VI Encontro Regional de Ensino de Biologia da Regional 2 RJ/ES CEFET/RJ, 2012 CONCEPÇÕES SOBRE DNA NO ENSINO MÉDIO Bianca Ferreira da Silva UFRRJ [email protected] Nadjara de Medeiros Corrêa UFRRJ [email protected] Lana Claudia de Souza Fonseca UFRRJ [email protected] Introdução A relevância dos conhecimentos prévios trazidos pelos alunos para a sala de aula é uma importante questão na relação ensino-aprendizagem. Schnetzler (1992) aponta que os alunos procuram dar explicações às diversas situações com que se deparam em suas vidas, chegando à sala de aula com ideias sobre os fenômenos e conceitos científicos que, de modo geral, são diferentes dos que os professores ensinam. Essas fontes de conhecimento explicam o mundo baseado na experiência e nas percepções sensoriais, estando relacionadas ao chamado conhecimento cotidiano (KRÜGER & GIL, 2005). O conhecimento cotidiano está presente desde os primeiros meses de vida da criança, sendo socializado precocemente, o contrário ocorre com o conhecimento científico, que é internalizado posteriormente no indivíduo. A aproximação dos conceitos científicos parte da escola e deve levar em conta as características próprias do conhecimento e dos alunos, assim como seus conhecimentos prévios (BIZZO, 2009). Com isso, torna-se necessário o entendimento de que o aprendizado por parte do aluno não ocorre com a internalização de um significado transmitido a ele, e sim através da interação entre os novos conhecimentos e os conhecimentos aprendidos anteriormente, num processo de atribuição de significados (SCHNETZLER, 1992). Para que ocorra a aprendizagem significativa, o novo conhecimento deve ancorar-se em conceitos relevantes preexistentes e, desta forma, a nova informação adquire significado. A concepção anterior serve como ancoragem, incorpora e assimila o novo conhecimento, modificando-se, ao mesmo tempo, em função dessa assimilação (MOREIRA, 2006). VI Encontro Regional de Ensino de Biologia da Regional 2 RJ/ES CEFET/RJ, 2012 Ao chegarem à sala de aula de Biologia, os alunos já possuem através de sua vivência conceitos pré-definidos sobre fenômenos naturais que serão abordados na disciplina. No entanto, segundo Souza & Freitas (2004) o cotidiano trabalhado pelo professor de Biologia é ainda limitado e possui uma participação superficial na sala de aula, verificando-se historicamente uma ênfase na transmissão de informações, com foco do ensino na aprendizagem de termos e definições (CARRAHER et al, 1985). Uma destas causas é concepção de que ao discutir situações cotidianas, o professor estará desprezando o conhecimento científico. No Ensino Médio, a Biologia encontra-se organizada em seis temas estruturadores, estabelecidos nos PCN+ (BRASIL, 2002), nos quais o tema Genética apresenta-se envolvido em três destes temas. Dentro do tema “identidade dos seres vivos” encontra-se a unidade temática “DNA: a receita da vida e o seu código”. Onde dentre os objetivos da unidade podese destacar: localizar o material genético em células de diferentes tipos de organismo; identificar a natureza do material hereditário nos seres vivos e analisar sua estrutura química para avaliar a universalidade dessa molécula; estabelecer a relação entre DNA, código genético, fabricação de proteínas e determinação das características dos organismos (BRASIL, 2002). Apesar de assuntos relacionados à genética terem se tornados rotineiros, como os testes de paternidade, as doenças hereditárias ou os transgênicos, o ensino de genética constitui um conteúdo de difícil compreensão para os alunos (PADILHA & PEREIRA, 2008). De acordo com Goldbach et al. (2009) a dificuldade se deve tanto à complexidade dos conceitos, quanto à organização e desenvolvimento de um conteúdo fragmentado, tanto nos planejamentos curriculares, quanto nos livros didáticos. Considerando-se o tema ‘Genética’ como uma parte significativa do conteúdo abordado em Biologia no Ensino Médio e, em vista das dificuldades no processo de ensinoaprendizagem do assunto, o trabalho realizou-se com objetivo de levantar as dificuldades existentes no aprendizado de Genética, as concepções dos alunos sobre o tema e como eles constroem significados. Metodologia O levantamento de concepções realizou-se no 2º semestre do ano de 2011, em três instituições que atendem ao Ensino Médio ou ao Superior, nos estados do Rio de Janeiro e de São Paulo. Através da aplicação de questionários (Anexo) foram realizadas a caracterização das turmas avaliadas e o levantamento das concepções doas alunos sobre o tema “DNA”. VI Encontro Regional de Ensino de Biologia da Regional 2 RJ/ES CEFET/RJ, 2012 Foram elaboradas questões abertas, em maioria, e fechadas. As questões abertas foram categorizadas