Dissertação de Mestrado APLICABILIDADE DE ESCORES DE RISCO EM PACIENTES SUBMETIDOS A CIRURGIA CARDÍACA NO INSTITUTO DE CARDIOLOGIA DO RIO GRANDE DO SUL Silvia Bueno Garofallo INSTITUTO DE CARDIOLOGIA DO RIO GRANDE DO SUL FUNDAÇÃO UNIVERSITÁRIA DE CARDIOLOGIA Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde Área de Concentração: Cardiologia Dissertação de Mestrado APLICABILIDADE DE ESCORES DE RISCO EM PACIENTES SUBMETIDOS A CIRURGIA CARDÍACA NO INSTITUTO DE CARDIOLOGIA DO RIO GRANDE DO SUL Autora: Silvia Bueno Garofallo Orientadora: Dra. Vera Lúcia Portal Dissertação submetida como requisito para obtenção do grau de Mestre ao Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde, Área de Concentração: Cardiologia, da Fundação Universitária de Cardiologia / Instituto de Cardiologia do Rio Grande do Sul. Porto Alegre 2011 AGRADECIMENTOS Primeiramente gostaria de agradecer à minha família: a meus pais, Nicola e Jacira, à minha irmã Cristina e à minha avó Olga, pela profunda ligação entre nossas vidas. Ao meu amor, Daniel, pela presença constante, carinhosa e paciente. Aos meus colegas de residência e pós-graduação, Dra. Agda Mezzomo e Dr. Daniel Rios Pinto Ribeiro, pela amizade. Ao Instituto de Cardiologia do Rio Grande do Sul/ Fundação Universitária de Cardiologia, em especial à Secretária da Cirurgia e ao Serviço de Arquivos Médicos e a todos seus funcionários. Aos meus colaboradores na coleta e digitação dos dados, o bolsista Daniel Pinheiro Machado, o estagiário da Iniciação Científica Odemir Bordim Junior e à residente de enfermagem Clarissa Garcia. À estatística Vânia Hirakata, pelo papel fundamental na análise dos dados. À professora Maria do Horto pela competência e pelo carinho com que revisou este trabalho. E não tenho palavras para agradecer à Dra. Vera Lúcia Portal, orientadora excepcional, sempre presente na elaboração e execução deste projeto. Minha evolução como pesquisadora e profissional está diretamente ligada a essa grande médica. SUMÁRIO LISTA DE ABREVIATURAS LISTA DE TABELAS LISTA DE FIGURAS BASE TEÓRICA 2 1 INTRODUÇÃO 2 2 REFERENCIAL TEÓRICO 3 2.1 CIRURGIA CARDÍACA 3 2.1.1 Histórico 3 2.1.2 Cirurgia Cardíaca no Brasil 8 2.2 ESTRATIFICAÇÃO DE RISCO EM CIRURGIA CARDÍACA 12 2.2.1 Escores de risco 12 2.2.2 O EuroSCORE 18 2.2.3 O escore Berstein Parsonnet 2000 24 2.3 DIFERENÇAS ENTRE O EUROSCORE E O Berstein Parsonnet 2000 .31 2.4 VALIDAÇÃO DO EUROSCORE E DO Berstein Parsonnet 2000 EM DIFERENTES POPULAÇÕES 3 OBJETIVOS 33 40 3.1 OBJETIVO PRINCIPAL 40 3.2 OBJETIVO SECUNDÁRIO 40 4 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 41 5 ARTIGO: APLICABILIDADE DOS ESCORES BERSTEIN PARSONNET 2000 E DO EUROSCORE EM CENTRO DE REFERÊNCIA BRASILEIRO 50 RESUMO 52 ABSTRACT 54 INTRODUÇÃO 56 MATERIAIS E MÉTODOS 57 ANÁLISE ESTATÍSTICA 58 CONSIDERAÇÕES ÉTICAS 60 RESULTADOS 60 DISCUSSÃO 62 CONCLUSÕES 65 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 66 TABELAS E FIGURAS 70 6 APÊNDICES 78 6.1 Elaboração de escores de risco 79 6.2 Protocolo de pesquisa 83 LISTA DE ABREVIATURAS ACFA Fibrilação atrial ACTP Angioplastia coronariana transluminal percutânea AVC Acidente vascular cerebral AUC Area Under Curve (área sob a curva ROC) BIAo Balão intra-aórtico CEC Circulação extracorpórea CIV Comunicação interventricular CKMB Creatinofosfoquinase fração MB CRM Cirurgia de revascularização miocárdica DAC Doença arterial coronariana DM Diabetes melito DPOC Doença pulmonar obstrutiva crônica DVP Doença vascular periférica EUA Estados Unidos da América EuroSCORE European System for Cardiac Operation Risk Evaluation FE Fração de ejeção FV Fibrilação ventricular HAS Hipertensão arterial sistêmica IAM Infarto agudo do miocárdio ICC Insuficiência cardíaca congestiva IC/FUC Instituto de Cardiologia do Rio Grande do Sul/ Fundação Universitária de Cardiologia IMC Índice de massa corporal MIH Mortalidade intra-hospitalar MS Morte súbita PSAP Pressão sistólica na artéria pulmonar ROC Receiver Operating Characteristics RS Rio Grande do Sul SCTS Society of Cardiothoracic Surgeons of Great Britain and Ireland STS Society of Thoracic Surgeons TCE Tronco da coronária esquerda TOT Tubo orotraqueal TV Taquicardia ventricular VE-Ao Gradiente ventrículo esquerdo-aorta VE Ventrículo esquerdo LISTA DE TABELAS TABELA 1 Diferentes prevalências entre países europeus quanto a idade, sexo, disfunção ventricular, tipo de cirurgia e mortalidade 6 TABELA 2 Diferenças quanto ao número de cirurgias entre Brasil, Europa e Estados Unidos da América (EUA) 9 TABELA 3 Diferenças entre o número de CRMs isolada realizadas e índice de mortalidade nas cinco regiões brasileiras 10 TABELA 4 Diferenças entre escores de risco 17 TABELA 5 EuroSCORE 19 TABELA 6 Grupos de risco segundo a pontuação do EuroSCORE aditivo e a mortalidade esperada 21 TABELA 7 Diferenças das áreas sob a curva ROC do EuroSCORE entre países europeus 21 TABELA 8 Mortalidade esperada em pacientes de alto risco e muito alto risco segundo o EuroSCORE aditivo e o EuroSCORE logístico 23 TABELA 9 Berstein Parsonnet 2000 26 TABELA 10 Situações especiais 28 TABELA 11 Grupos de risco segundo o escore aditivo do Berstein Parsonnet 2000 30 TABELA12 Comparação dos fatores de risco e escores dos modelos aditivos do EuroSCORE e do Berstein Parsonnet 2000 31 LISTA DE FIGURAS FIGURA 1 Diferenças das proporções do tipo de cirurgia entre os grandes bancos de dados e o DATASUS FIGURA 2 11 Gráfico para cálculo da mortalidade esperada e respectivos intervalos de confiança segundo modelo aditivo do Berstein Parsonnet 2000 29 FIGURA 3 Resultado de revisão sistemática do EuroSCORE aditivo 35 FIGURA 4 Metanálise do EuroSCORE em Cirurgia Valvar 36 2 1 INTRODUÇÃO Um importante elemento na avaliação de pacientes com indicação de cirurgia cardíaca é a possibilidade de predizer a mortalidade e o risco de complicações pós-operatórias intra-hospitalares mediante a análise de fatores de risco. Com a estratificação de risco desses pacientes, pode-se preparar a equipe médica em relação aos pacientes que necessitarão de cuidados mais intensivos no pré, no trans e no pós-operatório. Além disso, possibilita expor os riscos cirúrgicos para o paciente e seus familiares de uma forma mais consistente. Centros de referência em cirurgia cardíaca, através de estudos clínicos, revisaram fatores de risco para morbidade e mortalidade pós-operatória em seus respectivos serviços e montaram modelos de estratificação de risco, denominados escores de risco. Esses escores possuem diferenças entre si devido à adaptação para a realidade de cada um deles, à forma de obtenção de dados e às características dos pacientes. O Instituto de Cardiologia do Rio Grande do Sul/Fundação Universitária de Cardiologia (IC/FUC) é um dos centros de referência da região Sul do país para tratamento de patologias cardíacas complexas, onde se realizam, aproximadamente, 2.000 cirurgias por ano. No entanto, não se dispõe da análise de escores de risco na população submetida a cirurgia cardíaca, na instituição, razão pela qual o presente estudo pretende avaliar a capacidade de dois diferentes escores de risco de predizer mortalidade intra-hospitalar no IC/FUC. 2 REFERENCIAL TEÓRICO 3 2.1 CIRURGIA CARDÍACA 2.1.1 Histórico Nesse novo milênio, observa-se o avanço tecnológico em todos os ramos do conhecimento. Na cardiologia, a abordagem cirúrgica mudou a evolução das enfermidades do coração. A cirurgia cardíaca passou por três fases 1 2 . A primeira, iniciada na década de 1.930, chamada de “período pericárdico”, caracterizou-se por intervenções sobre os grandes vasos e o pericárdio, tendo se destacado Robert Gross, em 1.938, com a ligadura e a secção do canal arterial, e Alfred Blalock e Helen Taussig, em 1.944, com a primeira anastomose sistêmicopulmonar para redução da cianose na tetralogia de Fallot. Na segunda fase, a cirurgia intracardíaca fechada mantinha os batimentos cardíacos, e o dedo indicador do cirurgião era utilizado como instrumento, destacando-se a comissurotomia mitral no tratamento da estenose mitral POR Charles Bailey. Na terceira fase, teve início a utilização de técnicas sob visão direta das lesões, com o coração aberto, parada circulatória e hipotermia, idealizada por Wilfred Bigelow. Em 1.953, John Gibbon desenvolveu o emprego de circulação extracorpórea (CEC), o que permitiu a idealização de um grande número de novas técnicas. Em 1.955, iniciou-se o reparo ou substituição das lesões valvares com o auxílio da CEC. O advento da cineangiocoronariografia por Mason Sones permitiu um maior detalhamento da fisiopatologia da insuficiência coronariana e tiveram início as cirurgias de revascularização miocárdica com CEC, sendo a primeira ponte venosa 4 realizada em 1.962 por David Sabiston. A primeira cirurgia de ponte de safena foi efetuada em 1.967 por René Falavoro, e a primeira ponte utilizando a artéria mamária interna em 1.968, por Charles Bailey. No Brasil, a primeira cirurgia com a técnica de Blalock-Taussig ocorreu em 1.948. A primeira cirurgia com CEC foi realizada por Hugo Felipozzi em 1.956 e as primeiras cirurgias utilizando pontes de safena foram feitas por Euryclides Zerbini e Adib Jatene em 1.968. Em Porto Alegre 3, a primeira cirurgia com CEC foi realizada por Cid Nogueira, em 1.962, para correção de um defeito no septo interatrial, e a primeira cirurgia de ponte de safena foi feita no Instituto de Cardiologia (IC/FUC), em 1970, por Ivo Nesralla. A cirurgia de revascularização miocárdica (CRM) é uma das mais frequentes em todo o mundo, sendo que, desde a realização da primeira experiência, ocorreram muitos avanços, relacionados, sobretudo, à revisão de vários conceitos concernentes a aterosclerose, tecnologia e técnica cirúrgica. O aprimoramento da técnica cirúrgica e a evolução tecnológica proporcionaram a abordagem de pacientes mais graves com bons resultados. Os avanços nas técnicas anestésicas também contribuíram de forma significativa para a melhora dos resultados, juntamente com o aperfeiçoamento de perfusionistas e da equipe de cuidados intensivos pósoperatórios e com a qualidade dos bancos de sangue e laboratórios 4. Além dos fatores supracitados, a mortalidade após uma cirurgia cardíaca, hoje em dia, depende de outros fatores: a cardiopatia a ser tratada, as comorbidades associadas, o estágio evolutivo da doença quando o paciente chega para a cirurgia, a seleção apropriada dos casos, a avaliação 5 pré-operatória e a preparação adequada da equipe cirúrgica. Uma vez que a mortalidade pós-operatória sofre a influência destes diferentes fatores, as taxas de mortalidade diferem entre as instituições. Uma revisão de sete grandes bancos de dados 5, incluindo mais de 172.000 pacientes submetidos à CRM entre 1.986 e 1.994, encontrou sete principais fatores de risco: idade acima de 65 anos, cirurgia de urgência, cirurgia cardíaca prévia (esses três com maior poder preditivo), sexo feminino, disfunção ventricular, estenose em tronco da coronária esquerda e número de coronárias com estenose superior a 70%. Comorbidades como diabetes, doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC), doença neurológica e nível de creatinina sérica mostraram discreto impacto no aumento de risco quando adicionadas aos fatores de risco principais. Estima-se que um paciente submetido à CRM isolada eletiva, sem cirurgia cardíaca prévia, com menos de 65 anos e função ventricular normal apresente um risco de mortalidade inferior a 1% em 30 dias. No relatório da Society of Cardiothoracic Surgeons (STS), com aproximadamente 2 milhões de dados de pacientes que realizaram cirurgia cardíaca entre 1.994 e 2.003, a mortalidade na CRM isolada foi de 2,4%, na troca valvar aórtica foi de 5,6% e na troca valvar mitral foi de 7,9%. 