponíveis para ação biológica (testosterona biodisponível, ou BAT – bioavailable testosterone) (Figura 2).26 U R O L O G I A V.18 N.3 JULHO C O N TE M P O R Â N E A SETEMBRO 2010 29 urologIa DE conSultórIo DaEm E tEraPIa DE rEPoSIÇão hormonal com tEStoStErona (trt) DanIEl DE FrEItaS g. SoarES figura 2 Formas de testosterona presentes na circulação sanguínea 2% 40-50% Testosterona Livre Testosterona Albumina Testosterona-SHEG As concentrações séricas de SHBG aumentam gradualmente com a idade. 26 Uma vez que a SHBG se liga a testosterona com alta afinidade, esse aumento resulta em uma menor proporção de testosterona em sua fração livre, que é biologicamente ativa, ou seja, que atua nos tecidos. Graças ao aumento da SHBG, fica evidente uma diminuição mais expressiva da testosterona livre em relação à total. Trabalhos demonstram uma prevalência de 40, 70 e 90% de testosterona livre na faixa de hipogonadismo para pacientes de 60, 70 e 80 anos, respectivamente. 20 A queda estimada da testosterona livre é de 2,8% ao ano. 27 A testosterona é convertida ou em diidrotestosterona (DHT) pela enzima 5-alfa-redutase, ou em estradiol pela enzima aromatase, já nas células-alvo. Apenas 20% da DHT circulante é produzida diretamente por secreção testicular, com os 80% restantes sendo derivados da conversão da testosterona em tecidos periféricos.26 A causa do DAEM não está definitivamente estabelecida. Acredita-se que defeitos tanto a UROLOGI A V.18 N.3 C O NT EMPO R Â NEA JULHO SETEMBRO ErnanI luIS rhoDEn nível central (hipotálamo-hipofise), na resposta aos níveis séricos de testosterona ou mesmo na secreção pulsátil do LH, bem como a nível periférico (células de Leydig) seja, no número das mesmas ou na sua capacidade esteroidogênica, estejam de alguma forma envolvidos na produção de níveis progressivamente menores de testosterona idade-relacionado. manifestações Clínicas do daem 50-60% 30 2010 Os sinais e sintomas da DAEM ocorrem em composições distintas e em diferentes magnitudes, formando um Quadro clínico por vezes vago e insidioso. Muitas vezes, eles não são os principais motivos da consulta médica e podem constituir um pano de fundo das queixas referidas, os quais devem chamar a atenção do profissional para uma avaliação mais detalhada (Tabela 4). Embora não seja possível afirmar com certeza, diversos paralelos entre os efeitos do envelhecimento e as consequências conhecidas do hipogonadismo, bem como a melhora após a reposição hormonal, sugerem que a diminuição da testosterona sérica possa ser a causa de muitos dos efeitos do envelhecimento. Soma-se a isso o fato de pacientes jovens com hipogonadismo induzido cirurgicamente ou, por doença, apresentarem alterações clínicas similares àquelas observadas em indivíduos mais idosos, e que melhoram com normalização dos níveis de andrógenos. A função sexual, medida pela frequência de relações sexuais ou orgasmo ou pela satisfação sexual, é menor em idosos do que em homens jovens. Homens com hipogonadismo por doença conhecida também apresentam um declínio na função sexual, comprovado pela melhora após tratamento com testosterona. 28 A densidade mineral óssea também diminui com a idade. Mesmo em homens saudáveis que nunca sofreram fraturas, a densidade urologIa DE conSultórIo DaEm E tEraPIa DE rEPoSIÇão hormonal com tEStoStErona (trt) DanIEl DE FrEItaS g. SoarES ErnanI luIS rhoDEn Tabela 4 Quadro clínico de DAEM: Manifestações psíquicas, somáticas e sexuais Alterações Psíquicas Alterações Físicas Sintomas Sexuais Prejuizo do bem estar Diminuição da massa muscular Disfunção da libido Diminuição da sensação de vitalidade Anemia Disfunção erétil Prejuízo na Cognição Osteoporose Disfunção do orgasmo (obtenção e intensidade) Depressão Aumento da gordura corporal (especialmente a visceral) Disfunção ejaculatória Diminuição da Energia e aumento da fadiga Diminuição dos pêlos corporais mineral óssea do fêmur e da coluna lombar diminui significativamente dos 20 aos 90 anos. 29 A importância deste aspecto da função dos andrógenos é a observação constante da perda da mineralização óssea em homens submetidos a ablação androgênica para tratamento de neoplasia de próstata. Uma observação clássica é a de que com o envelhecimento a massa muscular diminui e a adiposa aumenta. Além disso, homens de 60 a 79 anos possuem menor força muscular do que homens entre 20 e 39 anos. Após indução de hipogonadismo com a administração de leuprolide por 10 semanas, observou-se que a força muscular no quadríceps, medida com dinamômetro, diminuiu cerca de 10%. Por outro lado, quando homens hipogonádicos foram tratados com 100 mg de enantato de testosterona 1 vez por semana por 10 semanas, sua força muscular aumentou em 22 a 45%.30,31,32,33 O declínio da função neuropsicológica observada no envelhecimento também pode ser atribuído, em parte, ao déficit de testosterona.34 Em um estudo longitudinal incluindo 407 homens com idades entre 51 e 91 anos, aqueles considerados hipogonádicos (por índice de testosterona livre, calculado pela divisão da testosterona total sérica pela SHBG) obtiveram escores significativamente menores em escalas de memória verbal e visual, performance visual e espacial, além de uma maior taxa de declínio na memória visual. Diversos estudos epidemiológicos associam, ainda, baixos níveis de testosterona com alterações em parâmetros metabólicos, como desenvolvimento de obesidade central, resistência insulínica, diabetes, síndrome metabólica e, finalmente, maior mortalidade. 35, 36,37,38 Outras alterações clínicas podem simular o Quadro de hipogonadismo e devem ser excluídos na avaliação, como a depressão maior, a senilidade, o estresse, o uso de medicações e as doenças vasculares cerebrais. Nessas situações o nível de testosterona sérica pode apresentar valores normais. Portanto, nem sempre o Quadro clínico é exuberante, podendo se comportar de maneira distinta em cada indivíduo e associado a mensuração dos níveis séricos de testosterona. Candidatos a TrT r rT A TRT está indicada para pacientes com hipogonadismo sintomático e que não apresentem contra-indicações para a mesma. U R O L O G I A V.18 N.3 JULHO C O N TE M P O R Â N E A SETEMBRO 2010 31 urologIa DE conSultórIo DaEm E tEraPIa DE rEPoSIÇão hormonal com tEStoStErona (trt) DanIEl DE FrEItaS g. SoarES Distintas Sociedades e Entidades de diferentes países e continentes como a EAU (European European Association of Urology Urology), EAA (European European Academy of Andrology Andrology), ISSAM (International International Society for the Study of Ageing Ageing), ISA (International International Society of Andrology Andrology) e ASA (American American Society of Andrology Andrology) apresentam recomendações próprias e com diferenças especialmente no que concerne a adoção de diferentes pontos de corte que definam o hipogonadismo bioquímico. 39 É recomendada uma avaliação basal, em termos laboratoriais, antes do início da TRT. Esta avaliação pode ser sumarizada da seguinte maneira: • Testosterona total • Testosterona livre (calculada pela Fórmula de Vermeulen) • SHBG • Hematócrito e hemoglobina • Glicemia de jejum • Perfil lipídico • PSA total (associado ao exame digital da próstata) • Exames subsidiários, a critério clínico (TSH e T4 livre, provas de função hepática) Exame físico completo, incluindo o exame digital da glândula prostática, deve ser realizado rotineiramente. Não existe indicação formal de biópsia de próstata de rotina para pacientes que iniciarão um programa de TRT. Entretanto, em pacientes com alterações dos níveis séricos do PSA ou no exame digital da glândula prostática, é recomendada a realização de biópsia de próstata antes de instituir-se a administração de testosterona. Poucas são as contra-indicações para TRT. Entre as absolutas, incluem-se a presença de neoplasia de próstata em atividade biológica não tratada com intenção curativa, câncer de mama em homens e prolactinoUROLOGI A 32 V.18 N.3 C O NT EMPO R Â NEA JULHO SETEMBRO 2010 ErnanI luIS rhoDEn mas. Por outro lado, pacientes com contra-indicações relativas, como portadores de Síndrome da Apnéia Obstrutiva do Sono, hiperplasia prostática com sintomas severos, eritrocitose ou poliglobulia podem ser incluídos em programas de TRT desde que a condição subjacente tenha sido corrigida. Além disso, é importante lembrar que homens que ainda desejam prole devem evitar o uso de testosterona exógena, haja vista a possibilidade de azoospermia, que em alguns casos pode ser irreversível. 4,41 Objetivos da TrT r rT Os objetivos da TRT visam restabelecer os níveis séricos da testosterona para concentrações dentro da normalidade e melhora dos sintomas clínicos relacionados ao DAEM, seja na esfera psicológica, somática e sexual. Há diversas formas farmacêuticas disponíveis, sendo fundamental para o urologista estar familiarizado com cada uma delas, suas vantagens, seus riscos e custos, a fim de adequá-las às demandas do paciente na sua individualidade. Um forte vínculo com o paciente em TRT permite a pronta detecção de efeitos indesejados e eventuais ajustes de dose visando a garantir a manutenção dos objetivos do tratamento. 11,40 Formas de administração O restabelecimento dos níveis séricos fisiológicos de testosterona podem ser alcançados através da administração exógena de testosterona, ou da administração de drogas que estimulam a sua produção endógena. 