EXPANSÃO URBANA E DEGRADAÇÃO AMBIENTAL: O CASO DO BAIRRO CAMILO PRATES 504 Gerlaine Soares da Silveira [email protected] Pós-graduanda em Meio Ambiente e Desenvolvimento Social, Universidade Estadual de Montes Claros-Unimontes Igor Martins de Oliveira [email protected] Pós-graduando em Meio Ambiente e Desenvolvimento Social, Universidade Estadual de Montes Claros-Unimontes Resumo: Com o crescimento urbano, as cidades possuem cada vez menos espaços verdes. A necessidade de expandir as áreas habitacionais contribui para o conflito: crescimento urbano versus preservação ambiental. Na cidade de Montes Claros a expansão urbana inicia-se na década de 1960, com o processo de industrialização que impulsionou a criação de bairros, sobretudo nas áreas periféricas, que nem sempre seguiram as normas regulamentais de preservação ambiental. O exemplo disso temse o bairro Camilo Prates, onde encontramos três lagoas naturais, o que deveria se uma área de Preservação torna-se um perigo e transtorno para os moradores devido as constantes problemas do entorno das lagoas como acúmulo de lixo e inundações. Diante deste cenário, este trabalho tem com objetivo conhecer o problema ambiental oriundo das lagoas do bairro Camilo Prates, localizado na região sudeste da cidade de Montes Claros, bem como os reflexos da expansão urbana da cidade no paradoxo sociedade X ambiente. Palavras Chave: Crescimento Urbano, Lagoas, Preservação Ambiental. ISBN: 978-85-99907-05-4 I Simpósio Mineiro de Geografia – Alfenas 26 a 30 de maio de 2014 Considerações Iniciais O Município de Montes Claros localiza-se no norte de Minas Gerais na Depressão Periférica do São Francisco, também denominada Depressão Sanfranciscana caracterizada por cobertura recente datado da Era Cenozóica, período Terciário. Sobre a caracterização dessa depressão Carneiro (2009, p. 09) afirma que essa [...] apresenta superfícies de aplainamento elaboradas por processos cuja gênese está relacionada com a evolução das depressões e áreas rebaixadas sublitorâneas, desnudadas, localmente, pela drenagem do rio Verde Grande. Estendem-se desde os sopés das encostas dos planaltos e das serras até os terraços e planícies fluviais. Figura 01: Norte de Minas - aspectos da Depressão Sanfranciscana Fonte: Leite, 2003, apud Borges (2007) ISBN: 978-85-99907-05-4 I Simpósio Mineiro de Geografia – Alfenas 26 a 30 de maio de 2014 505 506 Mapa 01: Localização do Município de Montes Claros na Meso Região do Norte de Minas. No que tange a hidrografia, deve-se ressaltar dois recortes geográficos, o primeiro concerne ao município que é drenado pelos rios Verde Grande, Pacuí, Riaçhão, e São Lamberto. Também possuem algumas lagoas, como Tiriricas, Lagoão, Periperi, São João, Brejão, da Garça, Veredas do Caetanos, Mombuca, São Jorge, dos Freitas, dos Matos e do Barreiro (LEITE; PEREIRA, 2008). A área urbana é drenada pelo rio Vieira que atravessa a cidade na direção Sul/Norte, nesta bacia predomina o relevo endocárstico, destacando a área da Lapa Grande com a presença de grutas e vales cegos, bem como, nascentes e surgências, mananciais subterrâneos além de rios e córregos intermitentes. (EMATER, 2003 citado por BORGES, 2007). A bacia do Rio Vieira é formada pelos córregos da Gameleira, dos Porcos, Palmital, São Geraldo, Vargem Grande, São Marcos, dos bois, Lapa Grande, Morcego, Cintra, Pau preto, Barrocão, Mocambo firme, Cabeceiras, Mumbuca, além dos rios do Cedro e Canoas (LEITE E PEREIRA, 2008). O rio Verde Grande tem suas nascentes no município de Montes Claros, tendo como principais afluentes de sua margem esquerda na área urbana de Montes Claros o rio Vieira, este apesar de ser o principal rio da cidade é utilizado como canal coletor de esgoto da área urbana, sendo apenas ISBN: 978-85-99907-05-4 I Simpósio Mineiro de Geografia – Alfenas 26 a 30 de maio de 2014 um entre vários outros exemplos de problemas ambientais encontrados na cidade de Montes Claros. 