6. No relatório da Society of Cardiothoracic Surgeons of Great Britain and Ireland (SCTS) de 2.000, entre 32.762 cirurgias, a mortalidade na CRM isolada foi de 2,2% e na cirurgia valvar aórtica e/ou mitral, de 5,5% 7. Na Europa, em um registro voluntário de 19.030 pacientes que realizaram cirurgia cardíaca em 1.995, a mortalidade na CRM isolada foi de 3,4%, na troca valvar aórtica foi de 6% e na troca valvar mitral, de 7%. No 6 entanto, observaram-se importantes diferenças epidemiológicas entre os países que participaram do registro europeu quanto à proporção de CRM isolada, diabetes, hipertensão, índice de massa corporal, idade, insuficiência renal crônica e DPOC (tabela 1). Vale observar os dados da Espanha em relação aos outros países. Tais diferenças podem ser explicadas por fatores hereditários, culturais, dietéticos e também socioeconômicos 8. Tabela 1 - Diferentes prevalências entre países europeus quanto a idade, sexo, disfunção ventricular, tipo de cirurgia e mortalidade Variável Alemanha Reino Unido Espanha Finlândia França Itália Idade (anos) 63,5 61,9 61,2 61,9 63,4 61,4 Sexo feminino 26,7 26,9 32,7 25,8 29,1 28,6 3,4 11,7 4,6 5,4 4,8 4,8 CRM isolada (%) 73,4 71,7 46,2 77,7 53,6 57,6 Cirurgia mitral (%) 5,7 9,0 23 6,0 14,9 16,1 Cirurgia aórtica (%) 16,0 15,4 28,5 12,6 26,8 19,4 Mortalidade (%) 3,6 5,2 8,3 3,2 5,1 3,5 (%) Disfunção ventricular (FE < 30%) severa FE: fração de ejeção; CRM: cirurgia de revascularização miocárdica Fonte: Nashef, S. A., F. Roques, et al.8 Em outro estudo 9, com base nesse mesmo banco de dados, foram analisados apenas os pacientes submetidos a troca valvar e divididos pela posição geográfica: os países do “norte” da Europa (Alemanha, Suécia e Finlândia) em relação aos do “sul” (França, Itália e Espanha). Nos primeiros, a proporção de troca valvar aórtica foi maior, contribuindo com 72% dos 7 procedimentos. Os pacientes eram mais velhos e com mais comorbidades. No sul, a proporção de troca valvar mitral foi maior, representando 46,1% dos procedimentos. Este achado explicaria a maior prevalência de pacientes com insuficiência cardíaca congestiva. Considerando que diferenças socioeconômicas também podem influenciar os desfechos pós-operatórios, um estudo realizado na Espanha, em 1.994, por Pons e cols10, analisou dados de 1.287 pacientes que realizaram cirurgia cardíaca. A mortalidade intra-hospitalar pós-operatória em hospitais públicos foi superior à dos hospitais privados (11,7% versus 6,7%, respectivamente). Seguindo justificativa similar, Shibata e cols. 11 usaram o produto interno bruto per capita (PIB) como um indicador de saúde básica. Compararam as populações alocadas em grandes ensaios clínicos (CORE12, COBALT13, ASSENT-II14, GUSTO-III15 e PURSUIT 16) de acordo com o PIB do país de origem. As populações pertencentes aos países com baixo PIB (US$ 3 a 8.000 per capita) mostraram uma mortalidade maior do que as dos com alto PIB (US$ 18 a 28.000 per capita). O Brasil participou do CORE, do COBALT e do ASSENT-II entre os países de baixo PIB. 8 2.1.2 Cirurgia cardíaca no Brasil A formação do cirurgião cardíaco brasileiro situa-se entre as melhores do mundo. Além disso, a cirurgia cardíaca no Brasil tem contribuído em muito para o aprimoramento das técnicas cirúrgicas. No campo da revascularização miocárdica, as duas contribuições que mais melhoraram os resultados cirúrgicos foram introduzidas por cirurgiões brasileiros, como a revascularização miocárdica com o coração batendo e a utilização de enxertos duplos de artéria mamária interna. Concomitantemente a isso, os pioneiros Euryclides Zerbini, Adib Jatene e Hugo Felipozzi propuseram a criação de uma “indústria nacional de ponta” para a produção de equipamentos, como máquinas de circulação extracorpórea, oxigenadores e valvas biológicas e mecânicas. Atualmente, o Brasil é praticamente autossuficiente nessa área 4. Contudo, dados epidemiológicos nacionais sobre a cirurgia cardíaca no Brasil ainda carecem de registros mais apurados. Os dados disponíveis são os registrados pelo Sistema de Informações Hospitalares (SIH) do Sistema Único de Saúde do Brasil (SUS) denominado SIH/DATASUS. Por ser um sistema administrativo, nesse banco não constam dados clínicos como fatores de risco, indicação cirúrgica e complicações hospitalares. Deve-se ressaltar, entretanto, que é uma fonte importante, de vez que o SUS é um dos maiores sistemas de saúde do mundo. Em 2.007, o SUS foi responsável por 11.315.333 internações hospitalares. Dados das cirurgias realizadas pelo Sistema de Medicina Suplementar ou pelo Sistema Privado não estão disponíveis até o momento para consulta no Brasil 17 . 9 Em 2.006, Ribeiro e cols. 18 realizaram uma revisão dos dados disponíveis do DATASUS referentes a 115.021 cirurgias cardíacas realizadas entre 2.000 e 2.003. A prevalência de CRM isolada foi de 57,1% e a de troca valvar, de 33,7%. A mortalidade total foi de 8,0% nessa amostra, sendo de 7,0% em pacientes que realizaram CRM, de 8,9% nos que efetuaram troca valvar e de 16,5% nos submetidos a cirurgia cardíaca complexa. A mortalidade em mulheres foi de 8,8% e, em homens, de 7,4%. Na análise multivariada, houve maior mortalidade em pacientes mais idosos, em mulheres, nos que fizeram cirurgias valvares e complexas e em pacientes de hospitais com menor número de cirurgia. Nos hospitais que realizaram de 1 a 130 cirurgias por ano, a mortalidade observada foi de 9,7%, enquanto que naqueles que efetuaram mais de 341 cirurgias por ano a mortalidade foi de 5,8%. Trabalhos anteriores já haviam mostrado a relação inversa do número de procedimentos realizados por ano com a mortalidade 18-21 . Com relação aos Estados Unidos da América (EUA), o Brasil realiza quase seis vezes menos cirurgias por 1.000.000 habitantes/ano (tabela 2). TABELA 2 - Diferenças quanto ao número de cirurgias entre Brasil, Europa e Estados Unidos da América (EUA) Cirurgias/1.000.000 habitantes/ ano Brasil 350 Europa 900 EUA 2000 Uma revisão de dados do DATASUS mostrou que nos anos de 2.005, 2.006 e 2.007 foram realizadas 63.529 CRMs isoladas em 191 hospitais 17 .A 10 mortalidade hospitalar registrada foi de 6,22%. Os índices de mortalidade variaram de acordo com as regiões do país (tabela 3). As regiões com maior número de procedimentos, que também são as mais ricas e com maior número de centros de referência, tendem a ter menor mortalidade. TABELA 3 - Diferenças entre o número de CRMs isoladas realizadas e índice de mortalidade nas cinco regiões brasileiras Região Número de cirurgias Mortalidade, % Sudeste 32.956 6,04 Sul 15.985 6,52 Nordeste 9.284 5,12 Norte 1.354 7,24 Centro-Oeste 3.693 8,67 CRM: cirurgia de revascularização miocárdica Fonte: Piegas, L. S., O. J. Bittar, et al. 12 Informações importantes também foram registradas na revisão do banco de dados do Instituto do Coração de São Paulo (Incor) 22 , um dos mais importantes centros de referência em cirurgia cardíaca do país. Foram analisadas 71.305 cirurgias cardíacas realizadas entre 1.984 e 2.007. A mortalidade anual média foi de 7,0% entre todas as cirurgias cardíacas. Quando analisadas apenas as cirurgias eletivas, a taxa foi de 4,9%. Na CRM isolada, a mortalidade média atual foi de 4,8% e, entre as operações valvares, foi de 8,5%. Não foi observada diferença significativa nas mortalidades intrahospitalares entre as três décadas analisadas. A CRM ainda é a cirurgia mais realizada nessa instituição, mas houve um incremento de 37,6% nas cirurgias valvares em relação à década de 1990. Também aumentou o número de cirurgias para tratamento de arritmias e de defeitos congênitos. 11 Quando se comparam as proporções do tipo de cirurgia cardíaca no DATASUS com as de outros grandes bancos de dados internacionais, observa-se maior proporção de cirurgia valvar no Brasil, como mostra a figura 1. 75,5 80 70 60 62,8 64 57,1 50 Proporções (%) 40 29,4 30 33,7 24,5 EuroSCORE SCTS STS 13,9 20 DATASUS 10 0 CRM isolada Cirurgia valvar Tipo de cirurgia EuroSCORE: European System for Cardiac Operation Risk Evaluation SCTS: Society of Cardiothoracic Surgeons of Great Britain and Ireland STS: Society of Thoracic Surgeons DATASUS: Sistema de Informações Hospitalares do Sistema Único de Saúde do Brasil Fontes:Nashef, S. A., F. Roques, et al. 23; STS Adult CV Surgery National 6 7 18 Database. .www.scts.org/file/NACSDreport2000part1.pdf ; Ribeiro, A. L., S. P. Gagliardi, et al. . FIGURAS 1 - Diferenças das proporções do tipo de cirurgia entre os grandes bancos de dados e o DATASUS Nesse cenário, observa-se a crescente importância de estudar as variáveis que envolvem a execução da cirurgia cardíaca no Brasil, tendo em vista que a mortalidade pós-operatória no país ainda é mais elevada quando comparada à da Europa e à dos Estados Unidos da América. 12 2.2 ESTRATIFICAÇÃO DE RISCO EM CIRURGIA CARDÍACA 2.2.1 Escores de risco A estratificação de risco pré-operatório tem papel substancial no que diz respeito a esclarecer os pacientes e seus familiares sobre a probabilidade de morte e complicações no pós-operatório. Também sinaliza para a equipe médica quais os pacientes de alto risco e os que necessitarão de terapia intensiva nos cuidados pré, intra e pós-operatórios 24,25 . A análise de grandes bancos permitiu a elaboração de modelos de estratificação de risco, denominados escores de risco ou índices prognósticos. Tais modelos estimam um coeficiente para cada fator de risco para mortalidade, que são somados quando o fator de risco está presente. O escore final coloca o paciente em um grupo de risco cirúrgico. Deve-se lembrar, entretanto, que a mortalidade esperada pelo escore de risco representa a probabilidade de morte de uma população (em que o modelo foi desenvolvido) e não do paciente individualmente 24 . A elaboração de modelos de risco segue alguns passos referentes à escolha do cálculo estatístico, à avaliação do poder discriminatório e da calibração e, finalmente, à validação do modelo. Considerações sobre esses passos encontram-se no Apêndice 1. Em geral, os fatores de risco, nos diferentes modelos, podem ser agrupados em quatro categorias principais: fatores demográficos (como sexo, idade, raça, entre outros), comorbidades, doença cardíaca e estado préoperatório (instabilidade hemodinâmica, sintomas refratários, cirurgia de emergência, entre outros) 24. 