Universidade Tecnológica Federal do Paraná ‐ UTFPR Programa de Pós‐Graduação em Ensino de Ciência e Tecnologia ‐ PPGECT Atecituraunidocentenaconstruçãodo conhecimentocientíficonosanosiniciais Sandra Mara Soares Ferreira Priscila Meier de Andrade Tribeck Resumo Com o objetivo de apresentar reflexões sobre a construção do conhecimento científico nos anos iniciais a partir da tecitura unidocente, este artigo se volta para a importância da contextualização e articulação dos processos de leitura, escrita, resolução de problemas, interpretação, entendimento e compreensão do mundo com as áreas do conhecimento, numa abordagem interdisciplinar. Palavras‐chave: conhecimento científico, anos iniciais, interdisciplinaridade, unidocência. Abstract The seam of unidocente in building of scientific knowledge in the early years Aiming to present reflections on the construction of scientific knowledge in the early years from the weaving unidocente, this article turns to the importance of context and articulation of the processes of reading, writing, problem solving, interpretation, understanding and comprehension of the world II Simpósio Nacional de Ensino de Ciência e Tecnologia 07 a 09 de outubro de 2010 ISSN: 2178‐6135 Artigo número: 143 Universidade Tecnológica Federal do Paraná ‐ UTFPR Programa de Pós‐Graduação em Ensino de Ciência e Tecnologia ‐ PPGECT with the areas of knowledge, an interdisciplinary approach. Keywords: scientific knowledge, early years, interdisciplinary, unidocência. II Simpósio Nacional de Ensino de Ciência e Tecnologia 07 a 09 de outubro de 2010 ISSN: 2178‐6135 Artigo número: 143 Universidade Tecnológica Federal do Paraná ‐ UTFPR Programa de Pós‐Graduação em Ensino de Ciência e Tecnologia ‐ PPGECT Introdução Nas últimas décadas, as formas de ensinar e aprender têm sido foco de discussões pela sua natureza e complexidade. Sob diferentes correntes epistemológicas e em diversas teorias, a prática pedagógica em qualquer nível, etapa ou modalidade de ensino reflete as concepções acerca dos processos de ensino e de aprendizagem. No Brasil, o direito à educação foi ampliado de oito para nove anos no ensino fundamental. O Ministério da Educação, por meio da Secretaria de Educação Básica esclarece que: A implantação de uma política de ampliação do ensino fundamental de oito para nove anos de duração exige tratamento político, administrativo e pedagógico, uma vez que o objetivo de um maior número de anos no ensino obrigatório é assegurar a todas as crianças um tempo mais longo de convívio escolar com maiores oportunidades de aprendizagem (BRASIL, 2007, p. 7). Entretanto, a ampliação do tempo da criança na escola não se resume a uma questão meramente etária. Tampouco garante a aprendizagem dos alunos. É preciso ampliar o olhar e aproveitar as características do universo infantil em benefício da aprendizagem e da qualidade de ensino. Para Libâneo (2002), a escola é o local onde se realiza a produção de saberes, a partir de atividades científicas ou não, sistematizadas ou não, vivenciadas por professores e alunos. Essa atividade de produção de saberes precisa acompanhar a evolução dos tempos. Chassot (2008, p. 51) ressalta: “(...) somos todos homens e mulheres do século passado, ou até do milênio passado”. Evidencia ainda o quanto a ciência evoluiu nesse período e o quanto ela está presente na vida de todos. Quando chegam aos anos iniciais, as crianças já estão em contato com os aparatos científicos desde o nascimento. Por isso, na escola, essa produção de saberes deve estar vinculada à prática social, oferecendo elementos que consolidem os conteúdos curriculares aprofundando as reflexões e experiências também no âmbito do conhecimento científico. II Simpósio Nacional de Ensino de Ciência e Tecnologia 07 a 09 de outubro de 2010 ISSN: 2178‐6135 Artigo número: 143 Universidade Tecnológica Federal do Paraná ‐ UTFPR Programa de Pós‐Graduação em Ensino de Ciência e Tecnologia ‐ PPGECT O pleno domínio da leitura, da escrita, da