507 Mapa 02: Bacia hidrográfica do Rio Vieira. Fonte: EMATER, 2003, citado por Borges (2007). No que concerne ao panorama socioeconômico da cidade de Montes Claros, cabe o destaque para os anos posteriores a década de 1970, onde a cidade passa por uma política intervencionista que resultou com a inserção da cidade na área de atuação da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste-SUDENE, que atraiu vários investimentos, principalmente os referentes ao setor industrial. Desta forma, o espaço urbano foi gradativamente sendo (re) articulado em favor, sobretudo, do modo de produção industrial que desenvolveu forte influencia na (re) estruturação do município, este processo similar a este foi analisado por Carlos (2001) ao estudar as relações entre processos de produção, desenvolvimento e acumulação ligados à produção do espaço. Somado a tais mudanças, a cidade de Montes Claros recebe no mesmo período grande contingente populacional oriundo da migração campo-cidade em busca de se ISBN: 978-85-99907-05-4 I Simpósio Mineiro de Geografia – Alfenas 26 a 30 de maio de 2014 integrar no sistema produtivo, sobretudo, o industrial. Nas palavras de França (2007, p. 74) “Os incentivos fiscais proporcionados pela SUDENE para a instalação de indústrias em Montes Claros acarretaram, além do aumento populacional via migrações, a transformação da economia do município”. Corroborando com a autora supracitada Leite e Pereira (2008) afirmam que na implantação e desenvolvimento da industrialização na cidade surgiram massas de trabalhadores, provenientes de várias cidades pequenas do norte do estado, o que contribuiu para o aumento populacional, bem como para o aumento da renda da elite industrial, tendo em vista que os trabalhadores possuíam baixa qualificação profissional e mão de obra barata, devido à grande oferta. Diante disso, o aumento da densidade demográfica acarretou sérios problemas para a cidade, uma vez que, grande parte da população migrante não se inseriu no mercado de trabalho gerando assim, a alteração sócio-espacial “como a violência, a falta de infra-estrutura e de serviços urbanos, o desemprego, a favelização, a degradação ambiental, dentre outros” (PEREIRA, 2007, p. 136). Também, a infra-estrutura criada em favor da industrialização expande-se atingindo outros setores econômicos. Assim, percebe-se que Montes Claros tem se firmado nas últimas décadas como centro comercial e de prestação de serviços, como afirma Leite citado por Pereira (2007). Outro fator relevante trata-se do acesso dos migrantes ao mercado de trabalho, bem com aos serviços e necessidades básicas (saúde moradia, segurança). Uma vez que, parte do contingente não se inseriu no sistema produtivo, criando assim, um excedente de pobres urbanos, parcela essa que em alguns casos não possuíam renda nem mesmo para pagar aluguel. Para Leite e Pereira (2008) o crescimento populacional contribuiu diretamente para o surgimento de vários loteamentos com pouca infra-estrutura, na maioria clandestino ou irregulares, quando não eram invadidos, criando assim o processo de periferização da cidade. Concomitante aos problemas sociais e econômicos, as condições ambientais é outro fator a ser analisado a partir do crescimento urbano. Sobre esta problemática Leite e Pereira (2008) salientam que a relação proporcional entre crescimento o urbano e problemas ambientais. Diante de tudo isso, este trabalho tem com objetivo conhecer o problema ambiental oriundo das lagoas do bairro Camilo Prates, localizado na região sudeste da cidade de Montes Claros, bem como os reflexos da expansão urbana da cidade no paradoxo sociedade X ambiente. ISBN: 978-85-99907-05-4 I Simpósio Mineiro de Geografia – Alfenas 26 a 30 de maio de 2014 508 Para realização deste trabalho, foi utilizada uma revisão bibliográfica apoiando-se em livros, periódicos, documentos eletrônicos, dissertações e tese de autores que abordam a questão do município de Montes Claros. Foram realizados trabalhos de campo e entrevistas não estruturadas, abrangendo o bairro Camilo Prates. Posteriormente elaborou-se um mapa de uso e ocupação do solo do bairro Camilo Prates utilizando a imagem de satélite Quick Bird da área urbana de Montes Claros (2005), bem como os softwares ArcView 3.2 e Auto Cad Map 2000. Crescimento urbano e problemas ambientais: As