13 Atualmente, há mais de 20 modelos de escores para avaliação de risco em cirurgia cardíaca. Entre os mais conhecidos estão: Parsonnet score, 2000 Bernstein-Parsonnet score, EuroSCORE, STS risk score, Higgins score, Northern New England score (NNE score) e Ambler score. A seguir serão descritos alguns desses escores a fim de esclarecer como eles foram desenvolvidos e validados e as diferenças que podem ser observadas entre eles. Grandes bancos de dados têm sido usados na elaboração de modelos de risco. O banco da Society of Thoracic Surgeons National Cardiac Surgery Database (STS) é um deles 26 . Criado em 1.986 por cirurgiões cardiotorácicos norte-americanos, dele participam hospitais acadêmicos, privados, militares e Veterans Affairs de 47 estados americanos e 5 províncias canadenses. Em 2.001, por exemplo, Edwards e cols.27 usaram os dados desse banco para estratificação de risco pós-operatório através do desenvolvimento de dois modelos multivariados para troca valvar isolada e para troca valvar combinada, com dados de 92.536 pacientes submetidos á cirurgia cardíaca entre 1.994 e 1.997. Rankin e cols.28, analisaram dados de 409.904 pacientes da STS submetidos a procedimentos valvares entre 1.994 e 2.003. Foram identificados 19 fatores de risco independentes para mortalidade intra-hospitalar, destacando-se a alta mortalidade em pacientes com disfunção valvar aguda, idade avançada, reoperação, endocardite, doença arterial coronariana e aqueles submetidos a aortoplastia. A taxa de mortalidade também foi maior nas trocas do que nas plastias valvares, nas cirurgias envolvendo a valva tricúspide e em procedimento valvar múltiplo. A fração de ejeção reduzida e a severidade da doença valvar tiveram menor 14 importância. Entretanto, o escore mais difundido, com dados desse banco, foi desenvolvido em 1.996 por Clark e cols. 26 . Esse escore utiliza o teorema de Bayes para o cálculo da mortalidade e das complicações pós-operatórias preditas e é atualizado periodicamente 29,30 . Sua última atualização ocorreu em 2.008 e disponibiliza escores de risco para CRM isolada (n=774.881 pacientes), CRM combinada com cirurgia valvar (n=101.661 pacientes) ou cirurgias valvares isoladas (n=109.759 pacientes) 31-33 . Está disponibilizado online, no site da STS, para cálculo não só da mortalidade, mas também de comorbidades, tais como risco de acidente vascular cerebral (AVC), mediastinite e ventilação mecânica prolongada, entre outras (www.sts.org/sections/stsnationaldatabase/riskcalculator). Outro escore bastante utilizado é o de Higgins 34 que foi desenvolvido em 1.992, através de análise retrospectiva de 5.051 pacientes de um único centro dos EUA. Em 1.997, o mesmo grupo de pesquisadores adicionou ao modelo eventos intraoperatórios, o que constitui o seu diferencial. Foram encontrados oito fatores que se correlacionaram com mortalidade intrahospitalar e cinco, com morbidade. O índice de Higgins inclui: IMC < 1,72 kg/m², reoperação, história de intervenção percutânea, idade, creatinina sérica pré-operatória ≥ 1,9 mg/dl e albumina pré-operatória ≤ 3,5 mg/dl. As variáveis transoperatórias são: tempo de CEC > 160 minutos, uso de balão intra-aórtico (BIAo) pós-CEC, gradiente arterioalveolar (A-a) O2 > 250 mmHg, frequência cardíaca (FC) > 100 batimentos por minuto, índice cardíaco à admissão na unidade pós-operatória (< 2,1 l • min-1 • m-2), bicarbonato arterial < 21 mmol/l e pressão venosa central >17 mmHg. O escore varia de 0 a 41, e a mortalidade, de 1% a 40% . 15 No mesmo ano, o Northern New England score (NNE) foi elaborado por O´Connor e cols.35. Inicialmente, os dados foram coletados prospectivamente de 3.055 pacientes submetidos a CRM e foram excluídos aqueles que necessitaram de troca valvar, ressecção de aneurisma ventricular ou outro procedimento cirúrgico. O modelo foi publicado nas Diretrizes de Cirurgia de Revascularização Miocárdica da American Heart Association em 1.999. Este modelo prediz não só mortalidade como também risco de AVC e mediastinite no pós-operatório. Os fatores de risco incluídos são: idade, sexo feminino, fração de ejeção do ventrículo esquerdo (FE) < 40%, cirurgia de emergência ou urgência, CRM prévia, doença vascular periférica, diabetes melito (DM), insuficiência renal, doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC), IMC de 31 a 36 kg/m2 e IMC > 37 kg/m2. O escore varia de 0 a 14 pontos e a mortalidade esperada de 0,4% a > 28,3%. O risco de AVC pode ser de 0,3% a > 6,5% e o risco de mediastinite vai de 0,4% a > 6,5%. Na Europa, o banco de dados da Society of Cardiothoracic Surgeons of Great Britain and Ireland (SCTS) está entre os mais conhecidos. Suas definições foram aplicadas na criação de um escore aditivo para pacientes com indicação de troca valvar aórtica 36 . Entretanto, em 2.005, foi criado o escore mais difundido para pacientes com indicação de troca valvar, conhecido como escore de risco de Ambler 37 , desenvolvido através da análise retrospectiva de 32.839 pacientes da SCTS submetidos troca valvar tanto aórtica quanto mitral. É constituído de 13 variáveis: idade, sexo feminino, IMC, tipo de cirurgia valvar (aórtica ou mitral), cirurgia de valva tricúspide concomitante, insuficiência renal, arritmias, hipertensão arterial sistêmica (HAS), DM, FE, prioridade da cirurgia e cirurgia cardíaca prévia. A 16 pontuação do escore varia de 0 a 25, e a mortalidade esperada, de 0,2% a 52,9%. A limitação desse escore é a exclusão de endocardite ativa como fator de risco apesar de sua forte associação com mortalidade intrahospitalar. Essa variável foi excluída por não estar documentada em mais de 50% dos casos do banco. O cálculo do escore está disponível online, no endereço: www.ucl.ac.uk/stats/research/riskmodel/ A tabela 4 mostra as principais diferenças entre os modelos de escore de risco. 17 TABELA 4 - Diferenças entre escores de risco Escore Parsonnet Berstein inicial Parsonnet EuroSCORE Higgins NNE Ambler 2000 Período em que 1982 a 1987 1994 a 1995 1995 1992 1987 a 1989 1995 a 2003 mortalidade mortalidade mortalidade mortalidade mortalidade mortalidade as cirurgias foram realizadas Prediz 1999: morbidade Centro Único centro EUA Multicêntrico EUA Multicêntrico Europa Único centro EUA Multicêntrico EUA Multicêntrico Grã-Bretanha Desenvolvimento do escore Retrospectivo 3.500 pacientes Prospectivo 8.593 pacientes Prospectivo 13.302 pacientes Retrospectivo 5.051 pacientes Prospectivo 1.539 pacientes Retrospectivo 16.149 pacientes Validação do escore Prospectivo 1.332 pacientes Prospectivo 2.110 pacientes Prospectivo 1.479 pacientes Prospectivo 4.069 pacientes Prospectivo 1.516 pacientes Retrospectivo 16.160 pacientes Tipo de cirurgia cardíaca CRM e cirurgia valvar CRM e cirurgia valvar CRM e cirurgia valvar CRM isolada ou combinada CRM Cirurgia valvar Número de variáveis do escore 15 34 17 13 10 13 NNE: Northern New England. CRM : cirurgia de revascularização miocárdica 33 34 35 Fontes: Parsonnet, V., D. Dean, et al. . Bernstein, A. D. and V. Parsonnet . Nashef, S. A., F. Roques, et al. . Higgins, T. L., F. G. Estafanous, et al. 29 O'Connor, G. T., S. K. Plume, et al. 30. Ambler ,G., R. Z. Omar, et al.32 18 O EuroSCORE e o escore de Berstein Parsonnet 2000 são bastante estudados em pacientes com indicação tanto de CRM quanto de troca valvar. Eles são os objetos deste trabalho e passarão a ser abordardados mais detalhadamente a seguir. 2.2.2 O EuroSCORE Em 1.998, no 12° Annual Meeting of the European Association for Cardiothoracic Surgery, na Bélgica, foi apresentado um escore desenvolvido a partir do banco de dados criado com a finalidade de avaliar a qualidade da cirurgia cardíaca nos países europeus 23 . Participaram 128 centros de oito países da Europa com dados de 19.030 pacientes para a análise (setembro a dezembro de 1995). Nessa amostra, a média de idade dos pacientes foi de 62,5 anos, 10% com mais de 75 anos, 28% mulheres, IMC médio de 26,3 kg/m2, 61% com fração de ejeção normal e 7% com fração de ejeção < 30%. A mortalidade total foi de 4,8%. Setenta e quatro por cento das cirurgias foram eletivas, 65% foram de CRM isolada, 2,6% de cirurgias envolvendo aorta torácica, 1,2% de correção de CIA e 0,71% de transplantes cardíacos. Entre os procedimento valvares, 57% de troca valvar aórtica, 29% de troca valvar mitral e 14% de troca valvar aórtica e mitral combinadas. A partir desse banco de dados, foi desenvolvido o European System for Cardiac Operative Risk Evaluation, o EuroSCORE 40 . Esse escore foi dividido randomicamente em dois grupos: um para o desenvolvimento (n=13.302) e o outro para validação (n=1.497) do escore de risco. No grupo de desenvolvimento, foram selecionados 68 fatores de risco pré-operatórios e 29 19 transoperatórios. Entraram no modelo as variáveis com significância de p< 0,2 e presentes em no mínimo 2% da amostra nos testes bivariados. Embora insuficiência cardíaca congestiva crônica e cirurgia de urgência tivessem sido fatores significativamente associados com morte, foram excluídos do modelo pela possibilidade de vieses na sua coleta. O modelo foi desenvolvido através da análise de regressão logística múltipla. Os fatores foram divididos em três grupos: relacionados ao paciente, fatores cardíacos e fatores relacionados com a cirurgia cardíaca, citados e definidos na tabela 5. Os pesos atribuídos a cada variável foram obtidos mediante os coeficientes β da regressão logística, constituindo o modelo do escore aditivo. A pontuação do escore varia de 0 a 36 pontos. TABELA 5 – EuroSCORE Escore Coeficiente β Variável Definição Idade Idade (para cada 5 anos acima dos 60 anos) 1 0,0666354 Sexo Sexo feminino 1 0,3304052 DPOC Uso prolongado de broncodilatadores ou esteroides para a doença pulmonar 1 0,4931341 Arteriopatia extracardíaca Qualquer um dos que seguem: claudicação, oclusão de carótida, estenose carotídea >50%, intervenção prévia em aorta abdominal ou carótidas ou artérias periféricas 2 0,6558917 Disfunção neurológica Doença neurológica grave afetando severamente a deambulação e tarefas diárias 2 0,841626 Cirurgia cardíaca prévia Procedimento requerendo abertura do pericárdio 3 1,002625 Creatinina sérica Creatinina sérica 200 mmol/l ou >2,26 mg/dl 2 0,6521653 Endocardite ativa Paciente na vigência de antibioticoterapia para endocardite no momento da cirurgia 3 1,101265 Status crítico préoperatório Qualquer um dos que seguem: taquicardia ventricular, fibrilação venticular, morte súbita abortada, BIAo no pré-operatório, suporte 3 0,9058132 20 inotrópico, massagem cardíaca préoperatória antes da chegada na sala anestésica, insuficiência renal aguda (anúria ou volume urinário < 10ml/h) Angina instável Angina de repouso necessitando nitrato endovenoso na chegada ao bloco cirúrgico 2 0,5677075 Disfunção ventricular esquerda Disfunção moderada (FE entre 30-50%) 1 0,4191643 Disfunção severa (FE < 30%) 3 1,094443 IAM recente IAM < 90 dias 2 0,5460218 Hipertensão pulmonar PSAP > 60 mmHg 2 0,7676924 Cirurgia cardíaca de emergência Necessidade de cirurgia antes do próximo dia de trabalho 2 0,7127953 Outra cirurgia cardíaca Procedimento cardíaco maior que não CRM ou combinado à CRM 2 0,5420364 Cirurgia de aorta torácica Cirurgia de doença de aorta ascendente, descendente ou arco aórtico 3 1,159787 Ruptura septal pósIAM Ruptura septal pós-IAM 4 1,462009 Constante β0 - 4,789594 DPOC: doença pulmonar obstrutiva crônica; BIAo: balão intra-aórtico; FE: fração de ejeção do ventrículo esquerdo; IAM: infarto agudo do miocárdio PSAP: pressão sistólica na artéria pulmonar. CRM: cirurgia de revascularização miocárdica Fontes: Nashef, S. A., F. Roques, et al. 35.; Roques, F., P. Michel, et al. 37 O escore identificou três grupos de risco, como mostra a tabela 6. 