1 reposição de testosterona exógena A TRT pode ser feita por meio das vias oral, transdérmica, injetável ou intrabucal (transmucosa) (Tabela 5). As diversas formas de apresentação diferem em vários aspectos, urologIa DE conSultórIo DaEm E tEraPIa DE rEPoSIÇão hormonal com tEStoStErona (trt) DanIEl DE FrEItaS g. SoarES ErnanI luIS rhoDEn Tabela 5 Formas de apresentação dos medicamentos à base de testosterona Via Droga Dose / intervalo Vantagens Desvantagens Intra-muscular Cipionato de testosterona (Deposteron®) 50-400 mg / 2-4 semanas Baixo custo Picos suprafisiológicos Dor local Consultas frequentes Intra-muscular Enantato de testosterona (Trinestril ap®) 50-400 mg / 2-4 semanas Baixo custo Picos suprafisiológicos Dor local Consultas frequentes Intra-muscular Propionato de testosterona (Durateston®) 25-50 mg / 2-3 x semana Baixo custo Picos suprafisiológicos Dor local Consultas frequentes Intra-muscular Undecilato de testosterona (Nebido®) 1000 mg / 3 meses Longa duração Alto custo Transdérmica – Gel Gel de testosterona hidroalcólica (Androgel®) 5-10 mg / dia Reproduz ciclo circadiano Irritação local mínima Alto custo Evitar contato cutâneo com outras pessoas Transdérmica – Adesivo Testosterona nãomodificada 2,5-5 mg / dia Reproduz ciclo circadiano Irritação local Formas escrotais necessitam tricotomia Transmucosa – Bucal Testosterona nãomodificada 30 mg / 2x dia Reproduz ciclo circadiano Poucos estudos Subcutânea – Implantes Buciclato de testosterona 1200 mg / 4-6 meses Longa duração Implante cirúrgico Dor, infecção Extrusão Oral Undecanoato de testosterona (Androxon®) 120-160 mg em várias doses diárias Administração cômoda Necessita refrigeração; Custo elevado; Variabilidade na biodisponibilidade que devem ser avaliados pelo especialista. Segurança, liberação adequada da substância ativa, aplicação fácil e tolerável e intervalo entre doses são fatores importantes que devem ser discutidos individualmente com o paciente. Aspectos econômicos e a privacidade na aplicação também devem ser considerados, tendo em vista a gama de alternativas disponíveis. 40 Formas injetáveis Disponíveis na forma de injeção intramuscular de enantato, cipionato, propionato e undecilato de testosterona, além de formas combinadas de ésteres de testosterona. A diferença entre essas está nos seus perfis farmacocinéticos. O propionato possui meia-vida bastante curta, em torno de 20 horas, o que torna necessária a administração de 2 a 3 doses semanais. U R O L O G I A V.18 N.3 JULHO C O N TE M P O R Â N E A SETEMBRO 2010 33 UROLOGIA DE CONSULTÓRIO daem e terapia de reposição hormonal com testosterona (trt) Daniel de Freitas G. Soares O cipionato, enantato e os ésteres podem ser administrados a cada 2 a 4 semanas, devido à meia-vida média de 5 dias. A desvantagem dessas drogas reside na produção de níveis supra-fisiológicos (logo após a administração) e sub-fisiológicos (próximo à aplicação subsequente) de testosterona sérica.42 A preparação mais comum é o enantato de testosterona na dose de 200 mg, de administração intra-muscular, que apresenta uma meia-vida de 4,5 dias, podendo atingir picos supra-fisiológicos nos primeiros 4 a 5 dias e níveis normais por volta do décimo segundo dia da aplicação, diminuindo, então, progressivamente, até níveis sub-fisiológicos acompanhados do retorno dos sintomas. A apresentação na forma de undecilato se propõe a manter os níveis séricos de testosterona na faixa fisiológica por períodos mais prolongados e evitando os picos supra-fisiológicos, permitindo, assim, maior comodidade de uso (aplicações trimestrais) e menos efeitos adversos.43 Formas transdérmicas São as que mais se assemelham à produção fisiológica da testosterona. A infrequência dos picos supra-fisiológicos e suas consequências clínicas é uma das vantagens dessa forma de administração. Formulações de absorção transdérmica na forma de adesivos (escrotais e não escrotais) ou, principalmente, na forma de gel hidroalcoólico de testosterona a 1% são amplamente utilizados em outros países. Adesivos escrotais são comercializados nas doses de 10 e 15mg, e, os não escrotais, nas doses de 5 e 10mg. A concentração sérica máxima é alcançada após 8 horas da aplicação, sendo recomendado seu uso diário, preferencialmente em torno das 22h.44 A necessidade de tricotomia e a irritação no local da aplicação são fatores que limitam o seu uso continuado. UROLOGI A 34 V.18 N.3 C O NT EMPO R Â NEA JULHO SETEMBRO 2010 Ernani Luis Rhoden Os géis de testosterona são encontrados em formulações de 5 e 10g, cujo conteúdo de testosterona não modificada é de 50 e 100mg, respectivamente. Sua liberação se faz de forma contínua durante as 24h, e os níveis fisiológicos do hormônio são atingidos em aproximadamente 30 minutos, podendo permanecer estáveis por até 48h.45 A base hidroalcoólica é incolor e seca em menos de 5 minutos após a aplicação. A necessidade de aplicar em múltiplos sítios para atingir níveis aceitáveis de absorção e a espera de até 6 horas para tomar banho após a sua aplicação são alguns dos inconvenientes. Administração oral O atrativo da reposição oral é a comodidade de administração. Entretanto, isso implica na necessidade de administrações frequentes e dificuldade de monitorizar os níveis séricos. As drogas orais apresentam metabolismo de primeira passagem, sendo 98% da dose metabolizada no fígado. Isto requer uma dosagem maior para atingir níveis fisiológicos – estima-se 100 vezes a quantidade produzida diariamente pelos testículos. É uma alternativa com baixa biodisponibilidade e não é utilizada com muita frequência. As concentrações máximas são atingidas rapidamente, em duas a três horas, porém a droga é logo metabolizada, retornando aos níveis pré-tratamento em seis a oito horas. Outra opção é a testosterona com absorção sub-lingual, que elimina o metabolismo de primeira passagem. Estudos preliminares demonstraram ser segura e eficaz na melhora da função sexual, porém mais estudos são necessários para avaliar efeitos a longo prazo.46,47 Sistemas de liberação bucal A composição dessa forma de reposição garante uma alta solubilidade, permitindo absorção elevada pela mucosa oral, evitando o metabolismo hepático de primeira passagem, urologIa DE conSultórIo DaEm E tEraPIa DE rEPoSIÇão hormonal com tEStoStErona (trt) DanIEl DE FrEItaS g. SoarES ou seja, aumentando a biodisponibilidade da testosterona. O primeiro microadesivo bucal foi lançado contendo 30mg de testosterona, permitindo que os níveis fisiológicos sejam alcançados cerca de quatro horas após a sua aplicação e concentrações estáveis de testosterona durante 24 horas após o início do tratamento. 48 Ainda não disponíveis no mercado brasileiro. Implantes subdérmicos A impossibilidade de interromper o tratamento na presença de efeitos adversos representa o grande inconveniente dessa forma de administração, além dos riscos associados à presença de corpo-estranho no tecido subcutâneo, como infecção e extrusão, que ocorrem em 5 a 10% dos pacientes.49 Por outro lado, oferecem testosterona continuamente por tempo prolongado. A dose padrão é de quatro implantes de 200mg em intervalos de cinco a sete meses. 2 estimulação da produção endógena da testosterona Gonadotrofinas coriônicas humanas (HCG) Drogas à base de HCG se propõem a aumentar os níveis séricos de testosterona total e livre e de estrógenos. A literatura atual demonstra esse efeito de forma significativa, além da diminuição da gordura corporal e do aumento da massa muscular, com pouco impacto sobre a próstata e o hematócrito. Entretanto, o pequeno número de estudos não permite afirmações definitivas sobre a sua segurança.50 Citrato de clomifeno A eficácia do citrato de clomifeno baseia-se no estímulo da hipófise e de seus hormônios sobre as gônadas, aumentando a produção testicular de testosterona. É utilizado em doses de 25 a 50mg por dia de forma contínua.51 Esta alternativa terapêutica é particularmente indicada para o paciente que ainda deseja prole embora os níveis de testosterona devam ErnanI luIS rhoDEn ser controlados pela possibilidade de poderem interferir na espermatogênese. 3 Outras formas de tratamento de daem Sarm (Selective androgen receptor modulators) Moduladores seletivos dos receptores de androgênios formam uma nova classe de substâncias não esteroidais cuja função é estimular seletivamente receptores androgênicos em tecidos específicos, evitando, dessa forma, os potenciais efeitos adversos associados à ação sistêmica dos esteróides. Estudos encontram-se em fase experimental.52 MENT (7 alfa-metil-19-nortestosterona) Administrado na forma de implantes subdérmicos, é um potente androgênio sintético que não sofre conversão pela 5 alfa-redutase. Também em fase experimental.53 DHT gel (Di-hidrotestosterona) Produz níveis séricos de DHT semelhantes aos fisiológicos quando utilizada na dose de 125 a 250mg por dia. Como a DHT não pode ser aromatizada a estradiol, é incomum a indução de ginecomastia com essa forma de apresentação. Essa característica farmacológica sugere um menor efeito no tecido prostático.54 resultados da TrT r rT Os benefícios da TRT no homem hipogonádico na função sexual, no humor, vitalidade e na qualidade de vida estão bem documentados na literatura. Tem-se observado, ainda, benefícios em relação à densidade mineral óssea, massa muscular e composição corporal, cognição e orientação espacial, obesidade, resistência insulínica e cardiopatia isquêmica. 