lagoas naturais do bairro Camilo Prates. O Bairro Camilo Prates localiza-se na região sudeste da cidade de Montes Claros, Limitando-se a norte com o bairro Lagoas do Belvedere, a sul com o bairro Vila Anália e a Oeste com o Novo Delfino. O mesmo apresenta-se como um bairro de habitação recente de pequena extensão, de baixa infra-estrutura, abrigando uma população em suma pobre e de baixa escolaridade distribuídos em todas as faixas etárias (OLIVERIA ett all, 2010). Ambientalmente essa área é de grande riqueza, tendo em vista que o mesmo contém lagoas naturais, mas, contudo, devido o processo de ocupação essas acarretam grandes problemas para a população do bairro. A partir de trabalho de campo realizado na área em estudo, verifica-se que o bairro Camilo Prates e imediações estão inseridos numa zona mais rebaixada, de relevo suave na parte Sudeste de Montes Claros, onde há o predomínio de metapelitos. Diferente da zona oeste de Montes Claros, que constituem cotas elevadas ascendendo até cerca de 1000 metros de altitude, predominando rochas calcárias, onde se observa evidências de fenômenos cársticos. Na área em estudo pode-se observar a presença de cursos de água exibindo formas de meandros, indicando um estágio de maior maturidade e a presença de lagoas semicirculares. Essas lagoas apresentam certo lineamento, que talvez possam estar associado a sistema de fraturas (OLIVERIA ett all, 2010). Um ponto que necessita de atenção é embora o bairro seja de baixa renda, a área apresenta uma beleza natural muito particular. As áreas das lagoas poderiam passar por um projeto de revitalização, preservação ambiental, por se tratar de ressurgências naturais. Contudo, as áreas em torno são negligenciadas, o que gera problemas para os moradores como acumulo de lixo, e enchentes no período das chuvas, que devido a falta de planejamento. ISBN: 978-85-99907-05-4 I Simpósio Mineiro de Geografia – Alfenas 26 a 30 de maio de 2014 509 510 Mapa 03: Uso e ocupação do solo no bairro Camilo Prates. Fonte: Oliveira (2010) Durante o trabalho de campo, visitamos as três lagoas, que identificamos como 1, 2 e 3 (nomeadas pela ordem que foram visitadas). A lagoa número 1 á mais distante das casas, essa recebe água do córrego que atravessa o bairro Novo Delfino. A lagoa número 2 está passando por um processo de soterramento e canalização devido a expansão urbana da área. Por fim a lagoa número 3 é a mais próxima das residências, o que a torna a maior detentora dos problemas de inundações. A partir das observações das imagens de satélites e trabalho de campo, nota-se que ocorrem algumas mudanças de 2005 a 2014. Estão sendo feitas obras na área em estudo em função de um loteamento de um novo bairro. Em decorrência desta expansão urbana Tentaram drenar a lagoa 1 e lagoa 2. Como o nível de base da lagoa 2 é inferior ao nível do canal que foi construído para o escoamento da água drenada, o projeto não teve êxito em sua totalidade tendo em vista que somente na lagoa 1 a tentativa ocorreu com sucesso. Na área do canal, pode-se percebe um solo hidromórfico, acinzentado, argiloso, e por cima desse solo há um solo transportado, amarelado, de aproximadamente 50 cm de espessura (OLIVEIRA et all, 2010). ISBN: 978-85-99907-05-4 I Simpósio Mineiro de Geografia – Alfenas 26 a 30 de maio de 2014 511 Figura 02: Canal de Drenagem da lagoa 02. Autor: Oliveira, 2010. Segundo morador residente próximo a Lagoa 3, há aproximadamente duas décadas a extensão da lagoa era muito menor que apresentada nos dias de hoje. Contudo, a partir da ação antrópica da retirada da mata ciliar, bem como através da utilização das águas e argila o seu tamanho expandiu de tal forma a se tornar um grave problema. Desta forma, tais moradores não veem o local de edificação de suas casas como um ponto de moradia definitiva, uma vez que eles apontam problemas e esperam por possíveis soluções, sendo as principais; a possibilidade de melhorar a estrutura de suas residências. Dentre os vários problemas enfrentados pelos moradores do bairro Camilo Prates, pode-se destacar o fato de suas residências estarem localizadas em área de risco e