21 TABELA 6 - Grupos de risco segundo a pontuação do EuroSCORE aditivo e a mortalidade esperada Escore Grupo de risco Mortalidade esperada - IC 95% 0-2 Baixo risco 1,27-1,29 3-5 Médio risco 2,62-3,51 >6 Alto risco 10,25-11,54 IC: Intervalo de Confiança Fonte: Nashef, S. A., F. Roques, et al. 35 O grupo de estudo avaliou o EuroSCORE em cada um dos países participantes, calculando a área sob a curva ROC (AUC) e aplicando o teste de Hosmer-Lemeshow. Apesar das diferenças epidemiológicas significativas observadas, que podem ser creditadas ao caráter voluntário do recrutamento dos pacientes, o poder discriminatório do escore foi excelente, exceto na Espanha, onde foi bom (tabela 7) 41 . TABELA 7 - Diferenças das áreas sob a curva ROC do EuroSCORE entre países europeus País Área sob a curva ROC Espanha 0,74 Reino Unido 0,79 Alemanha 0,81 França 0,82 Itália 0,82 Finlândia 0,87 ROC: Receiver Operating Characteristic Fonte: Roques, F., S. A. Nashef, et al. 41 22 Foi realizada uma análise das AUCs entre os pacientes que realizaram CRM isolada e outras cirurgias cardíacas para verificar se o tipo de cirurgia poderia alterar o poder do escore, mas não houve significância estatística. O modelo aditivo é de fácil aplicação à beira do leito, porém, após sua validação em pacientes de alto risco, observou-se que o escore tendia a subestimar a mortalidade esperada. Por esse motivo os autores publicaram o EuroSCORE logístico, que utiliza as mesmas variáveis do escore aditivo e obtém a mortalidade esperada através da seguinte fórmula estatística 42: Na fórmula, β0 é a constante do modelo logístico, β1 é o coeficiente da variável X1, β2 é o coeficiente da variável X2 e assim por diante (os coeficientes β são os que constam na tabela 5). Como esse modelo exige um cálculo estatístico bem mais complexo, os autores disponibilizaram-no na página oficial do EuroSCORE ( www.euroscore.org). Para avaliar as diferenças na prática entre os modelos logístico e aditivo, o grupo de estudo do EuroSCORE aplicou os dois modelos em 14.799 pacientes, dos quais 4.293 eram de alto risco 43 . A AUC dos modelos foi praticamente idêntica (0,783 para o modelo aditivo e 0,785 para o logístico). A diferença entre a mortalidade observada e a esperada em pacientes de alto risco foi menor no modelo logístico (a mortalidade observada foi de 11,18%, a esperada pelo escore aditivo foi de 7,83% e a pelo logístico, de 11,23%). O subgrupo de alto risco foi dividido em alto risco (6 a 13 pontos) e muito alto 23 risco (14 a 24 pontos). Apesar de este último subgrupo ser constituído por um pequeno número de pacientes, a mortalidade esperada pelo modelo logístico aproximou-se mais da mortalidade observada (tabela 8). TABELA 8: Mortalidade esperada em pacientes de alto risco e muito alto risco segundo o EuroSCORE aditivo e o EuroSCORE logístico Grupo de risco de Número de Mortalidade Mortalidade Mortalidade acordo com o pacientes observada esperada pelo esperada pelo (%) escore aditivo escore logístico (%) (%) EuroSCORE aditivo Alto risco 4171 9,9 (9,0-10,8) 7,6 (7,5-7,6) 9,9 (9,7-10,1) Muito alto risco 122 52,0 (42,6-60,6) 15,6 (15,3-16,0) 56,0 (53,6-58,6) Fonte: Michel, P., F. Roques, et al. 38. O EuroSCORE aditivo ainda é o modelo padrão por sua fácil aplicabilidade e bom poder discriminatório, contudo os autores recomendam o uso do modelo logístico para pacientes de muito alto risco 43. Seguiram-se estudos tentando melhorar o poder discriminatório e a calibração do EuroSCORE. Foram propostas modificações na fórmula estatística do escore logístico para pacientes de alto risco, o que melhorou a calibração, mas não modificou o poder discriminatório 44 . Além disso, foi testada a adição de um fator de risco nos modelos do EuroSCORE quando a mortalidade observada foi maior do que a esperada. Por exemplo, em pacientes com dissecção aórtica, quando este fator de risco estava presente, foram atribuídos 6 pontos a ele. Após esta correção, a AUC do EuroSCORE passou de 0,68 para 0,91 no escore modificado 45 . Por outro lado, em casos em que a mortalidade observada foi menor do que a esperada, subtraiu-se um fator de risco do escore. Matsuura e cols. 46 , em seu trabalho, calcularam o 24 escore sem pontuar a idade em pacientes submetidos à cirurgia de arco aórtico com perfusão cerebral seletiva. Neste caso, a AUC de 0,58 do modelo aditivo padrão elevou-se para 0,70 no escore modificado. 2.2.3 O escore 2000 Berstein-Parsonnet Em 1.989, Parsonnet e cols. 38 estudaram um método de estratificação de risco em cirurgia cardíaca motivados pelo interesse em comparar os resultados da cirurgia cardíaca entre as instituições, identificar fatores que definem a severidade da doença além das muitas variáveis que contribuem para a morbimortalidade após cirurgia cardíaca. O modelo foi desenvolvido através de dados retrospectivos de um banco de dados existente no Newark Beth Israel Medical Center, em New Jersey, nos EUA, com 3.500 pacientes consecutivos submetidos a cirurgia cardíaca entre 1.982 e 1.987. Mediante análise univariada, desenvolveu-se o modelo aditivo aplicado prospectivamente em 1.331 pacientes. Os componentes do modelo aditivo são: sexo feminino, obesidade mórbida, diabete melito (tipo não especificado), hipertensão arterial (pressão arterial sistólica ≥140mmHg), FE (valor atual quando disponível), idade, reoperação (primeira ou segunda), necessidade de balão intra-aórtico pré-operatório, aneurisma de ventrículo esquerdo, cirurgia de urgência após angioplastia ou cineangiocoronariografia complicada, estados críticos (defeito estrutural agudo, choque cardiogênico), insuficiência renal aguda, outras situações (paraplegia, dependência de marca-passo, cardiopatia congênita em adulto, asma severa), cirurgia de valva mitral, pressão na artéria pulmonar > 60 25 mmHg, cirurgia de valva aórtica, gradiente ventrículo esquerdo-aorta (VE-Ao) >120 mmHg e CRM combinada com troca valvar. Fatores de risco frequentemente relacionados com desfechos desfavoráveis, como DPOC, por exemplo, foram retirados do escore principal por não serem bem avaliados em todos os pacientes e não terem o grau adequadamente mensurado. Outro fator sabidamente relacionado com mortalidade, mas que teve de ser excluído, foi prioridade da cirurgia, pois não teve definição uniforme de termos. O modelo univariado de probabilidade de mortalidade esperada dividiu os pacientes em cinco grupos de risco: bom (0-4%), médio (5-9%), pobre (1014%), alto (15-19%) e extremamente alto (≥ 20%). Por ser o primeiro escore derivado de análise univariada, assumindo os fatores de risco como independentes, no ano de 2.000, foi realizada uma revisão do escore, derivando o modelo de uma regressão logística. O modelo ficou conhecido como Berstein Parsonnet 2000. 39 Dessa vez, foram obtidos dados prospectivos de 10.703 pacientes de 10 centros de New Jersey, entre 1.994 e 1.995, submetidos a CRM, troca valvar ou CRM e troca valvar combinadas. Desses pacientes, 8.593 foram selecionados para o grupo de desenvolvimento do modelo; os restantes participaram do grupo de validação. O modelo resultante foi designado como System 97. Foram identificados 14 fatores de risco principais relacionados com mortalidade pós-operatória por meio de regressão logística. DPOC e prioridade da cirurgia foram mantidas no modelo. Os valores atribuídos foram derivados do coeficiente β da regressão (foram arredondados para meia- 26 integral mais próxima e multiplicados por 10), constituindo o modelo do escore aditivo, conforme mostrado na tabela 9. TABELA 9 - Berstein Parsonnet 2000 Variável Definições Escore Coeficientes β Sexo feminino (sem definição disponível) 6 0,6180 70-75 2,5 0,2509 76-79 7 0,6861 >80 11 1,1052 (sem definição disponível) 3 0,3055 >50% 0 0 30-49% 6,5 0,6687 <30% 8 0,7802 Hipertensão arterial Medida acima de 140/90mmHg ou 3 0,2897 sistêmica história de hipertensão ou uso atual (sem definição disponível) 2,5 0,2705 Obesidade mórbida 1,5 vez acima do peso ideal 1 0,0762 DPOC severa (sem definição disponível) 6 0,5870 Reoperação Cirurgia cardíaca prévia 10 1,0216 Duas ou mais cirurgias cardíacas 20 1,9914 Idade Diabetes melito Fração de ejeção de medicação anti-hipertensiva Insuficiência cardíaca congestiva prévias Troca valvar aórtica Procedimento proposto 0 0,0068 Troca valvar mitral Procedimento proposto 4,5 0,4426 CRM com valva Procedimentos propostos: CRM e 6 0,5887 cirurgia valvar Lesão de tronco Estenose > 50% 2,5 0,2436 BIAo pré-operatório BIAo no momento da cirurgia 4 0,3769 27 Situações especiais TABELA 10 DPOC: doença pulmonar obstrutiva crônica BIAo; balão intra-aórtico CRM: cirurgia de revascularização miocárdica Fonte: Bernstein, A. D. and V. Parsonnet 34 As situações especiais ( tabela 10) também são pontuadas. Elas podem ser divididas em: (1) cardíacas (choque cardiogênico, endocardite ativa, aneurisma de ventrículo esquerdo, cirurgia de valva tricúspide, dependência de marca-passo, IAM há 48h, ruptura do septo interventricular, taquicardia ventricular, fibrilação ventricular ou morte súbita abortada); (2) pulmonares (asma, uso de tubo orotraqueal (TOT) pré-operatório, hipertensão pulmonar); (3) hepatorrenais (cirrose, dependência de diálise, insuficiência renal); (4) vasculares (aneurisma de aorta abdominal assintomático, doença carotídea, doença vascular periférica severa); (5) outros (reação transfusional prévia, doença neurológica severa prévia, angioplastia coronariana transluminal percutânea (ACTP) sem sucesso, abuso de drogas). Reação transfusional prévia e ruptura do septo interventricular receberam valores empíricos (os mesmos valores de hipertensão pulmonar e choque cardiogênico, respectivamente). Esses ajustes foram feitos com base na experiência clínica. 28 TABELA 10 - Situações especiais Variáveis (sem definições disponíveis) Escore Coeficientes β Choque cardiogênico 12 1,1927 Endocardite ativa 6,5 0,6651 Aneurisma de ventrículo esquerdo 1,5 0,1467 Cirurgia de valva tricúspide proposta 5 0,4771 Dependência de marca-passo 0 -0,1113 IAM há 48h 4 0,3876 Ruptura do septo interventricular 12 1,1927 Taquicardia ventricular, fibrilação 1 0,0834 Asma 1 0,1071 TOT pré-operatório 4 0,4261 Hipertensão pulmonar (PSAP > 30mmHg) 11 1,0831 Cirrose 12,5 1,2679 Dependência de diálise 13,5 1,3662 Insuficiência renal 3,5 0,3724 Aneurisma de aorta abdominal 0,5 0,0363 2 0,1915 Doença vascular periférica severa 3,5 0,3749 Reação transfusional prévia 11 1,0831 Doença neurológica severa prévia 5 0,5122 ACTP sem sucesso 5,5 0,5630 Abuso de drogas 4,5 0,4611 ventricular ou morte súbita abortada assintomático Doença carotídea (bilateral ou oclusão unilateral) Coeficiente β0 - 5,1850 IAM: infarto agudo do miocárdio TOT: tubo orotraqueal ACTP: angioplastia coronariana transluminal percutânea Fonte: Bernstein, A. D. and V. Parsonnet 34 29 Um gráfico foi elaborado para permitir determinar a mortalidade esperada e o intervalo de confiança de 95%, a partir do escore total obtido após a soma dos fatores de risco presentes, representado na figura 2. Fonte: Bernstein, A. D. and V. Parsonnet 34 FIGURA 2 - Gráfico para cálculo da mortalidade esperada e respectivos intervalos de confiança segundo modelo aditivo do Berstein Parsonnet 2000 Foram obtidas quatro faixas de pontuação do escore de acordo com a mortalidade esperada (tabela 11). 