de acordo com palavras-chaves ou ideias contidas na resposta dos alunos. Os dados obtidos foram tabelados e analisados e os resultados encontrados discutidos. A primeira das escolas amostradas pertence à rede estadual de São Paulo, no município de São José dos Campos e atende a um total de 1.150 alunos do Ensino Fundamental e Médio, em dois turnos. A turma amostrada era composta por alunos do 1º ano do Ensino Médio, entre 15 e 17 anos, não repetentes e em sua maioria (93%) do sexo feminino. O CIEP está localizado no centro do Município de Seropédica, sob jurisdição da Secretaria Estadual de Educação do Rio de Janeiro. Possui cerca de 1.500 alunos e 65 professores, com funcionamento em três turnos. As turmas amostradas foram do 2º e do 3º ano do ensino Médio, incluindo Ensino de Jovens e Adultos. A maioria dos alunos tem idade entre 15 e 17 anos (53%), seguidos de alunos com 18 a 20 anos (27%) e acima de 29 até 37 anos (20%). Cerca de 60% dos alunos avaliados eram do sexo masculino. Aproximadamente metade dos alunos era repetente (53%), sendo metade deste número com apenas uma retenção, e a outra metade com mais de uma reprovação, com casos de até cinco repetências. A Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso de Ensino Superior oferecido pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) campus Seropédica, RJ. Voltada para jovens e adultos dos Assentamentos de Reforma Agrária do Estado do Rio de Janeiro, a LEC atende a alunos que residem e/ou trabalham no campo, a quilombolas e indígenas, que estudam em regime de alternância (BRASIL, 2010). Resultados e Discussão As questões propostas no questionário abordam o tema genética, com enfoque no DNA. As respostas encontradas demonstram que os alunos não compreendem adequadamente o conceito “o que é DNA” e qual sua função. As respostas obtidas baseiam-se em conhecimentos adquiridos no cotidiano e frequentemente abordados pela mídia, como por exemplo, os testes de paternidade. As respostas demonstram que os participantes possuem um conhecimento científico superficial, que contudo não é completamente assimilado, não transformando os conceitos construídos anteriormente. A primeira questão – “Por que os filhos se parecem os pais?” – objetivou saber se os alunos conseguem estabelecer relação entre hereditariedade e material genético. As respostas encontradas abordavam, em geral, a transmissão de material genético dos pais para os filhos, VI Encontro Regional de Ensino de Biologia da Regional 2 RJ/ES CEFET/RJ, 2012 demonstrando certa compreensão do assunto. No entanto, algumas respostas apresentavam-se de forma vaga, como: “Por causa da genética” Aluna do 1º ano da Escola em São Paulo. Algumas respostas demonstraram conhecimento dos alunos sobre herança genética: “Porque erdam [sic] o DNA” Aluno do 2º ano do CIEP 155. “Por conta dos gens [sic] que vão receber [sic] de seus pais e que formaram suas características físicas” Aluna da LEC. “Os filhos carregam informações genéticas passadas de geração em geração” Aluno do 1º ano da Escola em São Paulo. Algumas respostas obtidas por alunos da LEC demonstram equívocos na assimilação do conhecimento sobre transmissão gênica: “De acordo com a ciência, os filhos quase sempre herdam genes dos pais” “Eu descordo [sic] nem sempre os filhos são espelho dos pais a genética nem sempre é correta” As falhas demonstram um conhecimento científico que não foi completamente incorporado, sem transformar os conhecimentos anteriores. O conhecimento com o qual os alunos chegam à sala de aula é que nem sempre os filhos se parecem com os pais, observação resultante da vivência cotidiana deles. Ocorre que os conhecimentos científicos abordados em sala de aula sobre transmissão de genes não respondem a esta observação, pois não levam em consideração o conceito prévio formulado pelos alunos. Desta forma, mesmo depois de concluírem o Ensino Médio carregam consigo informações mal estabelecidas e permeadas de dúvidas. A segunda pergunta do questionário - “Explique com suas palavras, o que é DNA?” objetivou perceber o que os alunos entendem por DNA. Algumas das respostas demonstraram concepções vagas e superficiais como: O DNA “É uma genética” Aluna do 3º ano do CIEP Outras respostas definem o DNA como uma exclusiva ferramenta para uso humano, em testes de paternidade, ou identificação de cadáveres: “É uma máquina que ajuda a encontrar seus filhos, etc.” Aluno do 2º ano do CIEP Na maior parte das respostas obtidas observaram-se formulações associadas à vivência e observação diária, sem, no entanto, associar-se ao conhecimento escolar. Isso fica evidente, quando o DNA caracterizado como uma “máquina” associada aos testes de paternidade, demonstrando a