1 densidade mineral óssea (dmO) Homens são relativamente protegidos do desenvolvimento de osteoporose, devido a sua maior massa óssea comparado com o das mulheres. Entretanto, homens iniciam a perda de U R O L O G I A V.18 N.3 JULHO C O N TE M P O R Â N E A SETEMBRO 2010 35 urologIa DE conSultórIo DaEm E tEraPIa DE rEPoSIÇão hormonal com tEStoStErona (trt) DanIEl DE FrEItaS g. SoarES massa óssea ainda quando adultos jovens, experimentando um aumento da taxa de perda óssea com o passar dos anos. Há evidências de que fraturas de quadril em homens sejam mais graves e de maior mortalidade do que em mulheres.39,40 Um grande número de estudos demonstrou o efeito positivo da TRT na DMO, mais expressivo nos estudos de maior seguimento, chegando a produzir níveis quase normais quando a TRT é administrada por no mínimo 2 anos.44,45 Três ensaios clínicos randomizados controlados compararam TRT com placebo. Snyder, em 1999,demonstrou que o tratamento com testosterona por 3 anos não aumentou a DMO da coluna e do quadril quando comparado com placebo, mas uma análise secundária mostrou que quanto menor a testosterona pré-tratamento, maior o efeito da TRT na DMO.55 No estudo de Kenny e colaboradores, a reposição de testosterona não aumentou a DMO vertebral, mas preveniu a diminuição da DMO do quadril.56 Já Amory e colaboradores demonstraram um aumento significativo da DMO vertebral em 10,2 e 9,3% e do quadril em 2,7 e 2,2% após TRT com e sem finasterida, respectivamente, além de um decréscimo significativo no marcador urinário de ressorção óssea desoxipiridolina.57 2 Composição corporal Segundo as diretrizes clínicas da Sociedade Americana de Endocrinologia, a reposição de testosterona aumenta significativamente a massa muscular (2,7 kg; IC95% 1,6 - 3,7) e reduz a massa adiposa (-2 kg; IC95% 3,1 – 0,8), quando comparada a placebo, embora o peso corporal não tenha sido modificado estatisticamente entre os grupos (-0,6 kg; IC95% 2,0 a – 0,8).11 Um estudo de base populacional que acompanhou homens de 24 a 85 anos demonstrou que os níveis de testosterona toUROLOGI A 36 V.18 N.3 C O NT EMPO R Â NEA JULHO SETEMBRO 2010 ErnanI luIS rhoDEn tal e livre são inversamente relacionados à circunferência abdominal e que os níveis de testosterona são especificamente relacionados a esta medida de obesidade central, e não à obesidade geral.58 Riedner, em 2006, estudou 106 homens entre 61 e 81 anos e mostrou ser a obesidade visceral, medida pela circunferência abdominal, um preditor independente da função erétil, de forma estatisticamente significativa.59 3 Função sexual A disfunção sexual afeta significativamente a qualidade de vida do homem e acomete cerca de 650 milhões de homens com mais de 60 anos em todo o mundo. A reposição hormonal aumenta a libido e a excitação sexual em homens idosos e melhora da função eretiva. A testosterona ainda aumenta o fluxo arterial peniano e melhora a resposta aos inibidores da fosfodiesterase tipo 5 no corpo cavernoso humano.60 Nos estudos em que o hipogonadismo foi critério de inclusão, a libido melhorou significativamente com o tratamento com androgênios. 4 diabetes e Síndrome metabólica Desde o início da década de 90, estudos em não-diabéticos já demonstravam haver uma correlação inversa entre testosterona total e livre com níveis de insulina e glicose. Atualmente, alguns autores demonstraram a associação entre síndrome metabólica e diabetes com níveis mais baixos de testosterona.61 Postulou-se que o ganho de peso pudesse ser o elo entre baixa testosterona, resistência insulínica, diabetes e doença cardiovascular. Entretanto, em estudos bem delineados, essa associação foi independente da presença de obesidade.61 Kapoor e colaboradores 62 publicaram o efeito da TRT para manter a testosterona na faixa fisiológica, comparada com place- urologIa DE conSultórIo DaEm E tEraPIa DE rEPoSIÇão hormonal com tEStoStErona (trt) DanIEl DE FrEItaS g. SoarES bo em 24 homens (média de idade de 64 anos) com diabetes e hipogonadismo. Dez desses pacientes eram usuários de insulina. Entre os que receberam testosterona, houve diminuição significativa na hemoglobina glicada e na glicemia de jejum, bem como uma redução significativa na resistência insulínica nos 14 pacientes não usuários de insulina. Não é possível medir a resistência insulínica em pacientes usuários, porém 5 entre os 10 tiveram a dose de insulina reduzida durante o estudo. Colesterol total, circunferência abdominal e índice cintura-quadril também reduziram significativamente com a TRT. 5 doença cardiovascular e aterosclerose Contrariamente ao temor dos potenciais efeitos adversos cardiovasculares da TRT, há mais de 40 estudos que examinaram a possível associação dos níveis de testosterona com a presença ou o desenvolvimento de doença arterial coronariana, e nenhum mostrou correlação positiva. Muitos deles, ainda, associam a presença de coronariopatia a níveis de testosterona baixos. 63 Essas evidências, juntamente com os efeitos benéficos da TRT sobre a obesidade central e o diabetes, permitem questionar se a testosterona não seria também benéfica na prevenção ou tratamento da aterosclerose. Já se demonstrou a melhora da angina e em testes de desempenho durante exercício em homens com cardiopatia isquêmica e hipogonadismo após administração de testosterona por 1 a 3 meses. Acredita-se que a testosterona melhora a angina por seu efeito vasodilatador, o qual ocorre independentemente de receptores androgênicos, via bloqueio de canais de cálcio tipo-L da camada muscular arterial, semelhante aos bloqueadores de canal de cálcio.64 ErnanI luIS rhoDEn 6 Insuficiência cardíaca Recentemente, dois ensaios clínicos randomizados controlados que administraram testosterona a homens com níveis séricos baixos e insuficiência cardíaca mostraram melhora nos sintomas e na capacidade para o exercício. O mecanismo desses benefícios não é totalmente compreendido, embora um estudo sobre efeitos da testosterona bucal dada a homens com insuficiência cardíaca sob monitoração invasiva mostrou que a TRT aumentou o índice cardíaco e reduziu a resistência vascular periférica.65 riscos potenciais da TrT r rT 1 Fertilidade F A reposição exógena de testosterona prejudica sensivelmente a fertilidade, sendo que o paciente deve sempre ser aconselhado antes do início da reposição hormonal sobre os possíveis efeitos deletérios na espermatogênese. Muitos homens em TRT poderão evoluir para azoospermia ou oligozoospermia severa, e não se pode garantir a reversibilidade dos efeitos do tratamento após a sua interrupção. 2 Câncer de próstata O câncer de próstata é parcialmente testosterona-dependente,66 o que pode ser ilustrado pelo papel da castração cirúrgica ou medicamentosa no seu controle. Nos ensaios clínicos que usaram testosterona em pacientes idosos, raros casos de câncer de próstata foram relatados.55-57 Neste contexto cabe ressaltar a importância de alguns estudos importantes como, por exemplo, o de Marks e colaboradores67 que randomizaram 44 homens com idade média de 68 a 70 anos e hipogonadismo (baseado em um questionário validado e testosterona total sérica < 300 ng/dL) para receber ou placebo ou enantato de testosterona (150 mg IM a cada 2 semanas). Após 6 meses, observaram-se os seguintes resultados: U R O L O G I A V.18 N.3 JULHO C O N TE M P O R Â N E A SETEMBRO 2010 37 urologIa DE conSultórIo DaEm E tEraPIa DE rEPoSIÇão hormonal com tEStoStErona (trt) DanIEl DE FrEItaS g. SoarES • A concentração sérica de testosterona total aumentou de 282 (basal) para 640 ng/dL (aos 6 meses) nos tratados com testosterona • PSA sérico aumentou, mas permaneceu na faixa considerada normal (de 1,55 para 2,29 ng/mL). • Volume prostático e sintomas urinários não se alteraram. • Pequena diminuição não significativa na taxa de fluxo urinário máximo. • No tecido prostático, obtido através de biópsia, as concentrações teciduais basais de testosterona (0,91 ng/g) e diidrotestosterona (6,8 ng/g) não se alteraram significativamente, apesar do aumento das concentrações séricas de testosterona no grupo tratado com o andrógeno • Não houve alterações significativas na histologia prostática, em marcadores teciduais e na expressão de genes relacionados à neoplasia prostática em ambos os grupos, tratados ou não com testosterona. Em metanálise de 7 estudos, Rhoden e Morgentaler4 observaram que de 461 pacientes em programas de reposição hormonal com testosterona, em apenas 5 (1,08%) foram diagnosticados neoplasia prostáticas incidentes quando estes homens foram acompanhados por 6 a 36 meses. Mais recentemente, em metanálise de estudos randomizados controlados por placebo que comparou a taxa de neoplasia prostática em homens em TRT ou não, durante 2 meses a 3 anos e observou-se diagnósticos de neoplasia prostática incidente em 1,3 e 1,5%, respectivamente.68 3 Hiperplasia Benigna da Próstata (HBP) A dependência da testosterona da HBP é há muito conhecida e constitui a base do tratamento medicamentoso com inibidores da 5-alfa-redutase finasterida e dutasterida. UROLOGI A 38 V.18 N.3 C O NT EMPO R Â NEA JULHO SETEMBRO 2010 ErnanI luIS rhoDEn Entretanto, nenhum estudo até o momento demonstrou piora de sintomas miccionais em pacientes tratados com testosterona. São necessários ensaios clínicos