30 TABELA 11 - Grupos de risco segundo o escore aditivo do Berstein Parsonnet 2000 Pontuação do escore Mortalidade esperada, % <3 1,5 4a6 4,1 7a9 8,2 > 10 20 Fonte: Bernstein, A. D. and V. Parsonnet 34 A AUC foi 0,81 para o grupo de desenvolvimento e 0,78 para o grupo de validação do modelo. A mortalidade observada nesta amostra foi de 5,3%, menor do que a do escore anterior de 1.989, razão pela qual foram feitos ajustes nas mortalidades esperadas. Em 65,6% dos pacientes estavam presentes menos de quatro fatores de risco. Finalmente, os autores comentam a análise feita comparando o escore logístico do System 97 com o aditivo simplificado que incluiu os fatores que haviam sido excluídos no primeiro. Por exemplo, um paciente com reação transfusional teria mortalidade esperada de 0,05% pelo System 97 (onde reação transfusional foi excluída por ter coeficiente negativo) e de 10,11% no escore aditivo simplificado (onde foram atribuídos 11 pontos para reação transfusional). Esta última observação demonstra a importância da experiência clínica na avaliação de um paciente, individualmente. O escore Berstein Parsonnet 2000 logístico pode ser obtido através dos coeficientes β da regressão logística (tabelas 9 e 10). 31 2.3 DIFERENÇAS ENTRE O EUROSCORE E O BERSTEIN PARSONNET 2000 ADITIVOS Pode-se observar que há diferenças importantes entre os dois escores que serão estudados. No desenvolvimento do Berstein Parsonnet 2000, após a análise univariada, todas as variáveis foram incluídas na regressão logística e mantidas no escore, o que fez com que o modelo se tornasse mais complexo e com variação ampla de valores (tabela 12). Além disso, os escores foram desenvolvidos em dois continentes diferentes, onde cada população tem seus próprios hábitos de vida, alimentares e culturais, fato que pode influenciar nos desfechos. O Berstein Parsonnet 2000 tem quase todas as variáveis do EuroSCORE, exceto algumas condições como cirurgia envolvendo a aorta torácica. Condições englobadas na “arteriopatia extracardíaca”, como claudicação, não são pontuadas no Berstein Parsonnet 2000. TABELA 12 – Comparação dos fatores de risco e escores dos modelos aditivos do EuroSCORE e do Berstein Parsonnet 2000 Fator de risco EuroSCORE Berstein Parsonnet 2000 Idade >65 anos: 1 ponto para 70-74 anos: 2,5 cada 5 anos adicionais 75 a 79 anos: 7 >80 anos: 11 Sexo feminino 1 6 PSAP > 60 mmHg: 2 > 30 mmHg: 11 Lesão de TCE -- 2,5 FE < 30% 3 8 FE 30 a 50% 1 6,5 Aneurisma de VE -- 1,5 Endocardite ativa 3 6,5 32 Cirurgia cardíaca prévia 3 Uma: 10 Duas ou mais: 20 Cirurgia tricúspide prévia -- 5 Diabetes melito -- 3 HAS -- 3 Creatinina sérica > 2,26 2 -- ICC -- 2,5 Obesidade mórbida -- 1 Insuficiência renal aguda -- 3,5 Diálise -- 13,5 DPOC DPOC/ Asma: 1 Asma : 1 mg/dl ou crônica DPOC grave: 6 Doença neurológica Doença vascular periférica AVC com sequelas graves: Disfunção neurológica 2 grave: 5 Arteriopatia extracardíaca: 2 DVP severa 3,5 Claudicação Intervenção em aorta abdominal, artérias ou carótidas -- Lesão de carótida > 50% 2 Aneurisma de aorta abdominal assintomático 0,5 Oclusão de carótida unilateral 2 Cirrose -- 12,5 Abuso de drogas -- 4,5 PTI -- 12 Cirurgia de emergência 2 -- ACTP sem sucesso -- 5,5 IAM prévio < 90 dias: 2 < 48 horas: 4 Angina instável 2 -- Ruptura septal pós- IAM 4 12 Status crítico: 3 TV/FV/MS 1 33 Choque cardiogênico 12 TOT prévio 4 BIAo prévio 4 Suporte inotrópico Insuficiência renal aguda PCR pré operatório Cirurgia de valva mitral -- 4,5 Cirurgia de valva tricúspide -- 5 Cirurgia envolvendo a aorta 3 -- CRM e troca valvar 2 6 DVP: doença vascular periférica; FE: fração de ejeção; TCE: tronco da coronária esquerda; HAS: hipertensão arterial sistêmica; ICC: insuficiência cardíaca congestiva; DPOC: doença pulmonar obstrutiva crônica; PTI: púrpura trombocitopênica idiopática; ACTP: angioplastia coronariana transluminal percutânea; IAM: infarto agudo do miocárdio; TV: taquicardia ventricular; FV: fibrilação ventricular; MS: morte súbita; TOT: tubo orotraqueal; PSAP: pressão sistólica na artéria pulmonar. BIAo: balão intra-aórtico; PCR: parada cardio-respiratória; CRM: cirurgia de revascularização miocárdica Fontes: Bernstein, A. D. and V. Parsonnet 34; Nashef, S. A., F. Roques, et al. 35 2.4 VALIDAÇÃO DO EUROSCORE E DO Berstein Parsonnet 2000 EM DIFERENTES POPULAÇÕES Após sua publicação, o EuroSCORE foi amplamente difundido e aplicado em diferentes populações. Quando colocado no sistema de busca do PubMed, foram encontradas 703 referências e, no portal da CAPES, 3.012. O EuroSCORE foi aplicado em populações dos EUA do Reino Unido 6, da China 49 , do Japão e da Austrália 47 , da Alemanha 50 48 , com bom poder discriminatório. A grande aceitação do EuroSCORE fez com que ele fosse utilizado como auxiliar na indicação de outros procedimentos cirúrgicos. Por exemplo, pacientes com estenose aórtica severa que foram classificados como de muito alto risco cirúrgico pelo EuroSCORE poderiam ter indicação de implante de CoreValve 51, 52 . O mesmo raciocínio poderia ser utilizado para 34 angioplastia de lesão de tronco de coronária esquerda, não protegida relação ao último procedimento, Capodanno e cols 54 53 . Com propuseram um novo escore que combina o EuroSCORE logístico com o escore SYNTAX (escore que caracteriza a anatomia coronariana mais detalhadamente com relação ao número de lesões, sua complexidade, impacto funcional e localização). O novo escore resultante dessa combinação foi intitulado GRC (Global Risk Classification) e mostrou um incremento no poder discriminatório do SYNTAX, tendo a AUC de 0,68 passado para 0,73. As várias publicações fizeram com que surgisse a necessidade de responder à questão: o EuroSCORE é capaz de predizer mortalidade em diferentes populações? Em 2.004, foi realizada uma revisão sistemática do desempenho do EuroSCORE aditivo 55 , avaliando seis estudos, que englobou cerca de 16.000 pacientes. Em pacientes com EuroSCORE < 6, o escore superestimou a mortalidade e nos com > 13, subestimou (figura 3). 35 Fonte: Gogbashian, A., A. Sedrakyan, et al. 50 FIGURAS 3- Resultado de revisão sistemática do EuroSCORE aditivo. Uma metanálise 56 avaliou o desempenho do EuroSCORE aditivo e logístico apenas em cirurgia valvar. Doze estudos, somando 26.621 pacientes, mostraram bom poder discriminatório com AUC 0,730 (IC95% 0,717-0,743), 36 porém com tendência a superestimar a mortalidade (figura 4), sugerindo-se aplicar outros escores de risco nesse grupo de pacientes. Em octogenários submetidos a cirurgia valvar, pacientes considerados de alto risco pelo EuroSCORE, com escore mínimo de 7 (soma da idade e do tipo de cirurgia), o modelo logístico também superestimou a mortalidade 57. Fonte: Parolari, A., L. L. Pesce, et al. 56 FIGURAS 4 – Metanálise do EuroSCORE em Cirurgia Valvar. Apesar de o escore Berstein Parsonnet 2000 ser bastante aplicado na prática, ele não possui um número tão expressivo de estudos quanto o EuroSCORE. Ele foi bem avaliado na população canadense por Varennes e cols 58 . Foram coletados dados de 4.883 pacientes submetidos a cirurgia cardíaca entre 2.000 e 2.005, prospectivamente. Foi utilizada a razão de mortalidade padronizada (SMR-standardized mortality ratio), que é a divisão 37 da mortalidade observada sobre a esperada, e os intervalos de confiança foram calculados segundo Breslow & Day. A SMR foi 0,52, indicando que o Berstein Parsonnet 2000 tem uma tendência para superestimar a mortalidade. Em 2.006, o 2000 Berstein-Parsonnet foi comparado ao EuroSCORE em um estudo prospectivo observacional, com dados de 1.639 pacientes submetidos a cirurgia cardíaca entre janeiro de 2.003 e junho de 2.004 na Universidade de Tel Aviv 60 . Os pacientes foram estratificados em cinco grupos de risco de acordo com os escores dos dois modelos. A AUC foi de 0,83 para o 2000 Berstein-Parsonnet e de 0,73 para o EuroSCORE. O 2000 Berstein-Parsonnet foi discretamente melhor do que o EuroSCORE para discriminar os pacientes de maior risco, porém não analisaram a causa das mortes e encontraram deficiências em determinados subgrupos, como o de pacientes que realizaram cirurgia de aorta torácica, os com complicações mecânicas agudas, os com implante de dispositivos e os transplantados. Uma comparação entre 19 modelos de estratificação de risco para cirurgia cardíaca, em um único centro na Suécia, observou que os modelos aditivo e logístico do EuroSCORE predisseram melhor a mortalidade em 30 dias (AUC de 0,84 em ambos os modelos) e em um ano (AUC de 0,77 em ambos os modelos) 61 . Provavelmente, o poder preditivo em 30 dias foi melhor do que em um ano em razão de a mortalidade nesse período estar mais relacionada com a cirurgia cardíaca. O escore de Parsonnet de 1.989 também foi avaliado, porém não ficou entre os quatro escores com maior acurácia. 38 Apesar de melhorar a qualidade do atendimento perioperatório, a aplicabilidade dos escores de risco multifatoriais, para predizer o desfecho de um paciente em particular, pode ser influenciada por inúmeros fatores: o perfil da população a ser estudada, as diferentes definições das variáveis, o manejo dos dados incompletos e os dados que nem sempre estão disponíveis. Na população norte-americana, o modelo aditivo do EuroSCORE foi aplicado em 401.684 pacientes submetidos a cirurgia cardíaca em 1.995, 1.998 e 1.999 47. Foram observadas diferenças significativas entre as duas populações: na STS, 84% dos pacientes foram submetidos a CRM isolada enquanto que na Europa foram realizadas duas vezes mais outras cirurgias que não CRM. Na América do Norte, havia maior prevalência de mulheres, de idosos e de pacientes com mais comorbidades. Quanto às definições, também foram encontradas diferenças: no EuroSCORE, a disfunção neurológica foi considerada deficit que afeta severamente a deambulação e/ou as atividades diárias, ao passo que na STS a disfunção neurológica foi considerada deficit neurológico central persistente por mais de 24h. Apesar dessas diferenças, o EuroSCORE mostrou um bom poder discriminatório, com AUC variando de 0,75 a 0,78. Porém a mortalidade esperada e a mortalidade observada foram discordantes principalmente em pacientes de alto risco, nos quais a tendência do escore foi subestimar a mortalidade. Na Austrália 50 , em 8.331 pacientes submetidos a cirurgia cardíaca, igualmente observaram-se diferenças entre as populações do escore e da amostra, além de diferenças nas definições. A definição de disfunção neurológica na Austrália incluiu AVC como qualquer comprometimento neurológico e estado comatoso por mais de 24h. Ataques isquêmicos 39 transitórios, deficits neurológicos reversíveis, amputações, aneurismas de aorta abdominal e reconstrução aortoilíaca foram incluídos na definição de arteriopatia extracardíaca. Tanto o EuroSCORE aditivo quanto o logístico superestimaram a mortalidade. A mortalidade observada foi de 3,20% e as mortalidades esperadas foram de 5,31% pelo modelo aditivo e de 8,76% pelo logístico, mostrando pobre calibração do modelo nessa população. 