Recomendações da Câmara Técnica Nacional de Medicina Baseada em Evidências do Sistema Unimed Ácido Zoledrônico no tratamento da Osteoporose 1 Recomendações da Câmara Técnica Nacional de Medicina Baseada em Evidências do Sistema Unimed I – Elaboração Final: 03/08/2007 II – Autores: Dr Alexandre Pagnoncelli∗, Dr Carlos Augusto Cardim de Oliveira*, Dra Claudia Regina de O. Cantanheda*, Dra Izabel Cristina Alves Mendonça*, Dr Jurimar Alonso*, Dr Luiz Henrique P. Furlan*, Dra Silvana M Bruschi Kelles*, Dr Valfredo da Mota Menezes*. Declaração de isenção de conflito de Interesses Os membros da Câmara Nacional de Medicina Baseada em Evidências declaram que não mantêm nenhum vínculo empregatício, comercial ou empresarial, ou ainda qualquer outro interesse financeiro com a indústria farmacêutica ou de insumos para área médica. Todos os membros da Câmara Nacional de Medicina Baseada em Evidências trabalham para o Sistema Unimed. III – Previsão de Revisão: ___ / ___ / _____ IV – Tema: Tratamento da osteoporose V – Especialidade Envolvida: Endocrinologia, Reumatologia, Geriatria, Ginecologia e Ortopedia. VI – Questão Clínica: Em mulheres pós-menopáusicas com osteoporose, o tratamento com ácido zoledrônico aumenta a densidade óssea, diminuindo a incidência de fraturas ósseas? Aumenta a aderência ao tratamento? VII – Enfoque: Terapêutica * Membro da CTNMBE 2 Recomendações da Câmara Técnica Nacional de Medicina Baseada em Evidências do Sistema Unimed VIII – Introdução: A partir da quarta e quinta décadas, relacionado principalmente com a diminuição dos estrógenos e facilitados pela diminuição da atividade física, deficiência em vitamina D e hiper paratireoidismo secundário, ocorre aumento da atividade osteoclástica (reabsorção) e diminuição da atividade osteoblástica (formação) resultando em redução da massa óssea. Essa redução provoca alterações da micro-arquitetura do osso levando ao enfraquecimento e facilitando o surgimento de fraturas. Isto é a osteoporose. Na maioria das vezes só é descoberta devido a fraturas (vértebras, bacia, etc.) causadas por pequeno trauma. A recomendação terapêutica em mulheres na pós-menopausa é feita para aquelas que apresentam: a) fratura de vértebra devido à diminuição da densidade óssea; b) densidade óssea consistente com osteoporose, com T-score de -2,5 ou menor ou c) densidade com T-score entre -2,0 a -2,5 com pelo menos um dos seguintes fatores: baixo índice de massa corpórea, história de fratura por fragilidade óssea desde o inicio da menopausa e história de fratura de bacia em um dos pais. Muitos são os fármacos usados no tratamento da osteoporose ou de seus sintomas, mas, atualmente, as drogas consideradas de primeira linha são os bifosfonatos. Essas drogas surgiram como uma opção terapêutica para prevenção de complicações ósseas devido a metástases de variados tumores e, nos últimos anos, começam também a ser usados no tratamento de alterações ósseas devido a osteoporose. O bifosfonato liga-se ao tecido ósseo, principalmente nos locais de maior metabolismo, e inibe a atividade e a sobrevida do osteoclasto, inibindo,diminuindo, dessa maneira, a reabsorção óssea1. Dentre esses, os mais usados, inclui são o Alendronato com posologia em dose diária de10 mg ou dose semanal de 70 mg e o Risedronato em dose diária de 5 mg ou dose semanal de 35 mg2,3. Porém, um dos grandes problemas da terapêutica medicamentosa na osteoporose é a falta de aderência ao tratamento, devido, principalmente, ao alto custo da medicação, efeitos adversos e multidrogas. Pacientes pouco aderentes à 3 Recomendações da Câmara Técnica Nacional de Medicina Baseada em Evidências do Sistema Unimed medicação apresentam pouca melhora na densidade óssea, assim como maior número de fraturas quando comparados com aqueles que são aderentes4,5. Por esses motivos, novas formulações terapêuticas buscam aumentar a aderência ao facilitar a posologia ou a via de administração. Dentre essas novas formulações estão: 1. Denosumab, um anticorpo monoclonal, que inibe a ação do RANKL(Ativador do receptor do fator nuclear KappaB ligand). Esse receptor é fundamental para a diferenciação, a ativação e a sobrevida do osteoclasto. Ensaio clínico em desenvolvimento vem demonstrando que, com apenas duas injeções sub-cutâneas por