de maior impacto estatístico para demonstrar uma possível exacerbação sintomática da HBP. 4 apnéia do sono Os dados disponíveis na literatura a este respeito são controversos tendo em vista, especialmente, o fato de envolver um contingente reduzido de homens para uma análise mais definitiva. Estudo com reduzido número de homens com hipogonadismo sugerem que mesmo a reposição fisiológica de testosterona aumenta a apnéia do sono, uma condição à qual indivíduos idosos já são propensos. Entretanto, em metanálise a respeito do referido tópico observou-se que a frequência de apnéia do sono não diferiu entre os grupos que receberam testosterona e placebo.69 5 eritrocitose O tratamento com testosterona causar eritrocitose especialmente quando utilizados compostos que causam doses suprafisiológicas. Em um estudo retrospectivo com 45 homens com idade média de 72 anos que apresentavam concentrações de testosterona relativamente baixas, o tratamento com 200mg de enantato ou cipionato causou um aumento de hematócrito maior do que 52% em 11 pacientes (24%)70. Outro estudo que utilizou enantato de testosterona 200mg a cada 2 semanas com ou sem finasterida, 14 de 46 pacientes desenvolveram aumento de hemoglobina.57 6 Hepatotoxicidade As formas não alquiladas de testosterona não são hepatotóxicas. Os estudos disponíveis na literatura não referem efeitos colaterais em termos de hepatotoxicidade com as formas de tes- urologIa DE conSultórIo DaEm E tEraPIa DE rEPoSIÇão hormonal com tEStoStErona (trt) DanIEl DE FrEItaS g. SoarES tosterona habitualmente empregadas no meio médico.4 Esta é também uma das razões pelas quais não há necessidade do controle de provas de função hepática no homem em programa de terapia de reposição hormonal com testosterona. monitoramento do paciente Uma vez iniciado o tratamento, deve-se avaliar a resposta clínica em cerca de 2-3 meses e ajustar a dose em função de resposta inadequada, testosterona em níveis subnormais ou surgimento de efeitos adversos. Na hipótese de aumento do hematócrito ou da hemoglobina acima dos níveis de referência, deve-se considerar a redução da dose ou uma pausa temporária da reposição. O antígeno prostático específico (PSA) e exame digital da próstata devem ser avaliados rotineiramente. As indicações de biópsia de próstata transretal são as mesmas utilizadas nos esquemas tradicionais de rastreamento de câncer de próstata (com atenção aos valores absolutos de PSA e especialmente à velocidade de aumento).4 (Tabela 6) ErnanI luIS rhoDEn Conclusão A deficiência androgênica é causa relevante de diferentes morbidades associadas ao envelhecimento, e existem evidências de que níveis reduzidos de testosterona estejam associados a mortalidade por várias causas. Entretanto, não existem evidências clínicas suficientes que justifiquem o uso de terapia de reposição hormonal no homem assintomático. A TRT em homens hipogonádicos está relacionada com melhora do desempenho física e psicológica e sexual, inclusive com ganho de massa muscular e óssea. No que concerne ao diagnóstico do DAEM é importante reforçar que esta não é uma entidade bioquímica que deva ser norteada exclusivamente pelos níveis séricos de testosterona, mas sim, deve-se considerar o conjunto de sinais e sintomas associados a estes, devendo a recuperação da qualidade de vida e da funcionalidade dos paciente ser o objetivo principal desta abordagem terapêutica. Tabela 6 Recomendação para acompanhamento do paciente em TRT Tempo de tratamento Pré-tratamento A Avaliação indicada Ht/Hb, PSA total. Exame digital da próstata. Registrar sintomas miccionais. Considerar densitometria óssea. 2-3 meses Acessar eficácia do tratamento: níveis de testosterona e alívio dos sintomas. Considerar ajuste de dose. 3/3 meses no primeiro ano Acessar alívio dos sintomas de DAEM, sintomas miccionais e apnéia do sono. Anualmente após o primeiro ano Acessar alívio dos sintomas de DAEM, sintomas miccionais e apnéia do sono. Exame físico com exame digital da próstata. Testosterona sérica. PSA, perfil lipídico, Ht e Hb. U R O L O G I A V.18 N.3 JULHO C O N TE M P O R Â N E A SETEMBRO 2010 39 UROLOGIA DE CONSULTÓRIO daem e terapia de reposição hormonal com testosterona (trt) Daniel de Freitas G. Soares Ernani Luis Rhoden Referências 1. Jockenhoevel F. Male hypogonadism. Bremen: UNI-MED Verlag AG; 2004. 22. Araujo AB, Esche GR, Kupelian V, O’Donnell AB, Travison TG, Williams RE, 2. Nieschlag E., Behre H.M. editors. Testosterone: action, deficiency, substitu- Clark RV, McKinlay JB. Prevalence of symptomatic androgen deficiency in tion. 3rd edn, Cambridge University Press; 2004. men. J Clin Endocrinol Metab. 2007 Nov;92(11):4241-7. 3. Kim YC. Testosterone supplementation in the aging male. Int J Impot Res. 1999 Dec; 11(6): 343-52. 23. Araujo AB, O’Donnell AB, Brambilla DJ, Simpson WB, Longcope C, Matsumoto AM, McKinlay JB. Prevalence and incidence of androgen deficiency in 4. Rhoden EL, Morgentaler A. 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U R O L O G I A V.18 N.3 JULHO C O N TE M P O R Â N E A SETEMBRO 2010 41 técnIcaS cIrúrgIcaS WWW.urologIacontEmPoranEa.org.br carlos teodósio da ros Chefe do Serviço de Urologia, Sistema de Saúde Mãe de Deus, Porto Alegre, RS Editor do Uro-Rom, Sociedade Brasileira de Urologia túlio meyer Graziottin Serviço de Urologia, Sistema de Saúde Mãe de Deus, Porto Alegre, RS Professor de Urologia da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre, RS Corporoplastia com enxerto de túnica albugínea da crura A doença de Peyronie (DP) é um processo inflamatório/cicatricial localizado, do tecido conjuntivo da túnica albugínea peniana, que provoca a formação de nódulos ou placas. Este distúrbio se manifesta clinicamente com ereções dolorosas, curvatura e encurtamento peniano, e, algumas vezes, estreitamento com formato de ampulheta. A repercussão no fator emocional é quase tão grande quanto sobre o fator físico, uma vez que esta deformidade pode impedir a penetração vaginal ou ainda ocasionar disfunção erétil. Apesar de ter sido descrita em 1743,1 a doença não tem uma etiologia definida e os tratamentos atuais não conseguem devolver a função normal da túnica albugínea. Neste aspecto, o tratamento cirúrgico visa somente a correção da curvatura. Existem muitas teorias para tentar explicar a fisiopatologia da DP. O que é mais aceito UROLOGI A 42 V.18 N.3 C O NT EMPO R Â NEA JULHO SETEMBRO 2010 sugere uma anormalidade no processo da cicatrização. Ocorre um processo inflamatório com infiltração linfocitária na túnica albugínea e do tecido erétil circunjacente, decorrente de traumas agudos e repetitivos ao pênis, e que levam a delaminação das camadas da túnica albugínea com a formação de hematoma e posterior fibrose.2, 3 A DP apresenta duas fases: (a) inflamatória aguda e (b) crônica. A dor é uma característica da fase inflamatória aguda e, geralmente, resolve espontaneamente. Esta fase inicial pode perdurar por aproximadamente 6 meses. A fase crônica é a fase de estabilização da doença. Qualquer procedimento cirúrgico somente está indicado quando a DP está estabilizada, isto é, mais do que 12 a 18 meses de evolução, e quando não existe mais nenhuma dúvida em relação à progressão da curvatura. Os pacientes que têm esta indicação técnIcaS cIrúrgIcaS corPoroPlaStIa com EnxErto DE túnIca albugínEa Da crura carloS tEoDóSIo Da roS túlIo mEyEr grazIottIn ou cirurgia de Nesbit) ou alongamento do lado côncavo ou curto (incisão da placa com colocação de enxerto). Os enxertos podem ser homoenxertos autólogos (túnica albugínea, túnica vaginal, fáscia temporal, fáscia lata, pele, veia safena, aponeurose, dura-máter) ou heterólogos (pericárdio humano, derme acelular liofilizada), ou xenoenxertos (pericárdio bovino, submucosa de intestino delgado de porco). Ainda existem os tecidos sintéticos, como teflon, dacron, marlex e goretex.6, 7, foTo 1 Ereção artificial induzida pela introdução de solução salina através de um butterfly 19 fixo à glande e garroteamento da base do pênis com dreno de Penrose número 1 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15 O conceito de “enxerto foTo 2 ideal” é: disponível em vários tamanhos, complacente Dissecção do feixe vásculo-nervoso (porém sem permitir a fore indução da ereção para identificação do ponto de maior curvatura, onde será realizada a incisão. mação de aneurismas), facilmente manuseável, produzir pequena morbidade (no caso de enxertos autólogos), não prolongar muito o tempo operatório, mínima resposta inflamatória, baixo risco de antigenicidade, baixo risco de transmissão de infecções e baixo custo. Quando analisamos o enxerto por nós proposto (túnica albugínea) percebemos que muito deste conceito é cirúrgica são aqueles com curvaturas imporpreenchido, o que nos leva a crer que temos tantes ou deformidades severas, que prejudiuma excelente opção terapêutica. O melhor 4, 5 cam ou impedem o coito. substituto para a túnica doente é a própria túExistem duas modalidades cirúrgicas: ennica. Nos enxertos de túnica albugínea, a arcurtamento do lado convexo ou longo (plicaturas quitetura das fibras elásticas e colágenas são U R O L O G I A V.18 N.3 JULHO C O N TE M P O R Â N E A SETEMBRO 2010 43 corPoroPlaStIa com EnxErto DE túnIca albugínEa Da crura técnIcaS cIrúrgIcaS carloS tEoDóSIo Da roS túlIo mEyEr grazIottIn figura 1 foTo 3 Dissecção do feixe vásculo-nervoso para permitir a abordagem da placa fibrótica localizada no dorso do pênis, e formação de um defeito no corpo cavernoso após a incisão da placa e tração do pênis. Incisão da placa e tração do pênis, com criação de um defeito na túnica albugínea, que deverá ser preenchido pelo enxerto. mantidas, o que poderia suplantar as demais alternativas de enxertia. Ademais, quando outros tecidos são utilizados, a cicatrização da túnica se dá por fibrose, o que pode resultar em zonas inelásticas da túnica. Enxertando-se a túnica normal, preserva-se teoricamente a elasticidade do tecido. reproduzir a curvatura peniana. Baseado nesta ereção artificial e nas fotos que o paciente fornece, fazemos todo o planejamento cirúrgico. Quando necessário, no caso de curvaturas dorsais ou ventrais, disseca-se o feixe vásculo-nervoso ou a uretra, liberando-os completamente da haste peniana, para prevenir qualquer dano e facilitar a incisão da placa fibrosa e fixação do enxerto. O local de maior curvatura, geralmente onde a placa está presente, é incisado (incisão longitudinal, transversal ou em “H”) e, com a tração do pênis, mede-se o defeito da túnica para calcularmos o tamanho do enxerto a ser empregado (Figura1 e Fotos 2 e 3). Tomando-se estas medidas como referência, realiza-se uma incisão em “Y” invertido, de 3 cm, na linha média do períneo, a mesma Técnica cirúrgica O paciente é colocado em posição de litotomia e o pênis, completamente desenluvado. Mede-se a extensão do pênis com régua neste momento e após a incisão da placa de fibrose. Um torniquete (dreno de penrose) é colocado na base do pênis e solução salina é introduzida através de um butterfly número 19 (foto 1), com intuito de produzir uma ereção artificial para UROLOGI A 44 V.18 N.3 C O NT EMPO R Â NEA JULHO SETEMBRO 2010 técnIcaS cIrúrgIcaS corPoroPlaStIa com EnxErto DE túnIca albugínEa Da crura carloS tEoDóSIo Da roS túlIo mEyEr grazIottIn que é realizada para abordagem nas uretroplastias bulbares ou membranosas. Desta maneira, obtém-se um acesso para ambas as cruras dos corpos cavernosos. Retira-se o segmento de túnica albugínea de uma ou ambas as cruras (Figura 2 e Fotos 4 e 5), que são posteriormente fechadas com uma sutura de ácido poliglicólico (Vicryl ®) 2-0. O enxerto é colocado em solução de ringer lactato e a sua superfície é preparada, retirando-se todas as inserções do músculo bulbo-esponjoso. O enxerto é então fixado no defeito criado, com a face interna em contato com a musculatura lisa dos corpos cavernosos, com uma sutura de Vicryl ® 4-0. Neste momento fazemos outra ereção artificial para averiguarmos a correção da curvatura. Complementa-se a postectomia após uma hemostasia rigorosa e sutura-se a pele com categute simples 4-0. Um curativo levemente compressivo é deixado por 48 horas. O paciente é orientado quanto aos curativos e quanto à abstinência sexual de 4 semanas, pelo menos, dependendo da evolução cicatricial e do próprio conforto. figura 2 Incisão perineal com exposição da crura direita para retirada do enxerto. Sutura do enxerto no pênis, recobrindo o defeito do corpo cavernoso criado com a incisão da placa. U R O L O G I A V.18 N.3 JULHO C O N TE M P O R Â N E A SETEMBRO 2010 45 técnIcaS cIrúrgIcaS corPoroPlaStIa com EnxErto DE túnIca albugínEa Da crura carloS tEoDóSIo Da roS túlIo mEyEr grazIottIn foTo 4 foTo 5 Exposição da crura direita, após incisão perineal, para retirada do enxerto livre de túnica albugínea. Enxerto de túnica albugínea sendo suturado no pênis, com intuito de recobrir o defeito no corpo cavernoso. r referências 1. De La Peyronie F. Sur quelques obstaclesqui sópposent à l’éjaculation nautrelle de la semence. Mem Acad Royale Chir 1743; 1: 337-42. 2. Gholami SS, Lue TF. Peyronie’s disease. Urol Clin North Am. 2001 May; 28(2): 377-90. 3. Smith CJ, McMahon C, Shabsigh R. Peyronie’s disease: the epidemiology, aeTeloken C, Grazziotin T, Rhoden E, Da Ros C, Fornari A, Soares FC, et al. Penile straightening with crural graft of the corpus cavernosum. J Urol. 2000 Jul; 164(1): 107-8. 7. Devine Jr CJ, Horton CE. Surgical treatment of Peyronie’s disease with dermal graft. J Urol 1974; 111: 44– 46. 8. 11. Gelbard MK, Hayden B. Expanding contractures of the tunica albuginea due 145(4): 772-6. 12. El-Sakka AI, Rashwan HM, Lue TF. Venous patch graft for Peyronie’s disea- tiology and clinical evaluation of deformity. BJU Int. 2005 Apr; 95(6): 729-32. 6. 10. 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Gustavo schroeder Médico Residente (quinto ano) do Serviço de Urologia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre Impacto da segunda ressecção transuretral de rotina nos desfechos em longo prazo de pacientes com diagnóstico recente de carcinoma urotelial pT1 com relação a recorrência, taxa de progressão, e sobrevida doença-específica: um ensaio clínico randomizado prospectivo Divrik RT Sahin AF Yildirim U Altok M Zorlu F Eur urol. 2010 aug;58(2):185-90. Introdução• A ressecção transuretral (RTU) de tumor vesical, não só é mandatória para um adequado estadiamento, mas também crucial para o retardo ou a prevenção da recorrência e progressão dos tumores. Objetivo• Avaliar o impacto da re-RTU nos desfechos em longo prazo dos pacientes com diagnóstico recente de carcinoma urotelial pT1. UROLOGI A 48 V.18 N.3 C O NT EMPO R Â NEA JULHO SETEMBRO 2010 delineamento, intervenção e participantes• Duzentos e dez pacientes com câncer de bexiga recentemente diagnosticado pT1, foram prospectivamente randomizados em dois grupos, entre janeiro de 2001 e janeiro de 2005. Uma segunda RTU foi realizada entre 2-6 semanas depois da ressecção inicial, para os pacientes do grupo 1. A segunda RTU não foi feita no grupo 2. Todos pacientes (grupos 1 e 2) receberam a primeira instilação de quimioterapia (mitomicina) intravesical dentro das primeiras 24 horas da ressecção. Citologia urinaria e cistoscopia de seguimento foram realizados num intervalo de 3 meses durante o primeiro ano, semestralmente no segundo ano, e anualmente a partir de então. Todos os pacientes foram acompanhados ate o óbito ou por um mínimo de 54 meses. desfechos• Este estudo avaliou recorrência, taxa de progressão, e sobrevida doença especifica. resultados e limitacões• O seguimento médio foi de 66,1 meses, sem uma diferença Uro-Resumos Brasil Silva Neto Emanuel Burck dos Santos estatisticamente significativa entre os grupos. Tumor residual foi detectado histopatologicamente em 35 de 101 pacientes no grupo 1. Destes pacientes, oito já tinham doença em estágio pT2. Recorrência foi observada em 37 dos 93 pacientes no grupo 1, e em 70 dos 98 pacientes do grupo 2. A sobrevida livre de recorrência foi em média de 47 meses no grupo 1, enquanto no grupo 2 foi de 12 meses. Progressão foi observada em 6,5% dos pacientes do grupo 1, comparado com 23,5% no grupo 2 (p=0,001). A sobrevida média livre de progressão foi de 73 meses no grupo 1, e de 53,5 meses para o grupo 2. A taxa de sobrevida global foi 67,7% e 64,3% nos grupos 1 e 2, respectivamente (resultado do log-rank test: 0,363). Somente 5 dos 30 pacientes no grupo 1 morreram de câncer, comparado com 11 de 35 pacientes no grupo 2 (p=0,038). Conclusões• Nós mostramos claramente que a segunda RTU, a qual é realizada somente depois de uma primeira RTU completa, diminui significativamente as taxas de recorrência e progressão nos pacientes com câncer de bexiga T1 recentemente diagnosticados, comparado com pacientes com doença T1 que não realizam uma segunda ressecção. Este estudo mais uma vez ressalta o efeito da RTU, a qual é geralmente subestimada. Comentários• A ressecção transuretral de bexiga é a chave para o diagnóstico e tratamento dos tumores de bexiga, sendo definida como ressecção completa o procedimento no qual erradicamos completamente todos os tumores macroscopicamente visíveis, incluindo todas as lesões exofiticas, a base do tumor e sua margem. Nos casos de uma nova RTU para ressecção de lesões residuais, devemos chamála de ressecção de repetição, enquanto que usamos o termo ressecção de reestadiamento nos casos de uma nova ressecção para amostragem de músculo. No presente estudo, a segunda RTU só foi considerada quando realizada 4 – 6 semanas após uma ressecção inicial completa (incluindo amostra da camada muscular), e durante este procedimento foram ressecados tumores novos inesperados ou a cicatriz da ressecção previa, sendo que nos casos de lesão positiva macroscópica e/ ou histologicamente, indicava-se uma terceira RTU. Os resultados deste estudo mostram de maneira bastante clara que a segunda RTU nos casos de tumores pT1 tem impacto significativo em desfechos importantes, tais como recorrência e progressão do câncer de bexiga, quando controlados para idade, sexo, numero de tumores, tamanhos dos tumores e grau histológico. Apesar do beneficio da segunda RTU já ter sido demonstrado em estudos anteriores, estes incluíam pacientes com todos os estágios e graus, e até mesmo pacientes com tumores residuais macroscópicos. Este estudo é o primeiro realizado de forma randomizada e prospectiva, e que demonstra o impacto positivo da segunda ressecção, com relação a recorrência, progressão e mortalidade doença-especifica no carcinoma urotelial de bexiga pT1. U R O L O G I A V.18 N.3 JULHO C O N TE M P O R Â N E A SETEMBRO 2010 49 Uro-Resumos Brasil Silva Neto Emanuel Burck dos Santos Resultados sobre mortalidade do estudo randomizado de Gotemburgo para rastreamento populacional do câncer de próstata Hugosson J Carlsson S Aus G Bergdahl S Khatami A Lodding P Pihl CG Stranne J Holmberg E Lilja H. Lancet Oncol. 