61 Na Suécia , quando o EuroSCORE foi comparado ao STS como preditor de mortalidade em CRM isolada, IAM recente foi considerado aquele ocorrido em 21 dias, enquanto que no EuroSCORE a definição é de 90 dias. No Instituto de Cardiologia do Rio Grande do Sul, dados como albumina, gradiente (A-a) O2 > 250 mmHg e índice cardíaco não são obtidos rotineiramente, o que compromete a aplicabilidade do índice de Higgins. Recentemente, no Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia de São Paulo, Bianco e cols. 62 , entre março de 2.002 e junho de 2.005, aplicaram dois escores de risco em 814 pacientes submetidos a CRM, o de Parsonnet e o de Higgins modificado. A instituição necessitou modificar o índice de Higgins, substituindo a variável “valor do índice cardíaco” por “síndrome de baixo débito cardíaco” pela dificuldade de obter o primeiro. Por este motivo, alguns centros de referência optaram por analisar os fatores de risco que se correlacionavam com a morbimortalidade pósoperatória sem adotar modelos já propostos, mas montando um modelo que se adaptasse à realidade local. No Canadá, em 1.995, Tu e cols. 63 realizaram um estudo multicêntrico, envolvendo instituições de Ontário. Foram coletados dados de 13.098 pacientes submetidos a cirurgia cardíaca e foram analisadas apenas seis variáveis de risco (idade, sexo, função ventricular, 40 tipo de cirurgia, cirurgia de urgência e reoperação). O índice foi preditor de mortalidade, tempo prolongado em UTI (> 6 dias) e tempo prolongado de internação hospitalar após a cirurgia cardíaca (> 17 dias). Em um centro terciário do Rio Grande do Sul, foi elaborado um escore de risco local para cirurgia valvar, com 1.082 pacientes. Ele possui apenas nove variáveis, sendo um escore mais simples do que outros disponíveis na literatura. Provavelmente, essa seja a estratégia ideal a ser adotada em cada serviço de cirurgia cardíaca para estratificação de risco de seus pacientes 64 . 3 OBJETIVOS 3.1 OBJETIVO PRINCIPAL Avaliar a capacidade do EuroSCORE e do Berstein Parsonnet 2000 em predizer a mortalidade intra-hospitalar em pacientes submetidos a cirurgia cardíaca no Instituto de Cardiologia do Rio Grande do Sul. 3.2 OBJETIVOS SECUNDÁRIOS Identificar fatores que se associem à maior mortalidade destes pacientes. 41 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFIAS 1. Nesralla IA. Cardiologia Cirúrgica: Perspectivas para o ano 2000. 1994. 2. 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CEP 90620-001; Telefone:51-32232746 52 Resumo Introdução: A aplicabilidade do Berstein Parsonnet 2000 (BP) e do EuroSCORE (ES), escores de risco internacionais em cirurgia cardíaca, ainda não está bem definida em centros fora da América do Norte e Europa. Objetivo: Avaliar a capacidade do BP e do ES em predizer mortalidade intra-hospitalar (MIH) em pacientes submetidos a cirurgia cardíaca (CC) em hospital de referência do Brasil e identificar os preditores de risco. Métodos: Coorte retrospectiva de 1.065 pacientes. A idade média foi de 61,4 anos (+/- 11,8 anos), 38% eram mulheres, 60,3% pacientes realizaram CRM, 32,7%, cirurgia valvar e 7,0%, CRM combinada com cirurgia valvar. Foram calculados os modelos aditivos e logísticos dos escores, a área sob a curva ROC (AUC) e a razão de mortalidade padronizada (RMP) e aplicado o teste de Hosmer Lemeshow (H-L). Regressão logística multivariada foi realizada para identificar os FR. Resultados: A mortalidade geral da amostra foi de 7,8%. As características basais dos pacientes da amostra foram significativamente diferentes em relação ao BP e ao ES. As AUCs do BP aditivo e logístico foram 0,72 (IC95%; 0,66-0,78 p=0,74) e as do ES foram 0,73 (IC95% 0,67-0,79 p=0,80). O cálculo da RMP no BP foi 1,59 (IC95%; 1,27-1,99) e no ES foi 1,43 (IC95%; 1,14-1,79). O teste H-L mostrou pobre calibração dos escores. Conclusão: As características da população operada diferem das que embasaram o estabelecimento dos escores. O BP e o ES aditivos e logísticos revelaram bom poder discriminatório, entretanto ambos subestimaram a MIH, mostrando-se inadequados na avaliação pré-operatória dos pacientes de nossa Instituição. Sete preditores independentes de mortalidade intra-hospitalar foram identificados: idade, creatinina sérica > 2,26mg/dl, endocardite ativa, 53 pressão arterial pulmonar > 60 mmHg, uma ou mais cirurgias cardíacas prévias, CRM combinada com cirurgia valvar e diabetes melito. É necessário o desenvolvimento de escores locais, baseados na realidade das populações, para melhor aferição de riscos na cirurgia cardíaca. Palavras-chave: 1.Cirurgia Cardíaca 2.Escores de Risco 3.Mortalidade 54 Abstract Introduction: The applicability of the Parsonnet Bernstein 2000 (BP) and EuroSCORE (ES) international risk scores in heart surgery is not well defined in centers outside of North America and Europe. Objective: To evaluate the ability of BP and ES in predicting in-hospital mortality (IHM) in patients undergoing cardiac surgery (CS) at a reference hospital in Brazil and to identify risk factors. Methods: Retrospective cohort study of 1,065 patients. The mean age was 61.4 years (± 11.8 years), 38% were women, 60.3% patients underwent coronary artery bypass grafting (CABG), 32.7%, valve surgery and 7.0%, CABG combined with valve surgery. Additive and logistic scores models, the area under the ROC (Receiver Operating Characteristic) curve (AUC) and the standardized mortality ratio (SMR) were calculated, and the Hosmer Lemeshow test (HL) was used to assess the model fit. Multivariate logistic regression was performed to identify the risk factors. Results: Overall mortality was 7.8%. The baseline characteristics of the patients were significantly different in relation to BP and ES. AUCs of the logistic and additive BP were 0.72 (95% CI, from 0.66 to 0.78 p = 0.74), and of ES they were 0.73 (95% CI; 0.67 to 0.79 p = 0.80). The calculation of the SMR in BP was 1.59 (95% CI; 1.27 to 1.99) and in ES, 1.43 (95% CI; 1.14 to 1.79). The HL test showed poor calibration of the scores. Conclusion: The characteristics of the population undergoing surgery differed from that used for the establishment of both scores. Additive and logistic BP and ES showed good discriminatory power, though both underestimated the IHM, proving to be inadequate in the preoperative evaluation of patients at this institution. Seven independent predictors of in-hospital mortality were identified: age, serum creatinine > 2.26 mg/dL, active endocarditis, systolic 55 pulmonary arterial pressure > 60 mmHg, one or more previous heart surgeries, CABG combined with valve surgery and diabetes mellitus. Local scores, based on the real situation of local populations, must be developed for better assessment of risk in cardiac surgery. Keywords: 1. Heart surgery 2. Risk scores 3.Mortality 56 Introdução Atualmente, há mais de 20 modelos de escores para avaliação de risco em cirurgia cardíaca [1-5]. Entre os mais conhecidos estão: Parsonnet score, STS risk score, Higgins score, Northern New England score (NNE score), Ambler score, 2000 Bernstein-Parsonnet score e EuroSCORE. Alguns destes escores são aplicáveis somente para revascularização miocárdica e outros somente para cirurgia valvar. O 2000 Bernstein Parsonnet e o EuroSCORE se diferenciam porque podem ser utilizados para cirurgia de revascularização, cirurgia valvar ou ambas, além da possibilidade de serem aplicados à beira do leito. O escore de Parsonnet foi desenvolvido em 1.989 e destaca-se por ter sido o pioneiro na estratificação sistemática de risco em cirurgia cardíaca e por ser aplicável em diferentes populações [6]. O Berstein Parsonnet 2000 corresponde ao escore de Parsonnet revisado e simplificado e foi baseado em um banco de dados de 10.703 pacientes de New Jersey, nos Estados Unidos, entre 1.994 e 1.995 [7]. O EuroSCORE (European System for Cardiac Operative Risk Evaluation) é um dos escores mais difundidos atualmente. Foi desenvolvido a partir de dados de 19.030 pacientes da Europa, em 1.995 [8-12]. Ambos os escores são apresentados nos modelos aditivo e logístico. O modelo aditivo é mais facilmente aplicável, embora menos discriminativo, nos pacientes de alto risco. Nesta situação, o modelo logístico é o mais indicado [1112]. Um aspecto importante a ser avaliado em um escore de risco, além do poder discriminatório, é sua capacidade de estimar, adequadamente, a mortalidade intra- 57 hospitalar. Alguns modelos apresentam bom poder discriminatório, mas podem subestimar ou superestimar a mortalidade [4, 13,14]. Dados disponíveis no Brasil revelam que a mortalidade pós-operatória ainda é elevada [15-16], o que pode ser explicado, em parte, pelas disparidades socioeconômicas da nossa população [17]. Também pode-se considerar que, no Brasil, há poucos centros terciários que realizam um grande volume de cirurgias cardíacas por ano e que esses centros se localizam nas regiões mais ricas (sabese que o número de procedimentos por ano está inversamente relacionado com a mortalidade) [15, 18]. Tendo em vista as diferentes características da população brasileira e a carência de escores nacionais, pretendemos testar a aplicabilidade do Berstein Parsonnet 2000 (BP) e do EuroSCORE (ES), dois escores de risco conhecidos internacionalmente, em pacientes submetidos a cirurgia cardíaca no sul do Brasil e identificar fatores de risco. Materiais e Métodos Coorte retrospectiva de pacientes atendidos no Instituto de Cardiologia do Rio Grande do Sul (IC/FUC), no período de janeiro de 2.007 a julho de 2.008, com idade superior a 18 anos, submetidos a cirurgia de revascularização miocárdica (CRM), cirurgia valvar ou CRM combinada com cirurgia valvar. Foram excluídos pacientes com patologias exclusivamente da aorta, cardiopatias congênitas e transplantes cardíacos. A amostra foi constituída de 1.065 pacientes. O IC/FUC é um centro de atendimento terciário em cardiologia, referência no sul do Brasil, onde são realizadas cerca de 2.000 cirurgias cardíacas por ano, 58 incluindo cirurgias congênitas, transplantes, implantes de marca-passos e cardiodesfibriladores e cirurgias da aorta, entre outras. Os prontuários médicos foram revisados manualmente pelos autores. Quase todas as variáveis dos escores de risco estudados encontravam-se nos prontuários, onde consta a ficha padronizada de avaliação de pré-operatório, preenchida sempre pela mesma equipe médica. Também foram extraídos dados das fichas anestésicas e da ficha de admissão na unidade de terapia intensiva pós-operatória. Apesar disso, informações do grau específico de severidade da doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) e do grau de sequela após evento neurológico, raramente estavam disponíveis. A definição de DPOC utilizada para o escore BP foi a mesma do ES, uma vez que não há definição disponível dessa variável no BP. Foram considerados portadores de DPOC grave apenas os pacientes com VEF1 < 50% do previsto na espirometria [19]. Disfunção neurológica foi considerada qualquer evento neurológico prévio (acidente vascular cerebral (AVC) ou acidente isquêmico transitório (AIT)). Insuficiência cardíaca congestiva foi considerada presente nos pacientes que estavam em classe funcional III ou IV conforme a New York Heart Association (NYHA). Os dados foram registrados em um formulário específico e digitados pelos autores em banco de dados Microsoft Office Excel. Cento e cinquenta e três pacientes não tinham a avaliação da fração de ejeção do ventrículo esquerdo no pré-operatório e 22 não tinham a dosagem sérica de creatinina. O valor dos dados faltantes (missing values) foram incluídos, estatisticamente, pelo programa SPSS versão 19.0, por imputação múltipla [2021]. Obteve-se, então, um banco de dados “completo”. 