ano,de 6 em 6 meses, ocorreram aumento na densidade óssea6 2. Os bifosfonatos, Ibandronato oral, em dose única mensal 7, o Ibandronato intra venoso, com injeção de 3/3 meses 8 e o Ácido zoledrônico, um bifosfonato injetável em uma dose única anual 9. Todos esses ensaios procuram demonstrar, não apenas melhora na densidade óssea, mas também maior aderência à medicação. IX – Metodologia: • Fonte de dados: PubMed, Cochrane library, CADTH, Busca manual de referências. • Palavras-chaves: zoledronic acid and randomized, osteoporosis, #1 AND #2, zoledronic acid AND systematic review. • Desenhos dos estudos buscados: Ensaio clínico randomizado e/ou Revisão sistemática. • Período pesquisado: 7 anos. • População incluída e excluída: Mulheres pós-menopáusicas com osteoporose, isto é, com densidade óssea de -2,5 ou menos ou, ainda, com densidade óssea menor que -2 e com história de fratura óssea por 4 Recomendações da Câmara Técnica Nacional de Medicina Baseada em Evidências do Sistema Unimed fragilidade óssea desde o início da menopausa ou história de fratura de bacia em um dos pais. • Resultados da busca bibliográfica: Revisão Sistemática e/ou ensaio clínico randomizado, duplo cego, avaliando o uso do ácido zoledrônico no tratamento da osteoporose, comparando-o com qualquer outra medicação ou com placebo. O grau de recomendação tem como objetivos dar transparência às informações, estimular a busca de evidência científica de maior força e auxiliar a avaliação crítica do leitor, o responsável na tomada de decisão junto ao paciente. Nível de Evidência Científica por Tipo de Estudo - “Oxford Centre for 14 Evidence-based Medicine” - última atualização maio de 2001 Grau de Nível de Tratamento/ Recomendação Evidência Prevenção – Etiologia Diagnóstico Revisão Sistemática (com 1A Revisão Sistemática (com homogeneidade) homogeneidade) de Ensaios Clínicos Controlados e de Estudos Diagnósticos nível 1 Critério Randomizados Diagnóstico de estudos nível 1B, em diferentes centros clínicos A 1B 1C 2A Ensaio Clínico Controlado e Randomizado com Intervalo de Confiança Estreito Coorte validada, com bom padrão de referência Critério Diagnóstico testado em um único centro clínico Resultados Terapêuticos do tipo “tudo ou Sensibilidade e Especificidade nada” próximas de 100% Revisão Sistemática (com homogeneidade) de Estudos de Coorte Revisão Sistemática (com homogeneidade) de estudos diagnósticos de nível > 2 Coorte Exploratória com bom padrão de B 2B Estudo de Coorte (incluindo Ensaio Clínico Randomizado de Menor Qualidade) Referência Critério Diagnóstico derivado ou validado em amostras fragmentadas ou banco de dados Observação de Resultados Terapêuticos 2C (outcomes research) Estudo Ecológico 5 Recomendações da Câmara Técnica Nacional de Medicina Baseada em Evidências do Sistema Unimed Revisão Sistemática (com homogeneidade) 3A de Estudos Caso-Controle Revisão Sistemática (com homogeneidade) de estudos diagnósticos de nível > 3B Seleção não consecutiva de casos, ou 3B Estudo Caso-Controle padrão de referência aplicado de forma pouco consistente C D 4 Relato de Casos (incluindo Coorte ou Estudo caso-controle; ou padrão de Caso-Controle de menor qualidade) referência pobre ou não independente Opinião desprovida de avaliação crítica ou baseada em matérias básicas (estudo 5 fisiológico ou estudo com animais) X – Principais estudos encontrados: a) Reid IR, Brown JP, Burckhardt PB, Horowitz Z, Richardson P et al. Intravenous Zoledronic acid in posmenopausal women with low bone mineral density. N Engl J Med 2002;346(9):653-61 b) Black DM; Delmas PD.; Eastell R; Reid IR; Boonen S; et al. Once-Yearly Zoledronic Acid for Treatment of Posmenopausal Osteoporosis. N Engl J Med 2007;356(18):1809-22 c) McClung R; Recker R; Miller P; Fiske D; Minkoff J; et al. Intravenous zoledronic acid 5mg in the treatment of posmenopausal women with low bone density previously treated with alendronate. Bone 2007;41:122-28 d) Devogelaer JP, Brown JP, Burckhardt P, Meunier JP, Goemaere S et al. Zoledronic acid efficcy and safety over five years in posmenopausal osteoporosis. Osteoporos Int 2007 may22[epub ahead of print] Abstract Estudos não incluídos: 1. Reid IR, Brown JP, Burckhardt PB, Horowitz Z, Richardson P et al. Intravenous Zoledronic acid in