2010 Aug; 11(8): 725-32. Introdução• O câncer de próstata é uma das principais causas de morte por doença maligna entre os homens do mundo desenvolvido. Uma das estratégias para diminuir esta alta mortalidade é o rastreamento com o antígeno prostático especifico (PSA); entretanto, a extensão do beneficio e do dano deste rastreamento está sob contínuo debate. Métodos• Em dezembro de 1994, 20.000 homens nascidos entre 1930 e 1944, amostrados aleatoriamente de registros populacionais, foram randomizados por computador numa taxa de 1:1 para, ou participar de um grupo que avaliaria o PSA a cada 2 anos (n = 10.000), ou para apenas entrar em um grupo controle, sem avaliar o PSA (n = 10.000). Homens no grupo do rastreamento foram convidados até a idade limite (mediana 69 anos, variando entre 67 e 71 anos), e somente aos homens com PSA elevado foi oferecida a realização de toque retal e biopsia prostática. O desfecho primário foi mortalidade câncer-especifica, analisada de acordo com o princípio de intenção de rastrear. O estudo está em andamento, com os homens que não atingiram a idade limite sendo convidados para testar o PSA. UROLOGI A 50 V.18 N.3 C O NT EMPO R Â NEA JULHO SETEMBRO 2010 Esta é a primeira publicação planejada dos resultados de incidência e mortalidade por câncer de próstata, com dados calculados ate 31 de dezembro de 2008. Este estudo esta registrado como um Ensaio Clínico Randomizado Internacional ISRCTN54449243. Resultados• Em cada grupo, 48 homens foram excluídos da análise por morte ou por terem emigrado antes da data de randomização, ou câncer de próstata já existente. Nos homens randomizados para o rastreamento, 7578 (76%) de 9952 foram avaliados pelo menos uma vez. Durante um seguimento mediano de 14 anos, 1138 homens no grupo rastreamento e 718 no grupo controle foram diagnosticados com câncer de próstata, resultando numa incidência cumulativa de 12,7% no grupo rastreamento e de 8,2% no grupo controle (hazard ratio=1,64; 95% IC 1,50-1,80; p<0,0001). A redução de risco absoluto cumulativo de morte por câncer de próstata em 14 anos foi 0,40% (95% IC 0,170,64), de 0,90% no grupo controle para 0,50% no grupo rastreado. A taxa proporcional de mortes por câncer de próstata foi 0,56 (95% IC 0,39-0,82; p=0,002) no grupo que avaliou o PSA comparado com o grupo controle. A taxa proporcional de mortes por câncer de próstata em pacientes rastreados com PSA, comparados com o grupo controle, foi 0,44 (95% IC 0,28-0,68; p=0,0002). No total, 293 (95% CI 177-799) homens precisaram ser incluídos no rastreamento, e 12 ser diagnosticados com câncer de próstata, para prevenir uma morte por câncer de próstata. Interpretação• Este estudo mostra que a mortalidade por câncer de próstata foi reduzida quase Uro-Resumos Brasil Silva Neto Emanuel Burck dos Santos pela metade nos 14 anos de seguimento. Entretanto, o risco de diagnósticos em excesso é substancial, e o numero necessário para tratar (NNT) é pelo menos tão grande quanto os programas de rastreamento do câncer de mama. O beneficio do rastreamento do câncer de próstata compara-se favoravelmente a outros programas de rastreamento para câncer. Comentários• Recentemente, tivemos a publicação dos dados do estudo europeu ERSPC, que avaliou pacientes que realizaram dosagens do PSA como forma de rastreamento do câncer de próstata. Neste estudo, observou-se uma redução significativa na mortalidade por câncer de próstata nos pacientes rastreados, e 1410 pacientes necessitaram ser avaliados para prevenir uma morte por câncer de próstata (semelhante ao screening de câncer de mama e colorretal). Entretanto, o elevado NNT para evitar uma morte por câncer de próstata (48 homens), sugeriu que muitos pacientes com tumores indolentes seriam tratados sem necessidade. Uma parte dos pacientes do presente estudo também foi analisada no ERSPC, entretanto não ocorreram mudanças no seu protocolo em função do ensaio clínico europeu. Na mesma época, os dados do PLCO não mostraram diferenças em termos de mortalidade por câncer de próstata entre os pacientes rastreados e os observados, colocando ainda mais em dúvida o papel do rastreamento. No estudo sueco, somente o PSA era realizado e nos casos em que o mesmo estava acima do limite (3,0 ng/ml no inicio do estudo, passando para 2,5 ng/ml a partir de 2005), estes eram convidados para uma avaliação urológica, incluindo toque retal, USTR e biopsias sextantes bilaterais. Nos homens com diagnostico de câncer de próstata, o tratamento não foi especificado, ficando a critério do seu médico. Nos casos de biopsia negativa, os mesmos voltavam a avaliar o PSA a cada 2 anos. O controle dos novos casos de câncer, em ambos os grupos, foi realizado através de consultas ao Centro Regional de Registros do Oeste da Suécia, alem de avaliação dos certificados de óbito dos pacientes que faleceram durante o estudo. Foram determinados como mortes por câncer de próstata, os eventos classificados como definitivos por câncer de próstata, mortes por intervenções relacionadas ao câncer ou mortes prováveis por câncer de próstata. No grupo rastreado, houve mais diagnósticos de câncer de próstata do que no grupo controle. Como os pacientes eram inicialmente randomizados e depois convidados a participar, um determinado numero de pacientes não respondeu aos chamados para realizar o rastreamento; estes pacientes que não responderam aos chamados, assim como os pacientes do grupo controle, tiveram uma maior incidência de tumores avançados e metastáticos. Ao contrario disso, os pacientes que realizaram o rastreamento, tiveram um maior numero de tumores em estágio inicial. Isto mostra uma migração de estágio do câncer de próstata após a introdução do PSA, com um maior diagnostico de tumores em estágio precoce. Também observamos uma maior mortalidade relacionada ao câncer de próstata no grupo controle, e quando U R O L O G I A V.18 N.3 JULHO C O N TE M P O R Â N E A SETEMBRO 2010 51 Uro-Resumos Brasil Silva Neto Emanuel Burck dos Santos avaliamos a mortalidade no grupo rastreado, dividindo os pacientes que realizaram o screening comparado aos que não fizeram, verifica-se que esta diminuição da mortalidade somente ocorreu no grupo que realmente realizou as medidas do PSA, já que o grupo que não respondeu ao comparecimento não mostrou diferença estatisticamente significativa na mortalidade, em relação ao grupo controle. Neste estudo, ocorreu uma redução da mortalidade bastante superior a de estudos prévios (RR 0,56, comparado com 0,80 no ERSPC, e ausência de diferença no PLCO). Esta diferença pode ser devida aos pacientes serem mais jovens no presente estudo (mediana = 56 anos no inicio), e também ao ponto de corte do PSA ter sido mais baixo. Além disso, o menor intervalo entre os exames, o maior numero de biopsias em pacientes com PSA alterado, o menor número de medições de PSA prévias à entrada no estudo, a provável menor contaminação do estudo, e o maior tempo de seguimento podem ser responsáveis pelos resultados encontrados. Com este estudo, podemos concluir que o uso do PSA como ferramenta de rastreamento é um método bem aceito pela população, e que o mesmo pode resultar numa diminuição relevante da mortalidade por câncer de próstata, até mesmo maior do que a obtida em programas de rastreamento do câncer de mama e colorretal. Quanto ao diagnóstico precoce do câncer de próstata levar ao tratamento de indivíduos que poderiam ter uma doença indolente, não-letal, ainda necessitamos de melhores evidências para guiar nossas condutas. UROLOGI A 52 V.18 N.3 C O NT EMPO R Â NEA JULHO SETEMBRO 2010 Eventos adversos associados com a reposição de testosterona Basaria S Coviello AD Travison TG Storer TW Farwell WR Jette AM Eder R Tennstedt S Ulloor J Zhang A Choong K Lakshman KM Mazer NA Miciek R Krasnoff J Elmi A Knapp PE Brooks B Appleman E Aggarwal S Bhasin G Hede-Brierley L Bhatia A Collins L LeBrasseur N Fiore LD Bhasin S N Engl J Med. 2010 Jul 8; 363(2): 109-22. Introdução• A suplementação de testosterona tem mostrado um aumento na massa e força muscular em homens idosos saudáveis. A segurança e eficácia do tratamento com testosterona em homens idosos com limitações de mobilidade ainda não foi avaliada. Métodos• Homens oriundos da comunidade, com 65 anos ou mais, com limitações na mobilidade e com níveis de testosterona total sérica de 100-350 ng/dL (3,5-12,1 nmol/L), ou testosterona livre sérica menor do que 50 pg/ml (173 pmol/L), foram randomizados para receber gel placebo ou gel de testosterona, aplicados diariamente durante 6 meses. Eventos adversos foram categorizados com o uso da classificação do Medical Dictionary for Regulatory Activities. A comissão de monitoramento de dados e segurança recomendou que o estudo fosse suspenso antes do previsto, pois ocorreram eventos adversos cardiovasculares significativamente em maior numero no grupo da testosterona do que no grupo placebo. Uro-Resumos Brasil Silva Neto Emanuel Burck dos Santos Resultados• Um total de 209 homens (idade media = 74 anos) tinham sido avaliados no momento em que o estudo foi interrompido. Nos dados iniciais, havia uma prevalência