59 O desfecho avaliado foi mortalidade intra-hospitalar definido como óbito por qualquer causa, tanto no trans como no pós-operatório, antes da alta hospitalar. Análise estatística Para a comparação entre as prevalências na amostra e nas populações dos escores foi calculada a diferença entre proporções de amostras independentes. Para a comparação dos fatores de risco em relação aos desfechos clínicos foi utilizado o teste de qui-quadrado de Pearson. Para magnitude do efeito foi calculada a razão de odds (OR - odds ratio) e intervalo de confiança de 95% (IC95%). O nível de significância considerado foi α = 0,05. Foram utilizados os softwares: SPSS versão 19.0 e PEPI 4.0. Modelos de regressão logística multivariada foram aplicados na amostra para identificar os preditores independentes de mortalidade dos escores. Os escores foram aplicados na amostra na sua forma aditiva e logística conforme os algoritmos dos artigos originais. No escore BP, a amostra foi dividida em decis e avaliada a mortalidade em cada decil para que fosse possível fazer a comparação com o ES já que este último é apresentado em faixas de risco (baixo, médio e alto risco). No escore BP, uma pontuação de 0 a 3 foi considerada baixo risco, de 3,1 a 17,5, médio risco e ≥ 17,5, alto risco. No ES, uma pontuação de 0 a 2 foi considerada baixo risco, 3 a 5, médio risco e ≥ 6, alto risco. A acurácia do escore foi avaliada pelo teste de Hosmer-Lemeshow, pelo qual comparam-se as mortalidades observadas e esperadas em decis de mesmo tamanho. A diferença entre as mortalidades observadas e esperadas também foi avaliada pela razão de mortalidade padronizada (RMP) que é a divisão da mortalidade observada pela esperada) e os intervalos de confiança calculados 60 conforme sugerido por Breslow & Day [22]. O H-L é o teste mais aceito para avaliar as diferenças entre as mortalidades observadas e esperadas, todavia optamos por também utilizar a RMP pelo fato de ser possível aplicá-la nas faixas de risco. A curva ROC (Receiver Operating Characteristic curve) avaliou o poder discriminatório dos escores e as áreas sob as curvas ROC (AUC) – Estatística Cde ambos os modelos, nas suas formas aditivas e logísticas, foram comparadas pelo programa STATA 9.2. Este último também foi utilizado para elaboração dos gráficos. Considerações éticas O estudo foi submetido à análise e aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa do Instituto de Cardiologia do RS, conforme resolução do Conselho Nacional de Saúde. Os pesquisadores comprometem-se a cumprir as normas da resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde, relacionado em IV.1- g. “a garantia do sigilo que assegure a privacidade dos sujeitos quanto aos dados confidenciais envolvidos na pesquisa”. Resultados A idade média foi de 61,4 anos (+/- 11,8 anos), 38% eram mulheres, 60,3% pacientes realizaram CRM, 32,7%, cirurgia valvar e 7,0%, CRM combinada com cirurgia valvar. 61 A mortalidade geral da amostra foi de 7,8%. Pacientes submetidos a CRM isolada tiveram mortalidade de 5,9%. Na cirurgia valvar (aórtica e/ou mitral e/ou tricúspide) a mortalidade foi de 8,6% e na CRM associada com cirurgia valvar foi de 20,0%. As médias de mortalidade no BP e no ES originais foram de 5,3% e de 4,7%, respectivamente. A pontuação média do BP na amostra foi 14,69 (mínima zero e máxima 84,5) e do ES foi 4,52 (mínima zero e máxima 16). As características basais dos pacientes foram significativamente diferentes em relação às das populações do BP e do ES (tabelas 1, 2 e 3). Em relação ao BP, houve predominância do gênero feminino e maior prevalência de hipertensão arterial, hipertensão pulmonar, asma, obesidade mórbida, lesão de tronco de coronária esquerda e cirurgia cardíaca prévia. Cirurgias valvar aórtica, mitral e tricúspide também foram mais frequentes. O número de pacientes com balão intraaórtico pré-operatório foi significativamente menor em nossa população. Em relação ao ES, também predominou o gênero feminino. Observou-se maior prevalência de DPOC, disfunção neurológica, cirurgia cardíaca prévia, angina instável e hipertensão pulmonar. As AUCs do BP aditivo e do logístico foram 0,72 (IC95% 0,66-0,78) e as AUCs do ES aditivo e do logístico foram 0,73 (IC95% 0,67-0,78). Não houve diferença estatisticamente significativa na comparação das AUCs dos modelos aditivos (p=0,74) e logísticos (p=0,80) dos dois escores de risco (figuras 1 e 2). O teste de Hosmer Lemeshow (H-L) mostrou pobre calibração do escore (x²= 87,61 (8 gl), p < 0,001 no BP e x²= 24,20 (8 gl), p = 0,01 no ES), e o cálculo da RMP geral mostrou que os escores tendem a subestimar a mortalidade na amostra, sendo que no BP aditivo e logístico a RMP foi 1,59 (IC95% 1,27 -1,99). No ES aditivo e logístico a RMP foi 1,43 (IC95% 1,14-1,79) (tabelas 4 e 5). 62 Na regressão logística multivariada (tabela 6), destacaram-se como preditores independentes de risco para mortalidade intra-hospitalar: idade 76 a 79 anos (OR=2,49 IC95% 1,12-5,54), idade > 80 anos (OR=3,61 IC95% 1,54=8,45), creatinina sérica > 2,26mg/dl (OR=4,71 IC95% 1,28-17,34), endocardite ativa (OR=4,388 IC95% 1,00-19,17), endocardite ativa (OR=4,388 IC95% 1,00-19,17), pressão sistólica na artéria pulmonar (PSAP) > 60 mmHg (OR=3,44 IC95% 1,607,39), duas ou mais cirurgias cardíacas prévias (OR=3,34 IC95% 1,16-9,63), uma cirurgia cardíaca prévia (OR=2,68 IC95% 1,40-5,12), CRM combinada com cirurgia valvar (OR=2,38 IC 95% 1,18-4,80) e diabetes melito (OR=2,28 IC95% 1,34-3,88). Discussão São raras as validações de escores de risco para cirurgia cardíaca em hospitais de fora da América do Norte e Europa. As características basais das populações operadas podem variar de acordo com as regiões. Conseqüentemente, escores preditivos precisam ser adaptados a tais amostras. O presente estudo é o primeiro a testar a capacidade de dois escores, o BP e o ES, em predizer mortalidade intra-hospitalar em casos mistos de cirurgia cardíaca (cirurgia valvar, de revascularização miocárdica ou ambas) no Brasil. Em nossa análise, ambos os escores mostraram bom poder discriminatório, porém subestimaram a mortalidade intra-hospitalar. Este resultado contraria o que tem sido observado na aplicação do BP e do ES em países desenvolvidos, onde a tendência desta mortalidade é ser superestimada. 63 A mortalidade geral da amostra foi de 7,8%, próxima à mortalidade de 8,0% observada em revisão de dados do Sistema Único de Saúde [15], ao passo que, na população do BP, foi de 5,3% e no ES, foi de 4,7%. Estudos têm mostrado que os escores podem ter sua aplicabilidade comprometida quando as populações avaliadas são diferentes daquelas onde os modelos foram desenvolvidos. Outra limitação dos escores de risco estudados é o fato de não avaliarem procedimentos cirúrgicos específicos, como, por exemplo, cirurgias valvares aórtica e mitral combinadas. Varennes e cols [23] avaliaram a aplicabilidade do BP em 4.883 pacientes submetidos a cirurgia cardíaca no Canadá. A mortalidade geral foi de 6,37%, enquanto a mortalidade esperada pelo BP era de 12,16%. A média do BP foi 18,8 pontos. A RMP, calculada para avaliar a diferença entre a mortalidade observada e a esperada pelo BP, foi 0,52 (IC95% 0,42 a 0,56), demonstrando que o BP superestimou a mortalidade na população avaliada. No presente estudo, a média do BP foi menor (14,5 pontos), mas a RMP foi maior 1,59 (IC95%; 1,27-1,99), ou seja, o BP subestimou a mortalidade na nossa Instituição. Recente metanálise, publicada em 2.010 por Parolari e cols.[13], avaliou o desempenho do ES aditivo em cirurgia valvar, envolvendo 26.621 pacientes. O escore mostrou tendência a superestimar a mortalidade na maioria dos estudos que entraram na metanálise, apesar de seu bom poder discriminatório (AUC 0,73, IC95% 0,78-0,74). O mesmo foi observado em uma revisão sistemática publicada em 2.004 por Gogbashian e cols. [14], envolvendo 16.000 pacientes submetidos a cirurgia valvar e CRM, em diferentes grupos de risco. Em nossa amostra, a calibração pobre dos escores que foi observada pode ser explicada, em parte, pelas diferentes características basais da população 64 inicial dos escores e da amostra, dificuldade encontrada também em outros estudos de validação do ES [24-27]. Por exemplo, pacientes com hipertensão pulmonar (PSAP > 60 mmHg) foram mais prevalentes do que na população inicial do ES (5,2% versus 2,0%) e esses pacientes apresentaram maior risco de mortalidade intra-hospitalar (OR=3,44 IC95% 1,60-7,39). O menor número de pacientes que usaram balão intra-aórtico (BIAo) no pré operatório também aponta para a possibilidade de subutilização desse recurso em pacientes mais graves. Deve-se ressaltar, entretanto, que não é a primeira vez que o BP foi comparado com o ES. Em 2.006, um estudo prospectivo realizado em Tel Aviv por Berman e cols. [28] comparou as formas aditivas dos dois escores em amostra de 1.639 pacientes submetidos a cirurgia cardíaca. A mortalidade na população estudada foi menor do que a registrada na nossa (4,83%). Os dois modelos mostraram boa correlação entre a mortalidade observada e a predita, conforme o teste de H-L. Além disso, com relação ao poder discriminatório, o BP teve melhor desempenho (AUC 0,83 versus 0,73). No estudo de Berman e cols [28], o perfil da amostra não foi comparado com o das populações dos escores e os pacientes foram divididos em cinco faixas de risco e não em três, como proposto pelo grupo do ES. Em 2.004, outro trabalho [29] comparou o escore de Parsonnet inicial com o ES utilizando dados retrospectivos de 194 pacientes submetidos a cirurgia cardíaca em um único centro da Arábia Saudita. O teste de H-L mostrou boa calibração do escore e as AUCs foram 0,68 e 0,66, respectivamente. Os autores consideraram que ambos os escores eram aplicáveis na sua população. O presente trabalho tem as limitações inerentes aos estudos retrospectivos. No entanto, alguns modelos de risco descritos na literatura foram desenvolvidos a partir de bancos de dados pré-existentes [6, 30-33]. Algumas variáveis que foram 65 avaliadas de forma subjetiva, tais como grau de DPOC, grau de dano neurológico e insuficiência cardíaca, tiveram suas definições adaptadas, da mesma maneira como foi feito em outros estudos [26-27]. Na comparação da Society of Thoracic Surgeons risk score (STS) com o ES em uma instituição da Suécia, a definição de infarto agudo do miocárdio recente era de 21 dias e não de 90 dias como proposto pelo ES. [27]. Mesmo com essa adaptação, o ES teve significativo melhor poder discriminatório que o STS (AUC 0,84 versus 0,71). No estudo do Parsonnet inicial, DPOC foi considerada como um fator de risco de difícil obtenção, sendo retirada do modelo do escore, mesmo estando associada à mortalidade pós-operatória [6]. Pelo mesmo motivo, cirurgia de urgência e insuficiência cardíaca crônica foram retiradas do ES [8]. Conclusões A aplicação do Berstein Parsonnet 2000 e do EuroSCORE na amostra mostraram um bom poder discriminatório, entretanto subestimaram a mortalidade intra-hospitalar, mostrando-se inadequados na avaliação pré-operatória dos pacientes que serão submetidos a cirurgia cardíaca em nossa instituição. Os preditores independentes de mortalidade intra-hospitalar foram: idade, creatinina sérica > 2,26mg/dl, endocardite ativa, pressão arterial pulmonar > 60 mmHg, uma ou mais cirurgias cardíacas prévias, CRM combinada com cirurgia valvar e diabetes melito. É necessário o desenvolvimento de escores locais, baseados na realidade das populações, para melhor aferição de riscos na cirurgia cardíaca. 66 Referências Bibliográficas 1. Omar RZ, Ambler G, Royston P, Eliahoo J, Taylor KM. Cardiac surgery risk modeling for mortality: a review of current practice and suggestions for improvement. Ann Thorac Surg 2004; 77(6):2232-7. 2. Bojar R, ed. Manual of perioperative care in adult cardiac surgery 2005. 3. Geissler HJ, Holzl P, Marohl S, et al. Risk stratification in heart surgery: comparison of six score systems. Eur J Cardiothorac Surg 2000; 17(4):400-6. 