posmenopausal women with low bone mineral density. N Engl J Med 2002;346(9):653-61 6 Recomendações da Câmara Técnica Nacional de Medicina Baseada em Evidências do Sistema Unimed 2. McClung M; Recker R; Miller P; Fiske D; Minkoff J; et al. Intravenous zoledronic acid 5mg in the treatment of posmenopausal women with low bone density previously treated with alendronate. Bone 2007;41:122-28 3. Devogelaer JP, Brown JP, Burckhardt P, Meunier JP, Goemaere S, et al. Zoledronic acid efficcy and safety over five years in posmenopausal osteoporosis. Osteoporos Int 2007 may22[epub ahead of print] Abstract Estudo Incluído: Black Deninis M; Delmas Pierre D.; Eastell Richard; Reid Ian R; boonen Steven; et al. Once-Yearly Zoledronic Acid for Treatment of Posmenopausal Osteoporosis. N Engl J Med 2007;356(18):1809-22 Com o objetivo de avaliar se uma infusão anual de 5mg de ácido zoledrônico reduz o risco de fratura vertebral, fratura de bacia e outros tipos de fraturas, esse ensaio clínico, randomizado, duplo cego, usando o placebo como controle, incluiu 7765 mulheres com idade entre 65 e 89 anos com osteoporose comprovada pela densidade óssea do colo do fêmur de T score de -2,5 ou menor, com ou sem evidências de fratura vertebral, ou T score de -1,5 ou menor com evidências radiológicas de, no mínimo, duas fraturas vertebrais médias ou uma fratura moderada. As pacientes foram estratificadas em dois grupos, um grupo no qual era permitido o uso de alguma medicação para osteoporose tais como: ”raloxifeno, calcitonina, tibolona, tamoxifen, dehidro-epiandrosterona, iprivalone, medroxiprogesterona e terapia hormonal” (estrato 2) e outro no qual nenhuma medicação era permitida, além da do estudo (estrato 1). Foram excluídas as mulheres que previamente usaram hormônios de paratireoide, esteróides anabolizantes, hormônio de crescimento, corticóide injetável ou estrôncio renalate; mulheres com calcemia acima de 2,75 mmol/l ou abaixo de 2,00mmol/l, assim como aquelas com clearence de creatinina menor que 30,0 ml/min. O principal desfecho analisado foi nova fratura vertebral (estrato 1) e fratura de bacia em ambos os estratos. Desfechos secundários incluíam: alguma fratura não vertebral, ou alguma fratura clínica ou fratura vertebral clínica (sintomática); 7 Recomendações da Câmara Técnica Nacional de Medicina Baseada em Evidências do Sistema Unimed mudança na densidade óssea da bacia, colo do fêmur e espinha lombar, assim como modificações nos marcadores sorológicos de reabsorção óssea e efeitos adversos. A amostra tinha poder de 90% para detectar uma redução de 50% de fratura vertebral no grupo do ácido e toda análise foi realizada por “Intenção de tratar” (ITT), porém analisando apenas as fraturas vertebrais nas mulheres que não usaram qualquer outro tratamento no início do estudo (estrato 1) Os grupos receberam três infusões intravenosas, durante 15 minutos, de 5mg de ácido Zoledrônico (n=3889) ou placebo (n=3876) anualmente: no início do estudo, aos 12 meses e aos 24 meses e foram acompanhadas durante 36 meses. Após três anos, a incidência de fraturas vertebrais no grupo placebo foi de 10,9%, enquanto no grupo do ácido foi de apenas 3,3% (RR de 0,30; 95% CI, 0,24 a 0,38). No grupo do ácido ocorreu também redução (1,4%) na incidência de fratura de bacia quando comparado com o grupo placebo (2,5%). Fraturas não vertebrais (25%), qualquer fratura clínica (33%) e fratura vertebral clínica (77%), todas foram reduzidas no grupo do ácido quando comparado ao placebo. O grupo do ácido apresentou também significativo aumento na densidade óssea da bacia (6%), coluna lombar (6,7%) e colo do fêmur (5,1%) em comparação ao placebo. Eventos adversos ocorreram em maior proporção no grupo do ácido (95,5% vs. 93,9%), entre eles: aumento da creatinina (1,2% vs.0,4%), arritmia (6,9% vs. 5,3%) e, nas arritmias, fibrilação atrial (1,3% vs. 0,5%). No grupo do ácido zoledrônico ocorreram também aumento da incidência de febre, mialgia, sintomas gripais, cefaléia e artralgia. Uma paciente em cada grupo desenvolveu necrose de mandíbula. Comentário: Esse estudo, financiado pelo fabricante, comprovou sua hipótese de que uma única dose anual de 5mg intravenosa de ácido zoledrônico diminui a incidência de fraturas em mulheres pós-menopáusicas com