de hipertensão, diabetes, dislipidemia, e obesidade entre os participantes dos dois grupos. No decorrer do estudo, o grupo tratado com testosterona teve maiores taxas de eventos cardíacos, respiratórios e dermatológicos do que o grupo placebo. Um total de 23 indivíduos no grupo testosterona apresentaram eventos adversos cardiovasculares, comparado com 5 homens no grupo placebo. O risco relativo de eventos cardiovasculares se manteve constante durante todo o período de 6 meses de tratamento. Comparado ao grupo placebo, os indivíduos que usaram testosterona tiveram melhoras significativas na força de pernas e tórax e em subir escadas carregando peso. Conclusões• Nesta população de homens idosos com limitações na mobilidade e com alta prevalência de doenças crônicas, a aplicação de gel de testosterona associou-se a um risco aumentado de eventos adversos cardiovasculares. O pequeno tamanho do estudo e as características peculiares da população não permitem maiores inferências sobre a segurança da terapia com testosterona. Comentários• Como sabemos, a testosterona aumenta a força muscular e a resistência dos membros inferiores, podendo levar a uma melhora da capacidade física do idoso e, por consequência da sua mobilidade. Associado a isso, a testosterona pode ter efeitos adversos, que no idoso com outras comorbidades, podem representar um risco importante, tais como: o aumento da retenção de sal e hídrica, com influências no débito cardíaco; promover, junto com a elevação do estradiol, o processo de inflamação, coagulação e agregação plaquetária; o efeito anabolizante, que leva a uma hipertrofia do músculo cardíaco, e consequente influência na função diastólica e sistólica. Apesar de já avaliada em homens saudáveis, os impactos da reposição da testosterona sobre a capacidade física de idosos com mobilidade prejudicada e comorbidades associadas ainda não tinha sido avaliada até a publicação deste artigo. Como observamos, ainda que ocorra melhora na capacidade física dos pacientes, estes resultados positivos vieram associados a um aumento significativo de eventos cardiovasculares dos mais diversos entre os indivíduos que receberam suplementação de testosterona, o que levou à interrupção do estudo. A ressalva que se faz em relação aos resultados do estudo, é a variabilidade da apresentação dos eventos adversos, além do pequeno numero de casos em cada tipo de evento cardiovascular, fatores que poderiam aumentar a chance dos resultados encontrados se deverem ao acaso. Mesmo que os desfechos estudados não fossem eventos adversos, e que o tamanho da amostra e o numero de eventos seja pequeno, os resultados apresentados devem ser considerados no momento de se indicar a reposição hormonal em pacientes pertencentes à população estudada. Por outro lado, devemos lembrar que não podemos extrapolar estes resultados para o restante da população de homens, idosos ou não, que tenham mobilidade preservada e que desejam fazer reposição hormonal. U R O L O G I A V.18 N.3 JULHO C O N TE M P O R Â N E A SETEMBRO 2010 53 Uro-Resumos Brasil Silva Neto Emanuel Burck dos Santos Comparação de isquemia quente versus sem isquemia durante nefrectomia parcial em rins únicos Thompson RH Lane BR Lohse CM Leibovich BC, Fergany A Frank I Gill IS Campbell SC Blute ML Eur Urol. 2010 Sep; 58(3): 331-6 Introdução• O tempo seguro de isquemia quente durante a nefrectomia parcial permanece controverso. Objetivo• Comparar os efeitos em curto e longo prazo da isquemia quente versus a cirurgia sem isquemia, em pacientes com rim único. Delineamento, intervenções e população Usando os bancos de dados da Cleveland Clinic e da Mayo Clinic, nós identificamos 458 pacientes que foram submetidos à nefrectomia parcial aberta (n = 411) ou laparoscópica (n = 47), para tratamento de massas renais, em indivíduos com rim único, no período de 1990 até 2008. Pacientes operados com isquemia fria foram excluídos. Medidas de desfecho• A associação do tipo de isquemia (sem isquemia vs isquemia quente) com a função renal em curto e longo prazo, foi avaliada usando modelos de regressão logística ou de Cox. Resultados e limitações• Cirurgia sem isquemia foi realizada em 96 pacientes (21%), enquanto que 362 (79%) tiveram uma média de 21 minutos (variando de 4 – 55 min) de isquemia quente. Pacientes UROLOGI A 54 V.18 N.3 C O NT EMPO R Â NEA JULHO SETEMBRO 2010 tratados com isquemia quente tinham uma taxa de filtração glomerular pré-operatória significativamente maior (TFG média: 61 ml/ min por 1,73 m2 vs 54 ml/min por 1,73 m2; p<0,001), e os tumores eram maiores no grupo da isquemia quente comparados ao tumores do grupo sem isquemia (média 3,4 cm vs 2,5 cm; p<0,001). Pacientes com isquemia quente tiveram uma chance significativamente maior de desenvolver insuficiência renal aguda (odds ratio [OR]: 2,1; p=0,044), e de ter TFG < 15 ml/min por 1,73 m2 no período pós operatório (OR: 4,2; p=0,007), comparado com o grupo que não teve clampeamento do pedículo renal. Entre os 297 pacientes com uma TFG ≥ 30 ml/ min por 1,73 m2 no período pré-operatorio, pacientes com isquemia quente tiveram uma probabilidade significativamente maior de desenvolver doença renal crônica estágio IV de início recente (HR: 2,3; p=0,028), durante um seguimento médio de 3,3 anos. Resultados semelhantes foram obtidos através de análise multivariada, ajustado para a TFG pré-operatória, tamanho tumoral, e tipo de nefrectomia parcial. Limitações incluem o viés de seleção do cirurgião no momento de determinar o tipo de isquemia. Conclusões• Isquemia quente durante a nefrectomia parcial esta associada a desfechos renais adversos. Embora um viés de seleção esteja presente, a nefrectomia parcial sem isquemia deveria ser utilizada quando tecnicamente possível, em pacientes com rim único. Comentários• Atualmente, o diagnóstico de tumores renais ocorre predominantemente de Uro-Resumos Brasil Silva Neto Emanuel Burck dos Santos maneira incidental, ocasionando o achado de lesões, na sua grande maioria, em estágios iniciais (T1a-b). Com isso, a nefrectomia parcial (NP) tornou-se um procedimento muito comum, sendo a cirurgia mais realizada para os tumores iniciais em centros de referência. Quando associamos a isso um paciente renal crônico ou com rim único, temos um paciente com indicação absoluta para uma cirurgia poupadora de néfrons. O tempo de isquemia durante uma NP é o principal preditor de evolução da função renal no pós-operatório e quando usamos um clampeamento sem resfriamento renal, é imperioso que o tempo de isquemia quente seja o menor possível. Em lesões menores e exofiticas, a cirurgia sem isquemia é uma opção muito boa para preservação da função renal. Com o objetivo de avaliar os desfechos renais a curto e longo prazo, os autores analisaram uma coorte para comparar os pacientes com rim único, submetidos à nefrectomia parcial sem isquemia ou isquemia quente. Apesar desta metodologia não ser a mais adequada, este estudo nos mostra resultados que são importantes na tomada de decisões em uma cirurgia que pode interferir muito na qualidade de vida dos pacientes. Este estudo já teve seus dados apresentados previamente, porém agora o número de pacientes foi maior, utilizouse a Taxa de Filtração Glomerular como medida de avaliação da função renal, e incluíram-se casos de nefrectomia aberta e laparoscópica. Como os pacientes tinham rim único, quando possível foi realizada a enucleação do tumor, pois pode ser feita apenas com compressão regional do rim, sem necessidade de isquemia. Os resultados deste estudo mostram que a nefrectomia parcial com isquemia quente está mais associada ao desenvolvimento insuficiência renal aguda e insuficiência renal crônica estágio IV no pósoperatório, do que quando realizamos uma nefrectomia sem isquemia. O tempo de isquemia quente seguro, para evitar que as células renais entrem em um processo de morte celular, gira em torno de 20-30 minutos. Neste estudo, os cirurgiões deveriam estimar o tempo de isquemia em função do tamanho e localização do tumor, e nos casos onde foi necessária a utilização de isquemia fria, os pacientes foram excluídos da análise. É claro que há um viés de seleção no estudo, já que a técnica cirúrgica era definida pelo cirurgião, sem uma randomização prévia. Talvez o principal objetivo deste estudo não seja comparar os desfechos entre os dois grupos, mas sim mostrar que, quando factível, a nefrectomia parcial sem campleamento do pedículo deve ser realizada, pois há uma melhor preservação da função renal destes pacientes. Além disso, nos casos de tumores periféricos e exofíticos, a hemorragia e as fístulas urinárias não parecem ser tão frequentes como se imaginava, quando realizada a nefrectomia parcial sem isquemia do rim. Infelizmente, a maioria dos tumores renais tem características que contra-indicam a cirurgia sem isquemia. Nestes casos, a isquemia quente não deve ultrapassar 20 minutos, e os casos mais complexos devem continuar sendo realizados com isquemia fria. U R O L O G I A V.18 N.3 JULHO C O N TE M P O R Â N E A SETEMBRO 2010 55 Ponto DE vISta WWW.urologIacontEmPoranEa.org.br Fernando Gomes da silva eloísio alexsandro da silva Serviço de Urologia do Hospital Universitário Pedro Ernesto Universidade do Estado do Rio de Janeiro Curvatura peniana por doença de Peyronie Introdução A prevalência das curvaturas penianas é de aproximadamente 10% considerando tanto as de origem congênita quanto as adquiridas.