4. Nilsson J, Algotsson L, Hoglund P, Luhrs C, Brandt J. Comparison of 19 pre-operative risk stratification models in open-heart surgery. 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Ann Thorac Surg 1996; 62(5 Suppl):S2-5; discussion S31-2. 70 Tabelas e Figuras Tabela 1 – Prevalência dos fatores de risco na amostra e na população do Berstein Parsonnet 2000 Fator de risco Prevalência na Prevalência no Valor p amostra BP (%) (%) (n=1065) (n=10703) 38,7 31,34 <0,001 70-75 14,7 18,05 <0,001 76-79 6,7 13,76 <0,001 >80 4,7 7,88 <0,001 Diabetes melito 23,6 29,44 <0,001 30-49% 15,8 38,2 <0,001 < 30% 4,8 8,4 <0,001 Hipertensão arterial 73,1 63,12 <0,001 Insuficiência cardíaca congestiva 19,4 18,99 0,720 Obesidade mórbida 19,6 8,96 <0,001 DPOC severa 0,1 2,50 <0,001 Cirurgia cardíaca prévia 10,0 7,06 0,001 prévias 2,1 0,41 <0,001 Troca valvar aórtica 18,8 12,09 <0,001 Troca valvar mitral 13,4 7,13 <0,001 CRM com cirurgia valvar 7,0 8,54 0,093 Lesão de tronco 23,8 16,98 <0,001 BIAo pré-operatório 0,6 8,74 <0,001 Sexo feminino Idade Fração de ejeção > 50% Duas ou mais cirurgias cardíacas BP: Berstein Parsonnet 2000; DPOC: doença pulmonar obstrutiva crônica; CRM: cirurgia de revascularização miocárdica; BIAo: balão intra-aórtico 71 Tabela 2- Prevalência dos fatores de risco na amostra e na população do Berstein Parsonnet 2000 Situações especiais Prevalência na Prevalência no BP amostra (%) (%) (n= 10703) Valor p (n=1065) Choque cardiogênico 0,8 1,78 0,017 Endocardite ativa 1,0 0,40 0,005 Endocardite tratada 0,8 0,77 0,915 Cirurgia de aneurisma de VE 0,8 0,50 0,194 Cirurgia de valva tricúspide 1,6 0,43 <0,001 Dependência de marca-passo 1,3 1,50 0,604 TV/ FV 0,5 3,28 0,03 Asma 7,9 2,50 <0,001 EOT pré-operatória 0,5 1,35 0,017 Hipertensão pulmonar 16,6 10,72 <0,001 Cirrose 0 0,27 <0,001 Diálise 0,5 0,93 0,151 Insuficiência renal aguda ou crônica 5,1 4,57 0,457 Aneurisma de aorta abdominal 0,8 1,35 0,128 3,0 2,64 0,612 Doença vascular periférica 6,9 9,12 0,013 Reação transfusional prévia 0 0,24 <0,001 Doença neurológica grave (paraplegia, 7,6 8,4 0,364 ACTP sem sucesso 1,2 2,37 0.014 Abuso de drogas 0 2,11 <0,001 IAM < 48h 0,9 5,39 <0,001 CIV aguda 0,1 -- -- Púrpura trombocitopênica idiopática 0 0,27 <0,001 assintomático Doença carotídea (bilateral ou oclusão unilateral) hemiparesia, distrofia muscular) BP: Berstein Parsonnet 2000; VE: ventrículo esquerdo; TV/FV: taquicardia ventricular/fibrilação ventricular; TOT préoperatória: entubação orotraqueal pré-operatória; ACTP: angioplastia coronariana transluminal percutânea; IAM: infarto agudo do miocárdio; CIV: comunicação intraventricular ---: não houveram casos na amostra. 72 Tabela 3 – Prevalência dos fatores de risco na amostra e na população do EuroSCORE Fatores de risco Prevalência na Prevalência no Valor de p amostra EuroSCORE (%) (%) (n=1065) (n=19030) < 60 40,8 33,2 <0,001 60-64 16,7 17,8 0,314 65-69 16,6 20,7 <0,001 70-74 12,6 17,9 <0,001 >75 13,3 9,6 <0,001 Sexo feminino 38,7 27,8 <0,001 DPOC 7,9 3,9 <0,001 Arteriopatia extracardíaca 9,0 11,3 0,019 Disfunção neurológica 5,7 1,4 <0,001 Cirurgia cardíaca prévia 11,9 7,3 <0,001 Creatinina sérica >2,26 mg/dl 1,4 1,8 0,344 Endocardite ativa 1,0 1,1 0,034 Status crítico pré-operatório 2,7 4,1 0,022 Angina instável 17,1 8,0 <0,001 FE 30-50% 15,8 25,6 <0,001 FE < 30% 4,8 5,8 0,168 IAM < 90 dias 1,2 9,7 <0,001 Hipertensão pulmonar (PSAP 5,2 2,0 <0,001 1,2 4,9 <0,001 39,7 36,4 0,029 Cirurgia de aorta torácica 2,3 2,4 0,834 CIV pós –IAM 0,1 0,2 0,467 Idade (para cada 5 anos acima dos 60 anos) > 60 mmHg) Cirurgia cardíaca de emergência Outra cirurgia cardíaca associada ou não a CRM DPOC: doença pulmonar obstrutiva crônica; FE:fração de ejeção do ventrículo esquerdo; IAM: Infarto agudo do miocárdio; CIV: comunicação intra ventricular; PSAP: pressão sistólica na artéria pulmonar; CRM: cirurgia de revascularização miocárdica; CIV: comunicação intraventricular 73 Tabela 4 – Mortalidade esperada e observada no Berstein Parsonnet 2000 aditivo e logístico nos grupos de risco BP Mortalidade Mortalidade Esperada Observada RMP N N % N % 0a3 157 1 0,69 3 1.9 3,1 a 17,5 596 10 1,69 28 > 17,5 311 41 13,21 Total 1064 52 399 Estimativa LI LS 2,77 0,57 8,09 4,7 2,78 1,85 4,03 52 16,7 1,27 0,94 1,67 4,91 83 7,8 1,59 1,27 1,99 4 0,93 12 3,0 3,23 1,67 5,66 0,0138 a 0,0304335 7 2,04 19 5,7 2,78 1,67 4,34 > 0,0304 338 42 12,64 52 15,8 1,25 0,93 1,65 Total 1064 52 4,91 83 7,8 1,59 1,27 1,99 Aditivo Logístico ≤ 0,0137 RMP: Standardized Mortality Rate LI: Limite Inferior LS: Limite Superior 74 Tabela 5 – Mortalidade esperada e observada no EuroSCORE aditivo e logístico nos grupos de risco Euro Mortalidade Mortalidade Esperada Observada RMP N N % N % 0a2 303 4 1,28 7 2,3 3a5 395 11 2,86 24 ≥6 365 42 11,50 Total 1063 57 354 Estimativa LI LS 1,80 0,72 3,72 6,1 2,12 1,36 3,14 51 14,0 1,22 0,90 1,60 5,38 82 7,7 1,43 1,14 1,79 5 1,35 10 2,8 2,09 1,00 3,85 0,021 a 0,05 358 11 3,07 22 6,1 2,0 1,26 3,02 ≥ 0,06 351 41 11,79 50 14,2 1,21 0,90 1,59 Total 1063 57 5,38 82 7,7 1,43 1,14 1,79 SCORE Aditivo Logístico ≤ 0,02 RMP: Standardized Mortality Rate LI: Limite Inferior LS: Limite Superior 75 Tabela 6 – Preditores independentes para mortalidade intra-hospitalar na amostra segundo regressão logística Fator de risco Odds ratio (IC95%) Idade 76-79 2,49 (1,12-5,54) >80 3,61 (1,54-8,45) Creatinina sérica > 2,26mg/dl 4,71 (1,28-17,34) Endocardite ativa 4,38 (1,00-19,17) Pressão sistólica na artéria pulmonar> 60mmHg 3,44 (1,60-7,39) Duas ou mais cirurgias cardíacas prévias 3,34 (1,16-9,63) Uma cirurgia cardíaca prévia 2,68 (1,40-5,12) CRM combinada com cirurgia valvar 2,38 (1,18-4,80) Diabetes melito 2,28 (1,34-3,88) CRM: cirurgia de revascularização miocárdica 76 Figura 1 - Comparação das áreas sob a curva ROC do Berstein Parsonnet 2000 e do EuroSCORE logísticos – programa STATA 9.2. AUC do Berstein Parsonnet 2000 logístico 0,73 (IC95% 0,66-0,78) e do EuroSCORE logístico 0,73 (IC95% 0,67-0,78). Qui-quadrado=0,06, p (x²)=0,79 77 Figura 2 - Comparação das áreas sob a curva ROC do Berstein Parsonnet 2000 e EuroSCORE aditivos – programa STATA 9.2. AUC do Berstein Parsonnet 2000 aditivo 0,73 (IC95% 0,66-0,78) e EuroSCORE aditivo 0,73 (IC95% 0,67-0,78). Qui-quadrado=0,10, p (x²)=0,74. 78 6 APÊNDICES __________________________________________________________ 79 6.1 Elaboração de Escores de Risco Há basicamente cinco métodos para o cálculo do risco e elaboração de modelos de escore de risco: análise univariada, métodos aditivos, teorema de Bayes, regressão logística e neural networks, os quais descreveremos a seguir [1, 31]. Análise univariada: responde simplesmente se um único fator de risco tem associação com o desfecho em estudo, utilizando o teste qui-quadrado, o teste t e correlações. Os resultados são expressos em valores p. Geralmente valores de p < 0,05 são considerados significantes. Métodos aditivos: o método aditivo pode ser construído a partir de análises uni e multivariadas para identificar associações com os desfechos. Posteriormente, calcula-se o odds ratio para cada fator significativo. A cada fator de risco é atribuído um valor a partir do odds ratio. À beira do leito de um paciente em particular, são somados os pontos dos fatores de risco presentes. A mortalidade esperada é obtida através da pontuação alcançada. A desvantagem desse método relaciona-se à situação de pacientes de alto risco, cuja mortalidade é mais elevada e geralmente difere significativamente da mortalidade esperada. Teorema de Bayes: somam-se todos os fatores de risco do paciente, resultando numa “matriz de probabilidade condicional”. Aplica-se uma equação padrão nessa matriz, que fornece o cálculo do desfecho. Esse método trata cada variável de forma independente. Regressão logística: a regressão logística também é conhecida como análise multivariada ou multifatorial e é considerada o método clássico para o 80 desenvolvimento de modelos de risco. Primeiramente, se faz análise univariada para todos os fatores de risco considerados e aqueles em que o valor de p for <0,05 ou <0,01 são selecionados para a análise multivariada. A ordem em que os fatores entram no modelo é importante e por isso deve-se escolher qual será essa ordem. No método backward, um fator é retirado do modelo a cada vez e no método forward, um fator é adicionado. Após cada remoção ou adição, um coeficiente β é atribuído para cada fator ou o peso relativo que o fator tem no desfecho. Então, os odds ratios são calculados. Neural networks: usa inteligência artificial para determinar a probabilidade de uma relação entre múltiplos fatores, com algoritmos que se acredita simularem padrões de pensamentos humanos. É complexo e caro. Outras análises fundamentais são: a razão entre a mortalidade observada e esperada (razão O/E), calibração do modelo, estatística C e curva ROC. Razão O/E: é simplesmente a divisão da mortalidade observada em qualquer prática médica pela mortalidade esperada. Uma razão O/E <1,0 indica que a prática foi melhor do que a esperada. A razão >1,0 indica que a prática foi pior. Essas razões sempre devem ser acompanhadas por intervalos de confiança para poder representar a variação ano a ano do indivíduo e do cirurgião [1]. Calibração do modelo: o teste de Hosmer Lemeshow (H-L) é o teste mais amplamente usado na calibração dos modelos de escore de risco. Ele divide a amostra em dez grupos iguais de risco (decis). Se o modelo é bem calibrado, a proporção de mortes em cada grupo se aproxima da mortalidade 81 esperada para o grupo. Se o valor de p do teste H-L for > 0,05, o modelo é estatisticamente bem calibrado [1]. Estatística C e curva ROC: indica a habilidade do modelo de discriminar os pacientes não sobreviventes dos sobreviventes. A área sob a curva ROC (Receiver Operating Characteristic) também é conhecida como “índice c”. Para calculá-la, os pacientes são agrupados em pares, onde um é um sobrevivente e o outro é um não-sobrevivente. Para cada par a probabilidade predita de morte deve ser idealmente maior no paciente nãosobrevivente. A área sob a curva ROC (AUC) é a percentagem em que essa probabilidade é verdadeira. Varia de 0 a 1,0. Valores de 0,5 indicam que o modelo não consegue discriminar entre os sobreviventes e os não sobreviventes. A prática clínica em cirurgia cardíaca considera que o modelo tem bom poder discriminatório se a área sob a curva ROC for > 0,70 [1]. Após a escolha do método a ser utilizado na construção do escore, deve-se ter o cuidado do cálculo adequado para o tamanho da amostra. O número de mortes observadas deve ser no mínimo dez vezes o número de fatores de risco examinados para a inclusão no modelo. Por exemplo: um modelo de 15 fatores de risco, assumindo uma mortalidade em 30 dias de 3%, requer, no mínimo, 5.000 pacientes. Os pesquisadores também devem estabelecer o método utilizado para avaliar os valores perdidos (missing values), uma vez que há várias técnicas de substituição desses valores atualmente disponíveis. Outra observação a ser feita é quanto ao desenvolvimento e validação do modelo de risco. Todos os pacientes devem ser submetidos a um procedimento num mesmo tempo específico e devem ser randomizados para 82 o grupo para desenvolver o modelo e o grupo para validá-lo. Os dois grupos devem ter o mesmo número de pacientes. Após a validação, o modelo deve ser aplicado na prática. 83 6.2 Protocolo de Pesquisa 84