osteoporose, aumenta a densidade óssea e diminui os níveis sorológicos de marcadores de reabsorção óssea. Demonstrou, também, que o uso do ácido está associado com aumento na incidência de fibrilação atrial, aumento da creatinina no soro, hipocalcemia, assim como de sintomas gerais como febre, mialgia, artralgia etc. 8 Recomendações da Câmara Técnica Nacional de Medicina Baseada em Evidências do Sistema Unimed XI – Discussão: O estudo de Black DM et al comprova que o ácido zoledrônico em dose única anual melhora os parâmetros ósseos relacionados com a osteoporose em mulheres pós-menopáusicas, mas, como todos os outros estudos, não incluídos ou referidos, utiliza o placebo como comparação, perdendo uma ótima oportunidade de fazer a comparação com outras drogas que também já comprovaram ação benéfica sobre esses mesmos parâmetros ósseos2,3,6,7,8, permanecendo a dúvida sobre qual delas é a melhor e dessas qual a mais efetiva. Por outro lado, uma das propostas, não explicitadas como desfecho, era a de analisar a aderência do uso anual ao ácido, porém, também nesse aspecto, sem uma comparação com outras drogas com posologias facilitadoras por intervalos maiores, como semanal (alendronato e risedronato), mensal (Ibandronato oral) ou trimestral (Ibandronato intravenoso), ou o bianual (Denosumabe sub cutâneo), ainda não aprovado, mas em fase final de estudos, permanecendo ainda a dúvida sobre a diferença, ou não, de aderência por qualquer delas. Outro aspecto que pode influenciar na aderência é o fato de o uso do ácido ser feito por infusão intravenosa com duração de cerca de 15 minutos, necessitando suporte hospitalar, enquanto tanto no Ibandronato intravenoso quanto no Denosumabe sub-cutâneo a injeção não demora 30 segundos e, ambos, sem as complicações imediatas que ocorrem com o ácido tais com febre, artralgia etc. Além disso também, todo o suporte hospitalar necessário para o acompanhamento dos pacientes em relação à possibilidade de aumento da creatinina e/ou necrose tubular 10, assim como de possível hipocalcemia9,11 poderão diminuir a aderência a essa droga ao aumentar seu custo. Outra complicação grave relatada com o uso, não só do ácido zoledrônico, mas com os bifosfonatos, é a necrose de mandíbula, que ocorre principalmente em pacientes que usam o bifosfonatos em tratamento de câncer com repercussão óssea 12,13. XII – Conclusões da Revisão: 9 Recomendações da Câmara Técnica Nacional de Medicina Baseada em Evidências do Sistema Unimed • O ácido zoledrônico, em dose única anual de 5mg, diminui a incidência de fraturas e aumenta a densidade óssea em mulheres pósmenopáusicas com osteoporose, quando comparado com placebo. • Complicações, tais como: fibrilação atrial, necrose tubular e necrose de mandíbula, causam preocupação e podem aumentar o custo da medicação. • Embora uma única infusão anual seja uma ótima opção para a aderência ao tratamento, alguns estudos mostraram que outras opções existentes apresentam, provavelmente, os mesmos efeitos benéficos sobre o metabolismo ósseo e, possivelmente também, boa aderência ao tratamento, aspectos sobre os quais só saberemos quando forem realizados os necessários ensaios clínicos comparando as diferentes drogas e as diferentes posologias. XIV – Recomendação final: Considerando a existência no mercado de drogas com efeitos similares às do ácido zoledrônico e com posologias e intervalos de medicação facilitadores de aderência e, por considerar que a utilização dessa nova medicação será feita principalmente em pacientes idosas e, considerando ainda os aspectos relativos aos seus efeitos adversos, concernentes ao sistema renal e cardíaco, a Consultoria de Medicina Baseada em Evidências, embora reconheça os aspectos promissores do novo medicamento, recomenda a sua não incorporação até que novos estudos sejam divulgados garantindo a sua segurança. XV – Bibliografia: 1. Fleisch H. Development of bisphosphonates. Breast Cancer Res 2002;4:30-34. 2. Black D, Cummings S, Karpf D, Cauley JA, Thompson DF, Nevitt MC, et al. Randomized 10 Recomendações da Câmara Técnica Nacional de Medicina Baseada em Evidências do Sistema Unimed trial of effect of alendronate on risk of fracture in women with existing vertebral fractures. 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