compreensão e do cálculo, como estabelece a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, nº 9.394/96, deve estar pautado na realidade do cenário científico. Para Callai (2005), é necessário que se considerem: (...) aspectos significativos de várias ciências, traduzidos em componentes curriculares absorvidos na complexidade da aula de forma integrada. (...) considerando também o que efetivamente acontece na sala de aula, realidade que se conhece por intermédio de várias publicações, pesquisas, diagnósticos e inclusive da observação direta, particularmente por conta de uma pesquisa realizada (CALLAI, 2005, p. 229). Porém, o processo de ensino‐aprendizagem nos anos iniciais depende fundamentalmente da tecitura unidocente, ou seja, de um único professor que conduzirá os fios das tramas que compõem o currículo escolar nas diversas e diferentes áreas do conhecimento, de forma significativa. O termo tecitura é abrangente e remete a vários sentidos: ‐ Do latim, deriva de “texto” e significa tecer, construir. ‐ Sob a ótica da biologia, tecido diz respeito a um conjunto de células especializadas, com a mesma função e que apresentam a mesma diferenciação morfológica. Vários tecidos constituem um órgão (MANUILA, 2003). ‐ Sob a ótica acadêmica remete ao entrelaçamento ou trama de fatos ou idéias. Bakhtin (2000) afirma que o texto é o ponto de partida para todas as disciplinas nas ciências humanas. Pode‐se acrescentar o valor do texto a todas as disciplinas e em todas as áreas do conhecimento, principalmente nos anos iniciais, etapa da aquisição da leitura e escrita. Sobre o texto, Bakhtin complementa ainda: II Simpósio Nacional de Ensino de Ciência e Tecnologia 07 a 09 de outubro de 2010 ISSN: 2178‐6135 Artigo número: 143 Universidade Tecnológica Federal do Paraná ‐ UTFPR Programa de Pós‐Graduação em Ensino de Ciência e Tecnologia ‐ PPGECT (...) Partindo de um texto, perambulam‐se nas mais variadas direções, recolhendo‐se fragmentos heterogêneos da natureza, na vida social, no psiquismo, na história, que serão unidos numa relação ora de causalidade, ora de sentido, confundindo‐se a constatação e os valores (BAKHTIN, 2000, p.341). Nos anos iniciais, um professor unidocente atua na mediação e tecitura do processo ensino‐aprendizagem. Trata‐se de uma prática extremamente complexa e dinâmica, que requer responsabilidade e compromisso na busca de informações e no confronto de idéias a serem lapidadas e exploradas, pois muito se discute a respeito da formação inicial e continuada do professor dos anos iniciais. Os Parâmetros Curriculares Nacionais (1998) postulam que é papel do professor proporcionar elementos das teorias científicas e outros sistemas explicativos em seu próprio discurso explicativo. Para Townsend e Tomazzeti (2007), o fato de o professor dos anos iniciais mobilizar uma gama de saberes consiste no fato de a docência nutrir‐se de saberes que se originam a partir da história de vida, da formação profissional e da prática docente. Dessa forma, o seu trabalho torna‐ se um espaço e território de aprendizagem contínua. Cascino (2001) estabelece a seguinte relação: No tecido, cada fio, isoladamente, possui uma força e uma resistência muito menor que a resultante de sua união aos demais fios. (...) Dessa forma, o processo de constituição do tecido tornará cada fio forte, único, considerado cada um à sua própria medida, demandando especificidade/unicidade. O conjunto, portanto, possibilitará ir além, ampliar horizontes, constituindo‐se num todo a partir da somatória complexa de inúmeras e singulares partes (CASCINO, 2001, p. 128) Essa relação metafórica condiz parcialmente com a abordagem deste artigo. Não se pretende julgar cada área do conhecimento enfraquecida quando abordada e sistematizada II Simpósio Nacional de Ensino de Ciência e Tecnologia 07 a 09 de outubro de 2010 ISSN: 2178‐6135 Artigo número: 143 Universidade Tecnológica Federal do Paraná ‐ UTFPR Programa de Pós‐Graduação em Ensino de Ciência e Tecnologia ‐ PPGECT isoladamente. Ao contrário, a especificidade deve ser considerada na medida em que cada área elege um objeto de estudo para conhecer, pois o conhecimento se gera de forma organizada. Porém, a conexão que se estabelece a partir da metáfora de Cascino (2001) direciona‐se aos anos iniciais, onde há a necessidade do posicionamento ativo do aluno em sua aprendizagem, enquanto sujeito em formação. Nessa etapa de ensino, todos os conhecimentos produzidos de forma contextualizada e articulada são importantes para os processos de leitura, escrita, resolução de problemas, interpretação, entendimento e compreensão do mundo. Desse modo, todas essas habilidades a serem desenvolvidas com os escolares dos anos iniciais apresentam igual grau de importância na trama que constrói o conhecimento científico, como demonstra a figura 1: Figura 1: Habilidades importantes para o conhecimento científico. Fonte: Autoria Própria II Simpósio Nacional de Ensino de Ciência e Tecnologia 07 a 09 de outubro de 2010 ISSN: 2178‐6135 Artigo número: 143 Universidade Tecnológica Federal do Paraná ‐ UTFPR Programa de Pós‐Graduação em Ensino de Ciência e Tecnologia ‐ PPGECT Um tema gerado a partir da matriz curricular pode refletir‐se em várias áreas do conhecimento ao mesmo tempo, uma vez que o “ensino das disciplinas científicas tem consequências específicas em vários elementos curriculares” (KRASILCHIK, 2000, p.88). Chassot (2008, p. 65) relembra Kuhn, ao afirmar que “(...) não há ciência pronta, de maneira definitiva” e que “(...) fazer ciência é como montar um quebra‐cabeça”. É nesse emaranhado de peças de um quebra‐cabeça que atua o professor unidocente dos anos iniciais, na trama de saberes de seu dia‐a‐dia em sala de aula. Porém, a trama que se estabelece nos anos iniciais com relação às habilidades, estabelece‐se também com relação às disciplinas, como demonstra a figura 2: Figura 2: Abordagem Interdisciplinar nos anos iniciais. Fonte: Autoria Própria Nos anos iniciais, as habilidades de leitura, escrita, resolução de problemas, interpretação, entendimento e compreensão do mundo são tratadas em todas as disciplinas, resultando na abordagem interdisciplinar. Nesse sentido, Santomé (1998) alerta: II Simpósio Nacional de Ensino de Ciência e Tecnologia 07 a 09 de outubro de 2010 ISSN: 2178‐6135 Artigo número: 143 Universidade Tecnológica Federal do Paraná ‐ UTFPR Programa de Pós‐Graduação em Ensino de Ciência e Tecnologia ‐ PPGECT (...) para que haja interdisciplinaridade, é preciso que haja disciplinas. As propostas interdisciplinares surgem e desenvolvem‐se apoiando‐se nas disciplinas; a própria riqueza da interdisciplinaridade depende do grau de desenvolvimento atingido pelas disciplinas e estas, por sua vez, serão afetadas positivamente pelos seus contatos e colaborações interdisciplinares (SANTOMÉ, 1998, p.61). Nesse sentido, a unidocência facilita o processo de interdisciplinaridade, uma vez que cabe a um só docente a tacitura de todas as disciplinas. Santomé (1998) complementa que a interação entre duas ou mais disciplinas resulta na intercomunicação e enriquecimento recíproco, e em intercâmbios entre diferentes disciplinas. Quando o processo de ensino‐aprendizagem torna‐se fragmentado e descontextualizado impede que o aluno se situe no tempo e no espaço, impedindo também que ele estabeleça relações fundamentais ao seu entendimento. Lenoir (2001) estabelece algumas etapas ou planos da interdisciplinaridade, conforme o quadro 1: PLANOS DA INTERDISCIPLINARIDADE Interdisciplinaridade Interdisciplinaridade Interdisciplinaridade Curricular didática pedagógica Estabelece seu enfoque na Seu foco encontra-se no Volta-se para a prática construção do currículo planejamento do da prática pedagógica no enfoque escolar na definição dos pedagógica, que busca interdisciplinar em sala de objetivos e programas de aproximar as especificidades aula cada disciplina. de cada disciplina numa abordagem interdisciplinar Quadro 1: Os planos da interdisciplinaridade Fonte: Lenoir, 2001. Os três planos da interdisciplinaridade propostos por Lenoir (2001) são importantes e complementares, embora resida na vertente pedagógica a real possibilidade de intervenção para que o processo de aprendizagem seja significativo em sala de aula. II Simpósio Nacional de Ensino de Ciência e Tecnologia 07 a 09 de outubro de 2010 ISSN: 2178‐6135 Artigo número: 143 Universidade Tecnológica Federal do Paraná ‐ UTFPR Programa de Pós‐Graduação em Ensino de Ciência e Tecnologia ‐ PPGECT Seja pela recepção de conteúdos ou pela descoberta, a aprendizagem significativa, opõe‐ se à aprendizagem mecânica, calcada na memorização e repetição, pois abre possibilidades a novos significados, numa relação indissociável entre aprendizagem e desenvolvimento (AUSUBEL, 1976). O conhecimento científico se constrói a partir da observação, da experimentação e da ação concomitante dos conhecimentos anteriores e interpretação das novas informações. Faz parte da realidade humana a congruência interdisciplinar dos assuntos, das informações, dos conhecimentos nas situações rotineiras e cotidianas. O mundo real não é um contexto fixo, não é apenas nem principalmente o universo físico. O mundo que rodeia a criança é hoje, mais do que nunca, uma clara construção social em que as pessoas, os objetos, os espaços e as criações culturais políticas ou sociais adquirem um sentido peculiar, em virtude das coordenadas sociais e históricas que determinam sua configuração (SACRISTÁN e GÓMEZ, 2000, p. 59). Chassot (2008) afirma que a ciência produz verdades, embora provisórias. Afirma também que a ciência é uma das maneiras que se tem de ler o mundo, e complementa ainda: (...) As atividades realizadas pelos estudantes consistem em procurar saberes populares e estudá‐los – com a ajuda dos saberes acadêmicos – e se possível, torná‐ los saberes escolares. Estes, então, retornam à comunidade donde foram garimpados como saberes populares, agora, como saberes escolares (CHASSOT, 2008, p. 205). Toda e qualquer atividade investigativa, que derive de saberes populares, precisa estar acompanhada de uma situação problematizadora, para que conduza professores e alunos a questionamentos e ao diálogo, eixos fundamentais no processo que possibilitará um novo conhecimento. Dessa forma, toda a classe terá a possibilidade de aprender sob a forma de perguntas, nomeações e leitura de textos complementares, num grande envolvimento interdisciplinar. Para II Simpósio Nacional de Ensino de Ciência e Tecnologia 07 a 09 de outubro de 2010 ISSN: 2178‐6135 Artigo número: 143 Universidade Tecnológica Federal do Paraná ‐ UTFPR Programa de Pós‐Graduação em Ensino de Ciência e Tecnologia ‐ PPGECT que se estimule a curiosidade dos alunos, é imprescindível incentivá‐los a levantar hipóteses sobre os fenômenos observados em sala de aula e fora dela. Conclusões Com a ampliação do ensino fundamental de oito para nove anos, as crianças chegam mais cedo na escola. Ávidos por novos conhecimentos, estes alunos precisam que lhes seja oportunizada a possibilidade de contato com os conhecimentos científicos. O professor dos anos iniciais – unidocente – tem a responsabilidade e o desafio de trabalhar todas as disciplinas, habilidades e conteúdos de forma crítica, criativa e organizada. Tem ainda a missão de que a aprendizagem dos alunos se dê de forma significativa. Há ainda a necessidade de articulação dos processos de leitura, escrita, resolução de problemas, interpretação, entendimento e compreensão do mundo. Nesse emaranhado todo, cabe ao professor ser um bom tecelão, pois a tecitura docente, numa abordagem interdisciplinar, fará toda a diferença no processo de ensino e aprendizagem. Referências AUSUBEL, D. Psicologia de la educación. Madrid: Morata, 1976. BAKHTIN, M. Estética da criação verbal. Trad. Maria E. Galvão. 3ªed. São Paulo: Martins Fontes, 2000. BOURDIEU, P. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1989. 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