real compreensão do tema. VI Encontro Regional de Ensino de Biologia da Regional 2 RJ/ES CEFET/RJ, 2012 No entanto, algumas respostas ligadas ao conhecimento científico foram observadas, quando os alunos demonstram compreender o DNA como um código que transmite as características gênicas de geração a geração. Ou quando citam o DNA como instrumento formador dos seres vivos: “DNA é o que nos forma” Aluna do 2º ano do CIEP “DNA é a nossa carga genética que passamos para nossos filhos” Aluno do 2º ano do CIEP A terceira questão teve o objetivo de verificar em quais elementos naturais ou não os alunos visualizam a existência de DNA, verificou que 33% dos alunos exemplificaram os animais como elementos que contém DNA. Plantas, bactérias, vírus e tecidos humanos também foram levantados pelos alunos. Verificou-se que todos os elementos citados constituíam-se de exemplos de seres vivos. No entanto, um dos problemas encontrados é a fragmentação, não de ensino de Genética, mas no ensino de Seres Vivos onde, por exemplo, o DNA pode ser encontrado “em qualquer parte do corpo de um ser vivente, quer seja animal ou vegetal”. Ou quando o homem é citado como um ser à parte do Reino Animal, como: o DNA é encontrado no“corpo humano, cabelo, animal”. A quarta questão - Onde podemos encontrar o DNA? - possuiu o objetivo de avaliar se os alunos entendem o DNA como parte que compõe nosso organismo, estando presente em nossas células. Somente 3 alunos, um da escola em São José dos Campos e dois do CIEP 155, responderam que o DNA encontra-se no núcleo celular, o que representa 5% do total de respostas. O corpo humano, em geral, ou partes do corpo eram apontados, na maioria das respostas, como o local onde se encontra DNA. Percebe-se que a concepção dos alunos é do DNA pertencente ao organismo, porém sem conhecimento do local específico em que se encontra neste. Contudo, percebe-se ainda uma visão popularmente difundida de DNA como “objeto” de uso do ser humano e que, portanto, pode ser encontrado em hospitais, como na resposta abaixo: “No hospital ou na clínica particular” Aluna do 3º ano do CIEP Uma resposta frequente entre os alunos foi a presença de DNA no sangue dos seres vivos: “No sangue dos seres vivos” Aluno do 2º ano do CIEP Nota-se que o discente sabe que DNA se encontra em todos os seres vivos, entretanto limita a distribuição ao sangue. Essa pode ser mais um conhecimento popular adquirido com a divulgação do DNA como parte do reconhecimento de paternidade. Transmite-se a VI Encontro Regional de Ensino de Biologia da Regional 2 RJ/ES CEFET/RJ, 2012 informação de que o teste de DNA é realizado através do sangue, logo, seria somente neste local onde se encontra o material genético. A questão 6 - Para que serve o DNA? - teve como objetivo observar como os alunos compreendem qual a função da molécula de DNA. Das respostas, 19% dos alunos não souberam ou não responderam. A maior parte dos alunos (52 %) relacionou o DNA às questões de identificação de doenças, parentesco e compatibilidade de órgãos e tecidos. As respostas deixam clara a influência das informações veiculadas pela mídia. E o uso biotecnológico desta molécula para resolver questões humanas: “Paternidade, clonagem, genética, etc.” Aluno do 2º ano do CIEP “Para saber se o filho tem a mesma genética do pai” Aluno do 2º ano do CIEP “Para identificar se o sangue é compatível com a outra” Aluna do 2º ano do CIEP “Para a descoberta da verdade” Aluno do 3º ano do CIEP Apenas 31% das respostas associou a função do DNA às atividades biológicas, como herança hereditária, expressão gênica, controle de algumas das funções fisiológicas da célula: ou que o DNA contém informações para síntese de proteínas da celular: “Serve para definir tipos de seres” Aluno do LEC “Para mostrar nossas características, como cor dos olhos, cor da pele, autura [sic], etc.” Aluno do 2º ano do CIEP A sétima questão - De onde vem o DNA que uma pessoa possui? - tem como objetivo verificar se os alunos percebem o DNA da prole como resultado da fusão dos núcleos do ovócito e do espermatozóide durante a fecundação e, portanto, como o processo responsável pela transmissão do DNA parental a cada nova geração. Das respostas analisadas, 18% dos alunos não responderam ou não souberam responder a questão. Dos entrevistados 36% associaram aos pais, à hereditariadade, às células germinativas ou ao sêmen, a origem da material genético de seus descendentes. “De seus pais” Aluno do 3º ano do CIEP “Meus antepassados, pai, mãe, avós, etc.” Aluna do LEC No entanto, 20% dos alunos associaram o sangue como elemento de origem do DNA da prole. Isto pode ser explicado pelo fato da maioria dos testes de DNA noticiados nos meios de comunicação