enfrentarem freqüentes inundações ocorridas em épocas de chuvas, devido ao volume da água da lagoa subir muito, invadindo as casas ao seu entorno, provocando desespero e transtorno à população, causando estragos em bens materiais. Outro problema existente na área é o aumento da área impermeabilizada no entorno das lagoas, poço artesiano a menos de 30 metros da lagoa, lixo doméstico e entulhos de construção as margens das lagoas como pode ser visualizado pela Figura 1. ISBN: 978-85-99907-05-4 I Simpósio Mineiro de Geografia – Alfenas 26 a 30 de maio de 2014 512 Figura 03: Presença de lixo e entulho próximo as lagoas. Autor: OLIVEIRA, I.M. de, 2010. Nesse contexto, verifica-se que parte da área residencial do bairro Camilo Prates não respeitou a Resolução 302 do Conselho Nacional de Meio Ambiente - CONAMA (20 de mar. 2002) que constitui Área de Preservação Permanente, tendo em vista que para o CONAMA [8] determina que ao entorno de lagos e lagoas naturais, a metragem mínima de: a) trinta metros, para os que estejam situados em áreas urbanas consolidadas. Outro problema importante percebido e comprovado através deste estudo é a retirada da vegetação natural do entorno principalmente da lagoa 3. Assim, as famílias residentes as margens da lagoa, provavelmente não possuem condições financeiras de ocupar outras áreas, levando-as, por ocupar áreas tão sensíveis, que não poderiam ser ocupadas. Considerações Finais. A cidade de Montes Claros passa desde a década de 1960 por constantes processos de crescimento, impulsionados pela industrialização da cidade. O aumento populacional, a criação de novos bairros, através da expansão das áreas periféricas deu inicio aos problemas ambientais urbanos, como o aumento do lixo, o desmatamento e a ocupação de áreas de preservação. O bairro Camilo Prates é um exemplo dessa ocupação. O conflito crescimento X preservação devem compor as pausas de analises do campo acadêmico, bem como a sociedade em geral, estudos empíricos foram realizados nos anos de 2008 (Costa et ISBN: 978-85-99907-05-4 I Simpósio Mineiro de Geografia – Alfenas 26 a 30 de maio de 2014 all) e 2010 (Oliveira et all) que abordaram a necessidade de intervenção na área, uma vez que esta é visivelmente negligenciada na cidade. Referencias: BORGE, Luciene. Qualidade da água do Rio Vieira sob a influência da área urbana de Montes Claros MG. 86 p. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil). Faculdade de Engenharia Civil/UFU. Uberlândia 2007. CARLOS, Ana Fani Alessandri. “Novas” contradições do Espaço. In: DAMIANI, Amélia Luisa; CARLOS, Ana Fani Alessandri; SEABRA, Odette Carvalho de Lima. (org). O Espaço no fim do Século: a nova raridade. 2ª Ed. São Paulo: Contexto, 2001. CARNEIRO, Marina de Fátima Brandão. OS ALICERCES DA REGIÃO DE MONTES CLAROS/MG: UMA LEITURA GEOLÓGICA E GEOMORFOLÓGICA. In: V Encontro Regional dos Povos do Cerrado. 2009. Pirapora. ANAIS... Pirapora: Unimontes, CD ROM. COSTA, Dayane Stephanie Maia. ANÁLISE ESTRUTURAL E COMPARATIVA DO LAGO NORTE E DA LAGOA DO BAIRRO CAMILO PRATES DA CIDADE DE MONTES CLAROS. In: VII ENCONTRO REGIONAL DE GEOGRAFIA: A Terra, as Dinâmicas Regionais e o Futuro da Geografia, 2008. Anais... Montes Claros: Unimontes, CD ROM. FRANÇA, Iara Soares de. A Cidade Média e suas Centralidades: O exemplo de Montes Claros no Norte de Minas Gerais. 256p. Dissertação (Mestrado em Geografia) Instituto de Geografia/ UFU. Uberlândia, 2007. LEITE, Marcos Esdras e PEREIRA, Anete Marília. Metamorfose do espaço intraurbano de Montes Claros/MG. Montes Claros: Unimontes, 2008. OLIVEIRA, Igor Martins de Oliveira. UTILIZANDO AS NOVAS TECNOLOGIAS VISANDO O MAPEAMENTO DO USO DO SOLO DO BAIRRO CAMILO PRATES E SEU ENTORNO. In: I Congresso Brasileiro de Organização do Espaço e X Seminário de Pós-Graduação em Geografia, 2010, Rio Claro. Anais... Rio Claro: UNESP, CD ROM. PEREIRA, Anete Marília. Cidade Média e Região: o significado de Montes Claros no Norte de Minas Gerais. 351p. Tese (Doutorado em Geografia) Instituto de Geografia/UFU. Uberlândia, 2007 ISBN: 978-85-99907-05-4 I Simpósio Mineiro de Geografia – Alfenas 26 a 30 de maio de 2014 513