22 ZERO HORA DOMINGO, 30 DE SETEMBRO DE 2012 Geral [email protected] (51)3218-4728 Editor: Marcelo Ermel - [email protected] Produtor: Jaisson Valim - [email protected] CÉREBRO ELETRÔNICO O maestro da superação João Carlos Martins se apresenta na Capital após implantar eletrodos na cabeça e recuperar movimentos perdidos há 10 anos FERNANDO MUCCI, DIVULGAÇÃO LARA ELY Seis meses após a cirurgia que devolveu o movimento a sua mão esquerda, João Carlos Martins – considerado um dos maiores intérpretes de Bach – se apresenta terça-feira no auditório Dante Barone da Assembleia Legislativa, em Porto Alegre. Apesar de ainda não ver toda a mão esquerda tocar o teclado do piano, os gaúchos poderão conferir o maestro com maior desenvoltura na regência da batuta e com mais movimento do braço. I sso só foi possível graças a uma cirurgia que implantou dois eletrodos no cérebro do maestro e restabeleceu parte de seus movimentos, no início deste ano. – É uma questão de tempo até conseguir recuperar o desempenho de antes – diz Martins, inspirado em um violinista dos Estados Unidos que,após uma cirurgia semelhante,voltou a tocar normalmente. O problema foi se agravando aos poucos, após uma série de acontecimentos: um machucado durante uma partida de futebol,em 1966,uma lesão por esforço repetitivo (LER),em 1985,e uma agressão sofrida durante um assalto na Bulgária,em 1995.Martins perdeu o movimento da mão esquerda, mas nunca se afastou da música e dos palcos. Deixou de se dedicar exclusivamente ao piano e passou a estudar regência.Criou a Orquestra Bachiana,voltada para a inclusão social de jovens carentes. Graças ao implante, Martins já consegue executar movimentos e sua expectativa é retomar plenamente as funções da mão e do braço Por dentro da cirurgia O procedimento, realizado em 16 de abril, teve como objetivo conter e reverter um processo de atrofia do braço e mão esquerdos: ● Em nome da arte, cirurgia foi realizada sem custos ● Em março deste ano, Martins entregou-se às mãos do renomado neurocirurgião Paulo Niemeyer Filho.Da mesma forma que fez com os músicos Herbert Vianna e Edu Lobo, o médico fez a operação de graça em prol do legado que os artistas deixaram para a arte e a música brasileira, como um tributo da ciência para a música. – Já houve outros testes como este, mas nunca para um profissional que quer recuperar os movimentos perdidos há tanto tempo – afirma Martins. Antes da cirurgia, o problema de distonia fazia com que três dedos se fechassem involuntariamente, cravando as unhas no centro da mão esquerda, que às vezes sangrava. A meta, segundo Martins, é conseguir recuperar o nível anterior: – Ou eu volto tocando profissionalmente ou não volto. E se for necessário, pode ter certeza de que farei mais uma cirurgia. [email protected] Nos últimos anos, o maestro sofreu um agravamento das dificuldades provocadas por uma distonia muscular que acomete seu braço e mão esquerdos. Na operação, realizada em março na Clínica São Vicente, no Rio de Janeiro, foram instalados dois sistemas estimuladores no cérebro (um japonês e outro americano). Também foi implantado um chip localizado no peito, na altura do tórax. Foram abertos dois pequenos orifícios no cérebro por onde passaram os eletrodos. Eles precisam de constantes ajustes para funcionar e fazer com que volte a movimentar braços e mãos. Conhecida como “cãibra do pianista”, a distonia consiste em uma alteração no cérebro que provoca, a cada movimento, uma contração. ● ● ● Apesar da dor, o maestro manteve-se acordado durante a cirurgia por conta dos testes de movimento. ● A cirurgia teve sucesso e, como resultado, ele conseguiu esticar o braço na hora. ● O desafio agora é recuperar o mo- vimento perfeito dos dedos que tinha antes da distonia. A apresentação na Capital No repertório, estão incluídas músicas eruditas a sambas-enredo: ● O que: Concerto Oficial Especial da ● Ospa ● sembleia Legislativa a partir de segunda-feira, das 11h às 19h. Na terça-feira, o horário de atendimento será das 12h às 20h Quando: terça-feira, dia 2 de outubro, às 20h30min ● Onde: Auditório Dante Barone – Assembleia Legislativa (Praça Marechal Deodoro, 101) Ingressos: estão à venda na As- ● Valores: R$ 30 (público geral) e R$ 15 (estudantes, sêniors e sócios do Clube do Assinante ZH) ENTREVISTA João Carlos Martins Maestro “Tem que correr atrás do sonho” Com seu bom-humor característico,o maestro adiantou que,na apresentação da Ospa,irá contar a história da dança e mostrar como ela evoluiu nos séculos.No final,tocará no piano duas peças: Libertango,de Astor Piazzolla,e Cine Paradiso,de Ennio Morricone. Zero Hora – Em Porto Alegre, você tocará piano normalmente com as duas mãos? João Carlos Martins – Eu ainda vou tocar no velho sistema, ou seja, usando a mão direita e um ou dois dedos da mão esquerda. Mas em casa, treinando, estou adotando o novo sistema (com as duas mãos). Após a bronca que levei do médico por praticar em turnos de oito horas, toco de cinco a 10 minutos por dia. Mas é um trabalho longo e terei que ir aos poucos, com muita determinação e força de vontade. Tem que ser velho para encarar. Com 72 anos, você faz isso, não tem nada a perder. ZH – Você acha que muitas pessoas vão aos seus concertos por admirar sua persistência e busca pela perfeição? Martins – Procuro a excelência musical sempre, assumo minha responsabilidade social com o trabalho que faço nas periferias e procuro dar o exemplo de que esperança é sinônimo de dor. Com a minha música, pretendo mostrar que, de cada adversidade, você pode fazer uma plataforma para o futuro, e deixar um legado. Minha meta é estar sempre procurando a excelência. Tem que correr atrás do sonho, pois, quando menos se espera, é ele que está correndo atrás de você. ZH – O que o público de Porto Alegre pode esperar da apresentação de terça? Martins – Todo concerto que faço digo que é o mais importante da minha vida. Esse ano já fiz 105. Sempre procuro fazer da minha orquestra o meu piano. Cada música é como se fosse uma tecla que tenho que tocar com muito amor.