ser realizado através do sangue e, por isto a associação dos alunos. Algumas respostas vagas e imprecisas como as abaixo demonstram uma compreensão superficial e deficitária não só de Genética, mas também em Citologia: “Vem das células que ela possui no seu corpo” Aluna da LEC “De seus descendentes” Aluno do CIEP VI Encontro Regional de Ensino de Biologia da Regional 2 RJ/ES CEFET/RJ, 2012 A última questão teve o objetivo de perceber como os alunos se apropriam visualmente do tema através do esboço de um fragmento de DNA. Um número relevante de alunos (34%) não realizou a atividade, e grande parte do grupo (45% dos alunos) representou o DNA como a típica dupla hélice. Alguns poucos representaram a célula com o DNA contido em seu interior, em seu núcleo. Um fato interessante de se observar é que 58% dos alunos representaram o DNA de alguma forma, no entanto quando questionados se já haviam visto o DNA apenas 25% afirmaram já ter visto um fragmento de DNA. Esta divergência pode ser compreendida se pensarmos que desenhos e esquemas podem não ser vistos como uma real representação do objeto. E apenas fotografias, fossem associadas à visão da própria coisa, como se diante da imagem estivéssemos diante da realidade do objeto e do fenômeno. Assim, quando olhamos fotografias de planetas e células, por exemplo, não encaramos desenhos, fruto da subjetividade humana, mas “vemos” um objeto “realístico” (SILVA et al., 2004). Considerações Finais Durante a análise dos questionários percebemos a influência dos conhecimentos preliminares, especialmente os veiculados pela mídia, na internalização do aprendizado de Genética. Por isto, enfatizamos a importância do levantamento das concepções prévias dos alunos para a construção de novos conhecimentos. Sendo este o ponto de partida para a elaboração das aulas que terão por base temas que os alunos já possuem conceitos e formulações próprias. Todavia, é necessário lembrar que, parte dos discentes avaliados encontra-se em séries/anos onde o conteúdo de Genética já foi abordado, ao menos em parte. Sendo assim, percebe-se que o aprendizado demonstrado pelos alunos ainda é carregado de conhecimentos populares, sem internalização do conhecimento científico. Considerando-se que conhecimentos populares não foram considerados pelos professores, reforça-se que o ensino ao se basear nas concepções prévias é capaz de gerar uma aprendizagem significativa. Sendo, portanto, necessária a utilização dessa metodologia no processo de ensino-aprendizagem de modo a gerar resultados satisfatórios não somente no ensino de Genética, mas também nas demais áreas do conhecimento. VI Encontro Regional de Ensino de Biologia da Regional 2 RJ/ES CEFET/RJ, 2012 Referências Bibliográficas BIZZO, N. Conhecimento: Científico e Cotidiano. In: ______. Ciências: fácil ou difícil? São Paulo: Ed. Biruta, 2009. cap. 1. BRASIL. Ministério da Educação (MEC), Secretaria de Educação Média e Tecnológica (Semtec). PCN + Ensino médio: orientações educacionais complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais – Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias. Brasília: MEC/Semtec, 2002. _____. Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. Concurso de acesso ao Curso de Licenciatura em Educação do Campo 2010 da UFRRJ. Seropédica, 2010. Disponível em: <http://www.ufrrj.br/concursos/edital45_2010.pdf>. Acesso em: 05 dez. 2011. CARRAHER, D. W.; CARRAHER, T. N. & SCHLIEMANN, A. D. Caminhos e descaminhos no ensino de Ciências. Ciência e Cultura, v. 37, n. 6, 1985. Disponível em: <http://www.ufpa.br/eduquim/caminhos_e_descaminhos_no_ensino.htm>. Acesso em: 30 jul. 2011. GOLDBACH, T.; SARDINHA, R.; DYZARS, F. & FONSECA, M. Problemas e desafios para o ensino de genética e temas afins no ensino médio: dos levantamentos aos resultados de um grupo focal. Encontro Nacional de Pesquisa em Educação em Ciências. 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Por que os filhos se parecem com os pais? ___________________________________________________________________________ 2. Explique com suas palavras, o que é DNA? ___________________________________________________________________________ 3. Cite cinco coisas que existem no mundo que você acha que tem DNA: ___________________________________________________________________________ 4. Onde podemos encontrar o DNA? ___________________________________________________________________________ 5. Você já viu um DNA? ( ) Sim ( ) Não 6. Para que serve o DNA? ___________________________________________________________________________ 7. De onde vem o DNA que uma pessoa possui? ___________________________________________________________________________ 8. Desenhe um fragmento de DNA: