Segunda-feira, 12 de dezembro de 2016 / Jornal do Comércio Empresários temem novo patamar alcançado pela China na OMC Thiago Copetti Estipular qualquer tipo de barreira protetiva conta o ingresso de produtos chineses será uma tarefa mais difícil a partir de hoje. Isso porque a China alcançou hoje, 12 de dezembro, em um novo patamar na Organização Mundial do Comércio (OMC). Tornou-se uma economia de mercado, mas não sem protestos de diferentes partes do mundo. Alguns ainda sutis, outros mais duros. O tema causa temor entre empresários brasileiros e o fato é dado como certo (já que faz parte de um acordo assinado pelos países membros da OMC e a China, em 11 de dezembro de 2001). A ira dos empresários e governos é devido ao que alegam ser as estatísticas oficiais chinesas manipuladas e com o sistema produtivo excessivamente estimulado pelo governo do país. E são esses dados que serão usados pela OMC, a partir de agora, para julgar processos antidumping. O dumping ocorre quando o preço de determinado produto ingressa em um país abaixo do preço de custo do similar nacional por consequência de intervenções do Estado chinês na economia, pondo em risco indústrias do país importador. Nos últimos 15 anos, para tentar barrar os produtos chineses em seus territórios os países podiam utilizar os preços dos produtos de uma terceira nação para mostrar que a China estaria praticando dumping nas suas exportações e praticando preços muito baixos. Com a mudança de patamar da China para economia de mercado, só serão aceitos dados chineses. De longe, garantem especialistas, a China é o país líder a responder na OMC por acusações de dumping. Conforme dados do Observatório de Defesa Comercial da Confederação Nacional da Indústria (CNI), em relatório sobre o tema, das 358 medidas antidumping aplicadas pelo Brasil desde 1988, 106 foram contra exportações chinesas (30%). De acordo com o com o diretor da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), Thomaz Zanotto, que estuda a questão há dois anos, a mudança pode afetar significativamente o Brasil, especialmente em um ano de desaceleração econômica. "Já movemos processos antidumping contra a China, por exemplo, nas importações de escovas de cabelo, óculos e calçados. Ainda há algumas dúvidas, aqui e em outros países, sobre como as coisas vão andar. É dia a dia que vai nos mostrar o caminho, até porque existe algumas margens para interpretação do artigo 15 do acordo firmado em 2001", afirma Zanotto. O governo brasileiro, no momento, mantém silêncio sobre o assunto, mas Zanotto recorda que, em 2004, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou ao então presidente da China, Hu Jintao, que o Brasil já a reconhecia como economia de mercado. "Foi erro grave, uma precipitação desnecessária. Lula era presidente há pouco tempo e certamente não entendeu o que estava dizendo ou foi muito mal orientado sobre o assunto", critica o executivo. www.funcex.org.br [email protected] Tel.: (55.21) 2509.7000, 2509-2662 Página: 1/3 O que caracteriza uma economia de mercado No Brasil, a Circular Secex no 59/2001 estabeleceu os critérios que devem ser observados para avaliar a existência de condições de economia de mercado: 1 Grau de controle governamental sobre as empresas ou sobre os meios de produção. 2 Nível de controle estatal sobre a alocação de recursos, sobre preços e decisões de produção de empresas. 3 Legislação aplicável em matéria de propriedade, investimento, tributação e falência. 4 Grau em que os salários são determinados livremente em negociações entre empregadores e empregados. 5 Grau em que persistem distorções herdadas do sistema de economia centralizada relativas a, entre outros aspectos, amortização dos ativos, outras deduções do ativo, trocas diretas de bens e pagamentos sob a forma de compensação de dívidas. 6 Nível de interferência estatal sobre operações de câmbio. Legislação pode proteger empresas brasileiras, diz especialista O advogado tributarista Claudio Tessari tem uma visão mais tranquila sobre o impacto que a China como economia de mercado terá para o Brasil. Tessari é autor do livro A defesa nas medidas antidumping por meio do interesse público no Brasil, no Canadá e na União Europeia. Ele explica que o Brasil é um dos poucos países a contar com um item em sua legislação que facilita proteger suas empresas. O advogado diz que um governo só pode impor barreiras à China se provar que ela está vendendo para o mercado externo com preço menor do que produz no seu mercado interno (dumping), com danos à indústria do importador em decorrência dessa relação comercial. A OMC, porém, permite que os países adotem um quarto item de defesa, contanto que previsto em sua legislação: o do interesse público. Esse argumento pode servir tanto para tentar barrar importações como liberá-las. "O setor de magnésio, que é utilizado para dar mais resistência ao aço usado na fabricação de motosserras, é um exemplo. Importar magnésio da China custa um valor, hipoteticamente, de cinco unidades, e extrair no Brasil, 10. Mas a extração de magnésio, também apenas como exemplo, emprega 800 pessoas. O setor de máquinas 10 mil. Qual do setores é mais importante proteger? Neste caso, as empresas de extração podem tentar barrar o produto chinês, e o governo do Brasil vai usar o argumento do interesse público para liberar", explica o advogado. Mas essa possibilidade não quer dizer que o Brasil esteja totalmente protegido da mudança nas regras. Os processos antidumping em que as ações brasileiras foram vitoriosas poderão ser revertidas pela China, avalia Tessari, com alguns produtos chineses recuperando espaço. A China pode pedir na OMC a revisão dos processos após cinco anos de vigência. Estimativas da CNI, a partir de dados da Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior (Funcex), é que o País pode perder cerca de 60 mil empregos em um ano. www.funcex.org.br [email protected] Tel.: (55.21) 2509.7000, 2509-2662 Página: 2/3 China é mercado bom para muitas empresas e países O professor de Relações Internacionais da USP, Paulo Feldmann, não acredita em reações contrárias dos outros países ao ingresso da China no grupo de economia de mercado da OMC. Jornal do Comércio - Como o senhor avalia esse avanço da China na OMC? Paulo Feldmann - O mundo do comércio exterior é muito pragmático, e a China é um mercado muito bom para produtos americanos e para muitas empresas, ela praticando ou não aspectos de economia de mercado. Acho que isso não interessa. Quando se fez o acordo, há 15 anos, a expectativa, na realidade, era de que a China se democratizasse, o que não ocorreu. O mundo achava que para ser uma economia de mercado a China obrigatoriamente se tornaria uma democracia. A China provou que essa premissa não era verdadeira. JC - O senhor acredita, então, que não haverá reação maior de outros países, como os EUA? Donald Trump, por exemplo, já disse que colocará barreiras tarifárias. Feldmann - O que os países vão fazer? Colocar a China para fora, agora? Não creio. Pode ocorrer de que um ou outro país venha a impor certa dificuldade, como os Estados Unidos, por exemplo, o que é uma completa hipocrisia. Se o fizer, Trump provocará um levante mundial contra ele. Isso porque o norte-americano tem muitos benefícios dados para suas empresas americanas. A própria Apple é um grande exemplo de empresa que foi extremamente apoiada. Outro exemplo, é da própria agricultura, que tem subsídios americanos que muito prejudica o Brasil, por sinal. E nem o Brasil escapa, por nós mesmos sofremos há pouco uma retaliação da OMC. Fonte: http://jcrs.uol.com.br/_conteudo/2016/12/economia/536139-empresarios-tememnovo-patamar-alcancado-pela-china-na-omc.html www.funcex.org.br [email protected] Tel.: (55.21) 2509.7000, 2509-2662 Página: 3/3