¹,² Apesar de se tratar de um problema comumente encontrado nos consultórios urológicos, o manejo deste paciente constitui num desafio para o urologista. Caso Clínico Homem de 45 anos de idade, casado há 15 anos, percebeu que seu “pênis estava entortando” desde dois anos. Atualmente é incapaz de realizar a penetração vaginal mesmo sendo capaz de conseguir uma ereção plena sem o auxílio do uso oral de inibidores da fosfodiesterase 5. A libido está presente e consegue orgasmo com ejaculação utilizando-se de masturbação. Atualmente não se queixa de dor peniana. Fez UROLOGI A 56 V.18 N.3 C O NT EMPO R Â NEA JULHO SETEMBRO 2010 uso oral de vitamina E tanto de forma isolada quanto associada à colchicina durante um ano, mas sem sucesso. O exame físico evidenciou uma placa fibrosa peniana ventrolateral direita, indolor, bem delimitada. Uma avaliação objetiva, durante o teste de ereção ambulatorial com 10 µg de prostaglandina E 1 intracavernosa causou uma ereção completa aos 15 minutos e evidenciou-se uma curvatura lateral direita de 52° e outra curvatura inferior de 47° (Figura) utilizando-se a técnica das cinco linhas de Kelami.3 O comprimento do pênis foi de 13,5 cm. O paciente foi avaliado pela psicologia médica que não identificou contraindicações para o tratamento cirúrgico. Optou-se por realizar uma corporoplastia, alongando a face côncava, utilizando o princípio geométrico e enxertos de túnica albugínea de ambas as cruras.4,5 ponto de vista Curvatura peniana por doença de peyronie Fernando Gomes da Silva Eloísio Alexsandro da Silva Comentários Até o momento ainda não existe tratamento clínico eficaz para as curvaturas penianas.² Por outro lado, como observamos no caso descrito a cima, muitos urologistas utilizam algum tratamento oral, às vezes com a intenção de placebo, para manejarem a ansiedade destes pacientes pela resolução da curvatura enquanto aguardam a estabilização da placa peniana por pelo menos um ano. A indicação cirúrgica decorre principalmente da modificação ou até da incapacidade da atividade sexual, o que pode afetar a auto-estima e a qualidade de vida do homem e de sua parceira. Inicialmente, deve-se avaliá-las de forma objetiva para identificar se está presente em apenas um ou em dois eixos, e medir o(s) ângulo(s), além de identificar a presença de deformidades em ampulheta. Curvaturas em um eixo menores de 20° são consideradas como estéticas pois teoricamente não atrapalhariam a biomecânica da penetração. As curvaturas simples, presentes em apenas um eixo, < 60° e sem deformidades podem ser tratadas com as técnicas de plicatura. São simples e eficazes.6 A redução esperada do tamanho do pênis depende da técnica de plicatura utilizada mas pode ser significativa estando descritos encurtamentos de até 2,6 mm para cada 10° de curvatura retificados.7 Não é possível corrigir deformidades em ampulheta através destas técnicas. As curvaturas consideradas complexas são aquelas que acometem mais de 1 eixo, ou > 60° em um eixo, ou apresenta deformidades, por exemplo, em ampulheta. Nestes casos, a retificação da haste peniana utilizando técnicas de plicaturas pode reduzir significativamente o tamanho do pênis e comprometer a satisfação do paciente. Uma opção para manter, ou até mesmo aumentar o tamanho do pênis é a utilização de corporoplastias com enxertos. A túnica albugínea de crura autóloga é uma excelente opção por ser o mesmo tecido a ser substituído e com bons resultados em aproximadamente 85% dos casos.5 Infelizmente, quando a área de enxertia é extensa, a quantidade da crura é limitada. Nestes casos, com resultados similares, pode ser utilizada veia safena ou derme.8 Os aloenxertos são uma opção controversa e há necessidade de resultados a longo prazo com seguimento rígido. Quando a disfunção erétil grave está associada à curvatura peniana, o implante de próteses penianas são opções atraentes. Por fim, é importante individualizar o tratamento oferecendo as opções e suporte psicológico para este homem que se encontra fragilizado na sua estrutura biopsicosocial. Referências 1. Taylor FL, Levine LA. Peyronie’s Disease. Urol Clin North Am. 2007 Nov;34(4):517-34, vi. 2. Hauck EW, Diemer T, Schmelz HU, Weidner W. A critical analysis of nonsurgical treatment of Peyronie’s disease. Eur Urol. 2006 Jun;49(6): 987-97. 3. Kelâmi A. Classification of congenital and acquired penile deviation. Urol Int. 1983;38(4):229-33. 4. Egydio PH, Lucon AM, Arap S. A single relaxing incision to correct different types of penile curvature: surgical technique based on geometrical principles. BJU Int. 2004 Nov;94(7):1147-57. 5. Teloken C, Grazziotin T, Rhoden E, Da Ros C, Fornari A, Soares FC, et al. Penile straightening with crural graft of the corpus cavernosum. J Urol. 2000 Jul;164(1):107-8. 6. Rolle L, Tamagnone A, Timpano M, Destefanis P, Fiori C, Ceruti C, et al. The Nesbit operation for penile curvature: an easy and effective technical modification. J Urol. 2005 Jan;173(1):171-3. 7. Schneider T, Sperling H, Schenck M, Schneider U, Rübben H. Treatment of penile curvature--how to combine the advantages of simple plication and the Nesbit-procedure by superficial excision of the tunica albuginea. World J Urol. 2003 May;20(6):350-5. 8. Kadioglu A, Akman T, Sanli O, Gurkan L, Cakan M, Celtik M. Surgical treatment of Peyronie’s disease: a critical analysis. Eur Urol. 2006 Aug;50(2):235-48. U R O L O G I A V.18 N.3 JULHO C O N TE M P O R Â N E A SETEMBRO 2010 57 IMAGEM EM UROLOGIA Jayme de www.urologiacontemporanea.org.br Souza Toledo Filho Professor Associado de Urologia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro Responsável pelo Setor de Endourologia do Hospital Universitário Pedro Ernesto Complicações do cateter duplo “J” C onsiderado um dos grandes avan­ ços da urologia, o cateter duplo “J” começou a ser utilizado no início dos anos 70 para melhor drenagem urinária do trato urinário superior. Os cateteres inicialmente eram de grande calibre (6 a 7 F) e de material pouco elástico. Com a melhora da tecnologia passaram a ser de menor calibre (4,3 F) e de material mais elástico e flexível, o que não diminuiu os sintomas irritativos vesicais causados pelo cateter. A ausência de irritabilidade vesical após a colocação do cateter duplo “J” poderá ser um bom sinal, mas poderá também constituir forte indício de sua migração para o ureter e dependendo do tipo da confecção do mesmo, isto poderá ocorrer mais facilmente: os que apresentam uma dobra maior e são mais rígidos em sua extremidade são menos susceptíveis a este tipo de problema. UROLOGI A 58 V.18 N.3 C O NT EMPO R Â NEA JULHO SETEMBRO 2010 A calcificação do cateter, mesmo os referendados como de longa permanência, poderá acontecer de maneira precoce de 2 a 3 meses após a instalação, ou poderá não ocorrer conforme relatos de permanência de cateter por até 13 anos sem calcificação.1 Mesmo que inicialmente tenha sido certificado seu correto posicionamento, a migração espontânea do cateter duplo “J” para o trato urinário superior pode ocorrer entre 0,6 a 3,5% dos pacientes. Isto é conhecido como “Jack” fenômeno.2 A ocorrência de dobra espontânea do cateter duplo “J” raramente é observada, e quando isto ocorre há necessidade de ureteroscopia para desfazer o mesmo e evitar maiores lesões ureterais. 3 Até mesmo a posição do duplo “J” no sistema renal influencia os sintomas de desconforto e o refluxo se- IMAGEM EM UROLOGIA Complicações do cateter duplo “J” Jayme de Souza Toledo Filho cundário que ocorre durante a micção. Vários estudos demonstram que quando a porção do cateter duplo “J” está colocada em cálice superior, os sintomas de dor lombar são bem menores quando comparados ao posicionamento do mesmo na pelve renal, ainda que esta posição poderá facilitar uma hematúria mais acentuada. 4 A imagem acima é de um paciente após uma cirurgia de nefrolitotomia percutânea que no primeiro dia de pós-operatório, durante a retirada do cateter de nefrostomia, devido à proximidade do cateter ao duplo “J”, este foi tracionado para o espaço perirenal. Entretanto, isto foi constatado por tomografia computadorizada realizada aos 30 dias de pós-operatório para tratamento do cálculo coraliforme. Como o cateter duplo “J” já estava calcificado, e não foi trocado neste primeiro ato cirúrgico, o mesmo não estava pérvio e funcionante e, consequentemente, não ocasionou nenhum acumulo de urina no espaço perirenal, bem como não levou a quadro álgico ou infeccioso. Simplesmente a surpresa da descoberta. Referências 1. Wood SJ, Tansley PD, Appleton DS, Doyle PT. Uncalcified ureteral stent in situ for 13 years. J Urol. 1997 Mar;157(3):943-4. 2. Ko W, Lee W, Jung J, Lee M. Spontaneous proximal double pigtail ureteral stent migration after shock wave lithotripsy: “jack” phenomenon. J Urol. 2001 Oct;166(4):1387. 3. Flam TA, Thiounn N, Gerbaud PF, Zerbib M, Debre B. Knotting of a Double pigtail stent within the ureter: an initial report. J Urol. 1995 Nov;154(5):1858-9. 4. Liatsikos EN, Gershbaum D, Kapoor R, Fogarty J, Dinlenc CZ, Bernardo NO, Smith AD. Comparison of symptoms related to positioning of double-pigtail stent in upper pole versus renal pelvis. J Endourol. 2001 Apr;15(3):299-302. U R O L O G I A V.18 N.3 JULHO C O N TE M P O R Â N E A SETEMBRO 2010 59